Eu sei que ela está chateada.
E, para ser sincero, eu também estou. Não só com ela, mas comigo mesmo.
Entro no quarto principal e me jogo na cama, lutando contra o peso do cansaço e do álcool. Meu corpo está exausto, minha mente um turbilhão. Tento me manter acordado, esperando que Giovanna entre a qualquer momento.
Mas meu estômago revira.
Droga.
Corro para o banheiro e me inclino sobre a privada. Mais vômito. Meu corpo parece querer expulsar cada gota de álcool que ingeri. Seguro-me na pia por um instante, sentindo as mãos trêmulas.
Será que ainda existe alguma merda para sair?
Fecho os olhos com força. A ânsia finalmente cede. Dou descarga e lavo o rosto, passando um pouco de água na nuca, tentando me sentir mais humano.
Mas o enjoo não é só físico.
É uma ressaca moral.
Dio Santo... Eu nunca aprendo.
Respiro fundo e olho meu reflexo no espelho.
Os olhos inchados, a expressão abatida. Meu corpo carrega o peso do cansaço, não apenas pela bebida, mas pelos últimos dias que me sugaram completamente. A falta de sono, a ansiedade crescente antes do casamento, as palavras ácidas de Raquel ecoando na minha cabeça, dizendo que eu estava cometendo o maior erro da minha vida ao me casar com Giovanna para agradar minha família.
Talvez ela estivesse certa.
Jogo a toalha de lado e volto para a cama, caindo pesadamente sobre o colchão. Meus músculos relaxam, minha mente oscila entre consciência e sono.
Bocejo uma última vez antes de apagar completamente.
Acordo com o quarto mergulhado na escuridão.
A luz fraca do luar atravessa a fresta da cortina, projetando sombras suaves no teto. O ambiente está abafado, carregado com o cheiro de quarto fechado e álcool velho.
Meu corpo inteiro reclama. Minha cabeça lateja em uma batida surda, e minha boca está seca como o inferno.
Mas não é apenas o desconforto físico que me atormenta.
A lembrança da noite volta com força.
O nojo nos olhos de Giovanna.
Seu tom de voz firme e magoado.
Meu corpo esquenta com um nervoso que sobe pelo peito. Eu odeio essa sensação.
Vergonha.
Eu não queria que ela guardasse essa imagem de mim.
Eu não queria ser apenas o marido bêbado que não soube se controlar na primeira noite do casamento.
Preciso consertar isso.
Levanto-me de supetão, forçando meus músculos a se moverem. Vou até o banheiro e tomo um banho gelado, deixando a água levar o torpor da ressaca. Esfrego a pele, como se pudesse me livrar do que aconteceu.
Visto um jeans escuro, uma camisa branca de malha e tênis. Nada demais. Só preciso parecer... normal.
Diante da porta do quarto de hóspedes, hesito.
São dez minutos de indecisão.
Minha mão paira sobre a madeira, sem coragem de bater.
Ela ainda deve estar chateada. E, para ser sincero, não sei como encarar isso.
Mas eu preciso.
Não pretendo seduzi-la, não estou aqui para fingir que tudo está bem. Só preciso falar com ela.
Bato.
Silêncio.
Sei que ela está ali. Consigo ver a luz acesa por baixo da porta.
Bato de novo. Mais uma vez. E uma quarta.
Ouço passos.
A maçaneta gira e, então, a porta se abre.
Giovanna está ali, parada diante de mim, vestindo um robe branco. Seus cabelos longos estão levemente bagunçados, soltos ao redor dos ombros. Mas o que me atinge de verdade são seus olhos.
Vermelhos.
E seu nariz também.
Ela estava chorando?
Isso me faz sentir ainda pior.
Ficamos em silêncio por alguns segundos, apenas nos encarando. O perfume dela chega até mim – uma mistura de rosas e jasmim. Um cheiro suave, mas envolvente.
Engulo em seco.
— Posso entrar?
Ela não se move. Não recua. Seus olhos encontram os meus com firmeza.
— O que você quer?
Sua voz é fria.
Ela bloqueia a entrada com o próprio corpo.
Não esperava isso dela.
Meu orgulho se acende no mesmo instante. Transformo meu nervosismo em ironia e forço um sorriso, como se estivesse me divertindo com o mau humor dela.
— Como assim, o que eu quero? Somos casados. Precisamos conversar.
Meu tom é neutro, mas estou me segurando para não perder a paciência.
— Não quero conversar com você.
Dá para sentir a raiva vibrando nela, pulsando em cada palavra.
Respiro fundo, tentando conter minha própria irritação.
— Olha, eu já pedi desculpas. Eu bebi demais. Mas, e daí?
Seus olhos faiscam.
— E daí? — Ela ergue a voz. — E daí que hoje era um dia especial e você poderia ter ficado sóbrio!
Seus lábios tremem um pouco, como se estivesse segurando a emoção.
— Sabe a impressão que eu tenho de tudo isso, Lucas? Que você se casou comigo por obrigação. Como se estivesse cumprindo uma missão. Um dever, não um desejo.
Suas palavras acertam o alvo.
Porque, no fundo, são verdade.
Hoje não foi o dia mais feliz da minha vida.
Tive minha solteirice sacrificada pelo bem da família.
Giovanna tenta fechar a porta, mas eu a bloqueio com o pé e forço a entrada.
Ela recua, os olhos arregalados.
Meu cérebro trabalha rápido, tentando encontrar as palavras certas.
— Giovanna, realmente fiz isso por um pedido do meu pai.
Ela ri sem humor, cruzando os braços.
— Claro.
Engulo em seco.
— Mas você tem que entender! Sempre te olhei com respeito, sempre te vi como...
— A esposa do seu irmão?
Meu silêncio responde por mim.
Ela desvia o olhar. Seu peito sobe e desce lentamente, e eu posso ouvir sua respiração pesada.
Espero que ela me olhe de volta com um pouco de compreensão.
Mas quando levanta o rosto, vejo tristeza nos olhos dela.
Isso mexe comigo de um jeito que eu não gosto.
— Se era assim que pensava, por que não negou o pedido do seu pai? Você teve seis meses para pensar, Lucas. Se era tão difícil para você, por que aceitou?
A resposta está na ponta da minha língua.
Por causa das crianças.
Porque eles precisavam de uma presença masculina.
Mas eu não digo.
Porque conheço as mulheres. Elas sempre tentam ver romantismo onde não há.
Então, minto.
— Porque acredito que podemos ser felizes juntos.
Ela pisca, surpresa.
Dou um passo à frente.
—Por que acredito que podemos ser felizes juntos. E se eu pensar bem, você é a mulher que mais me ouviu nesses últimos meses.
A única com quem perdi tempo ouvindo.Quase rio do meu próprio pensamento.
Os olhos dela suavizam.
Sei que venci essa rodada.
— Tudo bem, Lucas. Eu entendo. Mas hoje, quero dormir sozinha.
O gosto amargo da rejeição me atinge.
Um nó de contrariedade se forma no meu estômago.
As mulheres não costumam me rejeitar.
Forço um sorriso digno de comercial de pasta de dentes.
— Está certo. Mas amanhã, passaremos o dia juntos.
Ela não responde.
Dou meia-volta e saio do quarto.
A sensação de que perdi alguma coisa fica grudada em mim.
E eu não gosto nem um pouco disso.
GIOVANNAAssim que Lucas sai, tranco a porta atrás dele.O som do trinco ecoa pelo quarto silencioso, e um suspiro pesado escapa dos meus lábios.Não quero pensar nele. Não agora.Vou até a cômoda e pego meu caderno. Não gosto de chamá-lo de diário, porque não escrevo todos os dias nem relato meu cotidiano. Ele é mais que isso. Ele é meu refúgio, minha terapia silenciosa.Abro na página em branco e deixo minha caneta deslizar pelo papel, escrevendo tudo o que pesa em meu peito.Dia do meu casamento...Um dia que poderia ter sido perfeito, como um céu sem nuvens. Um dia que eu quis acreditar que seria feliz, que teria um significado real.Mas a sensação de felicidade passou rápido, como uma tempestade inesperada que destrói tudo em seu caminho.A realidade veio como um golpe cruel.Sonhei demais.Fui uma garota boba e ingênua, idealizando um momento que nunca existiu para ele.A verdade que me atinge agora é amarga: estou muito mais envolvida do que ele.Por seis meses, convivi com um
LUCASAcordo com uma sensação estranha.O quarto ao meu redor é um lugar desconhecido, e por um instante me sinto deslocado. Mas, aos poucos, as lembranças voltam e me situo dentro dessa história que agora é minha vida.Uma opressão incômoda pesa sobre meu peito, como se algo estivesse fora do lugar.Como se tudo estivesse errado.Levanto-me lentamente, massageando as têmporas. Minha cabeça ainda lateja levemente, um eco desagradável da ressaca. Vou até o banheiro e deixo a água correr antes de entrar no chuveiro.Primeiro, a água está morna. Depois, vou reduzindo a temperatura aos poucos, até que o frio intenso percorre minha pele como um choque elétrico.Talvez eu mereça esse castigo.Talvez precise acordar para a realidade de uma vez.Depois de sair do banho, visto uma bermuda escura e uma camisa leve. Vou procurar minha adorável esposa.O quarto de hóspedes está vazio.Na sala, encontro Helena, que me informa que Giovanna foi dar uma volta na praia.Droga.A angústia me atinge ant
LUCASO sol das dez horas reflete sobre o mar, criando uma paisagem de tirar o fôlego. O brilho dourado dos raios solares se mistura ao azul profundo do céu, sem nenhuma nuvem para ofuscá-lo. O branco das ondas se dissolve no verde-turquesa do oceano, formando uma paleta vibrante e ardente, como se a própria natureza celebrasse a grandiosidade do verão.Respiro fundo, absorvendo o ar fresco e salgado, sentindo o calor acolhedor do sol contra minha pele.Estou do lado de fora da propriedade, esperando Giovanna.Uso um calção de banho azul-céu, estou sem camisa, descalço, e pela primeira vez em muito tempo, me sinto tranquilo. A conversa de mais cedo com ela dissipou parte da tensão, e agora posso apenas aproveitar o momento.Que bom que ela abriu os olhos.Ela percebeu que precisa de mim.Que ninguém poderia assumir o lugar que ocupo ao seu lado. Nenhum substituto.Sou eu quem deve estar aqui. Sou eu quem foi designado para esse papel.Sinto um misto de pena e dever.Nos últimos seis m
LUCASEla saiu.E eu me senti impotente.O gosto amargo da rejeição grudou na minha garganta, se espalhando pelo meu corpo como veneno.Maldição.Agora que finalmente a via com outros olhos, agora que queria levá-la para a cama, agora que aquela barreira da estranheza havia se dissolvido... ela me negava.O mundo era injusto.Hoje eu entendo.Nosso arranjo, por mais conturbado que tenha sido no início, será bom para nós.Será prazeroso para mim.Giovanna é linda.E o mais irônico de tudo isso?Só agora, agora que ela é minha, que eu realmente percebo o quanto.Minha?Não.Quase minha.O pensamento me enche de raiva.Sigo até a sala, pego a garrafa de Jack Daniel’s e sirvo um copo. Bebo de uma só vez, o líquido queimando minha garganta.Sirvo outro. Bebo novamente.Espero alguns segundos. Depois, mais uma dose.Mas nada disso dissolve a inquietação dentro de mim.O desejo.A frustração.Então, num impulso, vou até o quarto de Giovanna.Abro a porta sem bater.E sou recebido pela visão
GIOVANNALas Vegas Lucas e eu continuamos na mesma. Já faz um mês que estamos "juntos", mas não estamos. Ele tem viajado muito, e eu me sinto cada vez mais sozinha dentro desse casamento.Na última conversa que tivemos, Lucas me disse que essa era sua última viagem e que, depois, colocaríamos nossas vidas nos eixos. A ideia de tê-lo de volta, retomando de onde paramos, e eu tendo que controlar minhas reações à mera presença dele, me deixa inquieta. Meu corpo ainda reage a ele de formas que me irritam. Minha mente se divide entre o desejo e o medo. Tanto que, quando Antony me ligou, acabei cedendo ao convite para esse encontro.A primeira vez que ele me ligou perguntando como eu estava foi uma semana depois da minha estranha lua de mel. Omiti detalhes e disse que estava tudo bem. Mas ontem, quando ele me ligou novamente, eu já havia bebido um pouco. Passava das oito da noite, as crianças dormiam, e a solidão pesava mais do que eu conseguia suportar. Acabei desabafando ao telefone e cho
Será que teríamos mais mortes na família? Sim, pois a vontade que eu tinha era de matar esse desgraçado que saía com minha mulher enquanto eu me matava de trabalhar! Fecho a torneira do chuveiro e me enrolo numa toalha, enxugando-me automaticamente. Visto uma calça preta e uma camiseta branca. Vou até o quarto de Giovanna e acendo as luzes. O cheiro do seu perfume domina o ambiente. Passo os olhos por tudo, reparando no seu bom gosto. No chão um tapete branco fofo e macio, a colcha e cortinas eram delicadas e tinham nuances de rosa. Seu quarto é tão feminino que chega a ser uma agressão. Como se ela não tivesse intenção nenhuma de se mudar desse quarto para que finalmente dividíssemos a cama. Reparei num robe branco jogado numa poltrona perto da janela.Aperto os lábios com raiva e fecho imediatamente a porta.Desci a escada com a cabeça quente. A ira novamente me domina.Giovanna está passando dos limites!Com quem ela pensa que está lidando?Dio Santo!Entro na sala de jantar. A
—Não preciso de sua caridade Lucas. —Olhei tudo ao redor. —Tenho tudo que preciso e estou bem assim. Não é porque não transamos que irei procurar outro homem.—Nunca imaginei que fosse assim, quando me casei com você, Giovanna.—Então, estamos empatados. Eu também me decepcionei com você.—Mas que diabo está querendo dizer?Eu meneio a cabeça e dou um sorriso sem humor.—Eu preciso ainda explicar?—Por favor, eu quero ouvir. Dizem que os casamentos não dão certo por falta de diálogo.Eu respiro fundo. Eu não quero falar sobre isso. Tocar nesse assunto é como se me despojasse de minha armadura.—Você se enxerga como meu salvador e me vê como uma coitadinha. E eu não quero suas migalhas Lucas. Lembre-se que disso eu entendo. Vitor era exatamente como você. Se achava o máximo. Me dava migalhas e achava que me dava muito.Lucas continua me olhando como se tivesse perdido em um dilema pessoal. Meus olhos se enchem de lágrimas.Droga!Eu me odeio por chorar na frente dele. Não entendo porqu
Dio! Esse é meu último pensamento antes de ser puxada e seus lábios tomarem os meus. Eu nunca tinha sido beijada assim antes. Sinto-me devorada. Acabo me desequilibrando e caio sobre ele.Se eu estivesse iludida, ele seria irresistível. Mas não estou... mesmo sentindo seu cheiro absurdamente bom, mesmo louca para me render diante da maravilhosa sensação de seus lábios úmidos sobre os meus. Macios, maravilhosos; do seu corpo quente, me esforço para afastá-lo. E não digo força motora pois ele não me segura forte, não força a situação, ele simplesmente me beija. Digo força interior pois meu corpo traidor o quer e muito. Eu me levanto. Umedeço os lábios. O bad boy sexy me olha resignado, então o olhar dele desce para a minha boca, seus olhos escuros observando-me enquanto eu mordo o lábio inferior.Preciso ser forte!—Não quero que isso se repita. Não, sem a minha aceitação. —Eu digo com a voz incrivelmente forte. —Você realmente não sabe com quem está mexendo. Eu não sou como essas gar