Capítulo 02

Louise

DECIDO USAR UMA SAIA preta lápis, com uma fenda em um dos lados, camiseta social vermelha e um blazer preto por cima. Faço um rabo de cavalo para ajeitar o cabelo.

Me olho no espelho, gostando do que vejo, pois até que fiquei bem vestida desse jeito. Esse tipo de roupa costuma me apavorar, gosto mais de peças básicas e sociais. O lado bom de trabalhar com os meus pais era poder usar moletom e não ouvir reclamações, a não ser da minha mãe, mas eu escolhia ignorá-la.

Caso eu consiga a vaga, terei que usar roupas assim todos os dias, o que me lembra de que terei que renovar o meu guarda-roupa.

Quando começo a fazer uma maquiagem bem básica, ouço uma buzina e nem preciso olhar pela janela para saber que é a Claire.

— A porta está aberta — grito da janela e volto a me maquiar.

Claire é minha amiga desde o primeiro ano do ensino médio. Nossa amizade dura há quase dez anos. Temos muito carinho uma pela outra e passamos por muita coisa juntas.

O fato de ela sempre ter sido popular e arrancar suspiros por onde passa nunca me causou inveja, pelo contrário. Concordo com todo mundo, pois ela é mesmo linda. Ela é uma mulher alta, olhos verdes, pernas longas e bem tornadas, cabelos que vão até a sua cintura e uma simpatia que lhe torna única.

— Louise, já está pronta? — Claire pergunta enquanto entra no meu quarto minutos depois.

— Mais uns dez minutos. 

— Já pesquisou sobre a empresa?

— Ainda não. — Digo e ela faz uma careta.

— Vamos lá. — Ela se j**a na minha cama e pega o meu MacBook. — Qual o nome da empresa?

— Não me lembro. Só sei que recebi um e-mail com as informações que preciso.

— Como você é péssima Louise. — Ela ri. — Acho que você está querendo voltar a trabalhar com a sua mãe.

— Não, né?!

— Vou olhar aqui.

Ela volta o olhar para a tela enquanto finalizo meu delineado.

— Já falou com o Alex? 

— Não. Aliás, vamos almoçar juntos hoje.

— Por que você não dá um ponto final nessa história? —pergunta. — Você nunca o amou.

— Você não precisa me lembrar disso.

— E o bonitão? Já deve desconfiar que você tem uma queda por ele.

— Isso não tem nada a ver, Claire. — Bufo. — Podemos mudar de assunto?

— Hein, você me disse que não sabe o nome da empresa, não é?

— Sim. Por quê?

— Como você enviou os currículos?

— Não me responda com outra pergunta. — Faço careta quando erro o meu delineado.

— Só me responda isso.

— Acho que foi num site, não me lembro muito bem. As vagas surgiram e eu fui me cadastrando em todas. Essa foi apenas uma que me chamou para a entrevista. — Dou de ombros.

— Não creio, Louise. — Ela começa a rir. 

— O que eu fiz?

— Nada de mais — responde, toda risonha. — Vou fazer um resumo sobre a empresa, e vê se estuda.

— Claro, dona mãe.

Na maioria das vezes, a Claire é pior do que minha mãe para me dar broncas. Mesmo assim, eu a amo.

— Vou enviar por mensagem.

— O que eu faria sem você?

— Sabe que a vaga é temporária?

— Eu sei. Até lá, vou encontrar outro emprego. A única coisa que eu sei é que não quero mais trabalhar com os meus pais. — Claire me encara e torce nariz.

— Meu deus. Que delineado horrível. — Sinceridade, com certeza, é um dos seus pontos mais fortes. — Vem cá, me deixa arrumar isso.

***

Já faz mais de dez minutos que Claire me deixou no restaurante, e o Alex ainda não apareceu. Liguei algumas vezes, mas sem sucesso em falar com ele, o que está me deixando frustrada.

Espero por mais alguns minutos, antes de ligar novamente pela última vez. Quando não consigo contato, decido fazer meu pedido e acabo almoçando sozinha.

Pago a conta e olho o endereço da empresa no meu celular. Peço um Uber, que chega em menos de dois minutos, entro no carro e seguimos.

Me lembro de abrir a mensagem que a Claire me mandou, com tudo o que eu preciso saber da empresa.

“Empresa Brown, fundada há mais de cinquenta anos...”

Paro de ler assim que leio essa informação. 

— Puta merda — murmuro para mim mesma.

Quando penso em pedir para o motorista mudar a rota, já é tarde demais.

— Chegamos, senhorita — o motorista de cabelo grisalho avisa.

— Obrigada. — Desço do carro e fico ali, parada em frente àquele prédio enorme, pensando se devo ou não entrar. Só que, se não quero mais trabalhar com os meus pais e preciso pagar a minha faculdade de letras, não há outro jeito.

Até então, ninguém tinha me dito quem iria me entrevistar, as chances de ser o Josh, são bem pequenas, pois, além de ser um CEO muito ocupado, é raro que ele receba visitas que não sejam seus investidores.

Respiro fundo e entro,

caminhando até final do hall.

— Oi. Tenho uma entrevista — digo ao segurança, que estava próximo à recepção. Ele não diz nada, apenas aponta com o dedo para onde devo ir. — Não tem ninguém ali.

— Último andar — responde, sem me olhar.

— Obrigada. — Chamo o elevador e aperto o botão da cobertura.

Assim que as portas do elevador se abrem,

uma moça ruiva, de estatura mediana, se aproxima e sorri para mim. Só aí eu percebo o tamanho da sua barriga.

— Olá. Tudo bem? — ela pergunta. — Em que posso lhe ajudar? — Parece caminhar com uma certa dificuldade em minha direção, e devo ter feito uma expressão preocupada, pois ela continua: — Não ligue, não. Estou bem. Só estou com os pés inchados, hormônios à flor da pele e com muita, mas muita azia. — Ela ri. — Você acha que é fácil carregar três?!

— Oi, são... três? — Caminho em sua direção.

— Sim, trigêmeos. — Ela passa uma das mãos na barriga. — Me desculpa. O que você veio fazer aqui mesmo? 

 — Tenho uma entrevista.

— Ah, sim. — Ela caminha para trás do balcão. — Senhorita Louise Smith — fala, olhando para um papel em suas mãos.

— Isso.

— Aqui está seu currículo. — Ela me entrega a folha. – O senhor Kim está um pouco atrasado, mas, assim que ele chegar, ele irá realiza a sua entrevista.

— Obrigada. — Me sinto aliviada por não ser o Josh a fazer isso.

— Sente-se. — Ela indica uma das poltronas na sala de espera e faço o que me pede. — Aceita um chá, café ou água?

— Um chá, por favor.

A moça da recepção entra em um dos corredores e desaparece. Aproveito para  mexer no meu celular enquanto aguardo.

— Aqui está, senhorita Smith. — Ela me entrega a xícara com um líquido fumegante, o cheiro de hortelã preenchendo minhas narinas.

— Obrigado. — Pego a xícara e continuo mexendo no meu celular enquanto aprecio o meu chá.

— Senhorita Smith. 

— Sim.

— O senhor Kim não vai chegar a tempo, mas a senhorita pode entrar. — Me aproximo dela sem entender quem vai fazer a entrevista, lhe entrego a xícara, e ela indica a entrada enorme bem atrás dela.

Dou duas batidas à porta, espero por alguns segundos, mas, como ninguém diz nada, simplesmente giro a maçaneta, empurrando a madeira até abri-la.

A sala é enorme e tem apenas uma janela, cuja vista tenho certeza de que deve ser linda.

Só acho o ambiente um pouco escuro. Há uma combinação de cores neutras, para ser mais exata, preto e cinza. Do outro lado, há uma mesa enorme na cor preta, com uma estante atrás, enfeitada por algumas plantas e porta-retratos. Como estou um pouco distante, não consigo ver quem são as pessoas nas fotos.

O silêncio preenche o lugar e só então me dou conta de que abri a porta e fiquei apenas observando tudo. Que péssima impressão devo estar passando a quem vai me entrevistar…

— Me desculpa — digo, enquanto caminho em direção àquela mesa enorme. Ainda não vejo quem é a pessoas que está sentada na poltrona, pois ela permanece de costas para mim. — A moça disse que eu poderia entrar. — Continuo sem respostas, duvidando até mesmo que tenha alguém aqui comigo. — Com licença. — Tento mais uma vez. A pessoa não se pronuncia, e decido ficar quieta.

Algum tempo depois, a cadeira vira e perco o ar quando meus olhos encontram o do homem que está sentado nela.

— Louise — fala e sorri. — Sente-se, por favor. — Entro no automático com o choque que levo, consigo apenas me sentar. — Você se candidatando a uma vaga de emprego? — Ele ri e olha para o papel em uma das suas mãos, que deve ser o meu currículo. — Aconteceu alguma coisa?

— É, não... — Tento não gaguejar. — Eu não sabia que era aqui.

— Não entendi. — Ele me olha por cima dos óculos.

Ele é um homem alto, loiro, olhos azuis, cabelos castanho-claros e um sorriso encantador. 

Josh, esse é o nome do meu grande amor e quem está à minha frente.

Eu sempre ficava observando-o, especialmente quando íamos aos almoços de domingo em sua casa. Aos trinta anos, seu sorriso é contagiante e ele emana tanta simpatia que alguém poderia achar que ele está se jogando para cima da pessoa.

— Desculpa, me expressei mal — explico e respiro fundo. — É que eu não quero mais trabalhar com os meus pais, você sabe como a minha mãe é. — Dou de ombros.

— Sei bem como a Mila é, ela tem o gênio muito forte. — Ele passa umas das suas mãos em seus cabelos. — Mas você sabe que a vaga é temporária, não sabe?

— Sei, sim.

— É pra ocupar o lugar da Anna.

— A que está grávida?

— Sim, como são trigêmeos, ela vai ter que se ausentar antes do esperado. — Ele analisa o meu currículo. — Sabe que a vaga é de recepcionista e você é formada em Marketing?

— Eu ajudava a minha mãe com algumas coisas — menciono.

— Você tem que organizar a minha agenda, marcar algumas reuniões e me acompanhar em alguns eventos, viagens.

— Eu acho que consigo.

— Ok, Louise. — Ele sorri. — Eu fico uma bagunça toda vez que te vejo.

Não encontro palavras para respondê-lo. 

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