Enzo Albuquerque Sei que não deveria descontar a minha frustração nos outros, mas estou tão irritado que não medi as consequências dos meus atos e acabei gritando com a secretária de Ana Luiza. A menina ficou cinza e, rapidamente, seus olhos se encheram de lágrimas. No momento, nem me arrependi por isso.Voltei para minha sala completamente frustrado e não demorou nem quarenta minutos para Ana Luiza aparecer. Ela estava irritada, e eu sabia que sua secretária havia lhe dito algo.Em meio à nossa breve discussão, falei o que não devia — e levei um tapa na cara dela. O que me deixou ainda mais irritado, mesmo eu sabendo que a culpa era minha.— Você ficou maluca?— Você quem está louco! Acha mesmo que pode me comparar a qualquer vadia e eu ficarei bem? Esse tapa ainda foi pouco.— Pouco? Você está brincando com o perigo.— Se não está satisfeito com o meu trabalho, me demita. — Ela me olhou com um olhar desafiador.Essa nova versão da AnaLu me deixa com raiva e excitado ao mesmo tempo.
Eu deveria estar acostumado. A esses almoços, a esses convites que parecem mais uma obrigação do que um gesto de carinho. A essas conversas vazias cheias de segundas intenções, aos olhares calculistas da minha mãe enquanto despeja uma enxurrada de palavras que mal me interessam. Mas, ainda assim, toda vez que sento à mesa com ela, me sinto como um adolescente rebelde, entediado, desconectado do mundo em que ela vive e insiste em me arrastar junto.O restaurante era um daqueles lugares requintados que cheiram a dinheiro e pretensão. As paredes de vidro permitiam uma vista ampla do lago artificial do clube, onde alguns velhos ricos fingiam se importar com esportes aquáticos enquanto suas esposas ostentavam roupas de grife e bronzeados artificiais. Eu nunca gostei daquele ambiente, mas ali estava eu, sentado em uma cadeira desconfortavelmente dura, escutando minha mãe tagarelar sem parar.— ...e você precisava ter visto a Juliana Brandão ontem na noite de gala. Estava deslumbrante! Um ve
Ana Luiza MartinelliDepois da reunião matinal com o setor de marketing, onde discutimos os ajustes finais da campanha da nova linha de produtos, eu voltei para minha sala com a mente fervilhando. Ainda estava absorvendo o que havia acontecido mais cedo com Enzo. Não era do meu feitio perder o controle daquela forma, mas ele havia ultrapassado todos os limites.Precisava colocar um ponto final na forma como ele se dirigia a mim. E coloquei.— Ele nunca mais vai gritar com você. — repeti para mim mesma em voz baixa, como se reafirmar isso tornasse mais real.Camile me seguiu até a sala e assim que fechamos a porta, ela soltou:— Ana... você se expôs demais. Poderia ser demitida por ter confrontado o senhor Albuquerque daquela maneira.Suspirei, ajeitando os papéis sobre minha mesa e olhando para ela com calma.— Não se preocupe com isso, Camile. Eu sabia exatamente o que estava fazendo. — Mesmo assim...Levantei a mão, interrompendo-a suavemente.— Olha, não vou almoçar hoje. Tem mui
— Heloíse, com todo o respeito... — murmurei, tentando manter a compostura. — Vai pra puta que pariu e sai da minha frente.— Como você é baixa, menina.— E como você é uma velha mal amada. Vai atazanar quem te merece, no caso seu filhinho.Estiquei a mão e apontei para a porta. Ela hesitou por um segundo, depois se virou lentamente, como se concedesse uma vitória temporária. Parou à porta, me lançando um último olhar carregado de desprezo.— Último aviso, se afaste do meu filho.— Vai se foder. — sussurrei.Ela saiu e fechou a porta com força. Me deixei cair na cadeira de novo e levei as mãos ao rosto, sentindo uma lágrima solitária escorrer pela bochecha. Não chorei por medo. Nem por dor. Era raiva. Era exaustão. Era tudo.Permaneci ali por alguns minutos, sentindo o silêncio me engolir, até ouvir uma batida suave na porta. Era Camile, com um saco de papel na mão.— Trouxe seu lanche. Tá tudo bem? — ela perguntou, percebendo o clima pesado no ar.Assenti lentamente, limpando o rosto
Murilo se aproximou de mim com dois copos de café e me entregou um. Ele me olhou de cima abaixo e assobiou.— Está gostosa, gata! Isso tudo é para o nosso CEO? — Ele riu, divertido.— Estou gostosa para mim, pois eu mereço, migo. — Muri sorriu. — E aí, como foi a sua noite? Minha mãe está com saudades de você e da Bea.— Tenho que ir lá ver dona Fátima. Adoro a sua mãe como se fosse minha.Meu amigo é órfão de pai e mãe. Infelizmente, ele os perdeu em um acidente de carro quando era pequeno e foi criado pelos avós. E, mesmo com todo o carinho deles, ele sente saudades dos pais. Quando conheceu a minha mãe, virou um grude com ela. Minha mãe é muito acolhedora, e isso fez com que ele a adotasse como mãe.— Vai sim. Ela está na minha casa. Vou chamar a Bea e vamos nos divertir à noite.— Vou levar cerveja pra nós e refrigerante para o Nandinho.— Esqueceu que o Nandinho não toma refrigerante? Ele é chatinho, assim como o pai. Na verdade, ele tem diversas características do pai.— Se o no
— Você? — Richard rosnou, o sorriso completamente desfeito.— Até que enfim nos encontramos de novo, Richard. — Enzo rebateu com ironia, cruzando os braços. — Sempre rastejando nos lugares errados, pelo visto.Meus olhos foram de um para o outro, sentindo a tensão tomar conta da mesa. Eles se conheciam. E, pelo visto, se odiavam.— Enzo... o que está fazendo aqui? — perguntei, tentando manter a calma.— Vim jantar. Mas não imaginei que encontraria um velho conhecido... e minha... funcionária preferida. — Ele disse, com ênfase proposital na palavra “funcionária”.— Você não mudou nada, Enzo. Continua um babaca controlado pelo próprio ego. — Richard retrucou, inclinando-se para frente.— E você continua um verme oportunista. — Enzo rebateu, frio.Pisquei, tentando entender a conexão entre eles. O clima estava sufocante, como se qualquer palavra a mais fosse causar uma explosão. Enzo lançou um último olhar para mim e depois para Richard.— Enzo, você quer alguma coisa? Estamos no meio de
Enzo AlbuquerqueEstava em casa, como sempre fazia quando chegava da empresa, quando minha irmã entrou e me chamou para jantar.— Estou falando sério, Rafa, vou modificar as trancas da minha casa.— E eu também falo sério quando digo que vou descobrir como destrancar as portas e entrar do mesmo jeito. Você nunca vai se livrar de mim, irmãozinho. Agora levanta daí e me leve para jantar.— Vem cá, por que você não arruma um namorado pra fazer de pau-mandado? — perguntei ainda deitado.— Porque eu prefiro mandar no meu irmão mais velho. Cala a boca e anda logo! Quero filé de peixe com aspargos. Há um restaurante maravilhoso.— Tá… tá. Sua chata! Espera apenas eu trocar de roupa.Minha irmã bateu palmas animada e me levantei, tomando um banho rápido e trocando de roupa. Minha irmã às vezes não se comporta como uma mulher de 27 anos e, às vezes, tenho vontade de exportá-la para o Polo Norte, mas é ela quem me traz a leveza que preciso, e isso é bom de certa forma.Chegamos ao restaurante e
Ana Luiza Martinelli Acordei bem cedo, fiz tudo que precisava e, quando desci, minha mãe estava na cozinha preparando o café.— Bom dia, minha filha! Dormiu bem? — minha mãe perguntou, e assenti.— Sim, mãe! A senhora não precisa ficar preparando o café. Eu pedi pra senhora ficar no meu apartamento pra ter uma companhia, e não pra fazê-la de empregada.Minha mãe olhou pra mim ofendida, e por um segundo imaginei ela metendo a colher de pau na minha cabeça, como fazia quando eu era criança.— Não estou me fazendo de empregada. Eu gosto de cozinhar pra você, pro seu irmão e pro meu neto. Isso me faz sentir viva.— Só não quero que a senhora se canse.— Não sou tão velha quanto você tenta me pintar.Minha mãe estava certa. Ela era uma mulher de 53 anos e estava em ótimo estado.— A senhora é uma gata! Nem parece que tem dois filhos marmanjos e um neto.Dona Fátima sorriu com meu comentário e me abraçou.— Isso mesmo! Sua mãe é muito gata e ainda dá um belo caldo. — Nós duas rimos.— Deix