— Heloíse, com todo o respeito... — murmurei, tentando manter a compostura. — Vai pra puta que pariu e sai da minha frente.— Como você é baixa, menina.— E como você é uma velha mal amada. Vai atazanar quem te merece, no caso seu filhinho.Estiquei a mão e apontei para a porta. Ela hesitou por um segundo, depois se virou lentamente, como se concedesse uma vitória temporária. Parou à porta, me lançando um último olhar carregado de desprezo.— Último aviso, se afaste do meu filho.— Vai se foder. — sussurrei.Ela saiu e fechou a porta com força. Me deixei cair na cadeira de novo e levei as mãos ao rosto, sentindo uma lágrima solitária escorrer pela bochecha. Não chorei por medo. Nem por dor. Era raiva. Era exaustão. Era tudo.Permaneci ali por alguns minutos, sentindo o silêncio me engolir, até ouvir uma batida suave na porta. Era Camile, com um saco de papel na mão.— Trouxe seu lanche. Tá tudo bem? — ela perguntou, percebendo o clima pesado no ar.Assenti lentamente, limpando o rosto
Murilo se aproximou de mim com dois copos de café e me entregou um. Ele me olhou de cima abaixo e assobiou.— Está gostosa, gata! Isso tudo é para o nosso CEO? — Ele riu, divertido.— Estou gostosa para mim, pois eu mereço, migo. — Muri sorriu. — E aí, como foi a sua noite? Minha mãe está com saudades de você e da Bea.— Tenho que ir lá ver dona Fátima. Adoro a sua mãe como se fosse minha.Meu amigo é órfão de pai e mãe. Infelizmente, ele os perdeu em um acidente de carro quando era pequeno e foi criado pelos avós. E, mesmo com todo o carinho deles, ele sente saudades dos pais. Quando conheceu a minha mãe, virou um grude com ela. Minha mãe é muito acolhedora, e isso fez com que ele a adotasse como mãe.— Vai sim. Ela está na minha casa. Vou chamar a Bea e vamos nos divertir à noite.— Vou levar cerveja pra nós e refrigerante para o Nandinho.— Esqueceu que o Nandinho não toma refrigerante? Ele é chatinho, assim como o pai. Na verdade, ele tem diversas características do pai.— Se o no
— Você? — Richard rosnou, o sorriso completamente desfeito.— Até que enfim nos encontramos de novo, Richard. — Enzo rebateu com ironia, cruzando os braços. — Sempre rastejando nos lugares errados, pelo visto.Meus olhos foram de um para o outro, sentindo a tensão tomar conta da mesa. Eles se conheciam. E, pelo visto, se odiavam.— Enzo... o que está fazendo aqui? — perguntei, tentando manter a calma.— Vim jantar. Mas não imaginei que encontraria um velho conhecido... e minha... funcionária preferida. — Ele disse, com ênfase proposital na palavra “funcionária”.— Você não mudou nada, Enzo. Continua um babaca controlado pelo próprio ego. — Richard retrucou, inclinando-se para frente.— E você continua um verme oportunista. — Enzo rebateu, frio.Pisquei, tentando entender a conexão entre eles. O clima estava sufocante, como se qualquer palavra a mais fosse causar uma explosão. Enzo lançou um último olhar para mim e depois para Richard.— Enzo, você quer alguma coisa? Estamos no meio de
Enzo AlbuquerqueEstava em casa, como sempre fazia quando chegava da empresa, quando minha irmã entrou e me chamou para jantar.— Estou falando sério, Rafa, vou modificar as trancas da minha casa.— E eu também falo sério quando digo que vou descobrir como destrancar as portas e entrar do mesmo jeito. Você nunca vai se livrar de mim, irmãozinho. Agora levanta daí e me leve para jantar.— Vem cá, por que você não arruma um namorado pra fazer de pau-mandado? — perguntei ainda deitado.— Porque eu prefiro mandar no meu irmão mais velho. Cala a boca e anda logo! Quero filé de peixe com aspargos. Há um restaurante maravilhoso.— Tá… tá. Sua chata! Espera apenas eu trocar de roupa.Minha irmã bateu palmas animada e me levantei, tomando um banho rápido e trocando de roupa. Minha irmã às vezes não se comporta como uma mulher de 27 anos e, às vezes, tenho vontade de exportá-la para o Polo Norte, mas é ela quem me traz a leveza que preciso, e isso é bom de certa forma.Chegamos ao restaurante e
Ana Luiza Martinelli Acordei bem cedo, fiz tudo que precisava e, quando desci, minha mãe estava na cozinha preparando o café.— Bom dia, minha filha! Dormiu bem? — minha mãe perguntou, e assenti.— Sim, mãe! A senhora não precisa ficar preparando o café. Eu pedi pra senhora ficar no meu apartamento pra ter uma companhia, e não pra fazê-la de empregada.Minha mãe olhou pra mim ofendida, e por um segundo imaginei ela metendo a colher de pau na minha cabeça, como fazia quando eu era criança.— Não estou me fazendo de empregada. Eu gosto de cozinhar pra você, pro seu irmão e pro meu neto. Isso me faz sentir viva.— Só não quero que a senhora se canse.— Não sou tão velha quanto você tenta me pintar.Minha mãe estava certa. Ela era uma mulher de 53 anos e estava em ótimo estado.— A senhora é uma gata! Nem parece que tem dois filhos marmanjos e um neto.Dona Fátima sorriu com meu comentário e me abraçou.— Isso mesmo! Sua mãe é muito gata e ainda dá um belo caldo. — Nós duas rimos.— Deix
Enzo AlbuquerqueDepois daquela noite com Ana Luiza, decidi que precisava mudar de estratégia. Eu estava sendo impulsivo, direto demais, como se estivesse tentando forçar um sentimento que ainda estava em reconstrução. Não era isso que eu queria. Queria que ela viesse até mim por vontade própria. Queria que sentisse a minha falta, que se perguntasse o porquê de eu estar diferente. Queria que ela viesse porque, no fundo, ainda existe algo entre nós. E eu sei que existe.Por isso, naquela manhã, coloquei minha armadura de CEO e foquei no trabalho. Me escondi por trás de planilhas, reuniões e relatórios. Passei a manhã inteira analisando dados da nova campanha e conversando com Murilo sobre o desempenho do time B. A equipe estava indo bem, e apesar do caos que minha vida pessoal se tornara, eu precisava manter a postura de líder. Era isso ou virar piada dentro da própria empresa.Mas, claro, ela estava lá. Ana Luiza. No mesmo corredor. Na mesma rotina. Com aquele perfume que eu reconhece
Ana Luiza MartinelliA manhã transcorreu de forma estranha. Enzo, que até então fazia questão de me provocar com olhares intensos e comentários ambíguos, passou por mim duas vezes sem sequer me dirigir um olhar. A primeira vez, atribuí ao acaso. Talvez estivesse realmente ocupado. Mas quando aconteceu novamente, uma inquietação se instalou em mim. Algo estava diferente.Decidi que precisava conversar com alguém sobre isso. Peguei o celular e enviei uma mensagem para Murilo:"Murilo, preciso de um cigarro e de uma conversa. Terraço em 5 minutos?"A resposta veio quase instantaneamente:"Claro, já estou a caminho. Levo o isqueiro."Murilo sempre foi meu confidente no trabalho. Além de competente, tinha uma sensibilidade ímpar para perceber nuances que, muitas vezes, me escapavam. Subimos juntos para o terraço, um refúgio que descobrimos ser perfeito para conversas privadas e momentos de descompressão.O vento fresco do final da manhã acariciava nossos rostos enquanto nos encostávamos na
Quando girei a chave na fechadura, um cansaço bom percorreu meu corpo. Aquele tipo de cansaço que a gente sente depois de um dia mentalmente desgastante, mas que também traz uma certa leveza, como se tudo que precisássemos estivesse atrás da porta de casa.Assim que entrei, ouvi o som inconfundível de passos apressados sobre o piso de madeira. Antes mesmo que pudesse largar minha bolsa no aparador da entrada, um torpedo humano se lançou contra mim.— Mamãe!— Nandinho! — Abri os braços para recebê-lo.Ele se jogou no meu colo com aquela empolgação que só uma criança de cinco anos consegue ter. Seu rostinho estava um pouco suado, provavelmente de tanto correr pela casa ou brincar no quintal. Agarrei-o com força, erguendo-o no ar. Mesmo já pesando um pouco mais do que antes, segurei firme, como se fosse a coisa mais natural do mundo.— Nossa, você está cada vez mais pesado, meu amor! — brinquei, beijando sua bochecha. — Daqui a pouco, mamãe não vai mais conseguir te pegar no colo!Ele