João Collins A manhã passou como um borrão, e eu me encontrei na frente do espelho, ajustando o nó da gravata com mãos trêmulas. O reflexo me devolvia um olhar que eu quase não reconhecia — olhos fundos, cheios de incerteza. O terno preto que escolhi para aquela tarde parecia pesado, como se carregasse o peso de todas as minhas dúvidas e medos. Aquele era o dia do casamento de Anna, e eu ainda não sabia o que faria. Meu coração estava dividido entre a razão e o desejo, entre o medo de me arrepender e a possibilidade de um erro irremediável. Mas eu precisava estar lá. Precisava ver com meus próprios olhos e decidir por mim mesmo.Respirei fundo e finalmente consegui dar um jeito na gravata. Enfiei as mãos nos bolsos, tentando encontrar algum conforto nas dobras do tecido. Olhei uma última vez para o espelho, como se procurasse por uma resposta que ele não podia me dar, e saí.No carro, a cidade parecia passar em câmera lenta. Cada semáforo, cada pedestre, cada segundo se arrastava co
João Collins A igreja estava cheia, e o som suave do órgão tocava ao fundo, criando uma atmosfera solene e carregada de expectativa. Todos os olhos estavam voltados para o altar, onde Anna e Harry estavam de pé, frente a frente, diante do padre. Eu estava sentado no meio dos convidados, com o coração batendo como um tambor descompassado. Minha mente estava à deriva, tentando se ancorar em algum ponto de sanidade.O padre começou a falar, sua voz profunda ressoando pelas paredes da igreja.— Estamos aqui hoje, diante de Anna e Harry, que escolheram este dia para se unirem em matrimônio, para se tornarem uma só carne. O amor é algo grandioso, e os dois estão decididos a viverem uma vida de felicidade, juntos, como um só.Senti o suor nas palmas das minhas mãos, a tensão subindo pelo meu corpo. Tudo parecia se mover em câmera lenta. Olhei para Anna, esperando encontrar um vislumbre de incerteza em seus olhos. Ela olhou para mim. Foi um olhar longo, silencioso, cheio de algo que eu não c
Anna Muller Olhei para Helena, minha melhor amiga, que parecia estar surpresa com o que ela e todos presentes escutaram. João estava ali, diante de todos, sem nenhum medo, esperando a minha resposta. Eu levantei a barra do longo vestido de noiva e, antes que eu descesse do altar, Harry segurou a minha mão.— Anna, não faça isso comigo. Se me deixar aqui, nunca irei te perdoar.Eu olhei para a mão dele, que me segurava com força, e ele me soltou. Sem pensar muito, disse:— Sinto muito, Harry!Saí com João sem olhar para ninguém. Ele segurava minha mão enquanto corríamos para fora da igreja e, assim que entramos no carro, ele me levou para o seu apartamento. Entrei em pânico; agora eu não tinha mais nada a não ser ele. Minha carreira como professora universitária, a minha amizade com Helena, que poderia estar perdida, e até mesmo o meu futuro. Naquele momento, João parecia entender o que eu estava sentindo e, olhando nos meus olhos, segurou a minha mão e disse:— Anna, sei que está co
João Collins Havia se passado um mês desde que eu levei Anna comigo do casamento que ela não deseja. Eu observava Anna do outro lado da mesa, a luz suave do abajur desenhando sombras delicadas no rosto dela. Ela estava concentrada no livro à sua frente, mas eu sabia que sua mente estava longe, presa em pensamentos que a perturbavam. Desde o casamento, o clima entre ela e Helena tinha se transformado em uma névoa densa de ressentimentos e silêncios não ditos. Anna não perdeu o emprego na universidade, mas teve que lidar com o constrangimento de ver alguns dos colegas a olhando de forma negativa, já que foram para o casamento que ela fugiu comigo. Ela se mostrava forte, mas eu sabia que, por dentro, lutava com todas as inseguranças que esse novo começo trazia. Eu a amava ainda mais por isso por sua força, por sua vulnerabilidade. Cada dia ao lado dela era uma confirmação de que tínhamos feito a escolha certa, por mais difícil que fosse o caminho. Dividíamos o mesmo apartamento agora, e
Anna MullerO vento frio de setembro me envolvia enquanto eu saía da universidade. Apesar do sol, um arrepio percorria minha espinha. Eu ajustei meu casaco, tentando afastar o desconforto que sentia desde que saíra de casa. A minha mente ainda estava focada na conversa que tive com Helena na noite passada. A reconciliação havia sido um passo importante, e a presença de João fez tudo parecer menos pesado, mas eu sabia que ainda havia muitas pontas soltas em minha vida.Quando cheguei ao estacionamento, parei de súbito. Harry estava lá, encostado em seu carro. Eu não o via desde o casamento, ou melhor, desde o dia em que fugi do casamento com João. Seu olhar era indecifrável, uma mistura de mágoa e determinação. Ele me encarava como se tivesse ensaiado aquele momento por muito tempo.— Precisamos conversar — ele disse, sem rodeios, seu tom firme. — Acho que ao menos isso você me deve depois de me deixar no altar e me fazer passar por tudo que aconteceu.Eu podia sentir a tensão no ar, m
João CollinsEstava sentado na sala de aula, esperando o início da nossa aula de neuroanatomia, a mesma em que costumava encontrar Zara, minha amiga de medicina. O professor já estava se preparando para começar quando percebi que a cadeira ao meu lado estava vazia. Zara sempre chegava alguns minutos antes, com seu sorriso caloroso e pronta para reclamar das noites mal dormidas estudando. Hoje, porém, o lugar continuava desocupado, e uma sensação estranha de ausência começou a me incomodar.Enquanto a aula prosseguia, ouvi alguns murmúrios dos colegas ao meu redor. Comentavam que Zara havia trancado o curso, e uma parte de mim se sentiu pesada com essa notícia. Eu não a conhecia tão profundamente, mas era o suficiente para saber que ela tinha sonhos grandes e uma vontade enorme de vencer na medicina. Ela costumava me escutar, oferecer seu apoio silencioso, e agora essa conexão parecia perdida. Me perguntei se ela teria voltado para a Alemanha, de onde sempre falava com um brilho no ol
João CollinsEstava nervoso enquanto me dirigia à livraria para minha primeira sessão de autógrafos. O lugar estava lotado, algo que jamais imaginei, e cada rosto desconhecido me olhava com expectativa. Ver o meu nome estampado na capa de um livro, cercado por leitores que aguardavam uma assinatura, era surreal. Tudo parecia um sonho, o tipo que meu pai vivia desde sempre, só que ele sempre gostou de se manter em segredo, mas agora, era a minha vez de brilhar.Anna chegou alguns minutos depois que comecei a autografar. Ela se misturou aos leitores, como se quisesse passar despercebida, mas eu a vi assim que entrou. Ela sempre tinha essa forma discreta de estar presente, e eu apreciava isso. Nossos olhares se cruzaram, e não pude deixar de sorrir, mesmo em meio a tantas pessoas. Enquanto assinava mais um livro, uma senhora que estava na fila olhou para Anna, depois para mim, e comentou:— Sua mãe deve estar muito orgulhosa.Minha expressão se fechou momentaneamente. Sorri educadament
Anna MullerEu me olhava no espelho, ajeitando o véu com mãos trêmulas. O vestido branco, simples e delicado, parecia mais leve do que o peso que eu carregava no peito. Seis meses desde o noivado, e finalmente estava pronta para dar esse passo. Casar-me com João. Meus olhos se perderam por um instante no reflexo, buscando a mulher que eu esperava ser: confiante, apaixonada, decidida. Mas, por dentro, um turbilhão de emoções me assombrava.Senti um nó na garganta ao sair do apartamento. Era isso. Não havia volta agora. Meus pensamentos se misturavam com as memórias de todos os momentos que me trouxeram até aqui, desde a primeira noite em Cambridge até o dia em que João me pediu em casamento.O motorista da Helena estava na porta, esperando para me levar até a mansão. A cerimônia seria no jardim, algo íntimo, apenas com a presença da família e alguns poucos amigos. Perfeito, eu pensava, enquanto respirava fundo, tentando acalmar meu coração acelerado. Entrei no carro, ajustando o vestid