Fernanda Mendonça— Tia! — Uma voz infantil que eu conheço bem grita atrás de mim.Me viro a tempo de ver Luciano correndo em minha direção. Ele vem tão rápido que quase esbarra em um médico que sai de uma sala, mas consegue desviar no último segundo. Ele abre seus pequenos braços e se joga contra minhas pernas com tanta força que quase perco o equilíbrio, mas o agarro antes que ele tropece.— Luciano, devagar! — Laura, minha cunhada, reclama, mas meu pequeno sobrinho ignora completamente e me abraça apertado.— Oi, campeão — sorrio, abaixando para ficar na mesma altura da dele.Antes que eu possa dizer mais alguma coisa, Luciana também vem correndo, silenciosa, mas com um sorriso tão grande que enche o meu coração.— Venha cá, princesa — digo, e abro o outro braço para ela.Ela se aninha contra mim, e eu seguro os dois, apertando-os com carinho. Dou um beijo na bochecha de cada um.— Como vocês estão?— Bem, tia — Luciano responde com um sorriso de tirar o fôlego.Passo a mão pelos c
Fernanda MendonçaLevo o canudo do suco à boca, mas o gosto doce do pêssego não chega aliviar nem um pouco o nó apertado em minha garganta.Meus dedos apertam o copo de suco com força, tendo a todo custo não ficar encarado o casal sentado apenas duas meses de distância da minha. Contudo, sou fraca.Não consigo desviar o olhar.Pietro está ali, mas parece não me notar, ao apenas finge.A mulher com ele eu nunca a vi aqui antes, talvez seja uma das novas. Ela tem um sorriso radiante e sedutor, mostrando todos os seus dentes perfeitos e alinhados. O toque casual da mão dela no braço de Pietro me dá a sensação de um golpe no estômago.Ele não a afasta.Aperto o copo com força sem perceber, e o suco acaba transbordando pelo canudo, molhando a mesa.O som da risada dela me faz sentir uma vontade enorme de revirar os olhos enquanto enxugo a mesa com o guardanapo.Espio eles de novo, ela continua rindo e mexendo no cabelo, mordendo o lábio, tocando o ombro e mão dele.Eu não deveria me import
Pietro Castellane:Ainda de longe vejo a candidata conversar com a minha secretária, sorrindo com um certo brilho no olhar. Observo os cabelos loiros ondulados que caem perfeitamente sobre seus ombros brilham sobre a luz florescente, e os olhos verdes cintilam com um expressão que sugere confiança.Fecho as mãos em punhos.Elas são muitos parecidas.A imagem de outra loira, agora uma mulher adulta, de olhos verdes surge em minha mente, olhos gentis e inocentes que costumavam me olhar com admiração. Lembro-me de como Fernanda sorria quando eu chegava na casa dos pais dela para visita-la, como ela sempre se jogava em meus braços com um abraço apertado.Reprimo o pensamento no mesmo instante, mas a memória já está lá, como uma ferida que nunca cicatriza. Respiro fundo e forço um sorriso educado enquanto me aproximo a passos largos.— Senhoritas — cumprimento.— Bem, este aqui é o Doutor Castellane, Samantha — minha secretaria Emile me apresenta, Samantha estende a mão, seu aperto firme,
Fernanda MendonçaO vento suavemente frio do terraço toca meu rosto, trazendo consigo um cheiro leve de terra úmida vindo das plantas aqui em cima. O hospital abaixo de nós continua sua rotina incansável, mas aqui, no alto, parece que tudo se silencia.Tiago me guia até um dos bancos, e eu nos sentamos, minha pele pegajosa com os requisitos do suco não me incomoda tanto quanto as lágrimas salgadas em meus olhos, com as mãos trêmulas tenta limpar enxuga-las, mas elas insistem em cair.Tiago será as minhas suas mãos.— Chore, Fê — ele diz, sua voz suave, quase um sussurro. — Não prenda.Baixo o olhar para nossos dedos entrelaçados. Seu toque é quente, firme, e algo dentro de mim parece se desfazer. Ele não solta minha mão, não se afasta, apenas me encara como se estivesse me dando permissão para desmoronar. Ele me puxa para um abraço, e eu tento resistir.— Ti... você vai se sujar — eu murmuro, minha voz embargada.Ele dá um meio sorriso e me puxa para mais perto, envolvendo-me em um ab
Fernanda Mendonça:O copo de vidro gelado desliza entre meus dedos enquanto giro a bebida âmbar em círculos lentamente antes de levá-lo à boca. O álcool desce queimando, mas não o suficiente para aquecer o vazio que sinto no peito.O bar está cheio, a música ao fundo vibra no meu peito, e a conversa dos outros clientes cria um zumbido constante ao meu redor.Olho para a entrada, esperando pelas meninas, mas a cada novo rosto que entra, nenhum é o delas. Elas sempre demoram, mas hoje parece que o tempo está passando mais devagar, e pela primeira vez, estou agoniada por estar sozinha.Balanço o pé impacientemente sob a mesa, olhando para a tela do celular. Nenhuma mensagem justificando o atraso.Suspiro. Eu queria me aconselhar com elas, queria pedir ajuda pela primeira vez ao invés de resolver tudo sozinha.Aperto os olhos, tentando afastar o peso do que passei hoje, do que sinto em segredo.O celular vira sobre a mesa, o grupo em que estou com as meninas.Cunhada: “Não vou conseguir i
Pietro Castellane:Isso com certeza é um problema.Um problema desmaiado na minha cama de hóspedes, respirando de forma tranquila e completamente inconsciente do quanto me tira do eixo.Eu definitivamente não deveria estar aqui.Já se passaram quantos minutos? Dez? Vinte?Cruzo os braços e a observo por mais um momento. A iluminação baixa do quarto suaviza seus traços, o peito sobre e desce devagar, os fios sedosos dourados e ondulados espalhado sobre o travesseiro.Volto a encara o celular na minha mão, a tela iluminada destacando o meu endereço e número ainda estão salvos como emergência. Eu lembro de quando fiz isso, foi no segundo ano dela no ensino médio... - - Flashback on:— Toma — devolvo a ela o telefone. — Quando alguma coisa acontecer com você, poderão entrar em contato diretamente comigo.Fernanda solta um pequeno sorriso para mim, mas seus olhos estão cheios de uma tristeza que não combina com a idade dela. Ela aperta o aparelho entre os dedos pequenos e gordinho
Fernanda Mendonça:Minha cabeça lateja impiedosamente. A dor pulsante atrás dos olhos me faz espremê-los com força antes mesmo de abri-los. Cada pulsação me lembra exatamente do porque eu odeio beber. Meu corpo está pesado, e o simples ato de abrir os olhos parece um esforço sobre-humano.Que inferno!Solto um gemido baixo, esfregando o rosto com a palma da mão. Meu estômago se revira, e o gosto amargo impregnado na boca me faz desejar nunca mais encostar em uma gota de álcool pelo resto da vida.Com um suspiro profundo, finalmente forço meus olhos a se abrirem. A luz suave filtrada pelas cortinas me faz piscar várias vezes, enquanto tento organizar os pensamentos.O problema é que... algo não está certo.A cama é macia, os lençóis são fofos, mas... o cheiro não é nem um pouco familiar.Este não é o meu quarto!Meu coração dispara, e eu me sento num rompante, apenas para me arrepender no mesmo instante. A dor latejante me faz recostar com um gemido, e minha visão se embaralha perigosam
Fernanda Mendonça:Minha vergonha ainda está impregnada em cada célula do meu corpo quando desço as escadas para o andar de baixo.O cheiro de café e torradas invade minhas narinas, despertando meu estômago, que ronca em protesto, evidenciando que não comi nada desde meio dia de ontem, apenas enchi minha cara com bebida cara, me afogando na frustração e solidão.E agora estou aqui.Respiro fundo ao chegar na sala de jantar e paro na porta, hesitante.Pietro está sentado à mesa, segura o celular com uma das mãos enquanto bebe café na xícara, completamente tranquilo, como se eu não tivesse acordado só de lingerie na casa dele.Como se nada fora do comum tivesse acontecido.Aperto os dedos uns contra os outros, entrelaçando as mãos na frente do corpo. Não tenho coragem de me aproximar mais do que isso.Na verdade, o que eu quero mesmo é sumir.Pietro levanta os olhos calmamente, seus olhos perfurando os meus. O olhar dele é relaxado. Totalmente diferente do meu.— Sente-se — sua voz soa