Helena respirou fundo antes de entrar na sala de aula. O corredor estava silencioso, exceto pelo eco de seus próprios passos no piso de mármore polido. Ela sentia uma mistura de ansiedade e excitação, como sempre acontecia antes das aulas do professor Miguel Schutz. Era um nome que já circulava pelos corredores da universidade com um misto de respeito e admiração. Além de brilhante, sua presença magnética tornava impossível ignorá-lo.
Ao cruzar a porta, Helena procurou um lugar entre as fileiras de cadeiras já quase preenchidas. Não queria sentar-se nem muito na frente, onde poderia ser encarada diretamente por Miguel, nem tão atrás, onde não teria uma visão privilegiada dele. Escolheu uma posição estratégica no meio da sala. Ajustou os óculos e abriu seu caderno, como se estivesse preparada para anotar cada palavra dita, mas, na verdade, era a figura à frente que monopolizava sua atenção.
Miguel Schutz já estava lá, encostado na mesa de madeira, os braços cruzados sobre o peito e a expressão atenta. Ele usava um blazer escuro sobre uma camisa branca, o cabelo levemente bagunçado e a barba bem aparada, o que apenas acentuava seu ar de intelectual despretensioso. E então ele falou.
- A psicologia nos ensina que nem sempre controlamos nossas emoções. Muitas vezes, lutamos contra elas, tentando suprimir aquilo que não deveríamos sentir. Mas o que acontece quando o desejo ultrapassa os limites da razão?
Os olhos de Helena se prenderam aos dele no instante em que ele ergueu o olhar. Seu tom de voz era grave, envolvente, como se cada palavra carregasse um peso próprio. Ela engoliu em seco. O calor subiu por seu corpo como um alerta: ela sabia exatamente o que era lutar contra um desejo proibido.
A aula seguiu com discussões instigantes sobre ética e moralidade na psicologia, mas Helena já não conseguia prestar atenção como deveria. O que a prendia ali não eram apenas os conceitos acadêmicos, mas sim a maneira como Miguel movia as mãos enquanto explicava, como seus olhos faiscavam quando desafiado por um aluno, e a sensação incômoda de que, a cada vez que ela o olhava, ele já estava olhando para ela.
Quando a aula terminou, a maioria dos alunos se dispersou rapidamente. Helena demorou-se um pouco mais, fingindo revisar suas anotações enquanto esperava que a sala esvaziasse. Seu coração acelerou ao perceber que Miguel ainda estava ali, recolhendo alguns papéis sobre a mesa.
- Helena, certo? - a voz dele interrompeu seus pensamentos.
Ela ergueu os olhos, surpresa por ele saber seu nome. Um sorriso tímido se formou em seus lábios.
- Sim.
Ele assentiu, apoiando-se na mesa e cruzando os braços outra vez, analisando-a por um instante.
- Você tem um olhar curioso. É uma qualidade essencial para quem quer estudar a mente humana.
Ela abriu a boca para responder, mas as palavras pareceram travar em sua garganta. Ele a estava avaliando? Era apenas um comentário professoral ou algo mais? O calor se espalhou por seu rosto.
- Obrigada, professor - disse, tentando manter a compostura.
Ele sorriu de leve e desviou o olhar, recolhendo os últimos papéis antes de pegar sua pasta.
- Até a próxima aula, Helena.
Ela permaneceu ali, observando-o sair da sala, sentindo um formigamento percorrer sua pele. Sabia que estava pisando em um território perigoso. Mas, no fundo, uma parte dela queria cruzar todos os limites.
Naquela noite, ao chegar em casa, Helena não conseguia pensar em mais nada além dele. Sentou-se na cama, deixando os livros de lado, e fechou os olhos. A voz dele ainda ressoava em sua mente, o olhar intenso que parecia atravessá-la. Ela sabia que era errado, mas não conseguia evitar. Imaginou como seria se ele quebrasse as barreiras que os separavam, se cedesse à mesma tensão que a consumia.
Suas mãos deslizaram pelos lençóis enquanto sua mente criava cenários impossíveis: Miguel aproximando-se dela, seus dedos roçando sua pele, sua boca murmurando seu nome de forma proibida. A fantasia tomou conta de seus sentidos, e, por alguns minutos, ela se permitiu esquecer o que era certo ou errado. Apenas sentia. Quando abriu os olhos, o peito subia e descia em um ritmo acelerado. A realidade voltou como um choque, e ela balançou a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos. Mas sabia que, no fundo, não conseguiria resistir por muito tempo. O desejo já tinha sido despertado, e não havia volta.Então, o peso da culpa começou a se instalar. Miguel era casado. Ela havia ouvido os comentários de colegas, já tinha visto a aliança brilhando em seu dedo durante as aulas. Como ela podia desejar alguém que pertencia a outra pessoa? O pensamento a fez estremecer. Ela não era esse tipo de mulher, não queria ser.
E, no entanto, cada vez que pensava em resistir, lembrava-se do modo como ele a olhava, como sua voz a envolvia como um abraço invisível. E se ele sentia o mesmo? E se ele também estivesse lutando contra aquilo? Pensar nisso apenas aumentava seu conflito. Helena se deitou, encarando o teto escuro de seu quarto. Queria afastar o desejo, sufocar aquela paixão incômoda. Mas sabia que, por mais que tentasse, Miguel Schutz continuaria a habitar seus pensamentos. E a culpa, ao invés de afastá-la, apenas tornava tudo ainda mais intenso.Ela se perguntava se a esposa dele sabia o efeito que Miguel tinha sobre outras mulheres, se ela sentia medo de perdê-lo para uma aluna encantada pelo seu magnetismo. Sentia-se cruel por desejar, mesmo que em segredo, algo que poderia ferir outra pessoa. Mas ao mesmo tempo, a ideia de que Miguel pudesse estar tão atormentado quanto ela, dividido entre a moral e o desejo, só aumentava a atração.
Talvez ele fosse um homem fiel, alguém que jamais cederia à tentação. Mas e se não fosse? E se, a cada vez que ele a olhava, estivesse travando a mesma batalha interna que ela? O pensamento era tão intoxicante quanto angustiante. O desejo misturado à culpa criava um turbilhão dentro dela, deixando-a sem paz.Então, Helena apertou os olhos, tentando afastar a confusão de sentimentos, mas não adiantava. Miguel já estava dentro dela, ocupando cada espaço de sua mente, e ela temia que nunca mais conseguisse tirá-lo de lá.
Então ela se lembrou do primeiro dia de aula seus motivos para estar ali. Era uma segunda feira em início de semestre letivo, Helena estava muito animada por ter entrado para a universidade e estudar curso que sempre sonhou. Sempre quis ser psicóloga, ajudar aqueles em sofrimento, entender a mente humana e seus desejos mais ocultos. Algo que sempre a facinara é o fato de não compreender completamente as motivações das pessoas para serem como são e agirem como agem. Mas ela queria, ela queria saber porque o ser humano é como é, o profundo, a pele e o desejo mais oculto a aguçava sua curiosidade.
No fundo, Helena não se conhecia o suficiente, ela não sabia que poderia ser tão "impura" quanto aqueles que ela gostaria de entender. Quem em sã consciência iria querer alguém comprometido e 25 anos mais velho? "Ele tem idade para ser seu pai" diz sua melhor amiga Clara em tom de julgamento. E além, o que se esconde por trás deste desejo incontrolável por um homem tão mais velho? O que falta nela para que o proibido a preencha?Era o primeiro dia do semestre letivo. O professor Miguel acordara bem cedo a fim de organizar seus materiais para recepcionar os alunos no primeiro dia de aula.— Pasta? Ok. Livros? Ok. Computador? Ok. É, acho que não falta nada para hoje...— Espera!— Amor, onde estão minhas canetas pretas? — disse Miguel à sua esposa.— Estão na primeira gaveta da cômoda, Miguel!— Você não encontra nada! Me pergunta tudo! — disse Sarah rispidamente.Miguel tentou ignorar a grosseria da esposa, mas lembrou que isso já havia se tornado rotina. Há seis meses, eles não se deitavam como um casal, brigavam todos os dias e não entravam em acordo sobre nada.A verdade é que o peso de vinte anos de casamento começava a se instaurar na relação dos dois. Sem filhos e bem-sucedidos, as pessoas de fora os consideravam um casal perfeito e sem problemas — algo totalmente fora da realidade deles.Vinte anos se passaram, mas eles continuavam os mesmos.Miguel tinha um espírito aventureiro que, quando mais jovem,
Naquela semana, Helena tentou se concentrar em seus estudos, mas Miguel continuava a povoar seus pensamentos. Cada aula era uma nova batalha entre razão e desejo. Ela queria ignorar os olhares, queria evitar o magnetismo dele, mas algo dentro dela ansiava por mais. Sabia que era perigoso, sabia que não deveria nutrir sentimentos por ele, mas era inevitável.Na quinta-feira, ao chegar à universidade, sentiu o coração disparar ao ver Miguel encostado na porta da sala, conversando com um colega. Ele usava uma camisa azul clara dobrada até os cotovelos e segurava um livro na mão. Parecia distraído, mas assim que seus olhos cruzaram com os dela, houve um instante de hesitação.Ela desviou o olhar rapidamente, mas sabia que ele a observara. Fingindo naturalidade, caminhou até seu lugar habitual e se sentou. O barulho ao redor da sala era uma mistura de vozes animadas e papéis sendo folheados. Mas tudo se silenciou quando Miguel se aproximou, colocando o livro sobre a mesa.Hoje vamos falar
Miguel não conseguia tirar Helena da cabeça. A inteligência afiada daquela aluna, sua audácia e maneira destemida de encará-lo o deixavam intrigado. Ele já havia encontrado alunos brilhantes ao longo dos anos, mas Helena era diferente. Havia nela algo que desafiava seu autocontrole, que o fazia se perguntar até onde aquilo poderia levá-lo.Naquela noite, ao chegar em casa, Miguel encontrou Sarah de pé na cozinha, os braços cruzados e o olhar carregado de impaciência. Ele percebeu de imediato que uma discussão se aproximava. Nos últimos meses, os dois não conseguiam trocar mais do que algumas palavras sem que algo se tornasse motivo para brigas.- Você chegou tarde de novo — disse Sarah, sem rodeios.- Tive muito trabalho na universidade — respondeu ele, cansado. Ele não queria brigar, mas sabia que, como sempre, Sarah insistiria.-Sempre tem muito trabalho na universidade, Miguel! Mas nunca parece cansado demais para se perder nos seus pensamentos. O que é? Alguma nova distração?Ele
Naquela noite, Miguel foi para a biblioteca do escritório, um refúgio que antes o acalmava, mas que agora parecia sufocá-lo. Pegou um livro qualquer da estante, tentando forçar sua mente a se concentrar em algo que não fosse Helena ou a briga com Sarah. Mas era inútil.Lembrou-se do olhar penetrante de Helena durante a aula. A maneira como ela desafiava suas ideias sem medo, como absorvia cada conceito com uma curiosidade quase voraz. Não era apenas sua beleza que o atraía—era sua mente afiada, sua ousadia. Ela era diferente de todas as alunas que já tivera.Um som suave ecoou pela casa: a porta do quarto se fechando. Sarah havia se recolhido. Ele sabia que deveria ir até lá, que deveria tentar consertar as coisas. Mas a distância entre eles parecia insuperável.Miguel suspirou e abriu seu laptop. Havia recebido um e-mail de um colega da universidade sobre um congresso, mas sua atenção foi desviada por outro nome na caixa de entrada: Helena.Seu coração bateu mais rápido.O e-mail era
Naquela tarde, após o término da aula, Helena recolhia suas coisas com calma quando ouviu a voz grave de Miguel chamando seu nome.- Helena, poderia ficar um momento? Gostaria de conversar com você.Ela sentiu o coração acelerar e trocou um olhar breve com Clara antes de se virar para encarar Miguel, que agora se aproximava com uma expressão serena, mas carregada de intenções ocultas.- Claro, professor — respondeu, tentando soar tranquila.Os poucos alunos que restavam na sala foram saindo, e logo Helena estava sozinha com ele. Miguel se encostou na mesa e cruzou os braços, observando-a atentamente antes de finalmente falar.- Tenho acompanhado seu desempenho nas aulas e notei que você tem um olhar analítico muito apurado. Sua participação nas discussões sempre traz reflexões interessantes. Você já pensou em aprofundar seus estudos na área de psicanálise?No primeiro dia de atendimento, Helena sentia um misto de ansiedade e responsabilidade. Estava sentada em frente à sua primeira pa
Era o primeiro dia de atendimento, Helena sentia um misto de ansiedade e responsabilidade. Estava sentada em frente à sua primeira paciente, uma mulher de trinta e cinco anos chamada Patrícia. Com os olhos baixos e os dedos entrelaçados no colo, Patrícia parecia hesitante em começar a falar. O silêncio inicial foi quebrado por sua voz trêmula.- Eu sei que fui errada… — ela começou, a voz quase sumindo. — Eu o traí. Eu não deveria ter feito isso. Se eu tivesse sido uma esposa melhor, ele não teria ficado tão bravo.Helena respirou fundo, mantendo um tom de voz calmo e acolhedor.- Você sente que a culpa pela reação dele é sua? — perguntou, cuidadosamente.Patrícia assentiu, mordendo o lábio inferior.- Claro que é. Eu quebrei a confiança dele, destruí nossa família… Ele sempre foi um bom marido. Não era carinhoso, mas… pagava as contas, nunca deixou faltar nada para os nossos filhos. Eu fui fraca… e agora estou pagando por isso.Helena observou atentamente o peso da culpa em cada pala