Barbara parou seu carro no que era um vazio estacionamento, não parecia o mesmo lugar do dia anterior, mas normalmente o pequeno ginásio onde as lutas se realizavam era daquela forma, vazio e silencioso. Desceu indo direto para a sala da proprietária, ou melhor, a mulher contratada para ser proprietária. A verdadeira dona era a própria Bárbara, a mulher responsável pela administração, e por responder por todo o lugar era Érica, uma velha amiga dos tempos de infância de Bárbara.
Sua família costumava gerir, desde muito tempo, o ginásio/clube de treino e competições, mas o irmão de Érica bebeu e jogou tudo o que tinham, inclusive aquele espaço, a lutadora soube, pagou as dívidas e comprou o lugar, por um bom preço, com a única condição de que ninguém ficaria sabendo sobre ter feito isso, e que a velha amiga fosse o contato com os clientes da Muerte.
Passou pelo ringue vazio, bateu a porta da sala simples no mezanino, e ouviu a voz anasalada de Érica dizendo para que entrasse.
-E aí? - Bárbara entrou sentando diante dela tranquilamente, acendeu um cigarro e aceitou o café quente que ela lhe servia.
-Parabéns por ontem! Nem conseguimos nos falar, você foi bem. Aliás, foi bem em todas as suas atividades do dia e da noite.
-Obrigada! - Suspirou bebendo um gole generoso do café, fechando os olhos e sentindo o corpo esquentar. - Que horas o tal Gael vem?
-Depois das 17, por que? - A olhou de lado, tinha o nariz aquilino e olhos castanhos expressivos, pequenos e brilhantes, era ruiva, cheia de sardas, e linda.
-Nada não, mas soube que ele perguntou por mim, e ontem perdeu muito tempo acompanhando meus movimentos, para fechar, quer o contato da Muerte.
-Ah não se preocupe! Ele não faz ideia de que você é você, ao contrário, pensa que você é a esposa do contato, e quer você evidentemente, além de querer os serviços do Muerte.
-Bem, talvez ele consiga os serviços, quanto a mim, duvido muito. - Riu revirando os olhos. - Vamos pensar bem nesse alvo, não responda nada a ele. Vou viajar dentro de dois meses, acerte tudo para que os serviços sejam terminados antes disso, e me de uma janela de um mês, vou ter que ficar fora bastante tempo.
-Como ela está? - A olhou preocupada.
-Como sempre, às vezes bem, às vezes péssima. Mas está sendo bem atendida, o que já é alguma coisa. - Levantou e fungou, tirando os pensamentos da cabeça. - Vou treinar, a semana está calma eu acho.
-Tá brincando? Só ontem você fez 1,5M, meu amor!
-Eu sei, esse pessoal gosta mesmo de morte né! - Desceu as escadas terminando o café, deixou o copo no bar, vazio quando não haviam disputas, e entrou no vestiário para vestir as roupas de exercício. Colocou short justo e um top apenas, logo se aqueceria, detestava passar calor, se sentia sufocada com bastante facilidade.
-Tá afim de treinar campeã? - Jonatan piscou um olho charmoso e se aproximou dela, era lindo além da conta, e o único a treinar aquela hora. - Você foi incrível ontem!
-Obrigada! - E você é incrível sempre, gostoso! Pensou, mas jamais diria, até porque, não queria nada com ele.
Iniciaram o treinamento, ele não parecia estar se esforçando muito, ela ouviu o celular tocando e resolveu encerrar aquele treininho mixuruca, faria sozinha, era muito mais fácil.
-Tia! Tudo bem? - Atendeu apreensiva quando viu quem era, saiu vestindo o casaco e acendendo um cigarro. - Eu sei, não eu sei tia, mas eu… olha eu não posso ir antes, prometo que em dois meses estarei aí! - Uma pausa longa, olhos fechados como se ouvisse notícias terríveis. - Contrate mais alguém, tia, eu não posso ir antes, por favor… Ela está em casa? Tudo bem, eu ligo mais tarde então… Também te amo. - Desligou o telefone e ficou pensativa, socou a parede, o casaco aberto sacudia ao vento, o frio intenso passava por sua pele suada a fazendo arrepiar, mas não se importou com isso.
-Más notícias? - Gael parou na frente dela, seus olhos grudados a cada movimento que ela fazia.
-O que? - Não o viu chegando, olhou sem entender.
-No telefone? Você parece preocupada. - Fez uma careta. - Me desculpe, não quis me intrometer.
-Tudo bem, foi só coisa de família, sabe como é. O que você veio fazer aqui? Vai se inscrever para treinar?
-Não, eu moro longe, tenho uma reunião com… Bem, não sei bem com quem.
-Ah tudo bem! - Ergueu os braços se afastando. - É um dos assuntos que definitivamente não dizem respeito a uma lutadora não profissional, entre, acho que eles te acham sozinhos, sem anunciar sua chegada.
-E quem são “eles”?
-Aí é que está a parte dos assuntos que não me dizem respeito, meu negócio é dar socos em sacos de boxe. - Riu e ele ficou parado olhando, ela olhou a porta e ele abaixou a cabeça e entrou sem dizer nada.
Assim que entrou, viu Érica fazendo um sinal para que subisse. Sorria simpático, a mulher o olhou apertando os olhos, fora isso, não identificou outra expressão em seu rosto.
-Muito prazer, Gael Walsh.
-Walsh? Irlandes? - Ele acenou concordando e ela pareceu surpresa. - Sou Érica Byrne Tomasino, é um prazer conhecê-lo. Sente-se, por favor, aceita um café, água?
-Um café seria bom, obrigado. Sua mãe é irlandesa? - Pegou a xícara e a olhou curioso, ela parecia simpática e tranquila, provavelmente era o braço direito do tal Muerte.
-Sim, e meu pai italiano, foi isso que saiu! - Riu e então ficou séria. - E então senhor Walsh, me diga o que quer.
-Preciso dos serviços do Muerte.
-Quem você quer matar? - Ele a olhou surpreso e ela sorriu divertida. - Sabemos que você não pretende chamá-lo para um churrasco, então, quem é o alvo?
-Quando eu tenho contato com ele?
-Você não tem, a não ser que seja o alvo. Tudo é acertado entre nós, metade quando ele aceitar o trabalho, o restante depois que a notícia da morte sair nos jornais, se a pessoa for conhecida, ou quando a família identificar o corpo.
-Há um elemento que está causando problemas, ele…
-Não importa, apenas o nome e alguns dados se você tiver, a depender de quem é e da dificuldade, eu lhe darei o valor, e então ele resolve se aceita ou não o trabalho.
-Esteban Carrero.
-Mexicano?
-Caribenho, chefe da família Carrero, você deve conhecer.
-Ah esse Esteban… é ouvi falar. Não são necessários muitos dados então, vou passar o serviço para ele, o valor nestes casos varia de 2 a 3 milhões.
-Minha chefe gostaria de pagar 4, pelos possíveis inconvenientes que seu chefe possa enfrentar ao se meter com eles, são bastante ferozes.
-Ótimo, assim que ele aceitar eu entro em contato para confirmar a entrada. - Retirou um celular descartável de uma gaveta em sua mesa e entregou para ele. - Vamos ligar para este telefone, quando desligar, você deve destruir ele, se livrar dos restos, você sabe do que estou falando, não é um amador.
-Não sou… - ela o olhou erguendo as sobrancelhas e ele sorriu sem graça, baixou os olhos e os ergueu novamente. - A lutadora, Bárbara, você acha que ela…
Érica o olhou franzindo a testa.
-Ela pareceu preocupada, no telefone, é um mau dia para convidá-la para um jantar?
-Absolutamente, vou gostar de ver você tentando, isso não costuma acontecer, - fez um gesto com as mãos. - digo ela aceitar, mas normalmente recebe convites diariamente.
-Isso significa que eu não tenho chances?
-Isso significa que acho divertido ver os homens humilhados tentando, mas que se ela aceitar, você terá tirado a sorte grande!
Ele sorriu, levantou e apertou a mão dela, pareceu descer em câmera lenta as escadas, olhando fixamente para a lutadora, que desviou o olhar por um segundo, para ver os olhos azuis lindos grudados nela, foi derrubada pelo brutamontes com quem treinava, e ele a prendeu no chão, não de uma forma normal, como em uma luta. Por apenas dois segundos ela se sentiu sufocada, entendendo o que ele estava fazendo, e então ela virou e distribuiu uma chuva de socos nele.
-Tudo bem... me desculpe Bárbara! Pare!... Eu… Me desculpa por favor!
-Você, seu idiotinha cheio de músculos! - Ela falava e seguia socando sua cabeça e suas costelas. - Mas quem você pensa que é!?
Seguiu dando socos, até que alguém subiu no ringue e a tirou de cima dele, ou tentou, só havia uma outra lutadora chegando, seu nome era Claudia e ela tentou com toda sua força, que não era pouca, mas Bárbara queria o sangue dele, já estava desmaiado a essa hora, Gael se adiantou e ajudou a tira-lá de cima dele.
-Me solta! - Se desvencilhou empurrando eles.
-Ele já apagou, tudo bem B, já apagou. - Claudia parou na frente dela e segurou seus ombros.
Érica apareceu ao lado delas, olhou o homem desacordado com o rosto coberto de sangue e assoviou.
-Me ajuda aqui Clau, vou levar ele para o hospital, e você, poderia ter parado quando ele apagou Bárbara.
-Não! Ele não aprenderia a não tentar mais agarrar uma mulher que julga mais fraca do que ele se eu tivesse parado, quero que ele saiba que apanhou estando desacordado, para se sentir impotente e frágil. - Saiu dali, e foi até seus cigarros, fumou fechando os olhos e se acalmando.
-Você está bem? - Gael se aproximou lentamente. - Precisa de alguma coisa?
Ela o olhou séria, sorriu sem mostrar os dentes, um sorrisinho incontrolável, olhou em volta, estavam sozinhos.
-É, eu acho que preciso sim… - Foi para o vestiário e tirou as roupas, ligando a água bem quente dos chuveiros.
Gael hesitou por alguns segundos, ela queria que ele fosse? Ou acabaria com ele quando o visse? Resolveu arriscar, não conseguia mesmo tirar ela de sua cabeça, e realmente não se importou ao vê-la batendo no brutamontes, ao contrário, sentiu como se precisasse possuí-la naquele exato momento.
Ele entrou devagar, ouviu o barulho do chuveiro e sorriu involuntariamente para as roupas dela atiradas no chão. Parou na frente do chuveiro onde estava, e a olhou sério, ela sorriu, foi até ele e o ajudou a se despir, entre beijos na boca e pescoço. Ele a ergueu do chão, passando as pernas longas por sua cintura, e andou com ela até os chuveiros. A encostou na parede e olhou seus olhos negros quando começaram, ela suspirou e gemeu, o abraçando forte.
Barbara normalmente não fazia esse tipo de coisas, não olhava para ninguém, não deixava que se aproximassem, tinha uma casca dura que não se abria facilmente. Mas naquele momento, com aquele homem, resolveu que queria se entregar, talvez porque estivesse excitada depois de bater no idiota, adrenalina causa essas coisas, talvez porque ele estivesse entregue, desde o dia anterior, a ela, seu olhar revelando tudo o que queria.
Quando terminaram, ele sorriu passando a mão no rosto bonito, beijou a ponta do nariz dela e respirou fundo, sem se afastar.
-A propósito, muito prazer, me chamo Gael.
Ela soltou uma gargalhada e esticou a mão para que ele apertasse.
-Barbara, muito prazer. - Se afastou dele e pegou duas toalhas, alcançou uma para ele e se enrolou na outra, acendeu um cigarro e sentou no banco em frente a pia.
-Você é linda. - Ele não se aproximou, ficou olhando para ela como se estivesse hipnotizado.
-Você também. - Ela o olhou de cima abaixo e ouviu o celular tocando, pegou e atendeu rápido. - Como você está? Tudo bem, vai pra minha casa, eu pego o jantar. - Desligou e sorriu amarelo. - Preciso ajudar um amigo, ele recebeu um diagnóstico hoje, quer companhia.
-Tudo bem, eu tinha pensado em jantar com você, - Se aproximou dela a beijando, e cochichou em seu ouvido. - Jantar você.
-Ele precisa de mim. - Ela riu e o beijou, levantou e começou a se vestir.
-Eu vou ver você novamente?
-Vamos ver… - Fez uma careta e saiu apressada, o deixando sozinho no vestiário silencioso e vazio.
Gael tinha apenas uma certeza, a veria novamente, nem que tivesse que se inscrever para aulas de boxe do outro lado da cidade, e em território inimigo. Se deu conta de que não havia pego o celular dela, e fez uma careta desanimada, mas isso não seria problema, poderia descobrir com facilidade, era um homem inteligente e, a julgar por essa incrível experiência no chuveiro, bastante sortudo.
Bárbara dirigia com pressa, comprou a comida preferida de Guilherme e chegou junto com ele na frente de seu prédio. Desceu devagar, detestava saber sobre doenças, detestava a ideia de que o amigo poderia estar morrendo. Parou na frente dele muito séria.
-Vem, vamos subir. - Subiram em silêncio, ela morava no quarto andar, usaram o elevador, ela estava com pressa, e ao mesmo tempo querendo adiar as notícias, mas não era sobre ela, precisava dar forças ao amigo. O abraçou apertado quando entraram, antes mesmo de tirarem os casacos. - Vai dar tudo certo, eu prometo que você vai ter o melhor tratamento que o dinheiro possa pagar.
Ele a abraçou apertado e suspirou cheirando seu pescoço, e então soltou uma risada divertida.
-Eu não tenho nada, mas queria demorar mais para falar, do jeito que você está me abraçando, mesmo sem saber os resultados, imagino o que faria se por acaso eu estivesse morrendo.
-Seu filho da puta! - Se afastou dele lhe dando um tapa no braço. - Porra Gui!
Riu e secou algumas lágrimas, estava realmente feliz por ele não ter nada, não chegou a ficar brava com a brincadeira de péssimo gosto.
-Eu sei, às vezes sou um cuzão, mas queria comemorar o fato de que viverei mais muitos anos, perturbando suas fantasias sexuais, querida. - Riu e tirou o casaco indo até a cozinha e aquecendo o jantar que ela trouxe.
-Você sabia que meu avô era cardíaco? Essas coisas são hereditárias, eu quase morri do coração, e você ainda me fez largar uma coisa importante!
-Eu soube que você mandou o Jonatan para o hospital. O que ele fez?
-Coisas idiotas, é só o que sabe fazer, e não sei se era tão necessário ir para o hospital, ele é muito fraco para um cara cheio de músculos. - Deu de ombros e entrou no quarto vestindo um pijama grosso cheio de caveiras mexicanas.
-Eu liguei porque a Érica me disse que você ficou sozinha com o tal Gael, foi tudo bem?
-Melhor impossível! - Sorriu involuntariamente.
-Você... tá... de brincadeira... comigo! - Ele arregalou os olhos sem acreditar, colocando as mãos na cintura e batendo um pé no chão, não era de verdade, riu e pegou pratos nos armários. - Você enlouqueceu? Foi treinar bêbada ou o que?
-Como você é puritano Gui! Foi só uma bobagem no chuveiro, vai me dizer que você nunca fez isso?
-Ah eu já querida, diversas vezes, com diversas pessoas, mas eu sou promíscuo, e não fiz nada com um possível cliente, que ainda por cima pode saber minha identidade secreta.
-Ah Gui, você e suas apresentações de séries de TV, adoro seu drama. - Riu servindo os pratos e taças cheias de vinho. - Ele não faz ideia de quem eu sou, pare de ser tão desconfiado.
-Tudo bem, já temos o alvo de qualquer forma. - Fez uma pausa e encheu a boca fechando os olhos e aproveitando o sabor do macarrão ao pesto perfeito do Juliu 's. - Esteban Carrero. É um problemão, eles querem pagar 4.
-4!? Caralho, ela quer mesmo se livrar dele. - Fez uma careta conformada. - Não vai ser ruim matar esse cara, soube que é um escroto, bate na mulher e tem algumas boates cheias de prostitutas viciadas para não reclamarem do que sofrem. Não é lá um exemplo de ser humano, o que você acha?
-Acho que 4 é grana demais, se ela quer pagar isso é porque ele é difícil de matar, e pode ter represálias.
-Para ter represálias, é necessário que saibam quem eu sou, e ninguém sabe, isso não é um problema. - Encheu a boca e olhou para o nada suspirando. - Eu gosto dela, é uma mulher determinada, transformou a boca de fumo do namorado morto em um pequeno império, faz acordos quando quer fechar negócios, e age quando não a respeitam, quando a tratam como se fosse inferior, por ser mulher, por ser latina. Provavelmente é por isso que quer pagar mais, para que o serviço não seja recusado apenas porque foi ela quem o encomendou. É esperta também.
-E claro, ela tem aquele funcionário que você pegou no chuveiro do vestiário… - Ele a olhou de forma condescendente.
-Não! Não é isso Gui, é como uma obrigação, sabe? Ajudar uma irmã.
-Por 4 milhões, até eu a chamaria de irmã. - Ele riu e ergueu a mão antes que ela falasse. - Eu sei, entendi você, mas cuidado, se você ajudar ela e se arriscar, ela não vai ajudar você.
-Mas não vou me arriscar, sou profissional, tenho um bom currículo para mostrar a você se quiser. - Riu secando o copo.
Jantaram, conversaram e beberam bastante, ele foi embora dizendo que ia para a casa de um amigo, já que ela não daria para ele, ele daria para alguém naquela noite, beijou sua testa e entrou no carro com agilidade. Estava aliviado, pensou que morreria de uma doença terrível, mas era apenas alarme falso, gostava da vida que tinha, era uma boa vida.
Ela recolheu os pratos e os lavou, sentou na frente da televisão e depois de alguns minutos foi para seu quarto, pensou no trabalho que lhe renderia dinheiro suficiente para ajeitar tudo, sua vida e a vida de todos. Ponderou se deveria mesmo aceitar, mas sabia que conseguiria, já havia pensado em matá-lo por conta própria, como isso quebraria suas próprias regras, desistiu. Já gostava da tal Angela, ela lhe dava um presente, e mais 4 milhões como incentivo.
Pensou em Gael e sorriu involuntariamente, ele era uma surpresa boa em sua vida quase sem prazeres, esperava não estar fazendo nenhuma merda muito grande. Não costumava se envolver com ninguém, era raro se sentir assim. Na verdade, já fazia mais de 7 anos que não se sentia daquele jeito. A última vez fora mais intensa, anos luz mais intensa, mas aquela fagulha no peito era boa, como se uma descarga de energia a fizesse retornar a vida, ao menos parte dela.
Acordou cedo e tomou um banho quente, estava frio, uma chuva congelada caia lentamente lá fora. O dia perfeito para ficar em casa, descansando, alguém como Bárbara, com a vida ganha, poderia se dar esse luxo, então vestiu roupas confortáveis, ligou uma música alta e pesada, e começou a limpar armas e afiar facas, todas guardadas no fundo falso dos armários da cozinha, Não eram muitas, ela não era do tipo que colecionava armas, apenas tinha instrumentos de trabalho que precisavam atender suas necessidades, e estar bem conservados.Desmontava algumas pistolas quando seu telefone tocou pela primeira vez naquele final da manhã, eram as últimas a ganharem sua atenção, dava prioridade às facas e armas mais potentes, mas as pistolas também quebravam um bom galho. A primeira ligação que rec
Érica raramente demonstrava nervosismo ou preocupação, fazia o que era preciso, quando era preciso, se surgissem problemas, ela os resolvia com facilidade, era sua função, a dominava muito bem. Por isso Bárbara a chamou para ser seu braço direito, porque era controlada e eficiente, era de confiança. Então, quando ela demonstrava agitação, todos a levavam a sério, nessa noite sentia que algo estava errado, precisava alertar a amiga, precisavam se preparar.Ela estava em sua sala, o lugar onde passava a maior parte do tempo, todos os dias, cuidando da academia de fachada, com alunos, patrocinadores e organização de lutas, e também dos negócios mais lucrativos e complicados, a administração dos clientes e trabalhos da Muerte. Guilherme esperava Barbara em frente a porta da frente do pr
Cinco dias depois da conversa com Érica, Bárbara estava sentada em uma camionete preta grande, blindada e com vidros escuros. Observava com binóculos o interior de um restaurante, já era o terceiro dia que fazia isso, Esteban Carrero vociferava com alguém aterrorizado atrás de um balcão, apontava o dedo para o nariz de seu interlocutor, não conseguia ver muito bem quem era, mas imaginava ser o gerente, funcionário de Carrero e alvo habitual de sua fúria, aquele era um de seus restaurantes.O mafioso saiu pouco depois, acompanhado de dois seguranças imensos, Carrero era um homem baixo e forte, parecia ainda mais baixo no meio dos dois brutamontes que trabalhavam para ele. Ela já sabia para onde ia, a rotina diária dele era essa, passar em seus estabelecimentos e perturbar a todos que trabalhavam para ele, mas naquele
Bárbara já sentia que o capítulo Gael havia acabado em sua vida, foi bom, e seria sempre uma ótima lembrança, mas não havia possibilidade de continuar, ele corria riscos, ela não se exporia tentando defendê-lo, não se a vida de seus amigos fosse colocada em risco por conta dessa exposição. Por mais que houvesse algo ali, aquele sentimento que poderia virar amor, não valia a pena se arriscar, e arriscar aqueles que já amava, por causa disso.Foi treinar normalmente, se fosse mesmo atacar os alvos encomendados, não precisaria de pesquisas e tocaias. Então resolveu aproveitar seu tempo para pensar na vida, treinar, e claro, esperar que Angela e Gael desaparecessem.Guilherme a esperava para o treino, ela entrou tentando disfarçar a tristeza, trocou de rou
Gael deu dois dias para ela, como não ligou, e não deu sinal de vida, no terceiro dia resolveu que já era hora de procurá-la, as ameaças estavam mais perigosas, ele mandou uma equipe de homens seus investigar e descobriu que o complô para derrubar Angela era maior do que haviam imaginado. Recebeu também uma ligação de Érica, dizendo que haviam diversos assassinos contratados para dar cabo deles. Se possuíam algum plano de fuga, deveriam agir logo, ele não compreendeu bem porque a mulher que trabalhava para o Muerte os estava informando, mas desde que ela não estava mentindo, e que as coisas que dizia poderiam ser comprovadas, acreditava e agradecia a boa vontade dela.Seus planos iniciais, de convencer Bárbara a fugir com ele, deveriam ser antecipados, e um pouco modificados também. Claro, tudo dependeri
Ser uma mulher latina não costuma ser fácil em qualquer lugar, mas no ramo de negócios de Angela, as coisas poderiam ser ainda mais difíceis. Era um ambiente tradicionalmente machista, mulheres prostituídas ou excluídas dos negócios. Essas mulheres, qualquer uma delas, poderia fazer um trabalho excelente, tão bom quanto, ou até mesmo melhor, do que os homens que comandavam 99% das famílias do tráfico nos países americanos do norte e sul.Ela tinha certeza disso, porque era uma dessas mulheres subestimadas, tratadas como inferiores apenas por serem mulheres, destinadas a vestir roupas bonitas e acompanhar seus homens em eventos sociais. O que era engraçado, na realidade irônico, pois se ela, uma mulher jovem que não cresceu naquele meio, conseguiu transformar o que era praticamente uma boca de fumo, em um
Bárbara não abriu os olhos a princípio, sentia uma dor de cabeça lancinante, ouviu barulho de água, chegando abafado e distante a seus ouvidos, gemeu com a dor, uma dor de ressaca terrível, não lembrava de ter bebido tanto na noite anterior. Na verdade, não lembrava de quase nada da noite anterior, imagens de Gael cozinhando para ela, dela em cima dele pouco antes disso, mas tudo parecia se esvair de sua mente com a dor.Abriu os olhos por fim, e a primeira coisa que viu foram os olhos azuis dele a olhando, estava sentado na cama, as costas encostadas na guarda, ela estava deitada para o lado oposto, a cabeça onde deveriam ser os pés, vestida e coberta, desviou os olhos dele, não conhecia aquele quarto. Tentou sentar mas ficou tonta, levou a mão à frente dos olhos e deitou novamente, os travesseiros eram macios. 
Barbara passava a maior parte do tempo na cabine, em silêncio, respirando, ou tentando fazer isso. Era mais forte do que acreditava, cada vez que se sentia sufocar, antes de estar naquele navio, imaginava que se não enxergasse a rua, se não respirasse ar puro, morreria sufocada. Ao menos o sequestro provava que aquilo não aconteceria, apesar de pensar, quase todo o tempo, nos dutos de ar sendo fechados, no oxigênio sendo interrompido, em seu peito apertado, o ar não chegando até seus pulmões.Respirava fundo e procurava as saídas de ar quando sua mente era tomada por esses pensamentos, havia ar sim, e não pararia de chegar. Estava sentada na cama, fumando e ruminando sua raiva, e a preocupação com Érica e Guilherme, esperava que tivessem desaparecido, pensou na tia, em todas que estavam em sua antiga casa, e engoliu al