— Sente-se — a voz de Eduardo Vasconcelos cortou o silêncio como uma lâmina.
Helena parou na entrada do escritório, o coração acelerando. Havia algo no tom dele que a deixava em alerta, mais do que de costume. Respirou fundo, ajustando a postura, e obedeceu. Eduardo não era o tipo de homem com quem se discutia — não se trabalhava ao lado dele por três anos sem aprender isso. Quando finalmente se acomodou na cadeira, ele não perdeu tempo. Com um movimento firme, empurrou uma pasta de couro em sua direção. — Leia isso. Ela olhou para o objeto sobre a mesa como se fosse uma bomba prestes a explodir. Seus olhos subiram para encontrar os dele, mas Eduardo já estava recostado na cadeira, os braços cruzados, observando-a com aquela intensidade fria e calculista. — O que é isso? — ela perguntou, hesitante, mas já desconfiando da resposta. — Um contrato — respondeu ele, a voz neutra como sempre. — De casamento. O impacto daquelas palavras a fez piscar, desacreditada. Um contrato de casamento? Aquilo só podia ser algum tipo de brincadeira absurda. — Isso é uma piada? — ela perguntou, tentando esconder o nervosismo em sua voz. Eduardo não sorriu. — Não costumo brincar. Leia. Ainda incrédula, Helena abriu a pasta. Os olhos percorreram as linhas do documento, e cada palavra parecia pesar mais do que a anterior. Era exatamente o que ele havia dito: um contrato de casamento, com termos claros e objetivos. Vivência pública como casal por um ano. Sem envolvimento emocional. Regras e condições detalhadas em cláusulas tão frias quanto o homem à sua frente. — Por quê? — ela perguntou, fechando o documento e encarando-o. — Por que eu? Eduardo a observou por um momento antes de responder. — Porque você é discreta, eficiente... e não é feia. A declaração cortou como uma faca. Helena engoliu a raiva, mas a expressão em seu rosto entregava sua indignação. — Que elogio generoso, Eduardo. Ele ignorou o sarcasmo. — Eu preciso de uma esposa de fachada. E você precisa de estabilidade. Isso resolve o problema de ambos. Ela soltou uma risada nervosa, balançando a cabeça. — Você é inacreditável. — E você é inteligente o suficiente para saber que isso é uma boa oportunidade. O sorriso frio dele não alcançou os olhos. Por um instante, Helena teve vontade de jogar a pasta na cara dele e sair correndo daquela sala. Mas ela sabia que não tinha essa opção. — E se eu recusar? — ela perguntou, cruzando os braços. — Sua demissão será imediata — respondeu ele, implacável. — Sem recomendações. Duvido que encontre outra posição no mercado depois disso. Helena sentiu o chão sumir debaixo de seus pés. Eduardo sabia exatamente onde atacar. O salário que recebia ali era tudo o que sustentava os tratamentos do pai. Perder aquele emprego significava colocá-lo em risco, e isso ela não podia permitir. Ela olhou novamente para o contrato, relutante, até que uma cláusula chamou sua atenção: **"É expressamente proibido qualquer sentimento por parte da Sra. Helena com o contratante."** Ela ergueu os olhos para ele, sarcástica. — Uma cláusula contra sentimentos? Sério? — Precaução — ele respondeu, sem se abalar. — Já vi coisas piores acontecerem. — E você acha que eu seria capaz de me apaixonar por alguém como você? O sorriso dele cresceu, um gesto mínimo, mas irritante. — Já vi pessoas se apaixonarem por muito menos. Ela se levantou, empurrando a cadeira para trás. — Você é um monstro. Eduardo não negou. — Talvez. Mas sou um monstro que está te oferecendo uma saída. Helena sentiu-se enjaulada. Ele sabia exatamente onde pressionar, e isso a deixava ainda mais frustrada. Sem dizer outra palavra, ela pegou a pasta e saiu do escritório, o coração batendo rápido. --- Mais tarde, em casa, Helena encarava o contrato sobre a mesa. A caneta descansava ao lado, um lembrete cruel do que estava prestes a fazer. Pensou no pai, na expressão dele ao dizer que tudo ficaria bem, mesmo sabendo que não era verdade. Era por ele que estava ali, sacrificando sua própria felicidade. Quando finalmente pegou a caneta, sentiu como se estivesse assinando não apenas um contrato, mas sua própria sentença. — Você vai pagar por isso, Eduardo Vasconcelos — murmurou para si mesma. Mas no fundo, ela sabia que o maior preço seria o dela.Helena despertou com o peso esmagador da decisão que havia tomado. A assinatura do contrato não era apenas um ato ousado — era uma rendição. Ao abrir os olhos, ela se sentiu em um campo minado, cada passo adiante prometendo mais instabilidade. Tomou um banho longo, como se a água pudesse levar consigo o turbilhão de pensamentos. Mas ao encarar o espelho, a mulher que via não parecia mais a mesma. Seus olhos refletiam incertezas e medos que ela não ousava admitir. Vestiu-se e prendeu o cabelo em um coque firme, como se a aparência impecável pudesse mascarar sua inquietação interna. Mas a cada movimento, sentia o fardo invisível que agora carregava: ser, mesmo que por contrato, a esposa de Eduardo Vasconcelos. No caminho para o trabalho, o celular vibrou com uma nova mensagem. Eduardo, em sua habitual falta de gentileza, enviara apenas uma ordem: **"Sala de reuniões 9h em ponto. Não se atrase."** Helena bufou e fechou os olhos por um momento. Ela nunca se atrasava, mas sabia q
O dia começou com o peso esmagador da decisão que Helena havia tomado. Após assinar o contrato, cada escolha parecia encaminhá-la a um destino inevitável, como uma peça de um tabuleiro que não podia ser movida de outra forma. Antes de seguir para o cartório, um impulso a fez desviar o caminho. Precisava visitar o pai. Era uma necessidade emocional que não conseguia ignorar. Queria vê-lo, ouvir sua voz e, de alguma forma, reafirmar sua própria coragem. Na clínica, o ambiente era acolhedor, mas carregado de uma tensão invisível. Helena caminhava pelos corredores com passos rápidos, ignorando os olhares dos enfermeiros que a reconheciam. Quando entrou no quarto, seu pai estava sentado na cama, com o semblante sereno e fragilizado. Os olhos dele se iluminaram ao vê-la. — Helena, que surpresa boa — disse ele, com a voz baixa, mas gentil. Ela se aproximou, sentando-se ao lado dele na cadeira de plástico. — Como o senhor está? — perguntou, segurando sua mão gelada. Ele sorriu, o
As luzes do apartamento de Dona Vera brilhavam contra o entardecer, emanando uma atmosfera sofisticada que Helena imediatamente percebeu ser o oposto da mansão Vasconcelos. Aqui, tudo parecia mais aconchegante e pessoal, um reflexo direto da dona do lugar. Helena ajustou o vestido enquanto seguia Eduardo pelo hall de entrada. Apesar de sua postura impecável, sentia o peso de todas as expectativas que recaíam sobre ela. O casamento repentino não era apenas um acordo entre ela e Eduardo — agora envolvia a família dele, que ela teria que convencer. Dona Vera abriu a porta com um sorriso caloroso, a elegância evidente em cada movimento. Vestia um conjunto discreto, mas sofisticado, e sua presença iluminava o ambiente. — Ah, então esta é a famosa Helena! — disse Vera, avançando para abraçá-la com espontaneidade. Helena ficou paralisada por um momento antes de corresponder ao gesto. — É um prazer conhecê-la, Dona Vera — respondeu com um sorriso nervoso. — Nada de “Dona”! Me cham
A primeira manhã na mansão começou com um silêncio incômodo. Helena despertou cedo, mas o corpo ainda se acostumava ao colchão macio demais e à ausência de sons familiares. Por alguns segundos, se permitiu esquecer onde estava. Mas, ao abrir os olhos, o quarto espaçoso, os móveis minimalistas e frios trouxeram a realidade de volta. Era o contrato. Ela se levantou devagar, ainda de camisola, e seguiu para a cozinha, na esperança de encontrar um pouco de normalidade na nova rotina. Mas normalidade não era uma palavra que combinava com a vida que havia aceitado. Eduardo já estava lá. Arrumado, impecável em um terno escuro, tomando café em pé como se o dia tivesse começado horas atrás. — Bom dia — murmurou Helena, hesitante. Ele a olhou de relance, pegou uma caneca extra e empurrou na direção dela. — Café? — Por favor. Ela aceitou, tentando não parecer desconfortável. O silêncio entre os dois era espesso, quase palpável. Eduardo voltou sua atenção para o celular, enquant
Helena congelou ao ver a mulher parada no meio da sala, deslumbrante em um vestido vermelho que exalava confiança e arrogância. Laura, como ela acabara de se apresentar, parecia completamente à vontade, como se fosse dona do lugar. A maneira como segurava a taça de cristal e olhava ao redor da mansão fazia seu status claro: ela não se via como uma intrusa. Quando os olhos de Laura pousaram sobre Helena, havia algo nítido em seu olhar — desprezo. Era o tipo de olhar que avalia, desqualifica e decide que o outro não pertence ao mesmo mundo. — E quem é você? — perguntou Laura, com um tom cortante, a voz carregada de superioridade. — A nova empregada? A pergunta veio como um golpe, mas Helena manteve a compostura. Antes que pudesse responder, uma voz firme ecoou do topo da escada. — Esposa — disse Eduardo, descendo as escadas com passos firmes, a palavra saindo como uma lâmina no silêncio. Laura congelou por um breve momento, como se precisasse de tempo para processar o que ele
O clima entre eles havia mudado desde a visita inesperada de Laura. Ainda que não admitissem, algo havia se instalado entre os dois — uma tensão que já não era apenas parte do contrato. Era algo mais... mais perigoso. Helena evitava Eduardo na casa, refugiando-se no quarto de hóspedes, mesmo que seu nome estivesse oficialmente nos papéis como esposa. Ele, por sua vez, também parecia mais calado. As provocações diminuíram, mas o olhar dele... aquele olhar que parecia perfurar sua alma, estava sempre ali. Na empresa, o ambiente não ajudava. Naquela manhã, Helena chegou cedo para adiantar alguns relatórios. A sala de Eduardo estava fechada, mas seu nome já aparecia no sistema. Ele estava ali. E a tensão em seu estômago voltou com força. No meio da manhã, enquanto organizava arquivos na sala ao lado, o celular vibrou. Uma mensagem anônima. **“Você sabe com quem está casada?”** O coração de Helena disparou. Ela olhou em volta, como se alguém pudesse estar a observando. Respon
O silêncio entre eles era tão palpável quanto a tensão que parecia preenchê-lo. Desde que Helena tocou a mão de Eduardo e ele recuou, algo havia mudado. Aquele momento, breve e carregado, havia criado uma barreira invisível entre os dois — uma barreira que Helena não sabia como atravessar, e que Eduardo parecia determinado a manter. Na mansão, Eduardo evitava sua presença com uma precisão quase ensaiada. Não compartilhavam mais o café da manhã; os olhares trocados haviam perdido qualquer resquício de calor, e, quando se cruzavam pelos corredores, eram pouco mais do que estranhos — unidos por um contrato, mas separados por muros emocionais que cresciam dia após dia. Helena sentia o peso desse afastamento com mais força a cada hora que passava. Havia algo em Eduardo que ela não conseguia decifrar completamente, algo que ia além do contrato ou da história com Valentina. Ele não era apenas frio; ele parecia com medo. No trabalho, as coisas não eram melhores. Eduardo retomara sua pos
A manhã começou como qualquer outra, repleta de compromissos da empresa e da tensão silenciosa que já se tornara habitual entre Helena e Eduardo. Ela estava concentrada na revisão de documentos quando a voz firme dele a tirou do foco. — Temos um jantar de negócios hoje. Sete e meia. Vista-se adequadamente. — Eduardo disse sem sequer levantar os olhos do notebook. Helena ergueu uma sobrancelha, intrigada. — Jantar de negócios? E eu vou por quê? Ele finalmente a encarou, o olhar sério e direto como sempre. — Porque você é minha esposa, lembra? Ainda que apenas no papel, nossa imagem como casal precisa ser convincente. Principalmente para investidores internacionais. Eles valorizam estabilidade... familiar. Helena cruzou os braços, desconfiada. — E o que significa “vestir-se adequadamente”? — Algo elegante, discreto, mas que combine com a imagem de uma mulher à altura do nome Vasconcelos. Ela sentiu a provocação embutida, mas não deu o gostinho da resposta. Apenas assen