— É claro que pode! — William o responde, sendo bastante prestativo e até mesmo interessado em ajudá-lo de verdade.
Eu ainda estou pensativa, me perguntando o que diabos estou sentindo. Talvez tenha sido o vinho. Apesar de uma garrafa não ser o suficiente para me embebedar — não uma compartilhada —, ainda assim, meu corpo parece estar mais elétrico. Então, sentindo os meus pés doerem, eu tiro os sapatos de salto alto. Não sei o motivo exato por ter colocado-os, eu nem mesmo sou adepta ao salto e muito menos sei andar bem com eles. De qualquer forma, me sinto aliviada quando os tiro, colocando-os do meu lado perto da porta. A satisfação é instantânea e vem de repente. Essa merda estava muito apertada!
— Isso é bom! — a voz de Hector está, agora, mais animada e eufórica: — O que tu acha de já chegar dizendo logo tudo? Jogar a verdade em cima dela e vê no que dá?
William pensa por alguns instantes, analisando a proposta feita pelo bêbado. Penso que comigo seria uma boa ideia. Que, se estivesse na pele de Suzane, gostaria de receber toda a verdade de uma vez só. Todavia, ao mesmo tempo, talvez, se eu fosse essa moça, fugiria para bem longe por não saber como lidar.
É difícil tentar simular situações e saber como o outro irá reagir quando não se dá para prever o futuro e nem saber o que alguma pessoa pensa em fazer. Então, de repente, a ideia de Hector, para mim, parece meio falha. É claro que se ele quiser treinar é uma boa ideia. Mas acredito que as coisas — às melhores, pelo menos —, acontecem de repente. Enquanto estamos apenas vivendo.
Lá fora outra música está tocando, e eu me lembro dela. Lembro com perfeição. Por que essa música justo agora? Ela ecoa feito um fantasma entrando pelas frestas desse banheiro, levando até mim a lembrança de um passado não tão distante, mas ao mesmo tempo, não muito recente.
Eu me lembro do dia em que fui com uma de minhas amigas da escola para uma festinha. Vânia estava eufórica por que estava completamente apaixonada por um moço aleatório, a quem eu sequer conhecia bem, mas ele estaria lá. Na verdade, era uma festa na casa dele. Haviam muitas pessoas as quais eu não conhecia, mas eu não estava lá por diversão — embora a música fosse boa e o clima interessante. O tal moço, Simon, tinha convidado-a para ir, e ela, que não desejava ir sozinha, havia quase implorado para que eu fosse.
Vânia estava amalucada, quase tendo um ataque. Sua paixonite era intensa e ela estava quase entrando em colapso quando Simon apareceu. E então ela sumiu no meio da multidão com ele, me deixando sozinha.
Lembro da luz avermelhada. Dos adolescentes — alguns anos mais velhos que eu —, bebendo e matando a vontade que os seus hormônios possuíam. E lembro dele. William. Sentado em uma rodinha com um violão nas mãos tentando cantar através da música super alta com os seus amigos. Lembro do seu olhar. Algo difícil de decifrar. Não tive tempo para pensar em ao menos lhe dar algo além de um sorriso. Uma garota de cabelo castanho aloirado sentou -se ao seu lado, dando-lhe um beijo intenso. Depois do que parecera séculos consegui desviar.
Mas os meus olhos teimosos queriam voltar até lá. Não deixei.
— Mas como tu faria isso? Ensaia aí para eu ter uma ideia. — William pede.
— Você quer que eu finja que estamos em uma peça?
— Mais ou menos isso. — responde ele, deixando que o seu cabelo caía novamente para trás quando se move. Tento bisbilhotar sua tatuagem, mas o ambiente escuro não permite.
“Droga!”
A Angelina adolescente bufa, irritada, enquanto a mais madura, sentada ao lado dela observando tudo com uma expressão mais seria e fechada não esboça nenhuma reação. Ela sabe como se manter calma. Queria ser como ela, mas no momento, estou mais conectada com a garota que cruza os braços e revira os olhos com raiva. Essa sim eu entendo.
Hector sorri. Na verdade, gargalha.
— Isso é tão ridículo e vergonhoso. Me sinto ridículo. — diz ele.
William sorri, mas não é um sorriso debochado e sim de compreensão a sensação que Hector está sentindo.
— Está tudo bem, Hector, você não é ridículo! — garante William: — Vamos, tente. Estamos aqui para ajudá-lo.
Hector murmura um “tudo bem” sorrindo, e parece que o clima fica mais ameno e leve.
— Quero ajudá-los. — digo, porque a situação parece começar a ficar interessante: — Posso fazer o papel da Suzane.
— Você? Mas não foi você quem mandou eu desistir de tudo e quase conseguiu quebrar meu coração mais ainda? — Hector fala em tom de acusação.
Eu reviro os olhos, ato que sempre faço quando algo me irrita, aborrece ou simplesmente me dá nos nervos.
— Sério? Ainda está ressentido? — ranjo os dentes: — Tudo bem então, finja que não me ofereci.
— Espera… — diz ele, pensativo: — Eu aceito a tua ajuda, mas só se não for tão dura e seria.
— Ok. — respondo simplesmente, tentada a em lhe espetar continuando com a frase “Se você quer se iludir eu não posso fazer nada.” Só não o faço, pois quero sair logo daqui.
William me olha sorrindo. Eu não desvio o olhar da porta.
— Tudo bem. — Hector começa, limpando a voz antes de prosseguir: — Suzane, podemos conversar?
Demoro um tempo a entender que ele está falando comigo e, quando me situo, o respondo.
— Podemos. O que tem para me dizer?
Hector demora um pouco, mas depois continua.
— Pode me acompanhar para um lugar mais reservado? Assim a gente conversa melhor.
— Tudo bem. — respondo-o.
— Me diz, o que há aqui? — pergunta.
Começo a notar emoção escorrendo novamente em sua voz. Me situo. O que a tal Suzane diria? Eu não sei. Continuo apenas seguindo o fluxo dos meus pensamentos, embora esteja os policiando bastante.
— O quê quer dizer com isso? — questiono.
Hector se cala. Talvez esteja pensando em como prosseguir.
— Droga, estou nervoso! — sussurra baixinho.
— Tente controlar o nervosismo, Hector. Pensa que você só precisa de alguns segundos de coragem. Não tente pensar muito nas consequências agora. — William o impulsiona.
Hector demora mais um pouco. Mas, enfim, ele prossegue:
— Quero saber por qual motivo está com a merda desse cara, inferno! Sabe que essa situação é ridícula e esse cara é um babaca! — sua fala soa autoritária.
Não gosto disso
— Acha que é assim que vai conseguir algo? Alguma resposta minimamente positiva? — estou chateada. Que droga! O cara sequer teve sensibilidade, muito menos — e pelo menos —, educação.
— Dessa forma não é melhor? Mais direto ao ponto? — questiona.
Há irritação na sua voz, até mesmo incerteza.
— É claro que não. Não se falar com essas palavras. — digo firmemente.
— Então como acha que eu devo falar? — sua voz é pura confusão e nervosismo.
A musica do lado de fora é agitada. William está olhando para mim a espera do meu próximo passo.
— Antes de qualquer coisa, não haja assim. — sugiro, decidida — Da forma com a qual falou foi muito arrogante e pretensiosa. Acha mesmo que ela sequer te ouviria se chegasse falando dessa forma? Se fosse eu, certamente não.— E como eu devo chegar nela? — Hector pergunta, sua voz adquirindo um tom mais intenso de desespero: — Inferno! Estou um caos. Eu não quero parecer um babaca, é só que eu estou muito nervoso e não sei o que fazer.Posso afirmar com todas as letras de que eu não iria querer estar na pele dele. Ter que declarar-se abertamente para alguém é de dar nos nervos, e a mínima possibilidade de que isso aconteça comigo — de que eu tenha que me declarar para algum cara a quem gosto, — me dá enjôo e me deixa tonta.— Primeiramente, se quer jogar a ve
— Eu não faria isso. Não sou tão má quanto pensa! — respondo Hector com o tom de voz mais calmo que consigo, porque, apesar de saber que ele está bêbado, sua postura de bebê chorão está começando a me irritar consideravelmente e sei que não posso falar da forma com a qual quero, afinal, preciso dele para sair daqui.Sei que as horas estão correndo, mas sequer sei que horas são. Não uso relógio e não reparei se há algum no pulso de William. De qualquer forma, sei que já se passou um tempo considerável, e tudo o que quero fazer é sair logo daqui.— E se ela disser não? — Hector pergunta. Sua voz está novamente nublada. Ele ainda está chorando, mas agora o choro é contido.Respiro fundo, buscando as melhores palavra
O tempo está passando, mas sinto que talvez ele tenha parado, com o único intuito de nos manter presosa essa situação. Não sei até que horas essa festa vai, mas posso especular que é provável que vá até de manhã. As festas das amigas de Thalia sempre acabam indo até o amanhecer.Ainda estou sentada no mesmo lugar. Faz algum tempo que Hector saiu, e começo a sentir meu coração acelerando muito rápido e a fadiga me atingindo decorrentes da expectativas de que ele venha logo e nos tire desse banheiro. Já observei meus pés várias vezes e, por estar em alerta o tempo inteiro, por que o tédio já me cerca, acabo percebendo que a guitarra de William está posicionada perto da pia. Ele anda de um lado para o outro várias vezes. Alguma coisa em seu rosto me denota preocupaç
— Isso, aí mesmo. —A garota fala, com a voz manhosa.William e eu estamos nos fitando. Provavelmente ele deve estar pensando o mesmo que eu: que merda é essa?A garota solta um gemido.— Você trouxe? — pergunta ela, com o tom cheio de inquietude.Tudo fica em silêncio, enquanto talvez o cara que está com ela procura alguma coisa. Ouço algo caindo no chão. Parece ser o barulho de chaves. O cara xinga alto.— Droga! — grunhe ele. — Louise, meu amor, a gente namora, não é? Só dessa vez não faz mal! — sua voz tem um tom persuasivo. Além disso, há desespero também.— Não e não, Thiago! Sem a porra da camisinha eu não faço, você sabe disso. — a garota dá a sentença.Ouço quando o suposto Thiago xinga novamente. Desta vez, um pouco mais frustrado que antes.— Por favor, só dessa vez
— Tem alguém aqui? Responda! — A voz de Thiago está cada vez mais autoritária. As batidas na porta se tornam mais urgentes. Ainda estou com os olhos fixos em William, mas agora o meu único pensamento é sobre o que vamos fazer para sair dessa situação. E se nos revelarmos? Será uma boa ideia? Será que eles ajudariam a gente? Ou é melhor não se revelar? — E se eles decidirem ajudar a gente? — aproximo-me para sussurrar ao ouvido de William, sentindo, repentinamente, um calor em meu ventre que se estende para todo o corpo. Tento não ligar para essa sensação. Confesso ser um pouco difícil. — A gente não perderia muito coisa. Aliás, as duas únicas opções que poderiam acontecer é ou eles ajudam a gente ou não. — Acha mesmo que devemos fazer isso? Que é uma boa ideia? Podemos esperar por Hector. Não acha que é melhor? — William questiona. Paro para pensar. Em parte, William tem razão. Esperar Hector é uma
Os olhos de William estão sobre mim. Algo me diz que pedir a ajuda deles não foi uma boa ideia. — Sabe o que eu acho que estão fazendo? Mentindo! — agora é Thiago quem, extremamente exaltado, fala: — Para mim vocês estão aí dentro porque querem foder à vontade. Talvez estavam transando. Acha mesmo que eu vou acreditar que estão presos aí? Talvez tenham ficado presos porque não conseguem sair, mas não que alguém tenha os prendido. — O quê? Claro que não! Por que mentiríamos? — exclamo. Estou começando a ficar impaciente com esse casal, porque a suposição que estão fazendo me deixa com muita raiva. Não tem fundamento nenhum eles sequer cogitarem isso. É um absurdo muito grande! Então, quando a raiva termina de cruzar os meus pensamentos e a razão decide acompanhá-la, retorno a compostura e penso um pouco melhor. Sim, chego a conclusão que eles possuem sim argumentos para ter tal dú
Estou sentada novamente encostada na porta. William, mais uma vez, sentou-se defronte à mim. Quero muito saber que horas são, e se ainda falta muito para amanhecer. A música do lado de fora parece, inexplicavelmente, ainda mais alta.Ninguém mais passou por aqui desde que o casal saiu às pressas, e Hector não voltou ainda, como eu já imaginava. Em meu íntimo, quero saber o que acabou acontecendo entre ele e Suzane. Será que ele se declarou mesmo? Se a resposta for sim, quanta coragem! E em relação aquele casal, o que será que acabou acontecendo quando eles se distanciaram demais e não conseguimos mais ouvi-los? A curiosidade inflama em meu peito.Sinto-me como alguém que está assistindo a um filme em seu ápice total. Estar presa dentro desse banheiro parece-me como viver em uma realidade paralela à que se encontra l&
Depois de o que eu acho que seja alguns segundos de silêncio, decido me pronunciar:— Se não quiser falar, tudo bem. — digo isto apenas para que ele saiba que está tudo bem, embora, com certeza, ele saiba disso. Até por que William não me deve explicação sobre nada. Nem nos conhecemos.Ele está me olhando e, quando digo isso, sorri.— Desculpa, eu estava um pouco longe. — confessa — A gente tem muito problema dentro da banda. Em relação a muita coisa!— É a relação de vocês? — digo, tentando manter o meu tom de voz o mais relaxado possível, embora estar ao seu lado ainda esteja se