Marcos Albuquerque
Acordo com meu telefone tocando incessantemente em cima do criado mudo e rosno um palavrão, quando uma dor de cabeça infernal começa a latejar. Me forço a abrir os olhos e a dor parece aumentar consideravelmente. Olho a tela do celular e respiro fundo fechando os meus olhos para tentar suportar as cobranças da dona Laura.— Oi mãe! — Minha voz soa ainda rouca de sono.— Como assim, oi mãe? — Ela cobra com voz firme. — Seu irmão te deu o recado? — retruca autoritária e eu bufo me sentando na cama e levando a mão a testa tentando aplacar a dor.— Que recado? — pergunto passando a mão no rosto tentando despertar. Porra! Me sinto atordoado. Se brincar não sei nem que dia é hoje. Resmungo internamente.— Semana que vem eu e o seu pai vamos viajar, Marcos. Ele precisa descansar um pouco, sair daquele escritório agitado. Portanto, vamos nos reunir no restaurante da família, para nos despedir. — Eu bufo em resposta.— Mãe, eu não posso...— Tento falar, mas ela me corta impaciente.— Não pode ou não quer, Marcos Albuquerque? — inquire ríspida. Puxo a respiração de modo audível, tentando manter a calma.— Mãe, eu realmente não posso. Eu tenho que trabalhar, sabia? — falo irônico.— Sem argumentos, Marcos, não seja um filho ingrato. Nós vamos passar dois meses fora do Brasil e eu quero que esteja lá no restaurante na quarta à noite e não aceito desculpas — diz enfática. Dona Laura Albuquerque é uma mulher impiedosa quando quer ser. Penso fechando os meus olhos e respirando fundo, aceitando a situação.— Tudo bem — digo vencido. — Eu vou fazer uma forcinha e chego a esse jantar, melhor assim? — respondo debochado.— Está perfeito, filhote! — diz e desliga na minha cara.— Droga! — resmungo encarando a tela do celular. Acho que ela ficou chateada comigo. Penso dando de ombros e devolvo o celular ao criado mudo. Sério galera, eu amo a minha mãe e a minha família, mas o fato de que eles querem me ver preso a um casamento e formando uma família, é o que me mantém distante. Dona Laura, seu Arthur, Guilherme e a Gisele juntos em uma única noite? Eu não sei se aguento não.Já é quase meio dia e eu não consigo mais dormir, resolvo sair da cama e tomar uma ducha fria e demorada para despertar de vez. Depois vou até a cozinha e tomo um copo de suco com uma aspirina e sigo para sala, para assistir TV. Adoro o meu cantinho! É aonde encontro o meu sossego e posso ficar mais à vontade, sem ter que dar satisfações da minha vida para ninguém. Algumas horas depois meu celular volta a tocar e sorrio ao olhar a pequena tela brilhante.— Fala Fábio, como estão as coisas aí na França? — pergunto com animação na voz. Fábio é o nosso engenheiro terceirizado, ele está na França para iniciar as obras do nosso mais novo empreendimento.— Nada bem cara, as obras pararam por aqui — diz com um tom totalmente desanimado, me fazendo brochar imediatamente. Suas palavras me deixaram bem chateado.— Eu preciso de você aqui, Marcos e é para ontem! — Fábio parece apreensivo.— Qual é, cara? É final de semana e ninguém trabalha em um final de semana, Fábio! — resmungo.— Você que sabe — diz com um tom seco. Eu bufo.— Segunda eu passo aí e resolvo o que tem de ser resolvido e você fica feliz, pode ser? — jogo a sugestão.— Segunda então! — diz com desdém e eu sorrio aliviado.— Pronto, caso resolvido — solto um sarcasmo e desligo o celular sem esperar a sua resposta. Passar o final de semana dentro de um avião só para arrumar a bagunça dos outros? — Nem fodendo!Passo o resto do meu sábado largado no sofá, comendo pizza com refrigerante e jogando vídeo game. Essa é a vantagem de você morar sozinho. Você faz o que quer, quando quer, como quer e não tem ninguém para meter o nariz. Bebo e como o que quero e não tem ninguém te cobrando nada. No meio da tarde ligo para alguns amigos marcando uma noitada de domingo, afinal semana que vem é chumbo grosso pra mim... Ter que viajar às pressas para França e resolver os pepinos do Fábio e ainda aguentar um jantar em família onde eu sei que a pauta da conversa serei eu. Com certeza preciso de um relaxamento antecipado. — Penso. São sete da noite quando Guilherme e Cia resolvem aparecer no meu apartamento. Eles trazem algumas sacolas com comida chinesa e um vinho envelhecido para acompanhar. Essa parte eu adorei! Visita que não me dá trabalho e ainda te traz comida? Isso é bom demais! Amanda parece um pequeno furacão solto pela casa, ela corre o apartamento inteiro e sobe e desce nas coisas falando sem parar. Beijo a minha cunhada no rosto assim que ela se livra das sacolas e abraço o meu irmão em seguida.— Nossa, Marcos! A quanto tempo você não arruma esse apartamento? — Gisele resmunga olhando a bagunça de caixas de pizza e garrafas de refrigerantes espalhadas por toda sala. Sua cara espantada é impagável. Dou de ombros.— Almerinda vem fazer uma faxina amanhã, dei folga para ela esse final de semana — expliquei.— O que não quer dizer que você tem que virar um porco — retruca. — Não tem lixeira no seu apartamento não? — indaga recolhendo algumas garrafas em cima da mesinha de centro. Reviro os olhos e ela me dá as costa, levando o lixo para a cozinha. Viu? É disso que eu estou falando... Cobranças e mais cobranças. Não dá para imaginar uma mulher aqui dentro, metendo o seu fedelho em minhas coisas.— Tio, posso brincar no seu Xbox one? — Amanda pergunta esperançosa. Sua respiração está acelerada por causa da correria dentro do apartamento.— Você pode tudo, princesa — digo a pegando nos meus braços, eu a jogo para o alto e ela solta um gritinho e quando a pego de volta nos meus braços, beijo todo seu rostinho rosado. — Depois o tio vai se juntar a você tá bom? — A pergunta soa sugestiva e a garota me retribui com um sorriso gigante. Eu a ponho de volta no chão e ela dá alguns pulinhos e sai correndo para sala de jogos. Depois de recolher o meu lixo e de deixar a minha sala um brinco, Gisele abre as sacolas com as comidas que estão sobre o balcão e começa a pôr a mesa. Ela serve a comida nos pratos e todos nos acomodamos a mesa. Eu olho para Gui e Gisele sentados do outro lado da mesa e para Amanda que está ao meu lado. É um ensaio para o jantar em família que vem por aí. Penso.— Que tal se você for passar o domingo com a gente lá na chácara, Marcos? — Gui inicia uma conversa nada a ver. — Amanda vai adorar ter o tiozão dela por perto — diz e depois levar uma garfada da comida a boca. Eu suspiro baixinho.— Amanhã não dá, Gui, tenho uma programação... — Tento dizer, mas sou interrompido bruscamente.— Deixe-me adivinhar — Gisele me corta irônica. — Você vai dormir o dia todo, vai acordar lá pelas cinco da tarde, depois jogar vídeo game, comer muitas besteiras e bagunçar todo o seu apartamento mais do já bagunçou e depois de tudo vem uma noitada com os amigos e muita bebida e por fim, terminar a sua noite com alguma vagabunda na sua cama. Acertei? — Da pra sentir o poder da ironia da mulher só no olhar dela, imagina na voz? Reviro mais uma vez os olhos para ela e nem chego a dar uma resposta à altura, porque a Amanda começa com as suas especulações logo em seguida.— Papai, o que é uma vagabunda? — Ela pergunta abrindo um par de olhinhos curiosos, e faz uma cara inocente e os seus pais a olham completamente sem ação e com os olhos bem arregalados. Segurando uma boa gargalhada, eu olho para Guilherme e faço sinal para que ele explique a palavra para menina.— É, como eu posso te explicar isso, filha? É, — Ele gagueja e eu me encosto na cadeira, segurando a gargalhada, fechando a mã
Mônica SampaioO mês passou rápido demais. E esses dias tenho andado bastante ocupada com o escritório de advocacia e com a faculdade também. Como é meu último ano na faculdade e eu tenho acompanhado a doutora Gisele em algumas audiências, quase não tenho tempo para respirar. Mas isso tem me dado algumas experiências interessantes, e tem me ajudado bastante na conclusão do meu curso. Estou em minha sala quando recebo um telefonema de um número desconhecido. E antes de atender, fico olhando o celular por um tempo, na dúvida se atendo ou não? Decido atender.— Alô? — Deixo transparecer o meu receio e me repreendo por isso.— Mônica Sampaio? — A voz máscula, de um timbre rouco e ao mesmo tempo grave me deixa arrepiada. Eu respiro fundo e me forço a falar alguma coisa.— Sim é ela. Quem é?— É o chefinho. — Ele faz uma pausa mínima. — Tudo bem? — PUTA MERDA! — Xingo mentalmente, fechando os olhos e seguro a ponta do meus nariz, respirando fundo. Estou morta de vergonha. Respiro fundo mais
— Eles também trabalham na mesma empresa em que eu e Ana trabalhamos. — Luís complementa. E eu apenas assinto dando um meio sorriso.— Mônica, por favor, me chame de Mônica. — Exijo me acomodando na cadeira de frente para o tal Marcos. Ele fica sério, mas seus olhos ainda me devoram.— Desculpe Mônica! — diz e sorri. E meu Deus, isso não se faz com uma pobre moça indefesa como eu! Que sorriso é esse papai?— Então, Mônica? — Luís começa a falar desfazendo a nossa conexão. O que eu agradeço de todo o coração. — Soube que você convidou a Ana para uma comemoração a dois em um barzinho. E eu gostaria de combinar...— Não é bem uma comemoração a dois. — O interrompo — Tem alguns amigos de infância e também alguns amigos da faculdade que a Ana fazia. Eu falei pra ela te levar. — Paro de falar quando vejo que Luís foi pego de surpresa. Definitivamente a Ana não havia dito nada pra ele.— É, ela me convidou, mas coincidentemente é o dia do seu aniversário e eu...— Coincidência? — Volto a int
Marcos AlbuquerqueO fato da Mônica ter quase estragado a surpresa do Luís para Ana me ajudou e muito a conseguir o contato dela. O que está me deixando acuado é o fato do Luís ter me feito prometer que eu não iria me aproximar da garota e a promessa para o meu melhor amigo é dívida. Então eu vou tentar me comportar o máximo que eu puder. Pego o meu celular e olho o número salvo na minha agenda. Ligo ou não ligo, eis a questão. Estou passando por uma guerra onde o anjinho no meu ombro direito me diz que não. Que eu tenho que cumprir a promessa. Mas o capetinha no meu ombro esquerdo fala que sim. Me mostra o lado delicioso da coisa toda e eu sou vencido pelo desejo ardendo dentro de mim, dando de ombros. O que eu tenho a perder? Nada. Ouvir um não, não vai me matar certo? E se eu ouvir um sim, será coisa de uma noite só. — Alô! — Ela diz do outro lado da linha. A voz deliciosamente sedutora me arrepia inteirinho e eu puxo a respiração. Controle-se homem! Me repreendo. Você deve isso a
— Porra, morena, assim não dá pra ser feliz! — resmungo para mim mesmo.Sinto as duas loiras se aproximarem e tocarem em meus ombros. Elas alisam, beijam meu rosto, mordiscam a minha orelha. Um arrepio descomunal se apossa da minha coluna. As loiras praticamente me devoram, mas os meus olhos estão lá embaixo, de olho naquela morena deliciosa, mexendo o seu corpo e deixando os caras próximos a pista de dança loucos de desejos por ela. Me afasto das meninas e sigo na direção das escadas e deixando-as para trás e começo a descer as escadas sem dar nenhuma justificativa e quando chego na pista de dança, tem uns caras dançando com ela. Me aproximo por trás da morena sem nenhum receio, coloco as mãos em sua cintura, começando a me mexer, seguindo o seu ritmo. Lanço um olhar furioso para os homens ao seu redor e eles logo entendem o recado, se afastando sutilmente. É isso aí meu amigo. A garota é minha e só minha. Penso me entrego ao ritmo da minha morena. Nossa dança continua de uma música
— Nossa, que bicho te mordeu? — A voz de Cassandra ressoa ao meu lado. — Nunca te vi assim tão mal-humorado — comenta. Eu respiro fundo. Ela tem razão. Fui um filho da puta com o cara, mas quem manda ser tão incompetente? Porra era só ele dá um telefonema e tudo estava resolvido!— Vamos para o hotel. — falo com um tom seco, ignorando o seu comentário. Cassandra arregala os olhos apertados e abre a boca pequena em espanto, por causa da minha atitude grosseira. — O que foi agora? — inquiro irritado.— Você está estranho — diz.— Estranho como?— Eu sei lá. Você não deu em cima de mim. Não tentou colocar suas mãos bobas em mim. Está irritado com tudo e com todos e agora quer ir para o hotel? Nada de garotas francesas? — inquire.Dou-lhe um sorriso malicioso.— Está sentindo falta das minhas investidas, senhorita Hattori? — inquiro debochado fazendo-a revirar os olhos.— Retiro o que disse! Vamos, estou com fome — retruca me fazendo gargalhar em alto e bom tom, enquanto ela bufa de modo
Mônica SampaioMais um dia se foi e foi tão corrido quanto os outros e entre uma audiência e outra, estudando casos e mais casos, eu tirei um tempo para finalizar alguns trabalhos da faculdade também. Encosto-me na cadeira, puxando o ar com força e tentando relaxar um pouco e para minha felicidade, doutora Gisele acabou liberando boa parte da equipe mais cedo. Pelo menos a parte envolvida na surpresa da Ana, no caso eu e ela. Pois é, ela decidiu que também vai para a festa da Ana. Perto das cinco da tarde corro para casa e me arrumo para ir para o barzinho que locamos para a surpresa da minha amiga e opto por um jeans surrado que eu amo, uma blusa estilo cigana com estampa floral e salto alto. Olho os meus cabelos soltos e decido deixar os meus cachos livres, sorrindo satisfeita para o espelho, mas logo o meu sorriso desfalece. Falta alguma coisa. Penso olhando o meu look de alto a baixo e vou até a pequena necessaire que deixei em cima da cama de solteiro e observo as poucas bijuteri
— Aonde você vai? — Ele inquire exasperado, mas eu não olho para trás e sigo direto para o bar para pegar outro copo de vodca no balcão. Me sento a mesa onde a Ana e o Luís conversam intimamente. Eles param a conversa de repente e me olham com olhos especulativos e depois voltam a sua conversa como se nada tivesse acontecendo. Marcos também vem para mesa e nós ficamos nos encarando, como um duelo de olhares. Ninguém pisca e ninguém diz nada. Em algum momento, Luís e Ana resolvem ir dançar e Marcos continua a me encarar do outro lado da mesa. — Qual é a tua, garota? — Ele cospe uma pergunta afetada.— O quê, do que você está falando? — faço-me de desentendida.— Eu só pedi a porra de uma dança, precisava daquele teatro todo com aquele cara? — pergunta entre dentes.— Não era um teatro. Qual é? Eu não sou nenhuma traíra tá bom? Você pode ficar com quem quiser, só me deixa em paz cara! — Não escondo a minha indignação.— Que mané traíra o quê? Do que você está falando garota? — Quero sa