Helena despertou com o peso esmagador da decisão que havia tomado. A assinatura do contrato não era apenas um ato ousado — era uma rendição. Ao abrir os olhos, ela se sentiu em um campo minado, cada passo adiante prometendo mais instabilidade.
Tomou um banho longo, como se a água pudesse levar consigo o turbilhão de pensamentos. Mas ao encarar o espelho, a mulher que via não parecia mais a mesma. Seus olhos refletiam incertezas e medos que ela não ousava admitir. Vestiu-se e prendeu o cabelo em um coque firme, como se a aparência impecável pudesse mascarar sua inquietação interna. Mas a cada movimento, sentia o fardo invisível que agora carregava: ser, mesmo que por contrato, a esposa de Eduardo Vasconcelos. No caminho para o trabalho, o celular vibrou com uma nova mensagem. Eduardo, em sua habitual falta de gentileza, enviara apenas uma ordem: **"Sala de reuniões 9h em ponto. Não se atrase."** Helena bufou e fechou os olhos por um momento. Ela nunca se atrasava, mas sabia que isso não importava para Eduardo. Ao chegar na empresa, foi recebida pela atmosfera de sempre: séria, impecável, impessoal. Caminhou pelos corredores até a sala de reuniões, onde Eduardo já estava sentado à cabeceira da mesa. Pastas e documentos ocupavam boa parte do espaço, mas era a figura dele que dominava completamente o ambiente. Ele levantou os olhos para ela, então olhou para o relógio de pulso. — Está atrasada — declarou, sua voz tão cortante quanto sempre. Helena sentiu o sangue ferver. — Cheguei no horário — retrucou, mantendo a voz controlada. Eduardo inclinou-se levemente para frente, os olhos semicerrados. — Quem chega no horário já está atrasado. Pontualidade, Helena, é estar antes da hora marcada. Ela mordeu a língua para não retrucar. Sabia que Eduardo se alimentava de confrontos, especialmente quando estava no controle. Sentou-se ao lado dele, mantendo a postura ereta e o queixo levemente erguido, como uma barreira contra a intensidade do olhar dele. A tensão no ar era quase palpável, como se cada movimento carregasse uma ameaça velada. — O contrato foi encaminhado ao meu advogado. Está tudo certo — disse ele, com a naturalidade de quem fala sobre o clima. — Que ótimo — murmurou Helena, sem emoção, concentrando-se em manter o tom neutro. — Amanhã cedo iremos ao cartório. Depois disso, você se muda para minha casa. Helena arregalou os olhos. — Amanhã? — Está no contrato. A partir do momento em que você virar minha esposa, terá que morar comigo. Afinal, esposas moram com os maridos. A naturalidade com que ele dizia aquilo era desconcertante. Parecia apenas mais uma cláusula, uma obrigação contratual, sem nenhum traço de humanidade. Eduardo a observou com olhos semicerrados, como se analisasse sua alma. — Não esperava que você fosse hesitar logo agora. — Não estou hesitando. Só estou processando tudo — respondeu ela, lutando para não transparecer a insegurança. — Então processe rápido. Não gosto de incertezas. Helena desviou o olhar, encarando o tampo da mesa como se aquilo pudesse oferecer respostas. Sua vontade era sair correndo daquela sala, mas sabia que não podia. Era tarde demais para recuar. Durante o resto do expediente, Helena se dedicou ao trabalho com intensidade redobrada. Cada tarefa era realizada com foco absoluto, quase como um anestésico contra os pensamentos que ameaçavam dominá-la. Ainda assim, Eduardo parecia estar por toda parte. Seu perfume amadeirado invadia o ambiente. Sua voz firme e precisa ecoava pelos corredores. Sua presença imponente a seguia como uma sombra. Ele entrava nas salas como se o mundo girasse ao seu redor. E, de certa forma, girava. As reuniões seguiam seu ritmo. As decisões eram tomadas com uma palavra sua. Helena sempre soube que Eduardo era autoritário, mas agora, com o contrato pendurado sobre suas cabeças, a arrogância dele parecia maior, mais agressiva, mais... sufocante. Na pausa para o café, Helena se encostou no balcão da copa, permitindo que sua mente vagasse por alguns instantes. Pensou em como as coisas haviam saído de controle tão rapidamente. O emprego que antes era seu porto seguro agora parecia uma prisão. E o homem que deveria ser apenas seu chefe agora era seu futuro "marido" — mesmo que por um ano. O celular vibrou novamente. Mais uma mensagem dele. **"Leve todos os seus documentos pessoais amanhã. Não esqueça."** Helena encarou a tela por alguns segundos antes de guardá-la no bolso. Nem se deu ao trabalho de responder. Apenas fechou os olhos por um momento e respirou fundo. O peso da responsabilidade era avassalador. Quando finalmente voltou para casa naquela noite, sentou-se na beirada da cama e permitiu que seus pensamentos tomassem forma. O quarto parecia mais frio, o travesseiro mais duro. Era como se o mundo ao seu redor a estivesse pressionando a desistir. Mas ela sabia que já tinha passado do ponto de retorno. Eduardo deixara claro que não era um homem com quem se brincava. A partir do momento em que assinara aquele contrato, não havia volta. Agora, a contagem regressiva havia começado. Em sua mente, a imagem de Eduardo parecia crescer, dominando tudo. Ele era o oposto de tudo o que conhecia e valorizava. Um homem de gelo, enquanto ela ainda se agarrava aos resquícios do calor de quem um dia sonhou em ser. Deitou-se e fechou os olhos. — Só preciso aguentar um ano — sussurrou para si mesma. Mas no fundo, ela sabia que o maior desafio não seria sobreviver a Eduardo. Seria sobreviver a si mesma.O dia começou com o peso esmagador da decisão que Helena havia tomado. Após assinar o contrato, cada escolha parecia encaminhá-la a um destino inevitável, como uma peça de um tabuleiro que não podia ser movida de outra forma. Antes de seguir para o cartório, um impulso a fez desviar o caminho. Precisava visitar o pai. Era uma necessidade emocional que não conseguia ignorar. Queria vê-lo, ouvir sua voz e, de alguma forma, reafirmar sua própria coragem. Na clínica, o ambiente era acolhedor, mas carregado de uma tensão invisível. Helena caminhava pelos corredores com passos rápidos, ignorando os olhares dos enfermeiros que a reconheciam. Quando entrou no quarto, seu pai estava sentado na cama, com o semblante sereno e fragilizado. Os olhos dele se iluminaram ao vê-la. — Helena, que surpresa boa — disse ele, com a voz baixa, mas gentil. Ela se aproximou, sentando-se ao lado dele na cadeira de plástico. — Como o senhor está? — perguntou, segurando sua mão gelada. Ele sorriu, o
As luzes do apartamento de Dona Vera brilhavam contra o entardecer, emanando uma atmosfera sofisticada que Helena imediatamente percebeu ser o oposto da mansão Vasconcelos. Aqui, tudo parecia mais aconchegante e pessoal, um reflexo direto da dona do lugar. Helena ajustou o vestido enquanto seguia Eduardo pelo hall de entrada. Apesar de sua postura impecável, sentia o peso de todas as expectativas que recaíam sobre ela. O casamento repentino não era apenas um acordo entre ela e Eduardo — agora envolvia a família dele, que ela teria que convencer. Dona Vera abriu a porta com um sorriso caloroso, a elegância evidente em cada movimento. Vestia um conjunto discreto, mas sofisticado, e sua presença iluminava o ambiente. — Ah, então esta é a famosa Helena! — disse Vera, avançando para abraçá-la com espontaneidade. Helena ficou paralisada por um momento antes de corresponder ao gesto. — É um prazer conhecê-la, Dona Vera — respondeu com um sorriso nervoso. — Nada de “Dona”! Me cham
A primeira manhã na mansão começou com um silêncio incômodo. Helena despertou cedo, mas o corpo ainda se acostumava ao colchão macio demais e à ausência de sons familiares. Por alguns segundos, se permitiu esquecer onde estava. Mas, ao abrir os olhos, o quarto espaçoso, os móveis minimalistas e frios trouxeram a realidade de volta. Era o contrato. Ela se levantou devagar, ainda de camisola, e seguiu para a cozinha, na esperança de encontrar um pouco de normalidade na nova rotina. Mas normalidade não era uma palavra que combinava com a vida que havia aceitado. Eduardo já estava lá. Arrumado, impecável em um terno escuro, tomando café em pé como se o dia tivesse começado horas atrás. — Bom dia — murmurou Helena, hesitante. Ele a olhou de relance, pegou uma caneca extra e empurrou na direção dela. — Café? — Por favor. Ela aceitou, tentando não parecer desconfortável. O silêncio entre os dois era espesso, quase palpável. Eduardo voltou sua atenção para o celular, enquant
Helena congelou ao ver a mulher parada no meio da sala, deslumbrante em um vestido vermelho que exalava confiança e arrogância. Laura, como ela acabara de se apresentar, parecia completamente à vontade, como se fosse dona do lugar. A maneira como segurava a taça de cristal e olhava ao redor da mansão fazia seu status claro: ela não se via como uma intrusa. Quando os olhos de Laura pousaram sobre Helena, havia algo nítido em seu olhar — desprezo. Era o tipo de olhar que avalia, desqualifica e decide que o outro não pertence ao mesmo mundo. — E quem é você? — perguntou Laura, com um tom cortante, a voz carregada de superioridade. — A nova empregada? A pergunta veio como um golpe, mas Helena manteve a compostura. Antes que pudesse responder, uma voz firme ecoou do topo da escada. — Esposa — disse Eduardo, descendo as escadas com passos firmes, a palavra saindo como uma lâmina no silêncio. Laura congelou por um breve momento, como se precisasse de tempo para processar o que ele
O clima entre eles havia mudado desde a visita inesperada de Laura. Ainda que não admitissem, algo havia se instalado entre os dois — uma tensão que já não era apenas parte do contrato. Era algo mais... mais perigoso. Helena evitava Eduardo na casa, refugiando-se no quarto de hóspedes, mesmo que seu nome estivesse oficialmente nos papéis como esposa. Ele, por sua vez, também parecia mais calado. As provocações diminuíram, mas o olhar dele... aquele olhar que parecia perfurar sua alma, estava sempre ali. Na empresa, o ambiente não ajudava. Naquela manhã, Helena chegou cedo para adiantar alguns relatórios. A sala de Eduardo estava fechada, mas seu nome já aparecia no sistema. Ele estava ali. E a tensão em seu estômago voltou com força. No meio da manhã, enquanto organizava arquivos na sala ao lado, o celular vibrou. Uma mensagem anônima. **“Você sabe com quem está casada?”** O coração de Helena disparou. Ela olhou em volta, como se alguém pudesse estar a observando. Respon
O silêncio entre eles era tão palpável quanto a tensão que parecia preenchê-lo. Desde que Helena tocou a mão de Eduardo e ele recuou, algo havia mudado. Aquele momento, breve e carregado, havia criado uma barreira invisível entre os dois — uma barreira que Helena não sabia como atravessar, e que Eduardo parecia determinado a manter. Na mansão, Eduardo evitava sua presença com uma precisão quase ensaiada. Não compartilhavam mais o café da manhã; os olhares trocados haviam perdido qualquer resquício de calor, e, quando se cruzavam pelos corredores, eram pouco mais do que estranhos — unidos por um contrato, mas separados por muros emocionais que cresciam dia após dia. Helena sentia o peso desse afastamento com mais força a cada hora que passava. Havia algo em Eduardo que ela não conseguia decifrar completamente, algo que ia além do contrato ou da história com Valentina. Ele não era apenas frio; ele parecia com medo. No trabalho, as coisas não eram melhores. Eduardo retomara sua pos
A manhã começou como qualquer outra, repleta de compromissos da empresa e da tensão silenciosa que já se tornara habitual entre Helena e Eduardo. Ela estava concentrada na revisão de documentos quando a voz firme dele a tirou do foco. — Temos um jantar de negócios hoje. Sete e meia. Vista-se adequadamente. — Eduardo disse sem sequer levantar os olhos do notebook. Helena ergueu uma sobrancelha, intrigada. — Jantar de negócios? E eu vou por quê? Ele finalmente a encarou, o olhar sério e direto como sempre. — Porque você é minha esposa, lembra? Ainda que apenas no papel, nossa imagem como casal precisa ser convincente. Principalmente para investidores internacionais. Eles valorizam estabilidade... familiar. Helena cruzou os braços, desconfiada. — E o que significa “vestir-se adequadamente”? — Algo elegante, discreto, mas que combine com a imagem de uma mulher à altura do nome Vasconcelos. Ela sentiu a provocação embutida, mas não deu o gostinho da resposta. Apenas assen
Helena entrou na sala de reuniões com o maxilar travado e os pensamentos ainda fervendo pelo jantar da noite anterior. Valentina não era só uma ex encrenqueira. Era uma ameaça declarada. E agora, depois daquela aparição teatral, ela tinha plena certeza: o que estava vivendo com Eduardo não era simples, nem controlável. A mensagem que recebera naquela manhã havia sido curta, seca e típica de Eduardo: "Preciso te ver. Agora."Ele estava de costas para a porta, encarando a parede de vidro. As mãos repousavam nos bolsos do paletó, mas a tensão em seus ombros era quase palpável. Helena parou na entrada, cruzou os braços e falou num tom duro: — Já tô aqui. Vai me dizer o que tá acontecendo ou vai continuar com esse suspense idiota? Eduardo se virou devagar, os olhos carregados de algo que ia além do cansaço. Havia uma gravidade ali, um peso que ele não conseguia esconder. — Entraram no nosso sistema. — A voz saiu firme, mas baixa. Helena franziu o cenho, tentando entender. — Sis