**Xavier** —Rainha em G5 —disse Kiara, com aquele tom suave, mas implacável. Olhei para o tabuleiro. Meu rei estava encurralado. O telefone encostado na minha orelha parecia pesar cada vez mais à medida que a partida avançava. Eu não tinha Kiara na minha frente, mas quase podia imaginar a expressão dela: aquele sorriso calculado no rosto enquanto me encurralava no jogo. Era paciente, mas insistente, sempre sabendo exatamente quando atacar e como. —E aí? Já conseguiu o que pedi? —A pergunta que eu sabia que viria. As peças de ébano e marfim que estavam organizadas cuidadosamente sobre a mesa do meu escritório pareciam agora mais sufocantes. —Você precisa ter paciência, Kiara. Você sabe que não é fácil. Torre em C6. —Anunciei o movimento, tentando ganhar algum espaço no tabuleiro. Era um movimento desesperado, e eu sabia disso, mas Kiara tinha o poder sobrenatural de me desestabilizar, até em um jogo de xadrez à distância. Ouvi uma risada suave do outro lado da linha que mexeu com
O apartamento de Devon no "Elysium Golden" estava exatamente como eu lembrava. Nunca consegui entender como uma pessoa pode viver tanto tempo no mesmo lugar sem mudar nada. Se eu fosse obrigado a passar tanto tempo assim num só lugar, pelo menos faria uma reforma completa de vez em quando. —Você é Devon Kresler? —perguntou Rubi, pegando um livro de uma das prateleiras. Eu quase tinha esquecido que ela também estava ali. Precisava dar um jeito de fazê-la ir embora. —Você leu meus livros? —respondeu Devon com outra pergunta. Tinha aquela expressão no rosto, aquele sorriso que ele sempre fazia quando recebia atenção ou elogios pelo trabalho. Ainda era um maldito narcisista, e continuava usando o charme em cada palavra ou gesto como uma arma. —Todos, sem exceção! —respondeu Rubi, com entusiasmo. —Mas *A Teoria dos Pontos de Poder* foi o melhor de todos. —Ah, são só besteiras que ele escreve quando tá bêbado —comentei, sentindo um pouco de ciúmes da admiração dela por Devon. Eles n
—Foi culpa minha —Ryan me interrompeu, dizendo as palavras que eu deveria dizer. Ele não precisava me poupar, mas, ainda assim, o fez. —Eu não devia estar lá —continuou, enquanto mexia no bolso da calça. Seus dedos encontraram algo pequeno. Uma bolsinha de pó branco. Ele apertou o pacotinho com força, encarando a mão fechada como se estivesse travando uma batalha interna. Seus lábios ficaram tensos, e as bochechas coraram. Com um movimento firme, ele abriu a janela e jogou o pacote para fora.—Então... fico feliz que você tenha levado aquela surra —respondi, talvez de forma cruel, mas era melhor assim. Eu tinha cometido um deslize e quase me expus. Como pude sequer cogitar confessar que Xavier tinha mandado assaltar Ryan? Um peso saiu dos meus ombros ao perceber que não falei nada. Respirei fundo, como se estivesse segurando o ar há horas, e soltei um suspiro alto. —Você tem preferência por algum hospital? —perguntei, tentando mudar de assunto. Só então me dei conta de que nem tinha a
**Sarah** Quando entrei em casa, Xavier estava sentado no sofá, com as pernas cruzadas e um livro no colo, tranquilo, relaxado. Como ele conseguia estar assim depois de ter mandado Ryan para o hospital? — Conseguiu o que precisava? — não consegui evitar o tom de reprovação, e ele percebeu na hora. Tirei os sapatos e me sentei na poltrona em frente a ele. — Como está o garoto? — perguntou sem tirar os olhos do livro. Ele tinha essa maldita mania de responder uma pergunta com outra, e isso me irritava. — Você fez bem em levá-lo ao hospital — acrescentou, ainda olhando o livro. — Agora ele acha que você se preocupa de verdade com ele e que sua amizade é sincera. — Sim, ele está na minha mão — respondi, fingindo ser uma vilã, mas eu não era. Eu realmente me importava com Ryan; ficar com ele no hospital não fazia parte de nenhum plano ou estratégia de vingança. — Quem te trouxe pra casa? — perguntou, fechando o livro como se não soubesse cada um dos meus passos. — Cristhian — r
**Sarah**Abri a bolsa e, além de uma carteira, encontrei um frasco de comprimidos. “Dyana K.” era o nome na etiqueta; o remédio era algo como “oxi...” alguma coisa que eu não sabia pronunciar. Coloquei um comprimido na boca dela, e duvidei que ela conseguisse engolir sem água, mas o fez, como se não fosse nada. Abri um pacote de biscoitos para Addy, o que acabou sendo o distração perfeita. Observei a garota: o cabelo dela era loiro e bem curtinho, quase masculino. Usava uma calça larga de linho branca, uma blusa de seda branca e um blazer amarelo. O estilo dela era uma mistura de boêmio e elegante. Não parecia uma viciada, exceto pelo jeito que os ossos dela se destacavam sob a pele.—Ob...ob...rig...da —murmurou, o corpo cambaleando, e eu a segurei. O perfume dela era uma mistura de madeira e café.—Muito obrigada —disse finalmente—. Não sei o que teria feito sem você.O remédio parecia ter ligado um botão no corpo dela: ela já não parecia tão tensa; as mãos tinham largado o carrinh
SarahMeu nome é Sarah Blake, e minha história começa no dia que deveria ser o mais feliz da minha vida: o dia do meu casamento.Os estilistas terminaram de me arrumar depois de quatro longas horas. Quando me olhei no espelho, não me reconheci. O vestido feito sob medida era o mais lindo do mundo. O penteado, a maquiagem, as joias... tudo parecia um sonho.Como uma pessoa como eu podia se casar com um Vandervert? Essa pergunta não saía da minha cabeça desde o dia em que me deram a notícia. Por quê eu? O que eu tinha de especial? O jovem Cristhian nunca tinha me olhado de verdade. A frase mais longa que ele tinha me dito na vida foi algo como: "O chão está sujo, vá limpar." E lá estava eu, uma semana depois de completar dezoito anos, me casando com aquele rapaz rico, bonito e elegante.Talvez ele tivesse se apaixonado perdidamente por mim e enfrentado seus pais, dizendo que se casaria com a filha da empregada, mesmo que o mundo estivesse contra. Aquilo não fazia o menor sentido, mas al
Sarah—Sarah! —a voz de Cristhian me despertou. Eu nem sabia em que momento tinha conseguido pegar no sono; minhas pálpebras estavam tão inchadas de tanto chorar que mal conseguia abrir os olhos.—Oi —murmurei, sentando de um salto na beirada da cama. Era estranho acordar e vê-lo ali. Levantei e olhei ao redor, procurando algo para limpar ou arrumar; eu já estava programada para isso. Peguei alguns lençóis e comecei a dobrá-los.—Deixe isso —disse ele, irritado, parado no batente da porta. Ele não usava mais o terno do casamento; estava de jeans e camiseta. Olhou para o relógio, depois para mim, franzindo a testa. —Troque de roupa —ordenou—, nosso voo sai em uma hora.—Nosso voo? —perguntei enquanto esfregava os olhos. Ele me olhou indignado, mas sua expressão mudou em um segundo; ele sorriu e soltou o ar pelo nariz, num resmungo.—Casei com uma mulher comum como você —disse, dando passos lentos na minha direção. Olhou nos meus olhos; eu desviei o olhar, e meu coração se encolheu dent
SarahA festa de aniversário foi igual a todas as outras: muitas pessoas desconhecidas, inúmeros fotógrafos e jornalistas de revistas de celebridades, sempre à espreita dos mínimos detalhes de nossas vidas, com os quais eu estava completamente proibida de interagir. Só me era permitido posar para as fotos; jamais deveria conversar com alguém que não fosse um Vandervert. Nem mesmo podia dizer meu verdadeiro sobrenome. Para o mundo inteiro, Cristhian Vandervert havia se casado com Sarah Bennet, uma jovem de família humilde que vivia em uma pequena cidade rural, a horas de distância da cidade mais próxima, e que havia conquistado o coração do magnata; alguém sobre quem ninguém sabia nada antes de se tornar Sarah Vandervert.Cristhian e eu chegamos vestidos com roupas da mesma cor; naquele ano, minha sogra havia escolhido o turquesa, e o tema da festa era "floresta encantada". Tudo estava lindo e perfeito, como sempre.Posamos para as fotos com aqueles sorrisos rígidos aos quais havíamos