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Capítulo 3: Espelho da lua

— Ainda discutindo, Lykir? — Disse Kael, acomodando todo aquele volume viril na calça que acabara de vestir, com um sorriso malicioso para Althéa e, em seguida, um olhar de desdém para Eryon.

O líder dos Varkos tinha uma figura imponente, o corpo esculpido por músculos e decorado com tatuagens vermelhas, como seus olhos. Seus cabelos longos eram de um tom bordô, assim como sua barba cheia e curta, que emoldurava suas feições angulares. Era extremamente atraente e muito consciente do efeito que sua aparência causava. 

— Não temos tempo para seus dramas pessoais. O eclipse está chegando, e a profecia está se desenrolando mais rápido do que pensávamos. — Kael alfinetou.

Althea respirou fundo, colocando de lado suas emoções.

— O que descobriu?

O Varkos afastou qualquer tom jocoso de sua voz, antes de se pronunciar.

— Eirlys não pode estar agindo sozinha. Há algo... ou alguém... que a controla. Precisamos descobrir quem ou o quê.

Lobos de outros clãs se juntaram a eles e enquanto discutiam os próximos passos, Althea sentiu algo pulsar em seu medalhão. Um calor súbito subiu por sua pele, se concentrando em sua têmpora direita, e uma visão inundou sua mente: um altar antigo, em ruínas, cercado por chamas negras. Era um local que ela reconhecia, o Templo de Veyara, onde dizem que a Lua dos Antigos nasceu pela primeira vez.

— Precisamos ir para Veyara — disse ela, sua voz decidida. — É onde dizem que tudo começou. E, provavelmente, onde tudo terminará, daqui a quatro semanas.

Eryon e Kael olharam em volta, todos encaravam Althea, hipnotizados pela áurea prateada que ela emanava. Apesar de suas diferenças, ambos sentiam que Althea tinha razão. Mas a jornada até o templo seria perigosa, já que as coisas pareciam estar um tanto fora de seus cursos naturais, em todos os territórios.

O continente de Lykaria é uma terra vasta e diversificada, marcada por sua beleza selvagem, tradições antigas e territórios dominados por diferentes clãs, cada um com suas particularidades culturais. Governado pela influência da Lua dos Antigos, Lykaria é um lugar no qual a magia permeia o cotidiano, e os elementos naturais são tanto aliados quanto inimigos. 

Enfim, um grupo de sete lykor se preparou para seguir em direção a Veyara: Althea, acompanhada de dois dos melhores guerreiros Lykir, a loba Eyle e o lobo Sakyr; Kael, Kamar e Lukon, do clã Varkos e Eryon, o exilado. Todos sabiam que as alianças que formassem agora seriam cruciais para enfrentar o que estava por vir.

***

As noites no vale são iluminadas por vaga-lumes mágicos, que dançam em sincronia com a brisa. De acordo com as lendas, o vale foi o primeiro local criado pelos deuses, um símbolo de harmonia entre luz e escuridão, um ponto de equilíbrio entre as forças naturais do continente.

Após percorrem quilômetros em suas formas de lobo, exceto Eryon, que os acompanhou a cavalo, chegaram ao lago prateado que fica no meio do Vale da Harmonia, conhecido como Espelho da Lua, local definido para a primeira parada daquela incursão.

Eryon desceu do cavalo e após desamarrar suas provisões sentiu-se atraído pela magia do lago, colocou seus pertences no chão e seguiu a passos largos, atendendo aquele irresistível chamado.

— Cuidado, exilado. Se pisar aí, pode acabar mais perdido que um lobo em mar aberto.

Eryon sequer respondeu a Kael e quando tocou as águas prateadas seus olhos assumiram um aspecto antinatural. Seu corpo se enrijeceu por alguns instantes e em seguida, ele caiu no Espelho da Lua. Althea assistia a cena enquanto se vestia e se apressou em ajudá-lo.

— Althea! Não toque nisso! — Gritou Kael. — Já viu o que acontece quando se mete a pata em coisa que não deve?

Ela continuou avançando, com determinação. E quando estava prestes a tocar a água, lembrou que aquela era uma experiência muito individual: alguém que necessite muito de uma resposta e que não pretenda usa-la para praticar o mal, a encontrará quando tocar a magia contida nas águas do Espelho da Lua. Mesmo sem saber exatamente o que de fato aconteceria ao se juntar a Eryon, mergulhou sua mão no lago.

Eryon foi transportado para um templo com grandes claraboias que preenchiam o espaço com a luz natural da Lua dos Antigos. Ele sabia que estava em Veyara. Uma das sacerdotisas tinha um intenso brilho contornando-a e ele sentiu a necessidade de fixar seu olhar nela. A mulher prepara o que parece ser um ritual, adicionando alguns lírios de sangue ao líquido prateado contido numa tigela feita de pedra lunar. Por fim, secretamente tira do colo uma pedra negra, encostando-a na água, que se agita levemente enquanto ela recita sua prece:

"Oh, Lua dos Antigos, guardiã do equilíbrio entre luz e trevas, escute meu clamor. Proteja meu filho, fruto de duas forças opostas, mas unidas pelo amor. Que ele caminhe entre mundos com sabedoria, e que sua marca brilhe como um farol de esperança e harmonia."

Eryon sentiu uma onda de energia em suas costas e percebeu a presença de Althea.  Ela veio ao seu encontro, com uma expressão de vergonha e culpa:

- Eu agi por impulso, não deveria estar aqui e entendo o quanto isso é inconveniente.

- Não é, Althea. De verdade, estou muito feliz por você estar aqui comigo. – Ele diz, entrelaçando seus dedos em sua mão, o encaixe continuava perfeito e o calor era irresistível. – Não quero mais segredos.

Althea sentiu seu coração disparar não apenas pelo toque, mas com a sinceridade que ela percebeu vindo dele, com o compromisso que ele realmente pareceu assumir em eliminar os segredos entre eles.

No instante seguinte, todo o templo escureceu. Era o eclipse. A sacerdotisa, que continuava repetindo aquelas palavras, finalizou a sentença e começou a andar, apressadamente.

Eryon puxou Althea e ambos seguiram a sacerdotisa até um modesto quarto, onde perceberam a presença de um bebê. O pequeno dormia profundamente em um cesto, sob a cama estreita. A sacerdotisa pegou a criança no colo e com a voz carregada de amor, lhe disse:

- Que a luz guie suas escolhas. – Depositando um suave beijo em seu peito. - Que as sombras te respeitem e nunca te consumam. – Beijando delicadamente o topo da sua cabeça.

O ambiente foi envolto numa aura de amor e proteção, e tanto Eryon quanto Althea, experimentam uma sensação de paz e pertencimento em seus corações.

Momentos depois, a mulher saiu apressada, abraçada ao recém-nascido, carregando um pacote que parecia conter provisões. Eryon e Althea, que os acompanhavam de perto, sentiram a empolgação da sacerdotisa ao andar pelos corredores ainda escuros do templo, até chegar a uma porta e topar com um homem alto, esguio, com barba cheia e pele oliva.

O olhar âmbar daquele homem se iluminou ao vislumbrar a sacerdotisa e eles se cumprimentaram com um beijo afoito, repleto de afeto e cumplicidade. A mulher o entregou a pedra negra que usara no ritual – que ele rapidamente guardou na pequena bolsa presa ao seu cinto.

Em seguida, o homem inclinou a cabeça até o bebê, encostando em sua pequena testa enquanto sussurrava palavras inaudíveis que, instantaneamente, produziram um formigamento nas costas de Eryon. No mesmo instante, uma luz transpassou as vestes simples do pequeno no colo da sacerdotisa, que o virou para que o homem expusesse a pele entre as escápulas do bebê, tocando a fonte do intenso brilho.

Ele fez movimentos circulares, revelando grifos antigos que se estenderam como uma tatuagem dourada e o formigamento nas costas de Eryon aumentou, desviando sua atenção. Althea percebeu e apertou sua mão, o exilado pareceu estar em algum tipo de transe e tudo aconteceu muito rápido: a lua cheia voltou a iluminar o céu, Eryon começou a tremer como se não controlasse seus movimentos, a Lykir gritou seu nome e instantaneamente sentiu como se tivessem ganhado a atenção do homem misterioso, pois ele lançou um olhar terno exatamente na direção em que ela e Eryon estavam. Em seguida, ele voltou-se para o bebê e disse, com determinação e doçura:

- Eryon, fruto do nosso amor, que seu nome ecoe como o equilíbrio que nosso mundo tanto precisa. Seja forte, meu pequeno, e um dia você encontrará seu propósito.

Eryon e Althea são puxados por uma incrível força.

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