Parte 12 -Bianca— Eles queriam que eu fosse freira, por causa de três tias minhas, muito queridas - Luísa disse, sua voz fria de amargura. — Queriam que eu fosse alguém que eu não sou. Eu me escondi atrás daquela batina, atrás da oração, mas nunca fui feita para aquilo.Clara deu um passo em direção a ela, sua expressão cheia de compaixão. — Mas agora você está livre, Luísa. Nós podemos decidir o que fazer juntas. Não tem mais que voltar para lá.— Eu sei, Clara. E nem posso... Eles vão me mandar de volta ou me expulsar de vez - Luísa olhou para ela com olhos marejados, sua mão tremendo ligeiramente quando tocou a de Clara sobre a mesa. — Mas e se eles vierem atrás de mim de novo? Não tenho para onde ir. Não tenho mais família.— Se souberem que está comigo, não vão vir - ela deu de ombro — Eles não gostam de mim, aliás, me odeiam.— Mas se meu irmão...— Esqueça. Você tem a mim - Clara respondeu, sua voz suave, mas firme. — Agora vai ser diferente, você já ficou tempo demais naque
Parte 13 -AdrianoAinda bem que eu nasci homem nesse mundo capitalista e cruel. Deus me livre ter que passar a vida como essa garota. Apesar dela ser filha de um dos nossos conflitos, anteriormente inimigo, eu não desejo mal para ela.A garota foi enviada ao convento com apenas quatorze anos de idade, para que não tivesse contato com outros rapazes.E sei que a ideia absurda foi de meu pai, mas eu não tinha voz ativa na época. Nem mesmo cheguei a conhecer a menina, só sei que seu nome de batismo é Bianca.Nunca nem cheguei a ver seu rosto, o que não iria adiantar muito, já que na época do acerto feito por meu pai e pelo pai dela, eu tinha acabado de fazer trinta anos e a coitada só tinha treze.Meu pai já estava doente e tinha deixado o poder nas mãos de Leonardo e eu fiquei sendo o segundo na família. Isso realmente não me incomodou. Leonardo tem muitos problemas sendo o cabeça.Quando a menina foi enviada para o convento, o pai dela queria que eu fosse junto com ele, mas não vi mo
Parte 14 -Bianca— Nada disso - eu neguei balançando a cabeça — Seus pais, se já souberem, talvez nem queiram saber por onde você está - disse com um tanto de tristeza — Eu vou embora sozinha, para não prejudicar vocês duas.— É verdade, Luísa - Clara se aproximou entre nós e pegou sua mão — Agora podemos ficar juntas. A Madre não vai te aceitar de volta...— E meus pais também não... Ou talvez queiram me forçar a ir para outro lugar - ela mordeu o lábio — Mas agora eu sou maior de idade e eles não mandam mais em mim.— Pois é... Você fica e começa a organizar a sua vida junto com a Clara - eu sorri sem ânimo — Eu vou procurar um lugar onde possa ficar, até que meu pai desista de mim.— E você acha que ele vai desistir, amiga? E seu noivo?Eu suspirei, coçando a testa.— Acho que ele também não vai querer perder tempo me procurando.— Mas e o acordo?— Isso não é problema meu - abri os braços — Eu só tinha treze anos, nem pude falar nada. Só aceitei e pronto.As duas se olharam com d
Parte 15 - BiancaO táxi derrapou em uma curva, quase saindo da estrada. O motorista lutava para manter o controle, seus olhos arregalados de pânico.— Quem está atrás de você? - ele perguntou, a voz rouca de medo.— Não importa! Só me tire daqui! - eu mal conseguia respirar. — Por favor, senhor... Não pare... — as luzes do carro perseguidor refletiam nos espelhos, cegando-me por um segundo. Eu respirava fundo e batia no banco da frente, olhando para ver se estavam mais perto.Então, o pior aconteceu.O carro atrás de nós acelerou e bateu na lateral do táxi, nos jogando para fora da estrada. Senti o impacto, gritei com medo e o carro girou antes de parar abruptamente. O silêncio que veio a seguir foi ensurdecedor, mas durou apenas um segundo. Eu sabia que precisava agir rápido.— Saia daqui! - gritei para o motorista, enquanto abria a porta do táxi, minha respiração ofegante. Meus músculos estavam rígidos de medo, mas a adrenalina me empurrou para frente. Meus joelhos ainda doíam u
Parte 16 -BiancaOs segundos pareceram se arrastar como horas. Ele começou a caminhar novamente, seus passos lentos pelo vagão. Cada vez mais próximos. Meus músculos se contraíram de pavor, e minha mente estava uma confusão. Cada fibra do meu corpo gritava para fugir, mas não dava.Então ele passou direto.Ele não parou.Eu me virei lentamente, observando-o seguir até o final do vagão e desaparecer pela porta, indo para outro lado do trem. Eu tinha imaginado tudo. Minha garganta até doeu de tão nervosa que fiquei. O alívio veio como uma enxurrada, e meus músculos finalmente relaxaram. Quando o trem se afastou ainda mais de Sevilha, cortando a escuridão em direção ao desconhecido, eu tentei me acalmar. O cheiro do café derramado ainda pairava no ar, misturado ao perfume da noite que entrava pela janela entreaberta. *** *** *** ***O trem desacelerou enquanto serpenteava pelas montanhas, e o cenário ao redor foi se transformando em algo quase irreal. A estação era pequena, mais pa
Parte 17 - AdrianoEu estava sentado no escritório, lendo as mensagens que o grupo que mandei atrás de Bianca tinha me enviado.**Bianca fugiu.**As palavras ainda giravam na minha mente, cortando qualquer traço de paciência ou indiferença que eu tivesse tentado manter desde o começo. Eu nunca a tinha conhecido, nunca sequer a visto, mas isso não importava. O que ela havia feito — fugir, trair as expectativas da minha família e, pior ainda, desafiar o poder de quem controla essa cidade. Não se preocupou nem mesmo com o pai.A porta do escritório se abriu com um ruído seco, interrompendo meus pensamentos. Meu irmão, Leonardo, entrou com a mesma expressão rígida e impassível de sempre. Ele carregava em si o peso de ser o mais velho, o herdeiro da responsabilidade e da crueldade que mantinha nossa família no poder. Seu terno estava impecável, o rosto sereno, mas os olhos... Os olhos eram duas fendas gélidas.— Então ela fugiu... De novo - disse ele, sem rodeios, enquanto fechava a por
Parte 18 - BiancaEu o conhecia. Nos encontramos na boate dias atrás, em Sevilha, onde começou a confusão. Uma noite em que eu fugi de mim mesma, onde me escondi atrás do nome falso de Biatrice. E ele, sob as luzes da boate, era o único homem que havia conseguido despertar algo dentro de mim que eu não sabia se era possível sentir. Eu nunca imaginei que o veria de novo. Muito menos aqui.— Oi! - ele disse, com aquele sorriso leve, que parecia destoar de sua figura. — Você? - franziu as sobrancelhas — Biatrice?Ele estava diferente. Vestia roupas simples, com uma mochila surrada pendurada no ombro, o cabelo escuro caindo casualmente sobre a testa. — Espero não estar atrapalhando. Vi você aqui e pensei que... Bom, o lago parece um bom lugar para relaxar. Mas estou surpreso, realmente surpreso.Não mais do que eu. Meu coração bateu forte e fiquei nervosa. De um jeito bom.— Pois é... - fiz um gesto para que sentasse — Não está atrapalhando. - minha voz saiu um pouco hesitante, e me o
Parte 19 -BiancaO som das águas do lago batendo suavemente contra o píer contrastava com a tensão que pairava entre nós dois. Eu puxei meu casaco um pouco mais apertado contra o vento frio, enquanto ele, sentado ao meu lado, parecia alheio ao frio. Seu olhar fixo em mim era inquietante.— Eu não... - comecei a falar, mas as palavras falharam. Não sabia mais o que dizer. Tudo parecia em suspenso, como se o próximo momento pudesse mudar tudo.— Quem você está tentando enganar? - disse se inclinando mais, sua boca a centímetros da minha. — A mim, ou a si mesma?Ele podia ser qualquer um, podia ser algo bom ou algo ruim... Mas havia algo entre nós que eu não conseguia ignorar. Algo forte demais para ser racional.Em um impulso tirei os pés da água e me levantei, calçando os sapatos com os pés molhados mesmo.— Eu tenho que ir - passei minha bolsa pelo pescoço.— Eu vou te acompanhar - levantou.Eu não sei se isso é bom, mas não posso impedir que ele ande no mesmo caminho que eu.A tar