Pietro Castellane:Isso com certeza é um problema.Um problema desmaiado na minha cama de hóspedes, respirando de forma tranquila e completamente inconsciente do quanto me tira do eixo.Eu definitivamente não deveria estar aqui.Já se passaram quantos minutos? Dez? Vinte?Cruzo os braços e a observo por mais um momento. A iluminação baixa do quarto suaviza seus traços, o peito sobre e desce devagar, os fios sedosos dourados e ondulados espalhado sobre o travesseiro.Volto a encara o celular na minha mão, a tela iluminada destacando o meu endereço e número ainda estão salvos como emergência. Eu lembro de quando fiz isso, foi no segundo ano dela no ensino médio... - - Flashback on:— Toma — devolvo a ela o telefone. — Quando alguma coisa acontecer com você, poderão entrar em contato diretamente comigo.Fernanda solta um pequeno sorriso para mim, mas seus olhos estão cheios de uma tristeza que não combina com a idade dela. Ela aperta o aparelho entre os dedos pequenos e gordinho
Fernanda Mendonça:Minha cabeça lateja impiedosamente. A dor pulsante atrás dos olhos me faz espremê-los com força antes mesmo de abri-los. Cada pulsação me lembra exatamente do porque eu odeio beber. Meu corpo está pesado, e o simples ato de abrir os olhos parece um esforço sobre-humano.Que inferno!Solto um gemido baixo, esfregando o rosto com a palma da mão. Meu estômago se revira, e o gosto amargo impregnado na boca me faz desejar nunca mais encostar em uma gota de álcool pelo resto da vida.Com um suspiro profundo, finalmente forço meus olhos a se abrirem. A luz suave filtrada pelas cortinas me faz piscar várias vezes, enquanto tento organizar os pensamentos.O problema é que... algo não está certo.A cama é macia, os lençóis são fofos, mas... o cheiro não é nem um pouco familiar.Este não é o meu quarto!Meu coração dispara, e eu me sento num rompante, apenas para me arrepender no mesmo instante. A dor latejante me faz recostar com um gemido, e minha visão se embaralha perigosam
Fernanda Mendonça:Minha vergonha ainda está impregnada em cada célula do meu corpo quando desço as escadas para o andar de baixo.O cheiro de café e torradas invade minhas narinas, despertando meu estômago, que ronca em protesto, evidenciando que não comi nada desde meio dia de ontem, apenas enchi minha cara com bebida cara, me afogando na frustração e solidão.E agora estou aqui.Respiro fundo ao chegar na sala de jantar e paro na porta, hesitante.Pietro está sentado à mesa, segura o celular com uma das mãos enquanto bebe café na xícara, completamente tranquilo, como se eu não tivesse acordado só de lingerie na casa dele.Como se nada fora do comum tivesse acontecido.Aperto os dedos uns contra os outros, entrelaçando as mãos na frente do corpo. Não tenho coragem de me aproximar mais do que isso.Na verdade, o que eu quero mesmo é sumir.Pietro levanta os olhos calmamente, seus olhos perfurando os meus. O olhar dele é relaxado. Totalmente diferente do meu.— Sente-se — sua voz soa
Pietro Castellane:O silêncio dentro do carro é quase palpável. Fernanda está sentada ao meu lado, os dedos entrelaçados apertando-se com tanta força que as pontas dos dedos dela estão brancas. Ela está nervosa, e eu não posso culpá-la. Depois da noite que tivemos — ou melhor, da noite que ela não se lembra — é natural que ela esteja se sentindo desconfortável. E o pior, é que eu acho que ela fica uma gracinha quando está assim. Em uma rápida olhada pelo espelho retrovisor, a vejo mordendo o lábio rosado, sua perna bate levemente. Ansiosa, com certeza ela está doida para que cheguemos logo na faculdade.— Como vai indo a sua faculdade? — Pergunto, quebrando o silêncio. Olho para ela rapidamente pelo canto do olho, observando seu perfil por apenas um segundo, antes de voltar a atenção para a estrada.Ela se sobressalta levemente com a pergunta, como se não esperasse que eu falasse com ela.— Be-bem — ela responde, a voz trêmula. — Vai indo bem— Bom — eu digo, tentando manter o tom n
Fernanda Mendonça:O som do meu nome e as risadas atrás da porta do vestiário feminino do hospital me fazem paralisar com a mão sobre a maçaneta.Por que eu deveria estar surpresa? Quando foi que eu não fui tópico de fofoca aqui dentro e em outros lugares?Mas ainda assim, a cada riso e palavra, machuca.— Ka, foi verdade que a Mendonça quase matou o filho do CEO? — Uma voz questiona entre os riso, a conversa agora se tornando mais séria.Meu estômago se revira e o peito aperta.— Sim — Karina responde. — Mas, ouvi dizer que ela será expulsa.— Ainda bem, não aguentava mais trabalhar com alguém como ela — ecoa outra voz.— Eu ouvi rumores na faculdade que ela não é qualquer uma — fala um terceira voz baixa, quase conspiratória.— E quem ela séria? — Karina questiona.— Filha única de Artur Mendonça.Sinto um frio na espinha.Não, não tragam meu pai para isso.— O estilista mais talentoso da Mendonça Designs? — Outra voz ressoa por trás da porta.— Fundador e CEO da empresa.— Ah, por
Fernanda Mendonça:Concentre-se Fernanda. Você já passou por várias simulações na faculdade, respire fundo e ajude! — Pressão arterial subindo! — A voz da enfermeira corta o ar, carregada de tensão.— Precisamos acelerar — a obstetra declara, sua postura rígida transparecendo a gravidade da situação. Ela se volta para o anestesista. — Ela está estabilizada o suficiente?— Podemos começar — o anestesista responde com um breve aceno, embora o nervosismo esteja evidente em sua voz.Meu coração parece pular do peito quando o bisturi na mão da doutora reluz sob a luz fria da sala. O ambiente ao meu redor parece diminuir, cada som ampliado como se estivesse dentro de uma bolha prestes a estourar.Droga! A simulação nunca é como a vida real.A obstetra começa a incisão, suas mãos rápidas e precisas. O sangue surge na pele pálida da paciente, e o som dos instrumentos sendo passados de mão em mão enche a sala, um ritmo quase hipnótico.— Chegando na cavidade uterina — informa a Dra.Sinto o s
Pietro Castellane:— Sei que o momento é delicado para o senhor — minha secretaria começa. — Mas os novos estagiários chegaram ontem, você ainda não se apresentou a...A frase dela é interrompida pelo som agudo do meu celular vibrando em meu bolso.— Um momento, Emile — tiro o aparelho do bolso e vejo o nome da médica da minha esposa na tela. Meu coração acelera. — O que aconteceu? — Atendo imediatamente, minha voz soando mais firme do que me sinto por dentro.O silêncio do outro lado dura uma fração de segundo, mas é longo o suficiente para que meu estômago se contraia em um nó.— Senhor Castellane, o estado da sua esposa piorou. A pressão dela está perigosamente alta. Precisamos fazer o parto de emergência agora. Não há tempo, ou perderemos os dois.O peso das palavras atravessa o meu peito como um soco. A sala ao meu redor desaparece em um turbilhão de vozes abafadas e formas indistintas, como se o mundo tivesse perdido o foco. A única coisa que ouço, clara como um trovão, é o som
Pietro Castellane:Ela está pálida, o rosto marcado por uma expressão que mistura cansaço, nervosismo e algo mais... culpa? Por um instante, fico paralisado pela surpresa de vê-la ali, mas a preocupação com Marina e o bebê rapidamente me tira do transe.— Minha esposa... — meus olhos caem para suas mãos cheias de sangue.Ela respira fundo, os lábios se comprimindo como se estivesse escolhendo as palavras com cuidado. O silêncio dela é ensurdecedor.— Seu filho... — ela começa, a voz baixa e hesitante. — Ele nasceu. Está na UTI neonatal agora. Mas...Meu mundo gira. A palavra "mas" ecoa na minha mente como uma sentença. Minha garganta aperta, e preciso reunir todas as forças para perguntar:— E Marina? Ela está bem?Fernanda desvia o olhar, os olhos brilhando com lágrimas não derramadas. Meu coração para. Cada músculo do meu corpo fica tenso, esperando pelo golpe.— Eu sinto muito, Pietro. Fizemos tudo o que pudemos... — ela diz, e sua voz falha no final.As palavras me atingem como um