Rosalyne
Estava deitada no sofá, sendo acompanhada por Nicolau que se aconchegou em meus braços, e assistia a minha série predileta. Eu ria baixo pelo horário e a televisão também estava com pouco volume, o suficiente para que somente eu escutasse. Nicolau roncava mais alto que a televisão. Vez ou outra, o observava enquanto ele dorme, parecendo mais um trator em miniatura, mas ainda assim tão fofo. Conforme ficava mais tarde, comecei a ficar sonolenta também e percebi que quase adormeci. Porém, quando um trovão ecoou pela janela, um frio gelado percorreu minha espinha ao notar uma silhueta tomada pela escuridão. Eu não estava mais sozinha. Havia alguém lá fora, observando o meu apartamento. Olhei para Nicolau, que agora estava acordado, latindo freneticamente. O barulho de seus latidos misturava-se ao som distante da chuva. Afim de observar minuciosamente as intenções daquela pessoa, me mantive quieta, sem fazer sequer um movimento brusco. E então, escutei batidas na porta. Fiquei de pé, segurando instintivamente Nicolau sobre o meu peito e me coloquei em posição de luta. Eu tinha certeza que se alguém se deu ao trabalho de escalar o prédio, muito facilmente teria entrado e estaria pelos corredores dos apartamentos. Mas... qual seria a motivação disso tudo? Quando escutei a voz de Cesare, meu alívio foi palpável, mas algo dentro de mim ainda estava em alerta. Eu abri a porta sem hesitar, mas não pude deixar de me perguntar: o que estava acontecendo? Antes que eu falasse alguma coisa, ele pegou em minha mão e me puxou com cuidado para fora do apartamento, trancando minha porta em seguida. Fui guiada até o seu apartamento e entramos ali rapidamente. — O que está acontecendo? — perguntei confusa enquanto o observava fechar a porta e a trancar. Antes de responder minha pergunta, ele me analisou de cima a baixo e fez o mesmo com Nicolau. Deu um suspiro aliviado e passou a mão pela testa. — Ainda bem que eu percebi a tempo. — ele disse num tom aliviado e seu olhar se fixou no meu. — Estão atrás do Nicolau. — respondeu minha pergunta anterior. O olhei ainda mais confusa. — Quem exatamente? — arqueei a sobrancelha. Quem estaria atrás de uma fofura dessas? — Todos aqueles que me consideram inimigos. Sendo sincero, a lista é grande. — ele revelou e passou a andar para dentro. — Pode ficar à vontade. — Oh, obrigada. — disse a começar seguir ele. Mas ainda não compreendia inteiramente. Inimigos? Lista grande? — Me desculpa perguntar, mas... inimigos? Cesare parou de caminhar e olhou para mim. — Relaxe, Rosa. Primeiro, beba uma água. Deve ter se assustado. — ele sugeriu com um olhar preocupado. — Está bem. — me dei por vencida e o observei ir em direção da cozinha. Ainda estava na euforia da situação, por ter "acordado" de surpresa, então era melhor eu me acalmar. Me sentei no sofá da sala e coloquei Nicolau do meu lado. O pequenino nem entendia o que acontecia e já havia voltado a dormir. Deve ser bom ser um cachorro... Comecei a acariciar o pequeno animal e minha atenção foi desperta quando vi os pés de Cesare. Olhei para cima e percebi que ele me oferecia um copo com água. Agradeci e bebi um pouco, me sentindo mais relaxada. — Se acalmou? — perguntou e eu assenti. — Obrigada. — entreguei lhe o copo e ele o colocou em cima da mesinha de centro. Por um momento, ele apenas me observou. O silêncio era carregado, mas ele parecia confortável nele, como se não tivesse pressa em quebrá-lo. Percebendo isso, me limitei a encará-lo de volta e esperar o seu tempo. — Enquanto Nicolau estava seguro com você, comecei a investigar quem poderia ter soltado ele. Agora, eu consigo afirmar que se tratava da minha empregada. — deu um suspiro. Seu olhar de decepção era inegável. — O que ela ganharia com isso? — tombei a cabeça, confusa. Pensando de uma maneira racional, ela teria mais o que perder do que ganhar com isso. — Ganharia muita coisa. Porque a minha única fraqueza é Nicolau. — ele olhou para o cachorro. — Ela tem alguma relação com alguém que é meu inimigo. Foi a conclusão que cheguei depois de investigar. Mas eu não imaginava que estivessem de olho e percebessem que o plano deles de sumir com Nicolau falhou. Pensei sobre suas palavras, ainda sem acreditar que algo assim estava acontecendo. Eles realmente estavam atrás de Nicolau. Isso me fez cogitar algo e olhei para Cesare, assustada. — E se... quando eu resgatei Nicolau, na verdade eles ainda estivessem no processo de pegar ele sem que ninguém percebesse? Cesare deu um pequeno sorriso, um pouco surpreso, e assentiu positivamente. — Foi justamente isso que aconteceu. E na mesma medida que eu te agradeço, não posso mentir pra você... o perigo que você corre por causa disso agora é enorme. — sua voz se tornou un pouco mais séria e isso me fez sentir na pele a situação complicada que me encontrava. Estava no começo das minhas férias que acreditei que seriam tediosas. Mas, veja só? Não esperava que me envolveria em uma confusão. E mesmo sabendo disso tudo... — Não me arrependo. Na verdade, estou grata que estive na hora errada e consegui recuperar Nicolau para você. — dei um sorriso satisfeito enquanto olhava Nicolau. — Não consigo imaginar a ruindade que fariam com ele para... — subi o olhar para Cesare. — O atingir. Cesare, mais uma vez, pareceu surpreso. Ele balançou a cabeça negativamente e deu um sorriso de canto. — Eu esperava tudo, menos isso. — Cesare confessou. — Rosa, você não tem medo? Neguei e o olhei confusa. — Eu estava preparada para dar uma lição em algumas pessoas. — me justifiquei. — Protegeria Nicolau a qualquer custo. Cesare me olhava intrigado e se levantou do lugar que estava, passando a se sentar mais próximo de mim. — Você diz com a confiança de alguém que já lidou com um bandido. Dei um sorriso divertido e o olhei convencida. — Já lidei. No meu trabalho, não era incomum chegarem bandidos para serem tratados. E no meio do tratamento, caso tentassem fugir, eu os impedia. — disse orgulhosa. Cesare se mostrou interessado no assunto e deu uma risada leve. — Qual é a sua profissão? O olhei intrigada. Eu estava mais curiosa sobre qual era a profissão dele. Pois da maneira que ele fala sobre ter inimigos... isso abria caminhos para muitas coisas. — E qual é a sua profissão, então? — perguntei, ainda tentando juntar as peças do quebra-cabeça. Cesare hesitou por um momento, seu olhar se perdendo em algum ponto distante, como se estivesse ponderando o que dizer. Finalmente, ele me olhou de volta, com um suspiro, e respondeu: — Minha profissão... Não é algo de se orgulhar. E, sinceramente, acho que você não gostaria de saber. Eu o encarei, mais curiosa do que nunca. — Você não sendo dentista, tudo bem — disse, tentando aliviar a tensão com uma piada. Ele me olhou surpreso, sem entender a referência, e franziu as sobrancelhas. — Dentista? — Sim — respondi, rindo levemente. — Eu simplesmente odeio dentistas. Isso não significa que eu não os frequente, mas... com certeza não é minha profissão dos sonhos. — Oh? Então está tudo bem qualquer coisa, exceto dentista? — ele brincou, um sorriso leve aparecendo em seus lábios. Assenti, ainda intrigada, mas me sentindo impaciente pela resposta que eu sabia que viria. Cesare deu um suspiro, o sorriso desaparecendo, e ele se aproximou um pouco mais, como se se preparasse para dizer algo sério. — Eu sou... — Ele fez uma pausa, analisando meu rosto. Então, com um olhar sombrio e uma leve tensão na voz, ele continuou. — Mafioso, Rosa.Rosalyne De todas as coisas, essa seria a última que eu iria cogitar. Eu cheguei até a pensar que ele era um policial, investigador ou parte de uma agência secreta. Estava completamente errada e bastante surpresa. Mafioso. Cesare é um mafioso? — Ficou sem palavras, não é? — ele disse ao observar o meu estado. Olhando para Cesare, sua aparência era realmente imponente. Eu estava realmente sem palavras. Agora fazia sentido a maneira como "inimigos" para ele soava tão natural. — Eu realmente fui pega de surpresa. — confessei, ainda o observando atentamente. — Mafioso... — repeti, pensativa. — Talvez fosse melhor eu não ter revelado? Balancei a cabeça negativamente. Na verdade, aprecio que ele não teve rodeios quanto a isso ou mentiu. — Por mais surpreendente que seja... você ainda não é um dentista. — comentei e ele riu levemente. — Mas, se você quiser correr, meu apartamento está disponível para isso. Eu só não indicaria você ir lá fora agora. — Tem pessoas que traba
Rosalyne Um trovejo alto foi escutado e eu estremeci no sofá. Cesare se levantou e puxou a cortina para cobrir a janela. O olhei agradecida e ele apenas assentiu em resposta. Acabei por bocejar e o cansaço do meu corpo me atingiu em cheio. Cesare notou isso e deu um pequeno sorriso.— Você parece bastante sonolenta. Irei preparar o quarto ao lado do meu para você. — disse e eu assenti.Enquanto o observei desaparecer pelo corredor, me encostei no sofá, passando a pensar sobre a nossa conversa. De certa forma, hoje conheci um pouco mais sobre ele. Um pouco mais sobre Nicolau. Em como nossos mundos parecem tão opostos. Era curioso e instigante. E o fato de que eu não poderia sair daqui hoje: caso contrário, estaria correndo um perigo que sequer posso imaginar. Pois, se tratanto do mundo dos mafiosos, o pior era sempre esperado se tratando de inimizades. Sem perceber, comecei a pescar ali mesmo no sofá. Era muita coisa para pensar e o sofá era tão confortável e tão quentinho que não p
A sala era ampla, com teto abobadado e janelas altas que deixavam entrar a luz pálida do entardecer. Os móveis de madeira escura e os estofados de veludo denso conferiam um ar austero ao ambiente. O som firme das botas de couro ecoava pelas paredes enquanto um homem de figura imponente atravessava o espaço. Seus ombros largos e postura ereta transmitiam autoridade, mas havia algo na rigidez de seu semblante que sugeria preocupação. Ao aproximar-se da mesa central, seus olhos — atentos, quase predatórios — notaram um envelope repousando sobre o tampo polido. Ele hesitou por um instante, os dedos robustos pairando no ar, antes de pegar a carta. O papel estava levemente amassado, como se alguém o tivesse manuseado repetidamente. Com movimentos lentos, ele rompeu o lacre e desdobrou a folha. A caligrafia era delicada, familiar. Seu rosto, que até então permanecera estoico, começou a mudar à medida que lia as palavras. A mandíbula apertou-se; as sobrancelhas franziram. Então, inespe
Rosalyne Assim que trocamos olhares, ele baixou o olhar e o fixou em Nicolau.— Nico?! Onde você estava, rapaz? — ele disse um pouco confuso e franziu o cenho.O cachorro começou a latir pra ele e eu o segurei para que não caísse. Que reação mais... amorosa? — Nicolau, calma. — o acariciei e ele parou de latir na mesma hora, o que surpreendeu tanto eu quanto o homem a minha frente. Fiz carinho no cachorro por ter se comportado e olhei curiosa para o homem a minha frente. — Ele é seu? — perguntei, tentando entender a situação. O homem coçou a nuca e se encostou na batente de sua porta. — Ele é! — disse olhando para o cachorro. — Ou pelo menos era. — brincou ao olhar para mim e eu dei um sorriso. — O que aconteceu? Ele fugiu? — Eu nem sei ao certo. Acabei de chegar do trabalho e notei que ele não estava. Joguei as coisas num canto e peguei uma capa de chuva pra ir procurar ele... — ele disse enquanto observava o cachorro. — Mas parece que gostou tanto de você que não me q