12

Uma doce melodia tem poder de afastar os nssos medos.

— Esperem aqui, meninas, eu tive uma ideia. — Salto para fora da cama, ouvindo os seus protestos atrás de mim e corro até o quarto delas. Pego seus celulares e os fones de ouvidos que estão largados nos criados mudos ao lado de suas camas e volto imediatamente para o meu quarto. — Prontinho. Agora coloquem esses fones — peço sem lhes dar muitas explicações e começo a mexer nos aparelhos. Logo uma melodia clássica começa a tocar e elas me encaram desnorteadas. — Agora se deitem e concentrem-se nessa música. Ela vai acalmá-las e vocês não vão mais ouvir esses trovões. — Elas se olham e depois para mim.

— Tem certeza, Eva? — Sorrio para passar-lhes confiança.

— Só, fechem os olhos e concentrem-se na melodia, meninas — insisto e não demora para elas relaxarem e adormecerem. No segundo seguinte, estou sozinha outra vez e volto para os meus pensamentos errantes. Fito as garotas adormecidas por algum tempo e penso se aquela música seria capaz de causar o mesmo efeito em mim. Com um suspiro afasto-me da cama devagar e vou para perto de uma janela para olhar o lado de fora. Da última vez que sai desse quarto a noite a garoa fria me acalmaram, porém, protelo se devo sair debaixo de uma tempestade como essa. Cruzo os braços e permaneço ali parada apenas preenchendo os meus pensamentos com as vozes enfurecidas que vem lá do céu. Uma batida na porta do meu quarto me faz olhar para trás e penso se deveria abri-la. Mais uma batida e resolvo atender quem quer que seja a essa hora. O senhor Ventura surge na brecha que acabei de abrir e ele não me parece nada bem. Seus olhos estão avermelhados e cansados, sua respiração está um tanto ofegante e seu semblante sofrido e... assustado.

— O senhor está bem? — Forço a minha voz a sair.

— Eu... — Ele para de falar e aponta para o quarto ao lado. — As minhas filhas não estão em suas camas...

— Elas estão aqui. — O interrompo.

— Ah! É que elas têm medo... Como elas estão?

— Dormindo. — Ele parece bem surpreso com a minha resposta.

— Será que eu posso?

— Ah sim, claro. — Abro um pouco mais a porta e lhe dou passagem. O senhor Ventura para em frente a cama e ele parece estar... chorando? Ele está chorando? Com uma respiração profunda, ele passa as mãos pelo rosto e fala sem me olhar.

— Ela sempre conseguia acalmá-las. — É um desabafo. Penso. — Eu nunca soube como ela conseguia fazer isso. Eu... apaguei no escritório e... acordei com um barulho estrondoso, e pensei... minhas filhas. Eu só... corri e pensei em... — Mais uma respiração alta em meio as palavras falhas e ele enfim se vira para me olhar. — Como fez, como seguiu acalmá-las? — Dou de ombros.

— Música — respondo o óbvio, já que os fones ainda estão em seus ouvidos.

— Claro. — Ele meneia a cabeça em concordância. — Você está fazendo um ótimo trabalho com elas! — Arqueio as sobrancelhas para essa afirmação. — Quando ela se foi, o silêncio tomou conta desse lugar. Eu não suporto estar aqui, entende? Eu não suporto esse silêncio. —Apenas aceno com a cabeça para ele. — Mas, hoje eu estava trabalhando no meu escritório e ouvi um barulho familiar que mexeu comigo. Era o som das risadas das minhas filhas e eu fui atraído para uma das janelas. Elas estavam correndo e rindo igual fazíamos quando ela... — Ele para de falar e trinca o maxilar. — Percebi o quão estou sendo egoísta em não participar de suas vidas. Eva, não é? — Faço sim outra vez. — Pela primeira vez desde que ela se foi eu me peguei sorrindo. — Meu chefe confessa e leva as mãos aos bolsos da calça amarrotada, e de repente ele parece sem jeito. O senhor Ventura pigarreia e dá alguns passos para trás. — Obrigado por cuidar delas por mim! — diz e caminha rapidamente para a porta.

— Desculpe me meter, mas, o senhor devia participar mais da vida delas — digo subitamente e droga! Fecho os olhos me repreendendo no mesmo instante. Ele para de andar, me olha outra vez, balança a cabeça sutilmente e sai. Simplesmente sai e fecha a porta.

***

A vida de Jade e Skarlitti após a morte de sua mãe têm sido bem solitárias. As meninas tiveram que se adaptar ao mundo dos adultos de uma forma brutal e sem direto a fazer quaisquer reclamações. Valéria não aceita que as crianças transitem pela casa, nem os seus barulhos mesmo que sejam apenas risadinhas. Elas precisam estar ocupadas o tempo todo, até que finalmente chegue a hora de ir para cama. O café da manhã, assim como o almoço e o jantar acontecem em uma mesa ampla demais e com várias cadeiras vazias, já que o pai e a tia quase não participam desses momentos. Portanto, passamos a fazer isso juntas e conversamos sobre os livros que elas estão devorando nesses dias. O entusiasmo em falar dos personagens e das suas habilidades são contagiantes. Seus horários passaram a ser preenchidos como haviam ordenado. Sim, eu sempre as mantenho bem ocupadas, mas não da maneira que a carrasca _ como elas se referem a tia, quer.

— Pega o disco, Eva! — Skarlitti grita me despertando e minha visão foca imediatamente no disco azul escuro que corre rápido demais em minha direção.

— Lá vai, Jade! — grito de volta, lançando o disco para ela. Correr, sorrir, gritar, ser criança. Até que o meu trabalho é bem fácil de se fazer. No final da brincadeira estamos suadas, ofegantes e deitadas na grama, brincando com as nuvens brancas espalhadas no azul celeste como sempre fazemos.

— Eva, preciso que venha até o escritório. — Valéria pede, aproximando-se com sua sombra gigante, tampando o sol alaranjado que jogava os seus raios mornos sobre nós. Observo as meninas se sentarem na grama em um sobressalto e o olhar intimidante da mulher logo está sobre elas.

— Claro, estarei lá em alguns minutos.

— Agora! — Ela ordena, tirando os olhos de cima das crianças e me encara duramente, dando as costas no segundo seguinte para sair. Bufo frustrada.

— Megera! — Jade resmunga se deixando cair na grama outra vez.

— Bruxa! — Skarlitti ralha, bufando em seguida.

— Eu volto logo, meninas — aviso, levantando-me e passo as mãos na traseira do meu jeans, caminhando para dentro da mansão. Um fato que já mencionei e que faço questão de repetir. Eu odeio essa casa e tudo que ela me faz lembrar, por isso a maior parte das nossas atividades são feitas fora dela. Tarefas da escola por exemplo, são feitas debaixo do velho carvalho, bem próximo do lago. Leituras, na biblioteca e acredito que é o único cômodo que escapa nesse na mansão inteira. Aulas de piano, na sala _ infelizmente não posso levá-lo para o lado de fora e brincadeiras, no jardim. Solto um suspiro baixo e encaro a porta fechada do escritório. Dou algumas batidinhas na madeira e a voz da megera... digo, de Valéria soa lá de dentro. Eu giro a maçaneta, abro a porta e entro logo em seguida.

— Não precisa se sentar, Eva, o que tenho para falar será bem rápido. O senhor Ventura me falou o quanto está satisfeito com o seu trabalho e me lembrou de pedir-lhe os seus documentos. Ele quer assegurar que não perderá a melhor babá que já encontrou para as suas filhas. — Bom, confesso que estou satisfeita que ele esteja aprovando o meu trabalho, mas daí a entregar os meus documentos? Isso é algo que preciso dar um jeito de burlar.

— Claro, senhora Valéria, assim que eu terminar com as meninas, farei isso. — Ela me olha em silêncio e confesso que não sei o que esse olhar avaliador quer dizer. Apenas engulo em seco e espero que ela me dispense logo de uma vez.

— Tudo bem, já pode ir.

— Obrigada, senhora! — Solto a respiração assim que saio do cômodo e caminho apressadamente para fora da casa de novo. À noite, surpreendentemente tivemos pessoas a mesa e eu me senti ridícula em estar sentada com Valéria e com o pai das meninas. Eu até fiz questão de não estar lá, mas as garotas exigiram que eu ficasse e o pai consentiu. Foi o jantar mais bizarro que já participei na vida. O silêncio era absoluto, até a Jade começar a tagarelar sobre os livros que está lendo. É lógico que Valéria protestou exigindo o silêncio da criança, porém, surpreendentemente o senhor Ventura fez questão de ouvir a filha. Vale a pena mencionar que ele parecia diferente dessa vez e acredite, eu estava vibrando por dentro.

***

NOTAS DO AUTOR: 

Gostando do romance? Eu realmente espero que sim. Que tal deixar o seu comentário para eu saber o que você está penando?

Ah, e por favor, deixem a sua avaliação, ela é muito importante. Beijinhos!

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