02

Lorenzo Santini,

Cinco anos depois….

Cinco anos haviam se passado desde o dia que mudou minha vida para sempre.

Eu nunca acreditei em coincidências. Na verdade, sempre desprezei a ideia de que a vida se desenrolava por mero acaso, como se não houvesse propósito ou controle sobre os acontecimentos que nos cercam. Mas, naquele dia, algo inesperado aconteceu, algo que me fez questionar minha própria convicção.

Era uma tarde de primavera, o tipo de dia que normalmente passaria despercebido em meio ao caos da minha vida. O ar estava fresco, com uma leve brisa que trazia o cheiro das flores recém-abertas do parque ao redor do lago. Aquele café à beira d’água era meu refúgio, um lugar onde eu costumava ir para tentar encontrar algum resquício de paz, ainda que fosse apenas por algumas horas.

Eu me sentava sempre na mesma mesa, no canto, com uma vista perfeita para o lago calmo. O som da água, com o murmúrio das conversas ao redor, costumava me ajudar a organizar os pensamentos, a planejar os próximos passos da minha vida. Mas naquele dia, a tranquilidade que tanto buscava foi quebrada.

Sentei-me com meu café habitual, sem pressa, tentando afastar o cansaço que parecia ter se tornado um companheiro constante. Olhei em volta, e então meus olhos caíram sobre uma figura que eu nunca havia visto antes, sentada a apenas duas mesas de distância da minha.

Ela estava lendo um livro, mas o que me chamou atenção não foi a capa do livro ou o fato de estar imersa na leitura. Era algo na maneira como ela estava ali, quase como se o resto do mundo não existisse para ela. Seus longos cabelos caíam suavemente sobre os ombros, balançando levemente com a brisa. Havia algo em sua postura tranquila, na forma como ela erguia o olhar ocasionalmente para o lago, que me prendeu.

Eu tentei afastar o olhar, me concentrar no café, nas mensagens que chegavam no celular, mas meus olhos sempre voltavam para ela. Havia algo que me atraía, algo que eu não conseguia explicar. E isso era perigoso.

Não era como se eu estivesse procurando por alguém. Desde Isabella, desde a perda… Eu não conseguia me permitir pensar em outra pessoa, em outro relacionamento. Meu mundo era o trabalho, a vingança e o luto. Era nisso que minha vida se resumia. Mas aquela mulher, sentada ali, alheia aparentemente a qualquer dor ou escuridão, me trouxe um lampejo de algo que eu não sentia há anos.

Curiosidade.

O tempo parecia passar devagar enquanto eu a observava discretamente. Ela fechou o livro por um momento e olhou para a paisagem ao redor, absorvendo o ambiente. Seu olhar encontrou o meu por um breve segundo, e em vez de desviar como eu esperava, ela manteve o contato. Eu me preparei para uma reação qualquer – talvez desconforto, surpresa, quem sabe até irritação. Mas, ao invés disso, ela sorriu. Um sorriso suave, tímido, mas presente. E aquilo foi o suficiente para me desarmar.

Eu, que sempre fui mestre em controlar minhas emoções, senti meu coração acelerar. Algo dentro de mim me empurrou a levantar, a me aproximar. Eu sabia que era uma péssima ideia. Afinal, minha vida não tinha espaço para distrações, muito menos para sentimentos. Mas, naquele momento, tudo isso parecia irrelevante.

Levantei-me, sentindo o peso de cada passo enquanto caminhava em direção à mesa dela. Quando me aproximei, ela olhou para mim com uma leve curiosidade, mas sem hesitação. Era como se ela soubesse que eu viria. E talvez soubesse.

— Com licença — comecei, tentando manter a voz casual, o que era uma tarefa difícil considerando o turbilhão interno que eu estava enfrentando. — Espero não estar interrompendo. Só… queria dizer que este é um ótimo lugar para relaxar, não é?

Ela ergueu as sobrancelhas, parecendo ligeiramente surpresa pela abordagem, mas então sorriu novamente. Havia uma naturalidade em seu sorriso que me fez relaxar instantaneamente.

— Sim, é — respondeu ela, ajeitando o livro com cuidado sobre a mesa. — Venho aqui sempre que posso. Gosto da paz que encontro nesse lugar.

Paz

Aquela palavra me atingiu de uma forma estranha. Paz era algo que eu não sabia mais como definir. Minha vida era tudo menos pacífica.

— Também é um dos meus lugares favoritos — comentei, tentando disfarçar o quanto aquela conversa parecia surreal para mim. Eu não fazia isso. Eu não me aproximava de estranhos. Mas, com ela, parecia… fácil.

— Você costuma vir muito aqui? — perguntou ela, agora me observando com um interesse genuíno.

— Sempre que posso — respondi, puxando uma cadeira para me sentar. Ela não pareceu se incomodar com a minha presença. — É um bom lugar para esquecer dos problemas, nem que seja por um momento.

Ela assentiu, e por alguns segundos, ficamos em silêncio, ambos observando o lago. O clima era calmo, a brisa suave. Aquele momento parecia ter sido tirado de uma realidade diferente da minha, onde não havia dor ou vingança, apenas duas pessoas desconhecidas se conectando de forma inexplicável.

— A propósito, meu nome é Camille — disse ela, estendendo a mão. Seu toque era quente, e eu quase recuei ao sentir o choque dessa conexão. Mas sorri, algo raro, e apertei sua mão.

Lorenzo — respondi, quase automaticamente.

Eu nunca falei meu nome com tanta facilidade para um estranho. Mas, naquele momento, isso parecia certo. Camille. A mulher que, em questão de minutos, me fez esquecer tudo o que havia me destruído nos últimos anos. Eu não sabia o que viria depois, não sabia se aquele encontro significava algo, mas pela primeira vez em muito tempo, senti que algo havia mudado dentro de mim.

Conversamos mais um pouco sobre trivialidades. Nada profundo, nada que revelasse muito sobre quem éramos de verdade. Mas o suficiente para que eu soubesse que queria vê-la de novo. E pelo jeito que ela olhou para mim, ela também queria o mesmo.

Eu sabia que estava entrando em um território perigoso, algo que meu instinto me dizia para evitar. Mas, por algum motivo, eu não consegui resistir. Camille já havia se tornado uma parte de mim, sem que eu percebesse.

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