Enzo AlbuquerqueEstava em casa, como sempre fazia quando chegava da empresa, quando minha irmã entrou e me chamou para jantar.— Estou falando sério, Rafa, vou modificar as trancas da minha casa.— E eu também falo sério quando digo que vou descobrir como destrancar as portas e entrar do mesmo jeito. Você nunca vai se livrar de mim, irmãozinho. Agora levanta daí e me leve para jantar.— Vem cá, por que você não arruma um namorado pra fazer de pau-mandado? — perguntei ainda deitado.— Porque eu prefiro mandar no meu irmão mais velho. Cala a boca e anda logo! Quero filé de peixe com aspargos. Há um restaurante maravilhoso.— Tá… tá. Sua chata! Espera apenas eu trocar de roupa.Minha irmã bateu palmas animada e me levantei, tomando um banho rápido e trocando de roupa. Minha irmã às vezes não se comporta como uma mulher de 27 anos e, às vezes, tenho vontade de exportá-la para o Polo Norte, mas é ela quem me traz a leveza que preciso, e isso é bom de certa forma.Chegamos ao restaurante e
Ana Luiza Martinelli Acordei bem cedo, fiz tudo que precisava e, quando desci, minha mãe estava na cozinha preparando o café.— Bom dia, minha filha! Dormiu bem? — minha mãe perguntou, e assenti.— Sim, mãe! A senhora não precisa ficar preparando o café. Eu pedi pra senhora ficar no meu apartamento pra ter uma companhia, e não pra fazê-la de empregada.Minha mãe olhou pra mim ofendida, e por um segundo imaginei ela metendo a colher de pau na minha cabeça, como fazia quando eu era criança.— Não estou me fazendo de empregada. Eu gosto de cozinhar pra você, pro seu irmão e pro meu neto. Isso me faz sentir viva.— Só não quero que a senhora se canse.— Não sou tão velha quanto você tenta me pintar.Minha mãe estava certa. Ela era uma mulher de 53 anos e estava em ótimo estado.— A senhora é uma gata! Nem parece que tem dois filhos marmanjos e um neto.Dona Fátima sorriu com meu comentário e me abraçou.— Isso mesmo! Sua mãe é muito gata e ainda dá um belo caldo. — Nós duas rimos.— Deix
Enzo AlbuquerqueDepois daquela noite com Ana Luiza, decidi que precisava mudar de estratégia. Eu estava sendo impulsivo, direto demais, como se estivesse tentando forçar um sentimento que ainda estava em reconstrução. Não era isso que eu queria. Queria que ela viesse até mim por vontade própria. Queria que sentisse a minha falta, que se perguntasse o porquê de eu estar diferente. Queria que ela viesse porque, no fundo, ainda existe algo entre nós. E eu sei que existe.Por isso, naquela manhã, coloquei minha armadura de CEO e foquei no trabalho. Me escondi por trás de planilhas, reuniões e relatórios. Passei a manhã inteira analisando dados da nova campanha e conversando com Murilo sobre o desempenho do time B. A equipe estava indo bem, e apesar do caos que minha vida pessoal se tornara, eu precisava manter a postura de líder. Era isso ou virar piada dentro da própria empresa.Mas, claro, ela estava lá. Ana Luiza. No mesmo corredor. Na mesma rotina. Com aquele perfume que eu reconhece
Ana Luiza MartinelliA manhã transcorreu de forma estranha. Enzo, que até então fazia questão de me provocar com olhares intensos e comentários ambíguos, passou por mim duas vezes sem sequer me dirigir um olhar. A primeira vez, atribuí ao acaso. Talvez estivesse realmente ocupado. Mas quando aconteceu novamente, uma inquietação se instalou em mim. Algo estava diferente.Decidi que precisava conversar com alguém sobre isso. Peguei o celular e enviei uma mensagem para Murilo:"Murilo, preciso de um cigarro e de uma conversa. Terraço em 5 minutos?"A resposta veio quase instantaneamente:"Claro, já estou a caminho. Levo o isqueiro."Murilo sempre foi meu confidente no trabalho. Além de competente, tinha uma sensibilidade ímpar para perceber nuances que, muitas vezes, me escapavam. Subimos juntos para o terraço, um refúgio que descobrimos ser perfeito para conversas privadas e momentos de descompressão.O vento fresco do final da manhã acariciava nossos rostos enquanto nos encostávamos na
Quando girei a chave na fechadura, um cansaço bom percorreu meu corpo. Aquele tipo de cansaço que a gente sente depois de um dia mentalmente desgastante, mas que também traz uma certa leveza, como se tudo que precisássemos estivesse atrás da porta de casa.Assim que entrei, ouvi o som inconfundível de passos apressados sobre o piso de madeira. Antes mesmo que pudesse largar minha bolsa no aparador da entrada, um torpedo humano se lançou contra mim.— Mamãe!— Nandinho! — Abri os braços para recebê-lo.Ele se jogou no meu colo com aquela empolgação que só uma criança de cinco anos consegue ter. Seu rostinho estava um pouco suado, provavelmente de tanto correr pela casa ou brincar no quintal. Agarrei-o com força, erguendo-o no ar. Mesmo já pesando um pouco mais do que antes, segurei firme, como se fosse a coisa mais natural do mundo.— Nossa, você está cada vez mais pesado, meu amor! — brinquei, beijando sua bochecha. — Daqui a pouco, mamãe não vai mais conseguir te pegar no colo!Ele
(Anos Atrás)Ana Luiza Martinelli A chuva castigava a cidade naquela noite, mas nada poderia se comparar à tempestade dentro de mim. O barulho das gotas contra o vidro da sala ecoava, abafando o som dos meus próprios pensamentos, mas não era o suficiente para silenciar a dor que se espalhava pelo meu peito.Meus dedos tremiam enquanto seguravam o celular, meus olhos fixos na tela, como se, a qualquer momento, aquela imagem fosse desaparecer. Como se, de alguma forma, eu pudesse acordar desse pesadelo.Mas a foto continuava ali. Ele continuava ali.Enzo.O homem que eu amava. O homem em quem confiei sem hesitar. O homem que, agora, estava estampado na tela do meu celular... com outra mulher.Ela sorria para a câmera, uma expressão de pura satisfação, e ele estava ao lado dela. Perto o suficiente para que qualquer desculpa fosse inútil. Seus braços envolviam sua cintura de um jeito íntimo demais para ser um mal-entendido.Meu coração batia forte, não por amor, mas por raiva, por incred
(Seis Anos Depois)Os corredores de vidro refletiam minha imagem conforme eu avançava, os saltos ecoando em um ritmo preciso, como um lembrete do caminho que trilhei até ali. O passado já não pesava mais sobre meus ombros, e a menina insegura, que uma vez trabalhou como auxiliar de serviços gerais para ajudar a família, agora não existia mais. No lugar dela, havia uma mulher confiante, determinada e, acima de tudo, implacável. Os funcionários desviavam o olhar quando eu passava, alguns cumprimentavam com um aceno respeitoso, outros cochichavam entre si, admirados ou intimidados. Eu sabia o que diziam,sabia o que pensavam. Ana Luíza Martinelli não era apenas a nova diretora-executiva, mas também a mulher que nunca aceitava um "não" como resposta. Meu nome já não estava vinculado à humildade do passado, mas à força que conquistei no presente. Ao entrar na sala de reunião, senti os olhares recaindo sobre mim. Alguns eram de respeito, outros, de inveja. Os diretores masculinos foram r
Cheguei à minha sala e me joguei na cadeira, irritada. Não acredito que o passado voltou. Só espero que ele não tenha reaparecido para me atormentar. Ouvi batidas na porta e dei permissão para entrar. — Oi, chefinha! Vai sair para comer ou quer que eu peça comida do seu restaurante preferido? — perguntou Camile. Antes que eu pudesse responder, meu celular apitou e vi o nome de Richard piscando na tela. "Oi, princesa! Ontem você saiu correndo do meu apê, quer almoçar comigo?"Não sentia nenhum sentimento por Richard, mas estar com ele era divertido. Ele era bom no sexo, mas era só isso. "Vou sim, me passa o endereço do restaurante que irei te encontrar."Ele me passou o endereço, e então me virei para Camile, que ainda aguardava minha resposta. — Ca, não se preocupe. Vou almoçar com um amigo. — Ok, chefinha. Bom almoço para você. Ela se retirou, e eu comecei a trabalhar para compensar o tempo perdido naquela reunião idiota. Meu telefone tocou, e Camile me avisou que o n