Capítulo 4

Quando Bruna entrou em casa, Angela já estava a sua espera sentada no sofá da sala. Ela chegou já passava das 19 h, pois depois da consulta ainda tinha ido dar mais um passeio pelas ruas da cidade. Ela adorava o final da primavera e o início do verão. Tudo parecia ficar mais alegre.

- Não me diga que estava na faculdade até este horário. – falou Angela olhando no relógio.

- Claro que não, mamãe... Eu tinha consulta no hospital as 16 horas e depois acabei me demorando por aí.

Bruna não queria incomodar Angela com sua briga com o namorado.

- Adrian ligou inúmeras vezes...

- Diga que não estou.

- Então é isso... Eu sabia que tinha alguma coisa errada. Você nunca chega em casa tão tarde. Vocês brigaram novamente?

- Sim. – confessou ela.

Angela riu:

- Não se preocupe em me contar, Bruna. Eu já nem me importo com as brigas de vocês...  Isso é tão comum.

- Desta vez é um pouco mais sério. – disse ela sentando ao lado da mãe no sofá e largando sua bolsa.

- Todas as outras também eram. – observou Angela.

- Mas desta vez realmente não quero falar com ele, mamãe.

- O que houve agora?

- Nada importante.

- Mas você mesma disse que era sério. Por que não quer me contar?

- Mamãe, não quero incomodar você com meus problemas...

- Nunca esqueça que seus problemas são meus problemas. Mas respeito se você não quiser contar. E se ele vir aqui logo mais, o que provavelmente acontecerá, não deixarei ele ver você.

- É isso que quero.

- Como foi na consulta?

- Tudo tranquilo. Estou quase de alta. – disse ela levantando as mãos para o teto.

- E os medicamentos? Continua? Tem previsão de quando irá diminuir?

- Ainda não... Hoje eu nem insisti para ele diminuir. Achei que precisava.

- Por quê? Sentiu algo?

- Tudo bem, mamãe... Na verdade foi até engraçado o que me aconteceu, mas deixa pra lá. Coisa da minha cabeça.

Cassiane e Cristiano entraram, fazendo a conversa das duas parar por ali.

- O que houve entre você e Adrian? – perguntou Cristiano dando um beijo na bochecha dela.

- Por que quer saber? – perguntou ela confusa.

- Adrian encheu meu telefone de chamadas esta tarde. Imaginei que algo tinha acontecido entre vocês. – disse ele sorrindo e piscando o olho.

- Nós brigamos. – disse ela fazendo cara de entediada.

- De novo? – perguntaram Cristiano e Cassiane juntos, se olhando e caindo na risada depois.

Bruna aproveitou que os dois começaram a falar sobre a pergunta que fizeram ao mesmo tempo, pegou seus pertences e subiu para o seu quarto.

Ela tirou suas pulseiras, sua roupa, tomou um longo banho quente, colocou um roupão, colocou uma música no rádio e foi deitar. Incrivelmente não estava pensando muito em Adrian e na discussão que haviam tido naquele dia. O ar fresco e ao mesmo tempo perfumado entrava pela janela lhe dando sensações boas.

Ângela passou pelo corredor e disse:

- O jantar será servido, Bruna.

- Não vou jantar, mamãe. Não estou com fome.

Ângela abriu a porta e disse:

- Sim, você vai jantar. E adivinha? Adrian já está aí.

- Eu não vou falar com ele. – disse ela firmemente.

- Bruna, eu não sei o que houve, mas nunca o vi tão desesperado. Acho que realmente foi sério o que aconteceu entre vocês. Mas ele garante que tudo não passou de um mal entendido.

- Ele disse que foi uma brincadeira, mamãe, mas não foi. Se foi, me magoou muito. Ele precisa ter mais cuidado com as palavras dele.

- Se ele diz que foi uma brincadeira, tenho certeza de que foi, Bruna. Perdoe este garoto. Ele faz tudo por você.

- Não vou vê-lo. – insistiu ela.

Bruna tinha certeza de que ele estaria por perto, ouvindo tudo que ela dizia. E sua mãe, incrivelmente sempre ficava ao lado dele nas brigas. Ângela saiu e Adrian colocou a cabeça na porta:

- Não faça isso comigo, meu amor. Por favor. Você sabe que te amo. Não me faça sofrer deste jeito. Tudo que eu disse era uma brincadeira. Perdoe-me como eu perdoei você.

“Perdoei você?” Ela ficou indignada. Do que ele havia a perdoado se ela não havia feito nada errado?

- Você sabe que não vivo sem você, Bruna.

Ela fingiu que não o ouvia. Desviou o olhar dele e ficou olhando para o teto. Ela sempre o perdoava de tudo e naquele momento não estava preparada para mais uma vez passar por cima do que ele havia feito. Ela realmente estava muito magoada. Ainda ecoava em sua mente o que ele havia dito duramente: “Não vou casar com eles e nem com você”. Ele saiu desistiu e saiu e ela deixou as lágrimas virem, inicialmente tímidas, depois escorrendo grossamente por suas bochechas coradas do sol da tarde. Seu coração partia ao tratá-lo daquela maneira, mas às vezes achava que era necessário. Por que tinha que gostar tanto dele para ser tão possessiva? Tudo que ela tinha em mente era casar com ele para ficarem juntos mais tempo e, no entanto estavam mais separados do que nunca. Ela sabia que seu ciúme atrapalhava bastante o relacionamento dos dois, no entanto não conseguia controlar. Era instigada na terapia a achar o motivo e sempre dizia que o amava por demais e por isso sentia aquela possessão sobre ele. Mas nem ao certo ela sabia o motivo, pois não tinha dúvidas dos sentimentos dele por ela. Ele até poderia ter receio de casar, mas os sentimentos dele eram sinceros. O relacionamento deles sempre fora assim, com idas e vindas, briguinhas sem motivo, às vezes um pouco mais sérias, mas no fim eles sempre reatavam e ficava tudo bem. Tanto Angela quanto Cassiane achavam Adrian um rapaz extremamente sensato e amável e tinham a mania de sempre achar que ele estava certo. Mas por algum motivo, naquele momento, ela se perguntou se algum dia aquele relacionamento poderia se transformar de tempestade para calmaria. Seria normal ser sempre daquela forma? Cassiane e Cristiano brigavam muito pouco. Algum dia aquela agitação toda poderia se transformar em tranquilidade? Algum dia ela olharia para ele sem temer que ele fosse o centro da atenção de outra pessoa?

Ela tinha a sensação de que tudo sempre dava errado em sua vida, por isso o tratamento, os remédios e tudo mais que ela fazia para se manter longe da depressão. Sabia da atenção e carinho que todos tinham por ela, no entanto era sempre o vazio que tomava conta de tudo. Tinha a sensação de que nunca seria realmente feliz. E naquele momento sentia que seu noivado estava indo por água abaixo e não sabia o que fazer para salvá-lo, pois seu orgulho era muito forte. Seria seu orgulho maior que seu amor por Adrian? Amor... Não tinha dúvida de que sentia isso por ele, mesmo sendo seu primeiro namorado. Adorava estar ao lado dele, ouvir suas palavras de carinho, especialmente quando ele lhe dizia que a amava. Para ela aquilo era muito importante. E ele sempre dizia. Ainda assim preferia manter-se virgem e entregar-se a ele após o casamento. Inicialmente achava que aquilo era realmente o que queria, sem bem ao certo saber o porquê. Com o passar do tempo, percebeu que isso poderia fazer com que Adrian decidisse casar-se logo, então passou a usar como forma de antecipar a vida deles a dois. No entanto, vivia pensando que ele tinha outras mulheres que provavelmente o satisfaziam sexualmente, o que lhe deixava insegura e com crises frequentes de ciúme. Então não sabia ao certo qual era a melhor coisa a fazer.

E foram poucas as vezes que pensou em ceder ao desejo. O fato de estar com ele simplesmente lhe satisfazia, tamanho amor que sentia por ele. Por vezes tinha a impressão de que traçara seu futuro sem ao menos consultá-lo e simplesmente o colocou ali, sem ele nem ao certo ter certeza do que realmente queria. Sim, eles precisavam conversar mais seriamente sobre isso... No entanto raramente conseguiam fazer isso sem brigar um pouco. Então ela muitas vezes preferia decidir tudo e não ouvir a opinião dele para não haver discussão. E ele aceitava, pois também não queria discutir sendo que sempre acabava cedendo e fazendo o que ela queria.

O celular tocou, tirando-a de seus pensamentos. Ela viu o nome de Adrian no visor e não atendeu. Ele tentou por várias vezes mas ela não atendeu.

Antes de dormir, Cassiane foi ver Bruna e ela contou a irmã com detalhes como havia sido a briga entre eles.

- Ele errou... Não deveria ter brincado com isso sendo que é bem importante para você. – falou Cassiane.

- Fiquei muito magoada, Cassi.

- Foi um erro, mas ele está arrependido, Bruna. E por este motivo está feito louco atrás de você. Eu duvido que você não tenha certeza do amor de Adrian.

- Ele brincou com algo muito sério para mim...

- Foi uma brincadeira... Não o torture desta forma, Bruna. Você sabe que ele está sofrendo e você também, pois o ama.

- Eu tenho tanto medo, Cassi...

- Do que você tem medo, Bruna?

- Da minha mente. – confessou ela.

Bruna não conteve as lágrimas e Cassiane a abraçou.

- Não quero que ele me deixe. – falou Bruna.

- Ele nunca vai deixá-la, meu amor. Ele a ama de verdade e todos sabem disso. Não deixe esta insegurança estragar tudo. Deixe que ele se explique e o perdoe. Ele é humano, ele comete erros. Não vale a pena você perder tanto tempo por uma briguinha de nada. Vocês precisam amadurecer esta relação. Já está na hora... Faz muito tempo que estão juntos.

- As palavras dele foram como uma facada no meu coração.

- E você precisa esquecer estas palavras, pois estão fazendo com que você sofra à toa e ele também.

Cassiane saiu e deixou Bruna ali, fingindo que havia parado de chorar. Assim que a porta se fechou, ela deixou que as lágrimas rolassem. Mas ela nem sabia ao certo o motivo. Sabia que não era tão sério o que ele havia feito para ela agir daquela forma. No entanto não se sentia bem consigo mesma e tinha muito medo. Sofria por antecedência por medo de seus novos pensamentos, do homem de seu sonho que havia visto por duas vezes naquele dia e pelo que sua mente podia fazer. Não queria voltar a ter pensamentos suicidas. Não queria voltar a tomar mais remédios controlados, para tristeza de sua mãe e sua irmã. Tampouco queria voltar para a clínica psiquiátrica.

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