21:42 PM

— Mas você mesmo não fez isso? Não deu certo? — O estranho questiona.

Observo William. Olhos fixos em meu objeto de estudo. Não quero

dar tanta importância a um fato revelado por ele, mas confesso que a minha curiosidade é do tamanho do mundo — talvez do Universo inteiro —, e ela tem a mania de ser intensificada e ampliada até chegar a níveis extremos. Juro, eu realmente sou muito curiosa!

Olho para a frente, para a porta, querendo — e desejando —, que eu tivesse super poderes para atravessá-la de uma vez por todas, ir até Thalia e lhe arrancar uma explicação à base de ameaças intensas. Talvez com a ajuda de algum objeto decorativo da sala ou, quem sabe, dos copos plásticos que estão sendo utilizados de forma terrível pelos convidados e que vão acabar contribuindo para mais acúmulo de lixo descartado erradamente em alguma esquina qualquer.

— Sim, eu fiz, mas isso não significa que foi o correto... é... Qual é mesmo o seu nome? — William inquire.

Seu cabelo está todo para trás, e agora seus ombros estão expostos. Quero olhar. Lembro que ali, no ombro, há uma tatuagem. Quero saber o que há nela e se ela é bonita ou não, e se há algum significado ou não. Está escuro, eu sei, mas talvez eu consiga visualizar... Não! Eu não vou olhar.

Continuo de olhos fixos na porta branca e fechada, sentindo-me patética. Sério? Mesmo depois de tantos anos você ainda se sente assim? Eu pergunto para mim mesma em pensamentos, dialogando com as várias versões de mim que tentam contar uma história com o mesmo enredo, mas tendo as suas perspectivas sendo apresentadas de forma diferentes.

A primeira versão, talvez a Angelina adolescente adormecida, que parece ter acabado de acordar, e que ainda vive em mim, tenta competir com outras mais maduras. Uma sequência de Angelinas. Essa, mais nova, parece cutucar o meu coração levando algo quentinho e, ao mesmo tempo, terrivelmente incômodo até o meu peito.

“Olha para ele! Não está lindo?”

Ela diz. Seu sorriso fofo e o cabelo extremamente longo está ali. A sua marca. A garotinha que era ingênua demais com todo mundo.

“Não seria legal cair nesses braços? Você quer tanto saber o que tem desenhado ali. Só uma olhadinha. Não é nada demais.”

Contenho-me. Não acredito que estou tendo esse tipo de pensamento. Balanço a perna freneticamente, o que indica que estou começando a ficar nervosa.

A segunda versão, mais centrada, rebate, sentada ao lado da mais nova a lhe mostrar o que realmente é algo bom a se fazer.

“Esquece isso, garota! Você precisa superar.”

Eu quero acreditar nela, mas a garota com um lacinho fofo no cabelo e sorriso fácil demais continua me tentando. Ela parece tão sincera e verdadeira... mas a outra também parece. Entro em desalinho.

— Meu nome é Hector.

— Tudo bem, Hector — William prossegue. Seu tom é sereno: — Às vezes a gente precisa arriscar, cara. Nosso erro é esperar que as coisas se resolvam da melhor forma possível sozinhas ao invés de resolvermos por conta própria.

— Mas o que eu faço em relação ao medo e ao nervosismo?

Hector está fungando. Eu acho que ele já chorou tanto que se estivéssemos em algum desenho animado ele seria a Alice se martirizando por ter chorado tanto ao ponto de causar uma grande enchente.

— Isso é algo complicado, mas não é totalmente impossível de lidar. — William expressa, pensativo: — No meu caso, quando aconteceu comigo, fiquei muito mal e completamente desorientado. Eu nunca fui assim, nunca! Sempre fui o cara aberto que consegue ser espontâneo com todo mundo, mas com ela era diferente. Havia algo a mais. Um quê de dúvida e incerteza. O que eu quero dizer é que Suzane e você se conhecem bem demais e possuem uma história. O achismo pode acabar com tudo isso. Mas é você quem decide se vai arriscar ou não. E o nervosismo, confia em mim, ele sempre vai existir. Não há uma porção mágica que arranque isso de ti, nem uma fórmula única que te deixe cem por cento preparado para tudo. A vida pode bater ou te abraçar e a gente tá sempre nesse barco esperando que ele não tombe pro lado. É você que escolhe se vai ou não, mas eu te entendo se não for.

Silêncio.

Hector não fala por alguns instantes, e na verdade, nenhum de nós diz qualquer coisa. Eu absorvo as palavras que William proferiu, tentando entender tudo. Quem pode ter sido essa garota? Eu não sei, mas de repente a Angelina mais nova está me olhando tristonha, e ela abraça os ombros como sempre fazia quando não queria chorar ou se sentir completamente sozinha, até mesmo vazia.

Respiro fundo. Ainda estou focada em observar a porta. Por que isso mexe tanto comigo? Minha mente está confusa e o meu coração mais ainda. Não sinta, eu peço. Não fique assim, eu digo.

— Eu quero fazer isso! — Hector afirma. Sua voz é embolada e temerosa: — Então acha que eu devo ir até ela e arriscar?

— Se é isso o que quer, acho sim. — William diz.

— Como eu chego nela? — Hector quase implora. Seu tom é de súplica.

— Volte à festa e peça para conversar com ela. — sugere: — Pergunte o que está acontecendo entre vocês e, principalmente, o que esse cara significa para ela. Depois, quando tiver a resposta, sendo boa ou ruim, vai agradecer aos céus por simplesmente tê-la. Não é fácil. Nunca vai ser. Mas é melhor saber a verdade do que viver numa eterna dúvida.

Hector se silencia mais uma vez. A música do lado de fora está ainda mais alta, e me pergunto como eles conseguiram fazer tal proeza.

Depois de alguns minutos, mais choro. Começo a me perguntar se a realidade de Hector como uma Alice da vida real é mesmo muito utópico. Quem sabe daqui a pouco não haja um mar de lágrimas desse cara? Não sei, todavia, começo a sentir-me sem fôlego. Talvez eu já esteja afogando. Eu não olho para o lado, porque não quero dar de cara com William. De qualquer forma, ele não está olhando para mim e eu agradeço aos céus por isso.

— Você tem razão. —Hector responde. Posso quase ouvir um "até que enfim" sendo entoado por um coro invisível. — Eu preciso saber a verdade. Preciso que saber o que ela pensa. Foda-se, eu vou até ela. Obrigado. Eu posso treinar com vocês como vou falar?

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