Lucas

LUCAS

Eu sei que ela está chateada.

E, para ser sincero, eu também estou. Não só com ela, mas comigo mesmo.

Entro no quarto principal e me jogo na cama, lutando contra o peso do cansaço e do álcool. Meu corpo está exausto, minha mente um turbilhão. Tento me manter acordado, esperando que Giovanna entre a qualquer momento.

Mas meu estômago revira.

Droga.

Corro para o banheiro e me inclino sobre a privada. Mais vômito. Meu corpo parece querer expulsar cada gota de álcool que ingeri. Seguro-me na pia por um instante, sentindo as mãos trêmulas.

Será que ainda existe alguma merda para sair?

Fecho os olhos com força. A ânsia finalmente cede. Dou descarga e lavo o rosto, passando um pouco de água na nuca, tentando me sentir mais humano.

Mas o enjoo não é só físico.

É uma ressaca moral.

Dio Santo... Eu nunca aprendo.

Respiro fundo e olho meu reflexo no espelho.

Os olhos inchados, a expressão abatida. Meu corpo carrega o peso do cansaço, não apenas pela bebida, mas pelos últimos dias que me sugaram completamente. A falta de sono, a ansiedade crescente antes do casamento, as palavras ácidas de Raquel ecoando na minha cabeça, dizendo que eu estava cometendo o maior erro da minha vida ao me casar com Giovanna para agradar minha família.

Talvez ela estivesse certa.

Jogo a toalha de lado e volto para a cama, caindo pesadamente sobre o colchão. Meus músculos relaxam, minha mente oscila entre consciência e sono.

Bocejo uma última vez antes de apagar completamente.


Acordo com o quarto mergulhado na escuridão.

A luz fraca do luar atravessa a fresta da cortina, projetando sombras suaves no teto. O ambiente está abafado, carregado com o cheiro de quarto fechado e álcool velho.

Meu corpo inteiro reclama. Minha cabeça lateja em uma batida surda, e minha boca está seca como o inferno.

Mas não é apenas o desconforto físico que me atormenta.

A lembrança da noite volta com força.

O nojo nos olhos de Giovanna.

Seu tom de voz firme e magoado.

Meu corpo esquenta com um nervoso que sobe pelo peito. Eu odeio essa sensação.

Vergonha.

Eu não queria que ela guardasse essa imagem de mim.

Eu não queria ser apenas o marido bêbado que não soube se controlar na primeira noite do casamento.

Preciso consertar isso.

Levanto-me de supetão, forçando meus músculos a se moverem. Vou até o banheiro e tomo um banho gelado, deixando a água levar o torpor da ressaca. Esfrego a pele, como se pudesse me livrar do que aconteceu.

Visto um jeans escuro, uma camisa branca de malha e tênis. Nada demais. Só preciso parecer... normal.

Diante da porta do quarto de hóspedes, hesito.

São dez minutos de indecisão.

Minha mão paira sobre a madeira, sem coragem de bater.

Ela ainda deve estar chateada. E, para ser sincero, não sei como encarar isso.

Mas eu preciso.

Não pretendo seduzi-la, não estou aqui para fingir que tudo está bem. Só preciso falar com ela.

Bato.

Silêncio.

Sei que ela está ali. Consigo ver a luz acesa por baixo da porta.

Bato de novo. Mais uma vez. E uma quarta.

Ouço passos.

A maçaneta gira e, então, a porta se abre.

Giovanna está ali, parada diante de mim, vestindo um robe branco. Seus cabelos longos estão levemente bagunçados, soltos ao redor dos ombros. Mas o que me atinge de verdade são seus olhos.

Vermelhos.

E seu nariz também.

Ela estava chorando?

Isso me faz sentir ainda pior.

Ficamos em silêncio por alguns segundos, apenas nos encarando. O perfume dela chega até mim – uma mistura de rosas e jasmim. Um cheiro suave, mas envolvente.

Engulo em seco.

— Posso entrar?

Ela não se move. Não recua. Seus olhos encontram os meus com firmeza.

— O que você quer?

Sua voz é fria.

Ela bloqueia a entrada com o próprio corpo.

Não esperava isso dela.

Meu orgulho se acende no mesmo instante. Transformo meu nervosismo em ironia e forço um sorriso, como se estivesse me divertindo com o mau humor dela.

— Como assim, o que eu quero? Somos casados. Precisamos conversar.

Meu tom é neutro, mas estou me segurando para não perder a paciência.

— Não quero conversar com você.

Dá para sentir a raiva vibrando nela, pulsando em cada palavra.

Respiro fundo, tentando conter minha própria irritação.

— Olha, eu já pedi desculpas. Eu bebi demais. Mas, e daí?

Seus olhos faiscam.

E daí? — Ela ergue a voz. — E daí que hoje era um dia especial e você poderia ter ficado sóbrio!

Seus lábios tremem um pouco, como se estivesse segurando a emoção.

— Sabe a impressão que eu tenho de tudo isso, Lucas? Que você se casou comigo por obrigação. Como se estivesse cumprindo uma missão. Um dever, não um desejo.

Suas palavras acertam o alvo.

Porque, no fundo, são verdade.

Hoje não foi o dia mais feliz da minha vida.

Tive minha solteirice sacrificada pelo bem da família.

Giovanna tenta fechar a porta, mas eu a bloqueio com o pé e forço a entrada.

Ela recua, os olhos arregalados.

Meu cérebro trabalha rápido, tentando encontrar as palavras certas.

— Giovanna, realmente fiz isso por um pedido do meu pai.

Ela ri sem humor, cruzando os braços.

Claro.

Engulo em seco.

— Mas você tem que entender! Sempre te olhei com respeito, sempre te vi como...

A esposa do seu irmão?

Meu silêncio responde por mim.

Ela desvia o olhar. Seu peito sobe e desce lentamente, e eu posso ouvir sua respiração pesada.

Espero que ela me olhe de volta com um pouco de compreensão.

Mas quando levanta o rosto, vejo tristeza nos olhos dela.

Isso mexe comigo de um jeito que eu não gosto.

— Se era assim que pensava, por que não negou o pedido do seu pai? Você teve seis meses para pensar, Lucas. Se era tão difícil para você, por que aceitou?

A resposta está na ponta da minha língua.

Por causa das crianças.

Porque eles precisavam de uma presença masculina.

Mas eu não digo.

Porque conheço as mulheres. Elas sempre tentam ver romantismo onde não há.

Então, minto.

— Porque acredito que podemos ser felizes juntos.

Ela pisca, surpresa.

Dou um passo à frente.

—Por que acredito que podemos ser felizes juntos. E se eu pensar bem, você é a mulher que mais me ouviu nesses últimos meses.  

 A única com quem perdi tempo ouvindo.

Quase rio do meu próprio pensamento.

Os olhos dela suavizam.

Sei que venci essa rodada.

— Tudo bem, Lucas. Eu entendo. Mas hoje, quero dormir sozinha.

O gosto amargo da rejeição me atinge.

Um nó de contrariedade se forma no meu estômago.

As mulheres não costumam me rejeitar.

Forço um sorriso digno de comercial de pasta de dentes.

— Está certo. Mas amanhã, passaremos o dia juntos.

Ela não responde.

Dou meia-volta e saio do quarto.

A sensação de que perdi alguma coisa fica grudada em mim.

E eu não gosto nem um pouco disso.

Continue lendo no Buenovela
Digitalize o código para baixar o App

Capítulos relacionados

Último capítulo

Digitalize o código para ler no App