Stella
É provável que a maior preocupação da minha família seja a mudança para Boston, que está a aproximadamente uma hora de distância da nossa cidade, não é tão longe, mas como somos de família humilde, o deslocamento diário seria impossível, especialmente porque também preciso trabalhar para me sustentar. Além disso, o curso ocorrerá no período da noite, o que tornaria arriscado a volta para casa sozinha. Esses serão os principais pontos de preocupação que minha família provavelmente reclamará, e o fato de “se me der um treco2, quem me socorrerá?”. Não sei como dizer, mas preciso fazer isso logo, pois o curso começa daqui a duas semanas.
— Amiga, volta para terra! — Emma diz estalando os dedos na minha frente. Eu sorrio sem graça e digo:
— Desculpa, estava longe.
— Percebi, Stelinha, como vai fazer agora? — Pergunta Emma preocupada. — E se eles não deixarem?
— Amiga, já sou maior, eles não podem me impedir de realizar meu sonho. — Digo decidida.
— Sabe que estou aqui para o que precisar, eu tenho umas economias, te dou de coração.
— Não precisa amiga, eu agradeço muito, de coração! — Dou um abraço apertado em minha amiga, não tem como não se emocionar com a atitude dela, limpo a lágrima teimosa que desceu, e sorrio para ela. — Tenho algumas economias guardadas, dos longos anos de babá. Agora terei que enfrentar as feras. — Ela sorri e diz em mais um abraço:
— Lembro bem, que você guardava todo o seu dinheiro, e fazia o Léo, ou eu, ou algum dos seus peguetes pagar a conta, quando saímos para comer. Dizia que não podia gastar à toa. — Ela diz rindo.
Por isso que eu a amo, ela sempre tenta me animar, me aconselhando ou fazendo alguma gracinha.
— Boa sorte, Stella!
— Obrigada amiga!
Respiro fundo e entro em casa, encontrando todos sentados na mesa me esperando para jantar, já que avisei por mensagem que estava chegando. Nosso jantar foi descontraído como sempre, meu irmão gêmeo contando as proezas3 que fez no emprego hoje.
Eu e Léo somos gêmeos, mas não idênticos, já que minha mãe nos gerou em placentas separadas4, mas somos muito grudados e cúmplice um do outro, só não fomos dessa vez do curso, porque ele está protetor como meus pais.
Fisicamente, somos muito diferentes também, eu sou loira como minha mãe e ele tem os cabelos castanhos como do meu pai, nossos olhos são azuis, minha mãe diz que é do lado do meu pai, já que na família dela não tinha ninguém com olhos claros.
Nós não temos contato com a família do meu pai, mas somos apegados a família da minha mãe, eles sempre vem nos visitar, e quando não podem, nós vamos. Eles são brasileiros, sempre animados.
— Porque está quieta hoje, Stella? Aconteceu alguma coisa? Você está bem, minha filha? — Minha mãe pergunta me analisando. Todos olham para mim, chegou a hora, terei que falar.
— Verdade mana, nem mexeu na comida. — Meu irmão diz, olhando-me com preocupação.
— Estou bem, graças a Deus! Quero compartilhar uma coisa com vocês.
— Não vai me dizer que está grávida! Eu mato aquele moleque. — Meu pai diz irritado.
— NÃO! Não estou grávida. Eu, eu fui aprovada no curso culinária do chef Bonavalle, e ganhei a bolsa integral em Boston. — Falei olhando para meu prato, sem ter coragem de encarar minha família.
Ouço um som alto de algo se quebrando. Procuro o som e encontro meu pai, que me encara com ódio. Me encolho como forma de proteção. Nunca o vi assim. Ele sempre foi muito carinhoso. Estou assustada quando um copo se despedaça na parede ao meu lado.
— Está louco Jimmy, se errar pode aceitá-la, e machucá-la.
— Prefiro-a machucada e me odiando aqui, do que nas mãos dessas pessoas mesquinhas e sem coração.
— Jimmy, não! Ela não é eles, ela foi criada por nós.
— Do que estão faltando? — Léo pergunta o que não conseguia perguntar, ainda estava imóvel, assustada.
— Está assustando a menina. — Minha mãe entra na sua frente.
— Des, desculpa ter ido s avisa, mas passei com honras, fiz o teste no final de semana e saiu o resultado hoje, o curso inicia daqui a duas semanas, me deixe ir pai! — Imploro por sua benção.
— De Boston aqui é longe, como vai ir e voltar todos os dias maninha? — Olho para o prato que só remexi e ele xinga baixinho, entendo o que não disse.
— Merda! Stella, você não pode fazer isso! — Meu irmão pragueja. — Como vai se sustentar?
— Boa pergunta, Leonardo. Resumindo, você não vai Stella. Não tem a minha permissão — Meu pai fala bravo.
— É uma oportunidade única, o processo seletivo é difícil, e eu consegui, teriam que se orgulhar de mim. — Digo chorando, olho para minha mãe que seca uma lágrima, e olha para o chão, evitando me encarar, Léo me abraça de lado, olho para o meu pai que estava bufando como um touro bravo, eu respiro fundo e digo: — Desculpa, pai, mas tenho reservas para ficar os três primeiros meses, vou arrumar um emprego e realizar meu sonho, com a sua permissão ou não.
— Se sair por aquela porta, — Ele diz apontando para a entrada de casa. — Eu não me responsabilizo mais por você, estará sozinha. — Olho para ele com lágrimas nos olhos. — Minhas portas estarão fechadas para sempre.
— Jimmy, ela é sua filha! — Minha mãe choraminga. Enquanto Léo encara o pai.
— Se é assim que deseja. — Digo num sussurro, — Não vou desistir do meu sonho, sairei amanhã pela manhã da sua casa.
— Está ouvindo isso… sua filha vai sair de casa, se ela sair, ela não volta mais.
— Jimmy, não pode colocar sua filha para fora de casa.
— Se ela me desobedecer, e ir atrás desse curso sem futuro, não será mais minha filha, então, não terá casa. Se está é sua decisão, tem uma hora para tirar tudo o que é seu da minha casa. — Saio correndo para o meu quarto, chorando, e não reconhecendo aquele homem frio que estava na minha frente.
— Onde você vai ficar hoje? — Leo entra falando me dando o maior susto.
— Pensei em ir para a casa da Emma, amanhã vou cedo para Boston.
— Sentirei sua falta! — Ele diz me ajudando a arrumar as coisas na mala.
— Também sentirei sua falta, mas essa oportunidade é única. Preciso ir atrás do meu sonho. — Coloco a mão no coração e digo — Meu coração está ótimo, não precisa ficar preocupado.
— Eu sempre vou me preocupar com você! — Ele diz apertando meu nariz tirando um sorriso meu — Que horas vai amanhã?
— Pretendo pegar o primeiro ônibus, sai às quatro e meia, eu acho.
— Não, eu vou te levar. — Ele diz decidido.
— Não quero atrapalhar, você tem que trabalhar amanhã. — Digo preocupada com ele.
— Converso com a Maria, ela vai entender, quero ver com meus próprios olhos onde você morará, se é seguro. — Meus olhos se enchem de lágrimas, com o cuidado dele, não resisti e pulo em seu pescoço, dando um abraço apertado.
— Stella, tem certeza? — Meu irmão pergunta, enquanto me ajuda a arrumar minhas coisas.
— O que houve com ele? Aquele homem não se parece em nada com nosso pai. — Digo, ainda pensando na atitude do meu pai.
— Dá um tempo para ele, você sempre foi nossa princesinha! Te ver partir dói, mas se é isso que você quer, eu não impedirei.
— Obrigada por não me abandonar! — Digo abraçando-o de novo.
...
Legenda:
2:Treco: Nesta frase quer dizer: indisposição, mal-estar.
3: Proeza: façanha, feito
StellaTerminamos de arrumar minhas coisas, eu desço as escadas tentando segurar o choro, mas ao ver minha mãe ajoelhada no chão, recolhendo os vidros quebrados dos copos que meu pai atirou nas paredes, eu me abaixo e a ajudo-a, ela me abraça chorando.— Não vá! — Ela diz.— Preciso ir, preciso descobrir o que há lá fora, preciso sair do meu casulo protegido, no qual você e o papai fez para mim. Não sou mais sua menininha.— Não importa sua idade, se está casada e com filhos, você sempre será nossa menininha, nossa princesinha. — Sorriso e dou-lhe um abraço.— Não estarei muito longe, sempre nos vere... — Meu pai entra na sala de jantar, me interrompendo de terminar a frase. — Já deu seu tempo, saia da minha casa. — Senti como se cada palavra perfurasse meu coração, que sangrava de dor.— Tchau mãe, eu te amo! — Dou um abraço nela, depois paro na frente do meu pai e digo: — Eu te perdoou, e prometo te dar muito orgulho.Viro as costas e escuto um barulho alto de algo se quebrando, não
Eduardo— Já estou exausto. Entrevistei oito mulheres, e das oito, sete se insinuaram para mim. E a que não se insinuou mal consegue andar devido seus problemas de artrite, ela não conseguiria acompanhar o pique da Bella. — Desabafo ao telefone, sentindo a frustração da busca por uma babá confiável.— Amanhã serão mais algumas horas de tortura. — Michael ri do outro lado da linha. — Mas conta aí. Elas eram gatas, pelo menos? — Reviro os olhos, para o comentário do meu amigo. Ignoro sua pergunta dizendo:— Deus, como é difícil contratar uma babá. — Falo sentindo o peso da responsabilidade sobre meus ombros.— Senhor, tem mais uma candidata — Anuncia Abigail ao entrar no meu escritório com uma xícara de café em mãos. Confio nela para gerir minha casa há anos. Olho para o relógio e percebo que a tal candidata está atrasada, despertando minha irritação.— Não vou atender mais ninguém hoje. Ela não chegou no horário, então que volte amanhã. — Decreto, mostrando minha determinação em não ad
StellaNa entrevista, o Sr. Hoork demonstrou-se irritado com meu atraso, mas consegui explicar a situação e percebi que ele teve uma certa compreensão. Ele parece ser uma pessoa perspicaz, talvez um pouco arrogante, meio grosso, mas sem dúvida muito lindo.Quando bati os olhos nele, eu paralisei, sua beleza era incomum, ele estava magnífico vestindo um terno negro de corte perfeito, seus cabelos castanho-claro e olhos cor de mel se destacavam na negritude de seu traje.Durante nossa conversa, o Sr. Hoork demonstrou interesse em minha formação, o que me deu a oportunidade de compartilhar minha experiência como babá na minha cidade. Percebi que ele apreciou o fato de eu já ter experiência. Embora ele não tenha solicitado, planejo pedir aos meus antigos empregadores que me enviem uma carta de recomendação. Acredito que isso possa reforçar minhas habilidades e demonstrar meu comprometimento.Também contei sobre a bolsa e outros detalhes relevantes. Foi gratificante ver sua expressão de su
StellaLembro-me do dia que o conheci pessoalmente. Foi no jantar da entrega do meu kit, Léo me acompanhou e ficou fofo com o smoking que alugamos para ele. Aquela noite foi inesquecível.Fui com um vestido longo preto, o mesmo que usei na minha formatura, o Chef estava vestindo seu dólmã, que não apagou em nada a sua beleza.O Chef é o típico italiano, branco, dos olhos verdes, sorriso safado, que deixa as mulheres loucas. Ele é alto, e mesmo com traje um pouco folgado, seus músculos ficam amostra.Aquela noite foi mágica, eu nunca havia entrado em um lugar tão chique, me senti um peixe fora d’água, mas o Chef tentou me deixar o mais à vontade possível, dizendo que esse seria meu ambiente agora, que eu voaria longe!Eu me sentia realizada e muito feliz, compartilhar esse momento com meu irmão foi gratificante, ele quem amarrou meu avental personalizado com minhas iniciais, eu chorei de emoção e felicidades. Me emociono toda vez que lembro o que ele me disse enquanto amarrava o avent
StellaDeixo minhas coisas no quarto e desço atrás da Abigail, ela é a governanta, quem manda na ausência do senhor Hoork. Para a minha sorte, ela é uma senhora muito simpática, gostei dela logo que a vi, acho que vamos nos dar bem. Ela vai me passar toda a agenda e cuidados com a Bella, para que eu possa me organizar. Como amo cozinhar, aproveito e pergunto qual será as refeições da pequena, ela me responde tudo sem questionar, mas confesso que torço o nariz, para a resposta.— Posso ver o prato dela antes da refeição?— Por quê? — Abigail pergunta intrigada.— Não sei se o senhor Hoork te falou, mas sou aluna em um curso de culinária, e aprendi alguns truques que tenho certeza de que ajudará ela a comer tudo sem reclamar.— Se está dizendo. Ela continua dormindo, mas precisa acordá-la, para que ela não perca nenhum horário.— Certo, esse é o café dela?— Sim. — Ela responde, eu não resisto e faço alguns cortes nos pães e frutas, deixando-os em forma de animais, Abigail me olha surpr
StellaEu estava arrasada. Nunca fui fã de cabelos curtos, mas não teve jeito; acabei optando por um corte no estilo Chanel, com a frente mais comprida. Existe um nome específico para esse corte, mas sempre esqueço. Resumindo, ficou mais curto atrás e mais longo na frente, mas nada exagerado. Chorei durante todo o processo, deixando o pobre cabeleireiro sem saber se deveria me consolar ou rir da situação.Ao chegar na mansão, fui direto para o quarto. Com Bella na escola, não havia motivo para ficar perambulando pela casa. Ao encarar-me no espelho, não pude deixar de admitir que o corte ficou bom. No entanto, sinceramente, parecia que eu era outra pessoa, não me reconheci perante o espelho.Pego meu celular e faço uma chamada de vídeo para Emma. Ao atender, ela faz cara de surpresa, ficando de olhos arregalados e muda, por alguns segundos. Ela sabia que eu amava meu cabelo cumprido e às vezes para me irritar, me chamava de Rapunzel pelo meu cabelo ser na cintura.— O que aconteceu? Vo
StellaEstou aguardando a professora confirmar minha identidade para liberar a Bella, quando de repente uma antiga colega de escola me reconhece.— Stelinha, quanto tempo! — Ela me abraça apertado, e sorrio com o seu jeito espontâneo. — Ashley! Quanto tempo! — Digo surpresa.— Está trabalhando aqui também? Menina, o que fez com seu cabelo? — Sorrio e respondo:— Não, só vim buscar uma aluna. E meu cabelo, decidi mudar um pouco. — Minto descaradamente, pois ela sabe que eu amava meu cabelo.— Entendi, ficou ótimo, apesar de que você é linda de qualquer jeito. Pega meu número de telefone, e marcaremos de nos ver.— Vamos marca sim, só não posso durante a semana, pois estou trabalhando e estudando. — Falo enquanto anoto o seu número no meu celular.— Ah, que legal! — Nos despedimos com outro abraço e a professora vem me devolver meu documento. Assim que Bella me vê, seus olhinhos se arregalam.— E aí? Ficou bom meu novo visual? — Pergunto com um sorriso, e uma piscada. Ela não diz nada
StellaAlgumas semanas se passaram, e a pequena diabinha continuava a aprontar.Mas sei que ela está começando a gostar de mim, ela tenta não mostrar interesse, mas acaba rindo das minhas brincadeiras.Hoje ela foi cedo para a escola, então estou preparando uma brincadeira diferente para ela, faremos um bolo.Próximo do horário eu já desço e encontro com o Ernandes me esperando.— Já está pronta Stella? — Ele diz ao me ver.— Sim, se quiser já podemos ir.No caminho fomos escutando uma música tranquila, e tendo uma conversa amena sobre o dia a dia.Ao chegar, Ashley está me aguardando, no portão.— Amiga, tenho uma novidade, na sexta-feira vai ter uma mega balada e eu ganhei dois convites. Você vai comigo, não vai?— Aí, Ash! Dia de sexta fico exausta, porque é o dia mais puxado da Bella e do curso.— Por favorzinho, vamos! — Ela diz juntando as mãos. — Você dorme lá em casa.— Está bom, mas só porque fez essa carinha do gato do Shrek. — Ela solta uma gargalhada, e me abraça.— Certo