**Ryan**O quarto parece um refúgio antigo congelado no tempo. Apesar dos anos, tudo está exatamente como deixei: as paredes ainda exibem as pinturas que fiz à mão, os pôsteres das bandas que nem ouço mais pendem como fantasmas do passado, e a cama, um mar de lençóis amassados, me recebe com uma nostalgia sufocante. Uma brisa suave entra pela janela entreaberta, trazendo o cheiro distante da festa lá fora, um eco de risadas e música que parece zombar de mim. O que estou fazendo aqui? Por que voltei a esse lugar que tanto me lembra uma vida que achei ter deixado para trás?Cristhian foi embora, e eu fiquei preso neste canto, cercado por memórias que reverberam como uma melodia desgastada. Meus passos são leves enquanto ando pelo quarto, tocando cada superfície, cada objeto. Há algo inquietante nessa intemporalidade. Este espaço permaneceu intacto enquanto eu mudei, cresci. A vida nas ruas me ensinou muito, mas ainda assim sinto que algo me prende aqui.Me aproximo da velha escrivaninha
***Sarah*** Enquanto me arrumava para a festa de aniversário de Ryan, uma mistura de nervosismo e empolgação tomava conta de mim. A expectativa daquela festa era demais para mim; não era apenas mais uma chance de me aproximar de Cristhian e dos Vandervert, mas o plano de Xavier finalmente começaria a funcionar. Estava no banheiro, cercada por luzes brilhantes e um espelho que refletia uma mulher que tinha lutado para se libertar das sombras do passado. Com movimentos delicados, apliquei a maquiagem, destacando meus olhos com um delineador que fazia sua cor brilhar. Meus lábios, pintados de vermelho, eram o símbolo da minha nova identidade. Aquela noite, daria um passo crucial. Já havia me aproximado dos Vandervert o suficiente para começar a colher provas. A vingança era um prato que se comia frio, como Xavier sempre dizia. Ele mesmo tinha preparado todas as instruções do que eu precisava fazer. Escolhi um vestido preto justo, que acentuava minhas curvas. Olhei para o espelho
**Elena** Nessa altura, eu já era a vilã da história. Para ser honesta, eu gostava de ser a vilã, mas não na frente do Cristhian. Eu me esforcei tanto para ser exatamente o que ele queria, e tinha que vir aquele maldito moleque para estragar tudo. Decidi esperar no meu lugar na mesa da família, onde supostamente deveriam estar Richard, Melissa, Anastasia e Anabel, mas cada um parecia ter seus próprios interesses. Ryan era incapaz de se comportar ou sequer chegar sozinho ao quarto. Ele era uma das pessoas que eu mais odiava: sempre rindo, despreocupado com a vida. Melissa estava cuidando para que toda a organização do evento saísse perfeita. Aquela velha maldita era uma controladora de primeira. Já Anabel havia engordado uns mil quilos e estava sentada como uma vaca gigante, amamentando o terceiro filho. Sozinha, enquanto as outras duas crias faziam uma zona com a comida na mesa. E o pai? Ah, ele estava muito bem, obrigado, bebendo um drink no bar. Anastasia nem veio, e, para ser s
**Sarah** O vento sacudia violentamente os galhos das árvores, e a chuva parecia não ter fim. Cada gota que caía sobre mim parecia mais pesada que a anterior, me afundando ainda mais na terra encharcada do cemitério. Não muito longe, Cristhian estava de joelhos diante da lápide de Sarah, minha lápide. Seus ombros, que antes representavam toda sua imponência, agora tremiam sob o peso do arrependimento. Eu o observava em silêncio, escondida na escuridão da noite, com meu coração batendo tão forte que temi que ele pudesse ouvi-lo, mesmo com o rugido do vento.Nunca imaginei ver Cristhian assim. Em cada encontro nosso, ele era o homem frio, calculista, alguém que raramente mostrava qualquer vulnerabilidade. Mas ali estava ele, destruído diante da lápide de uma esposa que nunca amou. Era difícil processar isso. Vim até aqui para me manter firme no meu propósito, para lembrar por que precisava destruí-lo e acabar com toda a sua família. Mas o que eu via me despedaçava por dentro.Fiquei a
**Elena**Liguei para o Cristhian, desesperada, pela milésima vez. Mil vezes! E o idiota não atendia. Desliguei o telefone com tanta raiva que quase quebro a tela. Respirei fundo, tentando me acalmar, mas foi inútil. O pior não era ele não atender; o pior era saber onde ele estava, e isso me deixava ainda mais louca. Abri o aplicativo que usava para rastrear o celular dele. Sim, eu o rastreava, e daí? Cristhian não podia ter segredos comigo. O telefone mostrava a localização exata dele, e ele estava longe, muito longe.O apartamento estava em completo silêncio, só se ouvia o eco dos meus saltos no piso de mármore. Apesar de toda a sua elegância, aquele lugar sempre me pareceu vazio, impessoal. Glamurosos, sim, como tudo o que ele tinha, mas frios. As cortinas de veludo vermelho, as obras de arte que ele nunca olhava, o sofá de couro italiano onde ninguém se sentava. Era como se cada canto daquele apartamento gritasse o que eu sentia por dentro: solidão. Mas não uma solidão triste, não
**Elena**A porta continuava fechada, e a paciência que eu nunca tive estava se esgotando. O ar úmido entrava por baixo da minha jaqueta, mas eu ignorei. Isso não importava. O que não dava para ignorar era a imagem do Cristhian lá dentro, com ela. Eu sabia que ele estava com alguém, sentia isso nos meus ossos, e se ele não abrisse aquela maldita porta logo, eu ia arrombá-la eu mesma.Bati mais forte, dessa vez.—¡Cristhian! ¡Abre essa maldita porta!O vento ria de mim, me fazendo me sentir estúpida por estar ali, batendo como uma louca, mas não me importava. Eu não era a louca. Ele era o idiota.Finalmente, a porta se abriu. E claro, tinha que ser ela. Rubí, com aquela cara de "estou acima de tudo" que me fazia ferver de raiva. O que ela pensava que era? Nem tentou disfarçar, ficou ali na porta, sorrindo. Sorrindo.—¿Elena? —ela disse com uma voz que me deu vontade de arrancar da garganta. Ela sorria como se não fosse a razão de tudo na minha vida estar desmoronando. Como se fosse tão
**Sarah**O ar frio me atingiu quando saí da cabana, e a chuva escorria pelos vidros da janela, como se o mundo exterior sentisse pena do meu tormento interno. O motorista havia deixado o carro e pegado um táxi, me deixando sozinha com meus pensamentos. Cada curva do volante parecia me afastar mais da cabana, e de Cristhian, mas também me aproximava mais das minhas lembranças.Enquanto dirigia, o telefone vibrou no banco do passageiro. Uma ligação de Xavier. Sua voz, sempre firme e controlada, ecoou nos meus ouvidos.— Tive que voltar mais cedo, Rubí. Tem algumas coisas que preciso resolver.A palavra "coisas" me deu um calafrio. Era assim que ele costumava falar, como se o mundo girasse em torno dele e todos nós tivéssemos que nos ajustar à sua agenda. Mesmo assim, tentei manter a calma.— Tudo bem. Te espero em casa.Desliguei, sentindo que cada palavra dita se afastava de mim, como se cada vez que falava com ele, uma parte de mim desaparecesse. Quando cheguei em casa, a solidão me
*Xavier**O silêncio do escritório é perfeito, tão impecável quanto o tapete de lã tibetana sob meus pés, uma peça que custou mais do que alguém do meu passado poderia imaginar. As paredes estão adornadas com obras de arte exclusivas, mas há uma em particular, uma pintura do Renascimento, que ocupa um lugar especial. Eu a comprei em um leilão privado, depois de uma feroz competição com colecionadores que claramente não sabiam com quem estavam lidando. O couro italiano da minha cadeira estala sob meu peso enquanto observo a cidade pela janela. Tudo o que vejo daqui, eu conquistei, peça por peça.— Feito, senhor Xanders — a voz de Julius me tira dos meus pensamentos.Não levanto os olhos da pequena escultura de bronze na minha mesa, uma daquelas edições limitadas que alguns chamariam de "minimalista". Mas o preço dela seria suficiente para alimentar uma família por meses. É irônico.— Feito, senhor Xanders — diz Julius, meu empregado mais leal, depois de desligar o telefone.Assinto, ma