A viagem do Rio para Cabo Frio durou certa de duas horas, e eu já estava enjoada da estrada quando Samuca manobrou o carro na garagem da casa.
Eu tinha me esquecido de quão incrível esse lugar conseguia ser. Há dois anos, Marco, o pai de Samuca, se cansou de ficar preso ao escritório e passou a Pontes Torres, a firma de advocacia da família, para seu único filho. Decidido a aproveitar ao máximo a sua aposentadoria, se mudou para cá há um ano e meio, e estava vivendo tranquilamente nesta casa linda no interior do Rio de Janeiro.
O lugar era de tirar o fôlego. O céu azul por cima do cenário ampliava a beleza dos longos vidros da casa de dois andares que refletiam a paisagem que a cercava. A vegetação era estratificada e ia de pequenas plantas rasteiras como samambaias e orquídeas bambus, a incríveis e antigas quaresmeiras que formavam um jardim nas latera
Subi no píer e franzi os olhos quando vi ao longe um amontoado no chão. A minha cabeça processou a situação com um soco no estômago.— Samuel! — Grite, desesperadamente.Foi a única coisa que eu consegui proferir antes de correr em direção ao corpo da minha mãe. Ela estava caída no meio do caminho e quando me aproximei, vi que ela tinha desmaiado.— Mãe... — Abaixei-me ao lado dela com urgência, tocando em seu braço e sacudindo-o suavemente, tentando acordá-lo. — Mãe... — insisti, a garganta seca e apertada pela tensão de sentir seu braço mole e sem vida.— Samuca, ela desmaiou. — informei com pressa, erguendo olhar para ele.— Precisamos levá-la para dentro. — disse, abaixando-se e passando os braços por trás das pernas e dos braços dela,
Segunda-feira. Oito da manhã, e eu subia o elevador com Fernanda ao meu lado. Ela segurou a minha mão de repente quando o tilintar ressoou, e me fitou com nítida apreensão no rosto.— Você vai ficar bem? — Ela perguntou, demonstrando preocupação.— Vou sim. — Respondi, fitando-a depois de mirar sua mão, mesmo sabendo que não era verdade.Fernanda soltou a minha mão e levou o braço até o meio da porta antes que se fechasse comigo dentro.— Não fica assim. — Pediu, ela estava tentando melhorar o meu humor, e eu lhe dei um sorriso grato. — Eu tenho uma tia que teve câncer de mama, se tratou e hoje leva uma vida super normal — comentou, balançando a cabeça ao dispensar o que disse. — Vai ficar tudo bem, Nina.— Estou tentando ser otimista, mas obrigada por ficar do meu lado. — So
O meu almoço não passou de duas barrinhas de cereais de banana, aveia e flocos de arroz, mas nem tempo para descansar eu tive. O telefone notificou à uma hora um compromisso que eu tinha esquecido. Então, desci até o quinto andar. A porta se abriu e eu me deparei com a situação da minha sala. Já não havia mais a parede que ladeava o corredor, e todos os cascalhos tinham sido praticamente removidos.Passei pela cena, ainda sem acreditar na nova realidade. Sem paredes de concreto. Parecia bom, Thomas estava certo, embora não assumisse isso em voz alta. O andar ficaria muito mais amplo com menos paredes, mas uma obra em pleno outubro? Bufei, dando de ombro para a ideia.Maluco!Respirei fundo ao me lembrar que com ele tudo era para onde e pelo visto, isso não tinha mudado. O corredor terminou e eu passei pelo balcão onde a Lor estava, deslizando a ponta das unhas pela madei
A madrugada não estava sendo agradável. Já se passava de meia noite, e a minha mente não conseguia mergulhar no cansaço que pesava nos meus músculos. Eu bufava, virava e revirava na cama, até os meus batimentos estavam me deixando inquietas. Tudo estava acelerado e se resumia a condição de saúde da minha mãe. O câncer dela estava em estágio dois, mas saber que existem dois tipos de câncer, um mais leve e outro mais agressivo me deixou alarmada. Eu só conseguia implorar aos céus que não fosse um câncer tão nocivo, e que ela passasse por tudo isso e vivesse bem, depois do tratamento.O sono me abandonou, e de repente o teto girou. O quarto se tornou pequeno demais para mim. Livrei-me dos lençóis e sentei abruptamente à beira da cama, arquejando enquanto tentava levar oxigenação ao cérebro. Quando a sensa&cced
A quarta-feira passou como um sopro.Tinha conseguido entregar os textos da Verônica a tempo de mandar para a produção, mas precisei passar do horário para isso. No relógio, as horas passavam no grito — na verdade, elas pareciam ter agarrado nas sete. E isso aconteceu depois que Samuca me mandou uma mensagem, dizendo que passaria para me buscar. Nós precisamos conversar, embora isso não estivesse escrito, mas deva para ler nas estrelinhas. Eu comecei a listar mentalmente todos os assuntos que precisaria abordar e os argumentos em minha defesa começaram a surgir, tão rápido quanto um hamster correndo em uma roda, dando voltas e voltas sem sair do lugar.Isso é ridículo, pensei enquanto enumerava no dedo como se fosse uma espécie de reunião.Que absurdo!O que eu estava fazendo?Ele é meu noivo!Direcionei-me ao banheiro e fit
A sequência de Dua Lipa animava o local com as batidas agitadas de Don’t Start Now, mas eu não apreciava essa energia, porque já passava do sétimo chope, e começava a me afogar num desânimo que só conseguia me tirar suspiros frustrados.— Pensei que sair para beber fosse me deixar menos nostálgica. — Confessei apática, apoiando a cabeça em uma mão e girando a caneca de vidro vazia pela alça.— Conversar ajuda — Mari disse, olhando para mim como quem espera alguma coisa.— É verdade... — Lorena concordou, e Fernanda pegou a mão que girava a caneca sobre o tampo de madeira do bar do Brews.— Às vezes... — eu hesitei um pouco em falar, mas o álcool já tinha soltado a minha língua na quarta chopada — eu me pego pensando o porquê de algumas coisas acontece
A sala do consultório estava fria, mas eu não sabia se era o ar condicionado rufando abaixo dos vinte graus ou se era a aflição falando mais alto.Eu não sabia, mas a sensação não era boa. O meu estômago se revirava como se tivesse engolido alguma coisa viva, o meu abdômen e as costas estavam contraídos, e ver o médico correndo os olhos para lá e para cá na pasta de exames, num silêncio colossal fez tudo se tornar pior.A garganta do Doutor Maesse se mexeu para cima e para baixo, como se tivesse engolido alguma coisa muito grande e mal mastigada. Os olhos dele não estavam mais na pasta que continham os resultados dos novos exames da minha mãe e ele suspirou para o que diria a seguir.— Cecília, eu não tenho notícias agradáveis, mas o câncer está em estágio inicial. — Ele abaixou o olhar pa
— Pessoal — era a voz de Thomas e ele parecia esbanjar simpatia em seu tom. — O restaurante está bastante movimentado — constatou o óbvio, e Mariana se virou para o lado a fim de fitá-lo. Eu apenas ignorei o fato, já que estava de costas para ele e não me daria ao trabalho de virar para encará-lo. — Então, vocês se importariam se Augusto e eu nos juntássemos a vocês?O ar se tornou rarefeito, e nossas posturas se tornaram tensas. Nós quatro nos entreolhamos, sentindo o clima pesado. Quem teria a coragem de dizer não para o chefe? Fernanda tinha motivos óbvios para não querer Augusto por perto em sua hora de almoço, e esperei que ela fizesse alguma coisa, mas isso não aconteceu.Cutuquei o braço dela e ela ergueu a cabeça, inquirindo com