Luciana tinha tudo planejado. Ia aproveitar cada minuto de seu tempo para estar mais preparada para a viagem ao Pantanal. Era a realização de um sonho, não ia desperdiçar.
Muita gente, até mesmo trabalhando na área de turismo, passava a vida toda atrás de uma escrivaninha, lidando com reservas, documentos, reclamações. Poucos tinham oportunidade de viajar para um destino de sonho, como este.
Achou que o melhor para estar em boa forma, como o Helinho tinha sugerido, seria fazer ginástica em uma academia. Havia uma, perto da agência, o que era ótimo, pois se voltasse para casa, depois da escola e do trabalho, iria se atirar no sofá e assistir filmes com sua mãe. Não teria disposição para sair de novo.
Arrumou as roupas apropriadas em uma pequena mochila que ganhou da Marina e se sentiu pronta para a luta.
Aliás, a academia tinha um excelente programa de treinamentos para várias modalidades de artes marciais. Os alunos eram incentivados a competir em diversos torneios e conquistavam medalhas e troféus.
Também havia uma diversidade de aulas de natação, ginástica aeróbica, dança e step.
Mas Luciana ia começar com a esteira, a bicicleta, os abdominais, ou seja, o básico. Sua meta era se movimentar mais, pois passava muito tempo sentada, na faculdade e na agência. Queria mudar essa situação.
Na academia, a música vibrante, as roupas coloridas e a iluminação forte contribuíram para definir seu ritmo de caminhada.
As esteiras e as bicicletas ficavam na lateral da sala de musculação. Serviam também de aquecimento para esta modalidade. A instrutora, Neuraci, se ofereceu para ajudá-la na musculação, caso quisesse. Luciana avisou que por enquanto, ia ficar só com a esteira.
Estava há uns vinte minutos se exercitando quando percebeu um grupo de garotas muito animadas, quase agitadas. Seguiam um homem forte e bonitão, como se fossem seu harém particular. Luciana estava começando a achar graça, até que eles passaram bem próximo dela, a caminho da sala de ginástica, no andar superior.
Ganhou um sorriso, lógico, e foi atingida pelo brilho extraordinário dos olhos daquele que era, sem sombra de dúvidas, o homem dos seus sonhos.
...
Neuraci ficou surpresa que Luciana tivesse tropeçado e se atrapalhado tanto para descer da esteira, pois estava no ritmo lento, próprio para iniciantes.
A instrutora tentou ajudar, mas nem alcançou a moça que saiu apressada, como se fugisse de algo. “Essa não volta.” Foi o que pensou a Neuraci, acostumada com os desistentes.
A verdade é que Luciana perdeu a noção de tudo. Corria pela calçada em direção ao ponto de ônibus. Que susto ver em pessoa, aquele que enfeitava seus sonhos e seus pensamentos já há algum tempo.
Nunca tinha imaginado que ele existisse mesmo. Sonhava que estavam dando caminhadas longas e relaxantes. Ficavam de mãos dadas muitas vezes e ele a olhava com ternura. Sonhara com seus abraços e beijos apaixonados.
E o achava perfeito demais para ser parte do mundo real. Agora ele se materializara e ela saíra correndo.
Seu coração acelerou demais, achou que ia desmaiar pela primeira vez na vida...
Sentou-se no banco à espera do ônibus e tentou ordenar os pensamentos. Muito bem, então ele existia e eles haviam se encontrado. Mas o que isso significava? Que estavam destinados um ao outro? Ela tivera um aviso do encontro, em sonhos, para estar mais preparada?
Só que ninguém está preparada para uma emoção destas. E ele sorriu para ela, igual fazia tantas vezes no sonho.
Foi bom ter ido embora. Amanhã estaria mais centrada.
...
No dia seguinte arrastou Marina para uma aula experimental na academia, pois a amiga era sua confidente e melhor amiga. Precisava de sua ajuda, seu apoio, nesta situação tão emocionante para ela. Quantas vezes tinham falado sobre esses sonhos lindos e desejado que existisse alguém assim, que completasse e entendesse tanto Luciana, como esse homem misterioso e fascinante.
— Sério, Luciana, que era o cara dos seus sonhos?
— Eu reconheceria este homem até dormindo.
As duas dão risada com a fala bem-humorada, mas Marina nota que a amiga está nervosa. Já estão na esteira há quase uma hora e nada dele aparecer.
Com a desculpa de conhecer a academia, para ver se ia fazer a matrícula, Marina pedira a Neuraci um passeio por todas as salas. Luciana foi junto para localizar seu paquera. Elas ouviam Neuraci explicar sobre as vantagens da natação, souberam que a piscina era térmica. Subiram até a sala de ginástica com seus espelhos gigantescos e nada do moço aparecer. Por fim no espaço reservado para lutas, Neuraci falava com orgulho.
— Temos vários medalhistas do karatê e do judô. Mas nosso orgulho é o Renato, campeão brasileiro de jiu-jitsu. Ele é o dono da academia. A irmã dele, Sueli, dá aulas de abdominais e de dança Axé. Você está inscrita para começar os abdominais na próxima semana, Luciana.
— É, eu estou indo com calma, porque sou muito sedentária.
— Logo você se acostuma e vai estar nas turmas de spinning e step, que são as mais puxadas — Neuraci é uma incentivadora.
As amigas agradecem à instrutora e voltam para as esteiras.
— Lu, eu só aguento mais uns dez minutos de caminhada. Depois disso vou precisar de uma ambulância para me levar daqui.
Mas a amiga não responde. Olha fixo para a entrada da academia, onde debruçado sobre o balcão, guardando as chaves do carro, está o homem mais lindo que Marina já viu na vida.
Cutuca a amiga, que olha para ela em pânico. Não tinha ideia de como ajudar a amiga nessa situação.
Mas o rapaz vai direto até Neuraci, sem notá-las.
— Neuraci, acabo de receber sua mensagem. O Bruno faltou de novo, sem explicações?
— É porque não tem explicação. Ele é apenas irresponsável. Não aconteceu nada de anormal.
— Vamos ter que contratar alguém menos complicado — Renato conclui e sobe apressado para a sala de aula, de dois em dois degraus, como Luciana nota, hipnotizada.
Marina, com uma súbita inspiração, deixa a amiga na esteira e entra em ação. Vai até a atendente no balcão e conversa calmamente. Ganha um papel de horários de aulas e vai anotando todas suas dúvidas no verso.
...
Já no quarto de Luciana, trocavam informações. Marina decidira dormir lá. Tinham muita coisa para falar e o telefone não seria suficiente.
— Então seu homem dos sonhos é o campeão de jiu-jitsu, dono da academia Sweat Drop.
— Renato. Finalmente sei o nome dele. Renato é um nome tão bonito.
— Assunto bom pra discutir com a futura sogra. Agora, vamos ser práticas. Ele dá aulas de jiu-jitsu, obviamente. Até mesmo para as turmas iniciantes. Você pode se matricular.
— Não, amiga, nada a ver comigo.
— Lu, um homem desses, vale o sacrifício. E se ele apareceu nos seus sonhos, talvez quisesse te avisar que você ia ser a nova campeã de jiu-jitsu.
— E precisava me beijar tanto para isso?
— Ai, amiga, jura?
— Sim. Mas foi só um sonho, talvez seja tudo besteira.
— Bom, mas agora vocês se encontraram. Precisa dar uma chance.
— Sem ser luta marcial, qual a outra opção?
— Bom, segundo a recepcionista Arlete, o spinning é o exercício que queima mais calorias. Ele pegou umas aulas de um professor que falta demais. Tem também umas aulas tipo aeróbica, com muita música e uns movimentos de socos e chutes. Tonifica da forma mais eficiente, porque envolve alguns exercícios com pesos. E dá equilíbrio e fôlego, de acordo com nossa nova amiguinha Arlete.
— Chutes e socos?
— No ar. Como uma dança. Não é contra adversários. É um estilo chamado Corpus Body. As aulas do Renato lotam. Você tem que chegar cedo, mas não precisa marcar hora. Para o spinning tem que marcar, porque são só 20 bikes.
Luciana entrou apressada na academia. Estivera estudando a lista de passageiros inscritos para a viagem ao Pantanal e o tempo voara.Era um grupo de trinta pessoas e Luciana tinha que tomar as providências para solicitações especiais. Dois casais, por exemplo, viajavam com os filhos. Ela ia levar alguns lápis de cor e livrinhos de colorir, para distraí-los na longa viagem rodoviária. Como estavam programadas paradas longas, em restaurantes de estrada, valia a pena levar também jogos como dominó e damas. Embora as crianças tivessem seus próprios entretenimentos, como jogos no celular, sempre havia a chance de
Luciana mudou seu procedimento na academia. Não procurava mais oportunidades de estar perto do Renato. Passou mesmo a evita-lo. Concentrou-se em si e nas suas metas. Marina ficara furiosa e queria ir xingar todo mundo na academia. Mas Luciana não deixou. Afinal, aquele grupo de tiradores de sarro nem a conhecia. Ela agora notava que eles também implicavam com outras pessoas. Tudo para dar risada à toa. Perdera o interesse totalmente, por eles e pelo Renato, que afinal, era do grupo.Marina agora tinha ódio dele, queria que Luciana deixasse a academia. Mas ela tinha feito o pacote de plano semestral e não ia jogar dinheiro no lixo. Quan
E enfim chega o dia da viagem. O grupo interage desde o início. Surgem novas amizades que poderão durar pelo resto de suas vidas. As pessoas trocam informações e expectativas. O casal André e Marta estava indo ao Pantanal pela terceira vez. Contagiavam a todos com suas histórias maravilhosas de contatos com os povos ribeirinhos daquela região. Já o Jorge era pescador profissional; enquanto os outros iam fazer passeios turísticos diversos, ele tinha alugado um barco com guia local e ia se dedicar à sua paixão, a pesca.Luciana foi conhecendo cada uma destas pessoas e se sentindo próxima a eles.
Já estavam há doze dias na excursão. Durante o dia exploravam trilhas longas em meio a uma vegetação exuberante. As árvores tinham tantos pássaros, que parecia a Luciana que elas mesmas é que cantavam. Chegavam a grutas misteriosas e refrescantes, onde descansavam na sombra e usufruíam de fontes naturais de água mineral. Além disso, visitavam baías, salinas, lagoas e cordilheiras que compõe um mundo único em sons, formas e cores, no coração pulsante do Brasil. A localização do Pantanal no território do Brasil, é de fato bem central, como se a natureza facilitasse uma visita a esse paraíso natural, às pessoas das outas regiões do país.
De volta à agência, seu Artur demonstra seu orgulho pelo bom trabalho de Luciana.— A Vilma me contou como você controlou o pânico e restituiu a calma e a alegria da viagem, Luciana. Parabéns. Isso nenhuma escola ou empresa pode ensinar. É da pessoa. Nós estamos muito contentes com você.— Mas por dentro eu estava bem nervosa. No sábado Renato leva Luciana para tomar açaí num lugar tranquilo que abriu perto da casa dela. Eles conversam muito. Começam falando sobre o Pantanal, mas acabam abordando outros assuntos, como suas infâncias, seus hobbies, seus desafios. Ele estava com 28 anos e já era dono de uma academia, mas sonhava em abrir uma filial com mais ênfase nas lutas. Ela achava ótimo e dava sugestões de locais, influência de uma mãe corretora de imóveis.Neste primeiro encontro, Renato mergulhou na personalidade dela. Como era inteligente e calorosa. Ela o ouvia com toda a atenção e mesmo quando ele Capítulo 8
Luciana estava fazendo uma aula de abdominais com Sueli. A irmã de Renato era muito meiga, até seu andar era delicado, de dançarina.Sueli já estava com 32 anos e era casada, portanto não participava dos grupinhos de fofoca da Sweat Drop. Sempre após suas aulas, se encontrava com o marido que estava à sua espera no estacionamento. Ele era advogado. Sueli sempre contava casos engraçados sobre ele, para distrair as alunas durante as aulas, como sua mania de colocar suco nos cereais, ao invés de leite. O aniversário de dona Cida estava muito animado. Além dos vizinhos e de algumas amigas e amigos do trabalho, muitos jovens, amigos de Luciana, também foram convidados.Como moravam só as duas, dona Cida aproveitava todas as oportunidades para trazer mais gente para seu convívio. Não queria que a filha sentisse isolamento ou solidão. E isso nunca havia acontecido. Participavam de eventos do bairro, como festas juninas e desfiles do dia da Independência. Adoravam os vizinhos e iam sempre a batizados, casamentos e aniversários.Último capítuloCapítulo 10