Os olhos suplicantes de Lucas eram como os de um cachorrinho abandonado, implorando para que seu amigo bobo, fiel e apaixonado, o acompanhasse.
— Já cansei de dizer que não vou nesses lugares sem a galera.
— O seu "sem a galera" é só porque a Ana sempre está junto.
— Sabe perfeitamente que é isso sim! — confessou Theo, sem vergonha alguma.
— Sabe o que eu penso a respeito disso?
— Sei! E não preciso que você fique enchendo a minha paciência de novo com isso.
— Cara, eu não acredito... Você é o CEO de grandes empresas, é conhecido mundialmente. Poderia ter o mundo aos seus pés, mas prefere viver preso a uma mulher que não dá a mínima para você?
Theo fechou a cara, mas Lucas ignorou totalmente o olhar sério do amigo.
— Eu já disse que não quero falar sobre isso. Mas já que você insiste tanto, vou falar uma coisa que já disse várias vezes: eu. não. traio. a minha esposa.
As últimas palavras ditas por Theo saíram pausadamente entre seus dentes raivosos, enquanto encarava Lucas. Lucas se aproximou de Theo e não baixou a guarda, decidido a vencer essa batalha.
— Você fica agindo como o marido honrado que não trai a esposa. Mas por acaso a sua esposa faz isso por você? — rebateu Lucas. — Cai na real, Theo... Ana não gosta de você. Ela não te ama, e você sabe bem disso... Então para de correr atrás de uma mulher que não está nem aí para você e que provavelmente te trai com muitos homens!
Aquelas palavras foram suficientes para Theo perder a paciência. Fechou o punho e se aproximou mais de Lucas, a fim de lhe dar um belo e caprichado murro no rosto. Mas, antes de socar a cara do indivíduo à sua frente, o murro acertou a parede mais próxima, deixando Lucas estático, encarando-o com surpresa. Os dois eram amigos de longas datas, e ele sempre soube que o amigo vivia para falar besteiras. Mas, mesmo com esse defeito, Lucas era um bom amigo.
— Cara! Quem avisa, amigo é! E é só isso que eu quero: que acredite em mim, porque eu realmente sou seu amigo. Agora me escuta: para de preservar a sua vida por uma mulher que não te ama e vai viver a sua vida.
— Tá! Sei que seu pai fez o favor de deixar você preso a ela e que, para piorar a situação, colocou aquele advogado filha da pu*ta para garantir que vocês dois não se separem. Mas você ainda é jovem, cara. Ainda pode e deve aproveitar a vida.
Lucas insistiu mais uma vez, e Theo o encarou com os olhos cerrados.
— Vou te dar três segundos para sair do meu quarto. Ou, caso contrário, aquele murro que acertei na parede vou fazer questão de parar nesse seu rosto.
Lucas levantou as mãos em rendição e saiu do quarto do amigo, batendo a porta com tamanha força. Theo, indignado com o comportamento de seu amigo e com os pensamentos à flor da pele pelas palavras ditas por ele, sentiu todo o sangue do seu corpo ir para a cabeça, onde ali se instalou uma dor insuportável. Em cima da mesinha perto da cama estava seu celular. Theo pegou o aparelho apressado e conferiu as horas. Já beirava às oito e meia da noite. Seus dedos foram guiados por ele, ativando o primeiro número salvo em favoritos: o número de Ana. Apertou o botão de chamada, que tocou diversas vezes sem sucesso, fazendo Theo ficar ainda mais frustrado e sua cabeça doer ainda mais. Mesmo nervoso com a situação, não desistiu. Retomou a ligação que há pouco foi encerrada por falta de atendimento. Iria ficar ali a noite toda, se possível, mas precisava ouvir a voz dela para se acalmar do tormento deixado por Lucas em sua cabeça.
Ana estava frustrada. Sua cabeça estava em um turbilhão de pensamentos, e todos eles tinham a ver com seu marido. Precisava jogar essa frustração fora, e qual o melhor método para fazer isso do que um belo copo de sua bebida favorita? "Cosmopolitan", um coquetel clássico feito com vodka, triple sec, suco de limão e cranberry. Uma combinação perfeita para ajudar a superar pensamentos indevidos.
Ainda eram 19h15, e como companhia para degustar esse delicioso drink, ela levou consigo sua companheira de copo, Alexa, que não dispensava uma bebedeira. Amigas e companheiras de copos seguiram para o bar onde toda a galera da turma tinha o costume de ir. Era um ambiente conhecido e confiável.
Já no local, sentadas na mesa de sempre, um ponto mais reservado do bar, as duas conversavam abertamente.
— Fala pra mim, amiga! Qual foi o real motivo de vir aqui hoje?
— E precisa de um motivo? Só queria relaxar um pouco depois de um dia estressante de trabalho.
— Tem certeza de que o motivo é mesmo por conta do trabalho estressante, e não por conta de um certo loiro de olhos azuis claros?
— O quê? — Ana tinha na mão o copo de bebida e um olhar relaxado. Mas bastou ouvir o nome "Theo" para que seus olhos se arregalassem. Alexa apenas sorriu, óbvia.
— Por que do nada Theo está fazendo parte da nossa conversa?
— Porque o real motivo de estarmos aqui não é o trabalho, e sim ele! — Alexa não supôs, afirmou. E Ana não teve argumentos para negar. Levou o copo à boca e tomou um generoso gole de sua bebida, enquanto Alexa ainda avaliava suas ações.
— O Theo te ligou, não foi? E aposto que ele te disse algo que te incomodou.
Com um suspiro derrotado e se vendo sem saída no momento, a única escolha a tomar foi confessar.
— Theo tem me tirado muito do sério ultimamente. Ele não deixa de lado aquela bendita frase: "eu te amo". E isso... isso... — Ana tentou de todas as maneiras terminar aquela frase, mas as palavras simplesmente lhe faltaram. Foi Alexa quem complementou o óbvio.
— Está mexendo com você!
Fez-se uma pausa de alguns minutos entre as duas, tendo apenas o barulho em volta.
Alexa encarava Ana cúmplice, e Ana tentava de todas as formas fugir daquele olhar. — Amiga! Sei que já disse isso um milhão de vezes, mas vou dizer uma vez mais. Você sempre foi apaixonada pelo Theo, mas guardou seus sentimentos a sete chaves, por que é teimosa demais. Não acha que já é hora de dar uma chance para esse casamento dar certo? — Dar uma chance? Eu não posso fazer isso... Simplesmente não dá! — É claro que pode, amiga! — Não, Alexa! Não posso! Sofri demais com esse casamento. Sabe o que é ter o pavor de andar sozinha na rua, mesmo que em plena luz do dia? E a sensação de que a qualquer momento posso ser levada novamente e passar por aquele mesmo tormento que passei? Ter medo de ser presa dentro de uma camisa de força, tendo alguém ao lado dizendo repetidas vezes que vai te mandar para um lugar onde jamais poderá ser livre? Me sinto ainda dentro daquela camisa de força, lutando pra ser liberta. Acha mesmo que consigo ignorar tudo isso e viver uma vida feliz ao la
Se o comportamento exagerado de Alexa deu certo? Oh, se deu! Ninguém ali presente ousou olhar mais para o lado do moreno chamativo. Mas, claro, havia aquelas que davam umas olhadas sutis. Afinal, olhar não arranca pedaço. Marlon acompanhou sua noiva de volta para o assento, sentando-se em seguida ao lado dela enquanto dava os devidos cumprimentos a Ana.— Como vai, Ana? — Eu vou bem, Marlon! E você? — Bem, também! — Isso é ótimo! Veio buscar a Alexa? Fique à vontade. — Não, amiga! O que temos que fazer não é tão importante assim! — Amor! — interveio Marlon. A morena só pode ter esquecido; os dois haviam marcado de encontrar os pais dele hoje. — Meus pais estão nos esperando! Você se esqueceu? O olhar surpreso dela só confirmou o óbvio. A sua tão distraída amada havia mesmo esquecido do compromisso deles.— Me desculpa, amor! Eu realmente esqueci! Ana, eu... — Não diga nada, sua pateta. Só andem logo. Os pais dele já devem estar esperando. A compreensão de Ana fez com q
Marlon não pensou duas vezes antes de partir para cima do infeliz abusado, enquanto Alexa correu para acudir Ana. O barman também não se segurou e correu para ajudar Marlon. Com os braços imobilizados para trás por Marlon, Kauan era interrogado por ele. Marlon, a todo custo, perguntava de um modo nada amigável o que Kauan poderia ter feito a Ana. E claro, Kauan, a todo momento, gritava dizendo que não fez nada. Ana estava nos braços de Alexa, e agora, com o alvoroço da confusão, as pessoas ao redor se solidarizaram para ajudar. Algumas mulheres se prontificaram a ajudar Alexa com Ana, enquanto os homens ajudavam Marlon e o barman. Nessa confusão, Kauan levou a pior. No caminho para o hospital, Ana, desacordada, não aparentava estar nada bem. Alexa foi a acompanhante que seguiu junto na ambulância. A morena, desesperada, chorava horrores enquanto segurava a mão gélida de sua amiga, a todo momento se culpando por deixar Ana sozinha. Já Marlon seguiu o infeliz rumo à cadeia. Kauan saiu
Foi por volta da meia-noite e meia quando o voo de Theo pousou no aeroporto da Califórnia. Theo estava desolado; por hora, a única coisa com que ele se preocupava era ir até o hospital onde Ana estava internada. Assim que pisou no aeroporto, Marlon já o esperava, já que há meia hora atrás, Theo havia avisado que estaria chegando. Os dois seguiram direto para o hospital, e entre eles foram ditas poucas palavras. Theo estava calado demais, apenas olhando para fora da janela do carro em movimento.— Cara! Ela está fora de perigo agora! Já a levaram para o quarto. Até a dona Maria e a Dona Bárbara vieram vê-la... — eram palavras ditas por Marlon na intenção de acalmar o amigo. Mas não pareceu dar muito certo, já que em poucas palavras Theo cortou suas falas, sem nem olhar para sua direção. — Só vou acreditar que ela está bem quando eu a ver pessoalmente. — Eu entendo! Mas precisa se acalmar um pouco, e ser forte. O seu sogro... O senhor Bento vai te causar muitos problemas. Sabe disso m
Estava bem tarde, e Theo dormia tranquilo, com sua cabeça repousada sobre a cama de Ana. Sentiu uma mão leve tocar seu ombro e a voz de sua sogra, Emília, soar calma em seus ouvidos. Bastou apenas isso para desapertar e voltar o olhar para a sogra, de sorriso gentil.— Meu querido, você deveria ir para casa. Teve um voo cansativo, que eu sei. Você deveria descansar — relatou a senhora Emília, preocupada com o genro. Ele, por outro lado, não demonstrou vontade de sair dali. Seus olhos de menino pidão repousaram sobre os dela, para em seguida voltar para o rosto pálido de Ana, e sua mão segurou firme a dela. Emília sorriu com a cena. Como era possível sua filha cabeça oca não ver o quanto esse rapaz era apaixonado por ela?— Não estou cansado! E, se a senhora me permitir, eu gostaria de ficar aqui com ela. — Tem certeza de que o melhor é você descansar em casa e voltar pela manhã mais disposto. — insistiu uma vez mais a senhora Emília, se compadecendo da cena de Theo, com os olhos meig
O silêncio no quarto fez Ana ficar pensativa. Todos os seus pensamentos eram voltados para Theo, enquanto seus olhos o avaliavam. Ele era lindo, não podia negar. Sempre foi. E essa beleza já a fez sentir-se muito estranha na época da escola, quando as moças do colégio ficavam secando ele. Elas eram displicentes o suficiente para deixá-la nervosa. Com esses pensamentos, não soube que horas dormiu, mas o sonho que teve foi bom. Os olhos de Theo abriram quando a luz do sol ultrapassou a janela, atingindo seus olhos perfeitamente belos. Ele estava meio aéreo, e sentia uma leve dor no pescoço pelo mal jeito que dormira. Theo levantou a cabeça, conferindo Ana ainda adormecida. A preocupação com sua baixinha o atingiu em cheio. Levantou-se, aproximando-se dela o máximo que conseguiu, conferindo sua respiração, que, por sorte, estava serena e calma. Contudo, respirou fundo e ficou ali, observando-a dormir. A pele do rosto de Ana já não tinha a tonalidade pálida da noite passada, o que o de
Os olhos dele se prenderam nela mais uma vez. Até voltar a razão e notar que ela saiu da cama. — O que você... Ana, porque saiu da cama? Você... — atordoado ele a repreendia. Já ela, sorriu com o cuidado que recebia dele. Sentiu a mão dele segura a sua, e notou ele tentar a guiar na direção da cama. Mas ela o impediu, estava se sentindo bem o suficiente para estar ali. E queria a todo custo mudar seu destino. Sabia que a hora era aquela, se esperasse mais, poderia não ter coragem de fazer o que tinha em mente.— Espera Theo. — Ana! Deveria estar deitada...— Me desculpa! — Para de me pedir desculpa Ana. Eu que deveria... — Ana interrompeu suas falas mais uma vez. Parecia mesmo decidida em estar ali. E sem muito o que fazer, ele apenas se manteve ao lado dela, esperando o que vinha a seguir. — Não deveria não! Sabe Theo. Fechei meus olhos por muito tempo. Mas estou cansada... Quero mudar... Mudar por mim, por você... Por nós! Acha que seria possível?Surpreso, era assim que ele esta
Meu nome é Ana Mayra. Vivo na cidade de São Francisco. Califórnia. Tenho vinte e cinco anos. E vi minha vida vira do avesso. Graças a um homem, que por capricho me forçou a casar com o seu filho. Mas vamos por partes. Vou contar a vocês a história desde o começo. Meus pais, Bento Alves e Emília Alves. São donos de um restaurante. Desde nova, aprendi a valorizar o árduo trabalho. Os dois desempenham bem esse papel. Mas não faltava tempo para o amor e o carinho de ambos comigo. Estudava em uma escola aqui em São Francisco. E como melhor amiga, confidente e até irmã, filha de outra mãe. Tenho ao meu lado, Alexa. Naquela época, eu tinha apenas doze anos, e Alexa Treze. Moramos na mesma rua, desde que me entendo por gente. Na escola tinha muitos amigos. Mas, em compensação, tinha o menino a quem eu julgo como peste. O seu nome. Theo. Theo tinha a aparência de anjo, mas a mente de um demônio. Os seus lindos olhos azuis-claros, os seus cabelos castanhos que de longe aparentavam ser mac