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Capítulo 7 - Certeza

Dormi muito bem durante a noite, acordei animada e ansiosa tanto para ver a Sarah quando para meu primeiro dia de aula. Saltei da cama antes do celular despertar, vesti a roupa que eu mais gosto, passei perfume, enfiei a carteira e o notebook na mochila e desci as escadas pulando os degraus. Atravessei a porta e me surpreendi, a rua estava lotada de estudante caminhando em direção ao prédio da universidade, desci a rua até o banco de pedra próximo a escada da praça e aguardei. Sarah surgiu entre a multidão, saltei do banco e me aproximei com um sorriso apaixonado. 

-Oi. 

-Oi - Sarah Sussurrou. 

Ela apertou os lábios e me lançou uma expressão fria, separei os braços e apertei a sobrancelha confusa. Ela passou por mim se encolhendo dentro do casaco, eu corri e saltei diante dela. 

-O que aconteceu? - perguntei. 

-Voltamos para a realidade. 

-Do que você está falando? - perguntei. 

Sarah arrastou os olhos para um grupo de garotas atrás de mim, virei o rosto e Camila, Alice e Cassie conversavam e riam de forma exagerada. 

-Sua vida é perfeita Mack, não vou estragar. 

Sarah me lançou um sorriso forçado e desceu a rua apertando o notebook contra o corpo. Apertei os punhos furiosa, não conseguia acreditar que passamos um dia tão maravilhoso ontem e hoje ela voltou a agir como antes. Desci a rua atrás dela, próximo o bastante para não perdê-la de vista e longe o bastante para não incomodá-la. De repente ouvi um comentário abafado. 

-É aquela menina do vídeo - disse uma voz feminina - nem parece uma p**a.

Virei o rosto e lancei um olhar furioso para uma garota de baixa estatura com o uniforme de líder de torcida. Voltei o rosto em direção a Sarah que se encolhia a cada passo, as pessoas lançavam olhares de julgamento e sarcásticos, sussurravam, riam e até apontavam pra ela. Alguns garotos se aproximavam e faziam sinais sexuais e cuspiam comentários de baixo calão extremamente explícitos. Eu me enfureci profundamente, desejei uma arma de fogo, por outro lado, uma bala seria rápido de mais, eles merecem sofrer. As líderes de torcida encurralaram a Sarah. 

-Olha quem deu as caras - disse uma garota alta, loira e com lábios grossos - vai dar para o time de basquete agora? 

Sarah não respondeu, apenas progetou seu corpo para frente empurrando as garotas com os ombros, de repente um garoto de casaco do time de futebol surgiu diante dela e lançou um pacote de Camisinha em seu rosto, ele gargalhou e cuspiu nela. Eu saltei sobre ele e o empurrei contra a parede. 

-Você é louco? - perguntei. 

-O que você tem com isso? 

-Oi Mack - disse Zuri. 

O garoto virou o rosto e lançou uma feição de medo para Zuri. Soltei o garoto e corri até o prédio da universidade, atravessei a porta e avistei Sarah empurrar a porta da escada de emergência e desaparecer. Corri até a porta e a empurrei, entrei em um corredor, subi as escadas até o terceiro andar onde Sarah está sentada no canto da parede, com os joelhos dobrados em prantos. Senti meu coração apertar, finalmente compreendi o motivo da Sarah tentar me afastar. Sentei no chão ao seu lado, apoiei as costas na parede, passei o braço por sua nuca e apertei seus ombros a abraçando. Ela deixou seu corpo encostar no meu, apoiou seu rosto em meu peito e chorou como uma criança, soluçando e respirando com dificuldade. Apertei seu corpo com força, fechei os olhos e desejei ter a habilidade de desmanchar a dor de seu coração. O fone caiu do seu ouvi direito e estava tocando a música "Depressão - Sadstation, VMZ". Ela desceu seu corpo deitando em meu colo em posição fetal, agarrou minha mão direita apertando contra seu coração e eu deslizei a ponta dos dedos da mão esquerda em seu couro cabeludo por entre os fios ruivos. A música mudou e começou a tocar "Nossa Conversa - Kell Smith", apoiei a cabeça na parede, meus pensamentos se entrelaçaram entre fugir com ela e ficar para sempre sentada na escada de emergência. Ela empurrou o corpo para cima se sentando ao meu lado, manteve o rosto voltado para o chão. 

-Está tudo bem? - perguntei. 

Sarah balançou o rosto de forma positiva, ficou sobre os pés, me lançou um sorriso tímido e desceu as escadas. Desci atrás dela. 

-Espera - chamei. 

-Melhor você ir para sua sala. 

-Você quer ir para algum lugar? - perguntei - bem longe daqui? 

-Vai para a sala Mack. 

-Não - respondi - Não vou te deixar sozinha. 

-Você não tem que fazer nada por mim. 

-Mas eu quero - comentei. 

-Eu não sou uma garota indefesa em apuros. 

-Eu não penso isso de você - comentei. 

-Você só está fazendo isso porque gosta de mim. 

Apertei a sobrancelha com uma feição confusa. 

-Você acha que estou tentando me aproximar com segundas intenções? - perguntei. 

-Todos tem segundas intenções Mack. 

-Eu não estou me aproximando para transar com você - comentei furiosa - nos tínhamos uma história, um passado. Você disse que nossa amizade é como a medusa, nunca morre. 

-Eu era uma criança inocente. E o que aconteceu ontem foi um erro. 

-Por quê? - perguntei. 

-Porque somos mulheres, não podemos nos relacionar. 

Sarah sempre foi a mais inteligente do nosso grupo de amizade e agora cuspia essa linha de pensamento retrógrada. 

-Você é mais inteligente que isso - Sussurrei.

Sarah jogou os olhos para o chão e deu um passo para trás. Empurrei a porta e sai enfurecida, tanto por Sarah me acusar de tentar usá-la quanto por suas palavras preconceituosas. Enfiei os fones no ouvido e começou a tocar a música "A noite - Tiê". Entrei no elevador de frente para o espelho, meu reflexo me encarava de volta friamente, apertei os olhos tentando organizar meus pensamentos. A porta se abriu no sexto andar, atravessei o corredor e entrei em um auditório grande, me sentei em uma cadeira perto da parede do lado esquerdo da mesa do professor. Virei o rosto e uma garota me lançou um sorriso gentil, pele branca, cabelos pretos, jaqueta jeans. Empurrei o canto dos lábios com um meio sorriso que se desmanchou com a melodia da música, apoiei o notebook na mesa e arrastei meus olhos pelo wallpaper da medusa, uma deusa da Mitologia grega, com serpentes no lugar dos cabelos, presas de bronze e asas de ouro. De repente o professor entrou na sala, pediu silêncio e apresentou sua matéria animado, mas confesso que minha mente vagou por entre os corredores da universidade procurando por Sarah. No final da aula eu apenas fui para o dormitório, empurrei a porta e Camila me lançou um olhar assustado. Me aproximei e notei um corte em seu lábio inferior. 

-Se troca, vamos para delegacia - comentei. 

-Não Mack. 

-Eu não vou permitir que aquele inútil bata em você de novo - gritei. 

-Não. 

-Ou você vai comigo para a delegacia ou eu ligo para a polícia - fiz uma pausa - De qualquer forma você vai denunciá-lo. 

-Eu vou denunciar, mas não agora. 

-Por quê? - perguntei. 

-Porque eu preciso que a Zuri fique do meu lado. 

-O que a Zuri tem a ver com isso? - perguntei. 

-Se ela estiver do meu lado, o Daniel não vai fazer nada contra mim. 

-Para de inventar empecilhos - gritei - aquele animal bateu em você de novo, ele não vai parar a menos que você se defenda. 

-Eu vou na delegacia amanhã com a Zuri. 

-Você não vai - Sussurrei - eu sei que não vai. 

-Eu vou Mack, confia em mim. 

Camila saltou da cama e jogou a mochila nas costas. 

-Vou passar alguns dias no dormitório da Zuri - ela fez uma pausa - vai ficar bem sozinha? 

-Sim. 

Camila saiu e bateu a porta, deixei meu corpo cair na cama, esfregue as mãos no rosto, senti que ela não teria coragem de denunciar ou que talvez Zuri a convença esquecer a agressão. Apanhei o notebook, apoiei nos joelhos e assisti uma vídeo aula de reforço para as aulas normais e em algum momento acabei dormindo. De repente senti um impacto no rosto, como se algo muito forte me atingisse, meu rosto virou para a esquerda com força. Abri os olhos e estava tudo escuro, levantei as mãos sobre o rosto e senti o impacto novamente, meu rosto virou em direção a parede. Senti o impacto pela terceira vez e meu maxilar estalou, senti um peso na barriga como se alguém se ajoelhasse sobre mim e comecei a sufocar. Levei minhas mãos ao pescoço e senti duas mãos apertando com força, apalpei o braço até o rosto, era um homem. Lancei minha mão para a mesa do lado direito da cama, bati os dedos na mesa em todas as direções até alcançar um copo de vidro da Camila. Lancei o copo contra a cabeça do agressor, o copo despedaçou e fez o cara gemer de dor e cair para a esquerda tirando o joelho de mim. Saltei para a cama da Camila, bati a mão no interruptor e a luz se acendeu. 

-Chance - Sussurrei. 

Ele virou o rosto para mim, me jogou um olhar furioso, o sangue escorria no pescoço, ele cuspiu no chão e saltou sobre mim. Joguei meu corpo em direção a porta, Chance agarrou minha perna e me puxou para trás, bati o rosto no chão e senti uma pontada nas costas do lado esquerdo. Dei um grito e agarrei os pés da cama, ele virou meu corpo para cima e lançou uma faca contra meu rosto, levantei a mão na frente do rosto e senti a faca atravessar minha mão. Arregalei os olhos, ele puxou a faca e o sangue espirrou em seu rosto. Ele lançou a faca novamente contra meu rosto, levantei a mão outra vez e a faca desceu da palma da minha mão, passou pelo pulso e saiu no antebraço. Ele agarrou a gola da minha blusa, puxou meu tronco para cima e jogou meu copo no chão, bati a nuca e senti gosto de sangue no fundo da garganta. Ele se inclinou sobre mim, seus olhos arregalados pareciam vazios, seus dentes cerrados cuspia saliva sobre meu rosto. 

-Você é a vadia que falou para a Camila me denunciar - disse ele furioso - Agora vai morrer. 

Lancei minha mão direita contra seu rosto, apertei o dedo polegar em seu olho, ele lançou seu corpo para trás, joguei meu pé em sua virilha o fazendo gritar. Virei o corpo e saltei sobre a porta, agarrei a maçaneta e a puxei. A porta se abriu, ele agarrou meus pés e me puxou para trás, agarrei o armário e puxei a última gaveta que caiu sobre mim. Chance apertou meu pescoço com força, seus olhos furiosos desejavam minha morte, ele queria ver a vida deixar meu corpo. Bati a mão no chão e apanhei um desodorante aerossol que caiu da gaveta e apertei diante de seus olhos, ele levou as mãos no rosto enquanto o pó arranhava suas córneas. Empurrei o corpo dele para trás e chutei sua virilha com força, ele gritou e se inclinou para frente. Finalmente consegui sair do quarto, desci as escadas e atravessei a porta, não tinha ninguém na rua. Desci a rua correndo, atravessei na faixa de pedestres e saltei sobre um arbusto de espinhos, senti minha carne rasgar, mas ele certamente não vai me procurar aqui. Me encolhi, levei as mãos no rosto tampando minha boca, pois minha respiração estava pesada. Por entre os galhos avistei Chance surgir na escuridão e descer a rua correndo, mas logo ele voltaria pois a rua é sem saída. Saltei do arbusto e subi a rua o mais rápido que pude, mas meu corpo estava pesado e dolorido, passei pelo meu prédio pensando que ele vai voltar pro meu quarto. Continuei subindo a rua até um prédio com a porta da frente aberta, subi as escadas me arrastando até o terceiro andar, atravessei o corredor e lancei meu corpo contra uma porta qualquer. Bati na porta desesperada. 

-Abre - tentei gritar mas a voz quase não saia - me ajuda. 

A porta se abriu e eu caí sobre os joelhos, senti alguém agarrar minha camiseta e me puxar para cima com força, tive certeza de que Chance me encontrou. Joguei minhas mãos contra ele, meu corpo caiu no chão, dobrei os joelhos, me encolhi apoiando a testa nas pernas, levei minhas mãos acima da cabeça e me preparei para o impacto. A luz se acendeu e eu mantive os olhos fechados. 

-Mack? 

Ouvi a voz suave e preocupada de Sarah, abri os olhos e virei o rosto. 

-Aí meu Deus, o que aconteceu? - Sarah perguntou. 

Joguei meu corpo para frente, empurrei a porta a fechando. 

-Tranca a porta - Sussurrei - tranca. 

Sarah enfiou a chave no trinco e se afastou com os olhos arregalados. Joguei os olhos para a cama do lado esquerdo do quarto e a garota que sorriu para mim na sala de aula estava de joelhos com as mãos no interruptor. 

-Mack, o que aconteceu? - Sarah perguntou. 

-Chance - Sussurrei. 

A garota saltou da cama e se ajoelhou diante de mim. 

-Oi, meu nome é Taylor - ela fez uma pausa - você está sangrando muito tem que ir para o hospital. 

-Preciso do telefone - Sussurrei. 

Eu precisava saber se a Camila estava bem, Sarah apanhou um celular que estava em baixo do travesseiro e me entregou. Meus olhos não se focavam na tela e então me dei conta de que não sabia o número da Camila de cor. 

-Vou ligar para ambulância - disse Taylor. 

-Não, vai demorar de mais - disse Sarah me puxando para cima. 

-Camila - Sussurrei. 

-Eu vou ver se a Camila está bem - disse Taylor pausadamente - e você vai para o hospital com a Sarah. 

-Eu não posso sair, ele vai me matar - Sussurrei. 

-Ele não vai te reconhecer - disse Taylor se afastando. 

Taylor jogou uma blusa e uma calça de moletom sobre a cama, Sarah se ajoelhou e me ajudou a vestir a calça e Taylor me ajudou a vestir a blusa e fechou o zíper. Calcei um chinelo preto e Sarah puxou a touca da blusa para cobrir minha cabeça. Taylor puxou a porta e nos descemos as escadas, Sarah agarrou minha mão e me puxou para o estacionamento. Abriu a porta do carro e me ajudou a entrar, bateu a porta, deu a volta no carro e saltou para o banco do motorista. Ela deu partida no carro, virou o volante com a mão esquerda enquanto o carro se afastava do prédio. No som tocava a música "Certeza - Mariana Nolasco". Desci o rosto e vi o sangue escorrer por minhas mãos, senti meu corpo esfriar e tremer. Sarah percebeu que eu estava entrando em desespero e agarrou minha perna, apoiei a nuca no encosto e respirei fundo. A partir daí as coisas ficaram confusas, vi a fachada do hospital, pessoas correndo, de repente eu estava na maca vendo as luzes do teto passarem por meus olhos e a música ao fundo me envolveu e levou minha mente para os olhos da Sarah, seu sorriso lindo, suas sardas, sua voz doce e tudo escureceu. 


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