Capítulo Três

Olhei pela janela mais uma vez. E mais e mais carros adentravam a mansão de Lucian. Isso tudo é por que eu me tornaria seu braço direito? 

Você sabe que os jantares aqui são grandes bailes de gala na verdade, né?  A voz de Kendra soou em minha mente. Respirei fundo. Eu era tremendamente tímida e odiava festas. E agora isso. Bem, eu teria que encarar, afinal a festa era para mim. 

- Pronta? – a voz veio da porta. Me voltei para ela e Kendra sorria para mim. 

- Não sei. Tem tanta gente! – exclamei. 

- Olivia, você é linda e encantadora. Todos vão te adorar. E você tem que ser apresentada para nossos amigos. – Kendra me puxou pela mão e me levou para me ver no espelho enorme de meu closet. 

Vi meu reflexo e tentei puxar um sorriso. Meu cabelo estava preso em uma espécie de coque com as pontas cacheadas e soltas. Minha franja caia ondulada em volta de meu rosto e meus lábios vermelhos foram repuxados com meu sorriso. Minha maquiagem era delineador, uma leve camada de contorno e base, mas Kendra insistiu que eu chamasse atenção ao menos para algo e passou um batom vermelho vivo em meus lábios. 

Tinha que dizer que com meu cabelo loiro dourado ficou bom e contrasta com meu vestido longo e tomara que caia vermelho. Ele era apertado em cima com um corpete e caia livre e solto de seda até o chão. 

Kendra ao meu lado estava com um vestido preto e rodado. Com alças caídas e na altura do joelho. Combinava com ela. Seu jeito meigo e inocente. Seu longo cabelo estava cacheado e sua maquiagem era pesada nos olhos. 

- Estamos lindas! – ela sorriu. 

- É, acho que sim. – sorri meio incerta. 

- Vamos. Papai nos espera. – ela me puxou pela mão e fechou a porta do meu quarto. 

Tentei me equilibrar nos saltos altos enquanto Kendra praticamente sorria e corria. Ao chegar à escada ela sorriu para mim e gesticulou para que eu fosse à frente. Respirando fundo mais uma vez, ergui delicadamente a barra do vestido e olhei para os degraus. Desci e foi então que percebi que todos os olhares estavam em mim. 

Levantei meus olhos para mais de cem pessoas espalhadas de preto e vermelho pelo salão da mansão e minhas bochechas coraram. Realmente todos me olhavam uns fascinados, outros curiosos e outros nada satisfeitos.

Por fim desci a escada e pisei firme no chão. Olhei para cima e Kendra havia sumido. Que droga, ela era a única que eu conhecia ali no meio de todos e eu me sentia envergonhada e constrangida. Mas, foi nesse momento que vi Heron. Ele estava conversando com duas lindas mulheres de preto e sentindo meu olhar, me olhou admirado. Sorriu e caminhou até mim. 

Fui até ele e seus braços me rodearam. 

- Você está estonteante. – ele murmurou em meu ouvido. 

Corei e me afastei um pouco. Olhei para os lados e vi as duas mulheres que ele estava conversando agora pouco, me olhando com veneno. Satisfeita, sorri para elas e acenei. Voltei meus braços em Heron. Pela primeira vez reparei no que ele estava vestindo. Era um smoking preto e elegante. Seus cabelos negros soltos nos ombros estavam penteados para trás e o transformava em um ator de Hollywood. 

- Você é que está lindo. – murmurei enquanto circulamos entre os convidados e os olhares se voltavam para mim. – Na verdade acho que suas amigas não gostaram quando você me abraçou.

- É pura inveja, amor. Você está inacreditável. – ele beijou minha nuca. 

Senti um arrepio e corei. 

- Vou te levar para seu pai. Ele queria que assim que você estivesse pronta, fosse até ele. Ao que parece você precisa ser apresentada a algumas pessoas importantes e sorrir o tempo inteiro. – ele riu. 

Suspirei, essa seria uma longa noite. 

Caminhamos por entre as pessoas que não tiravam os olhos de mim e no fundo do salão encontramos Lucian. Ele estava cercado por um grupo de senhores e algumas mulheres vestidas, eu diria, que provocantes e sensuais. Heron tocou o ombro de Lucian. 

- Bem, mas isso não terá problema algum... – ele murmurava para um senhor de terno preto e gravata vermelha. Ele se virou e sorriu ao me ver. – Deixe-me apresentar minha querida filha. Handora. 

Olhei para ele e não entendi por que ele estava me chamando de Handora. 

- Todos os novos demônios ganham um novo nome. O seu soou muito bem para quem você é agora, amor. - Heron soou aos meus ouvidos baixinho.

Handora. Forte. Simples. Difentente. Eu tinha gostado, era quem eu era agora.

O senhor de cabelos brancos e uma barriga elevada sorriu para mim e senti nojo, mas sorri em resposta. Lucian me apresentou a cada um deles, no entanto esqueci assim que ele pronunciava outro. 

- Como podem vê-la ainda não atingiu a maturidade. Mas, em um mês ela completará dezoito e se tornará meu braço direito. – ele sorriu como se eu fosse um troféu para ser exibido. 

- Sua filha é tentadoramente linda. – murmurou alguém atrás de mim. 

Me virei ainda com os braços em volta de Heron. Dei de cara com um negro alto e olhos incríveis verdes. Seu smoking feito sob medida ficava perfeito em seu corpo atlético e forte. Ele parecia ter quarenta e cinco anos. 

Ele sorriu e beijou meu rosto. 

- Eu sou Rimmon. Um prazer conhecê-la, Senhorita Handora. – ele sorriu. 

Rimmon cumprimentou Heron ao meu lado que olhava-o bravo com certeza enciumado pelo beijo no rosto. Em seguida Rimmon acenou para todos e deu um aperto de mãos em Lucian. 

- Handora, este será seu treinador. Dentro de dois dias você irá para o campo de treinamento dele. – Lucian disse. 

- Será um orgulho treiná-la. Sei que apenas por seus olhos que você é forte. Dará uma grande líder. Lucian não poderia ter escolhido uma pessoa melhor. – ele disse com os olhos cintilantes. 

Assenti. Não conseguia dizer nada, eu ainda estava constrangida pelos comentários dele. 

- Quer dar uma circulada? – perguntou Heron em meu ouvido, embora eu soubesse que todos ali tinham ouvidos apurados. 

- É uma grande ideia. – disse Lucian. – Apresente-a para os convidados. Todos vão adorar conhecê-la. – ele sorriu para mim como um pai amoroso e sorri de volta com desdém. 

Heron pegou minhas mãos e me puxou. Antes de irmos ouvi um comentário. 

- Eles estão juntos? – perguntou a morena que estava conversando com Heron e havia me olhado com veneno. 

Lucian nos olhou confuso e sem saber o que responder já que a pergunta tinha sido feita para ele, mas ele provavelmente queria que Heron ou eu respondesse. 

Porém, a resposta não veio de nenhum de nós dois. 

- Ela namora um anjo. – disse alto e claro, Ruanda. 

Ela vinha entre os convidados andando determinada e com os olhos pegando fogo. Seu olhar maldoso era dirigido às minhas mãos e de Heron juntas. Os convidados que estavam ao nosso redor nos olharam ultrajados e Lucian ficou em um impasse. 

Olhei para Ruanda e já estava ao meu lado. A raiva borbulhou por mim. Quem era ela para ficar falando da minha vida pessoal? Quem essa garota pensava que era? 

Com um sorriso orgulhoso no rosto me virei para a garota morena que tinha feito a pergunta à Lucian. 

- Sim. Estamos juntos. Eu namorava um anjo, mas isso bem antes de saber o que eu era. Terminamos há vários meses. E agora estou namorando Heron. E se me derem licença, preciso ir conhecer outras pessoas. – murmurei. 

Esbarrei meu ombro em Ruanda que era apenas cinco centímetros mais alta que eu, e suspeitava que apenas pelo salto mega alto preto. Olhei com veneno de volta para ela e sai com as mãos na de Heron. 

Sorrindo me afastei dela. 

- O que foi isso? – perguntou Heron enquanto andávamos. 

- Apenas a coloquei em seu devido lugar. Não ia aguentar o desaforo dela. – respondi e parei encostando-me a uma parede um pouco distante dos outros convidados.

- Mas, você tem certeza ao dizer que sou seu namorado? – ele perguntou com um sorriso brincando em seus lábios. 

- Sim. – sorri e passei as mãos pelo seu rosto. 

Eu sabia que estava colocando a carroça na frente dos bois ao falar que éramos namorados, mas eu estava disposta a mudar toda minha vida. Eu queria esquecer aquela menina e tola de uma semana. 

Eu estava crescendo e me transformando em uma mulher fria era verdade, mas que importância tinha isso? Eu era responsável por minhas atitudes e nada me impedia de fazer o que eu queria. 

Quando eu acreditei na única pessoa que me fizera sentir amor de verdade, ela me traiu com uma vaca e desistiu de lutar pelo que tínhamos planejado. E uma luta de um só não existe. E agora acabou. Eu era outra. Uma mulher completa e formada. Fria e calculada. Eu queria deixar ser o que eu era mesmo. Um Demônio cheio de atitudes e poderes. 

E eu tinha. E eu era. 

Heron passou a mão por um cacho que caia em meus olhos. 

- Percebi que você mudou muito desde o que aconteceu. Aliás, mudou radicalmente. – ele continuou com as mãos em meu rosto. – Só quero que saiba que estou aqui para tudo que você precisar. E se para isso tenho que fingir um namoro, bem por mim, ok. – ele sorriu.

De salto eu era apenas alguns centímetros mais baixa que ele, e me aproximei de seu ouvido. 

- Quem disse em fingir? – sorri atrevida. 

Os olhos de Heron se arregalaram um pouco e depois se suavizaram. Sua boca se aproximou da minha e seu hálito quente soprou em meu rosto, suspirei quente. 

- Faz quanto tempo que você não se alimenta de verdade? – perguntou. 

Lembrei que a última vez que eu realmente tinha cravado os dentes em algo e comido de verdade, era quando eu tinha feito amor pela última vez com Melahel. Rapidamente afastei os pensamentos nele, e olhei fixamente para Heron. 

- Uma semana e meia. – sorri. 

- Bem, então vamos dar um jeito nisso hoje a noite. – ele se aproximou mais e sua boca tocou de leve a minha. – Agora venha antes que eu perca o controle. 

Heron me puxou pela mão e conforme andávamos ele ia me apresentando às pessoas. 

Tinha que dizer, que nem todos os Demônios tinham cara de Demônios. Alguns tinham feições mais malvadas, outras tão belas que parecia um anjo ao invés de Demônios. Eu não via o mal circulando por ali, como se tivessem acabado de abrir as portas do Inferno. 

Parecia mais realmente uma festa de gala, com os músicos tocando músicas lentas e calmas para os convidados, embora eu não soubesse se os músicos eram Demônios ou apenas humanos. Rezei para que fossem Demônios, afinal ali todo mundo tinha fome por sangue. 

E tudo transcorreu mais normal do que eu poderia imaginar. Heron não saia do meu lado e sinceramente aquilo me fez ficar mais forte e me deu autoconfiança que antes eu nunca tive em minha vida. Rodopiei por todos os cantos com ele, e consegui fingir extrema felicidade com a festa e naturalidade de alguém que adorava o poder que estava sendo colocado em suas mãos. 

No meio da festa os músicos começaram a tocar músicas mais apaixonantes e ainda mais lentas. 

 - Venha. Quero que todos te vejam comigo. – Heron disse nesse momento e me puxou para a pista de dança que estava montada em uma ala perto do bar que servia bebidas, petiscos e sangue, é claro. 

- Mas, eu não sei dançar! – falei. 

- É só me acompanhar. – ele sorriu. 

Assenti e sorri. Ele me puxou para o meio dos casais dançantes e parou, pegando-me pela cintura e em seguida começando a dançar para lá e pra cá devagar. Tentei acompanhar seu ritmo e logo já estava aprendendo os passos da dança sem esforço. Não era assim tão difícil. 

Estava tão concentrada em aprender os passos, que demorei em perceber que apenas eu e Heron dançávamos esfuziantes pela pista. Os outros casais estavam amontoados no final da pista observando como eu dançava com Heron. Quase tropecei e ele me segurou. 

Heron sorriu. 

- Continuei tranquila. É só uma plateia. Eles querem ver você. Você é filha do irmão de Lúcifer, e isso não seria para menos. Venha, e me acompanhe. – Heron disse. 

Ele então começou a aumentar os passos e valsar sobre a pista. Não foi difícil acompanhar e dali a pouco estávamos dançando como um casal em uma competição de dança. Perfeita e encantadoramente giramos, juntos, intensos e gloriosos . Ofuscando qualquer um que quisesse nos acompanhar. 

A música terminou e Heron parou junto com ela. Todos nos olharam e bateram palmas. Corei e Heron me puxou para fora da pista. Ele caminhou para longe e os outros convidados voltaram a dançar. 

-Você é a mulher mais linda que já vi, amor. - os olhos dele tão profundos e escuros estavam regados de algo profano e íntimo.

Meu rosto esquentou ainda mais. 

A festa seguiu até a madrugada e meus pés doíam quando por fim o último convidado foi embora. E claro que tive que ficar para me despedir com uma anfitriã gentil. 

Estava subindo as escadas de mãos dadas com Heron, quando Lucian nos chamou. 

Nos viramos e ele acenou para irmos até ele. Suspirei e olhei para ele impaciente. 

- Esse romance é de verdade? – perguntou ele de braços cruzados sobre o terno todo preto. 

- Sim. – respondi sem hesitar. 

Ele ficou quieto durante alguns segundos e avaliou nossas mãos juntas. E em seguida assentiu. 

- Só espero que não estejam me enganando. E, Heron, cuide dela ou eu matarei você cruelmente, entendeu? – ele fixou seus olhos em Heron. 

- Sim, Senhor. – ele respondeu calmo. 

- Ótimo. E isso me deixou muito feliz. – ele sorriu antes de sumir pelo hall. 

- Às vezes ele me intriga. - murmurou Heron me puxando pelas escadas. 

- Ele apenas está pensando em si próprio. Se ele não me tiver ao seu lado, como vai dar conta de tudo sozinho? – falei e caminhamos pelo corredor. 

Heron abriu a porta do meu quarto e entramos. Trancou e ele não acendeu a luz. Olhei em volta. A luz da Lua entrava pela janela do meu quarto e iluminava minha cama e todo resto. Ciente em cada poro pela presença de Heron, caminhei para meu closet para tirar o vestido e os sapatos que já estava doendo e apertando. 

Heron se sentou na cama e tirou a gravata borboleta, em seguida o terno e desabotoou quatro botões da camisa. O Demônio dentro de mim sorriu e rugiu com fome. Calma, amigo, murmurei mentalmente. 

 Soltei meu penteado e meus cabelos caíram por meus ombros cacheados e brilhantes. Me olhei no espelho e meu corpete e calcinha preta destacavam minha pele translúcida. 

Sorrindo voltei ao quarto e Heron estava estendido em minha cama apenas de cueca preta. 

- Você é rápido. – murmurei. 

Ele correu inumanamente até mim. Mas, ao parar na minha frente, delicadamente beijou o canto de meus lábios. Sua boca trilhou beijos, descendo em direção ao colo e ele foi me levando, até me encostar à parede com mais força. Rosnei de prazer e seus lábios tocaram os meus vorazes. Ele me pegou no colo e me levou para cama. 

Seus beijos me deixaram zonza e completamente em combustão. Queria o para mim agora. Minhas unhas cravaram em sua pele enquanto seus lábios exploravam meu corpo. Gemi e me contorci quando seus lábios gélidos voltaram para os meus e suas mãos delicadamente arrancaram meu corpete e o jogaram no chão.

- Você tem certeza do que está fazendo? – ele murmurou em meu ouvido enquanto mordiscava minha orelha. 

- Tenho. – sorri e então mordi a pele de seu ombro.

O sangue explodiu em minha boca e a fome doeu meu estômago. Com tantas coisas acontecendo eu mal havia me alimentado. E agora eu realmente sentia o peso de como eu havia sentido falta disso. 

Suguei e suguei para dentro. A força revitalizou minha pele e senti meu sangue bombear mais rápido. O Demônio dentro de mim sorriu e os lábios de Heron beijavam meu pescoço. 

Aquilo me deu ainda mais prazer. E quando finalmente me senti satisfeita, beijei seu ombro e a mordida se fechou. Subi meus lábios para seu pescoço e então para sua boca. Heron soltou um gemido e suas mãos me apertaram mais. Ele tirou as poucas roupas que restavam.

Ele mais uma vez deixou seus lábios passear por mim e aquilo me deixava ainda mais em chamas. Era uma paixão devastadora que existia entre nós, mas mais do que isso, éramos feitos da mesma escuridão e no meio do abismo de nossas almas condenadas, nos pertencemos por completo. 

Heron juntou meu corpo ao dele e por inteiro, éramos escuridão e caos.  


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