Gustavo.
— Você tem certeza? — Silvia, minha ex-mulher, me perguntou.
— Sim. Agora que o pior já passou e o Mateus está novamente sob os seus cuidados, ficarei um tempo fora.
— Vai realmente desistir dela? Por que não a procura mais uma vez?
— Eu tive a minha chance e a perdi. Não há motivos para insistir no assunto. — Fui enfático. Reviver aquela conversa não levaria a lugar algum.
Depois do meu reencontro desastroso com a Fabiana, desabafei com a pessoa mais improvável possível. No entanto, a minha tristeza exigia uma confissão, e conversar com Silvia acabou fazendo parte das circunstâncias inusitadas da vida.
Ela me ouviu com bastante atenção, compreendendo minhas decisões passadas. Culpou-se por ser parte integrante e principal do contexto, mas não permiti mais d
Impedir a viagem do Gustavo passou a ser a prioridade daquele dia. Um medo cresceu no peito quando cogitei a possibilidade de ele me esquecer durante os seis meses que ficasse longe, ou pior e, se ele encontrar outra pessoa que acalentasse seu coração machucado?Passei a dirigir o carro com puro terror, no momento que constatei, como algo totalmente fora do comum, as ruas apinhadas de pessoas e veículos, então me perguntei se o destino tentava intervir, outra vez, no meu futuro, criando mais obstáculos para me separar de Gustavo. Minha pulsação forte e agitada forçava a atenção no trânsito desenfreado e na velocidade que eu impunha. Quando estacionei em frente à casa dele, o suor escorria pelas costas, contudo, o celular atrapalhou a minha correria descabida, e xinguei ao pegar o aparelho na bolsa enquanto lutava com a trava da porta.— Oi. — A ansiedade ofuscava as boas mane
Um ano depois...A casa encontrava-se em silêncio absoluto naquela manhã de domingo. Os meninos saíram cedo com o meu irmão para jogar bola na quadra da escola, já a minha pequena passara o final de semana na casa da Rita, e Gustavo ainda dormia.Enquanto aguardava a fervura da água para o preparo do café, deixei que a mente vagasse pelas lembranças. Quando comecei a contar essa história, o meu único desejo era desabafar confessando as dúvidas, inseguranças e os medos que serpenteavam o coração. Revelar o quanto fui amada pelo Fábio, e a maneira como Gustavo me realizava, também fizeram parte da minha vontade. Talvez, sendo mais objetiva aqui, explicar a minha trajetória da perda ao renascimento.Fui sincera desde o início, ao prevenir uma rejeição, raiva, compaixão, ou, até mesmo, uma possí
Gratidão. Talvez os meus últimos quinzes anos pudessem ser resumidos nessa palavra, pensando melhor, acho que não. Faltaria mencionar felicidade, amor, compreensão, conversas ao pé do ouvido, ideias divergentes... Ah, provavelmente, uma mescla de tudo um pouco. Mas, uma coisa é certa, não posso reclamar. Na verdade, nem devo. Afinal, de certa forma, eu aceitei o meu destino.Meu casamento com Gustavo aconteceu como ele idealizou, porém, no lugar que eu escolhi. Uma cerimônia simples com a presença das crianças, da família e o mar como testemunha.Levou algum tempo para que a nossa união se concretizasse no papel, um gesto exigido por ele, não por mim. Um documento não chegaria aos pés da verdade: Gustavo era o meu mundo inteiro. Formávamos um elo resistente e poderoso, juntamente aos meus filhos que se tornaram nossos. Uma família com todos os pr
Não sei se você sentirá pena, raiva, desprezo, amor ou paixão. Se tomará para si a minha história, mas, mesmo assim, vou lhe contar.Aconteceu como qualquer clichê de um bom livro de romance, daqueles em que basta um olhar para todo seu mundo sair do eixo. Confesso que várias vezes me perguntei se seria assim mesmo ou se tudo não fazia parte de uma ficção. Nunca soube o que era ter esse olhar, nem quando conheci o meu marido. Sim! Eu sou casada! Pensou que seria fácil? Se fosse, não estaria aqui contando o que vivi e ainda vivo.Alguns poderiam dizer que fui muito bem-casada, e a sua maneira, meu marido era atencioso e carinhoso comigo e com os nossos três filhos. Sempre tive tudo: apoio da família e amigos, carinho, dinheiro, amor... Será? Por causa desses detalhes, me perguntava a toda hora o porquê de ter acontecido aquilo comigo. Destino? Pode
Bom, você pode imaginar como foi o meu final de semana? Uma batalha quase perdida para manter a calma e ficar centrada.Naquele sábado, saímos do estúdio mais tarde do que imaginávamos. A tatuagem do Sérgio era grande e rica em detalhes e levou um tempo precioso para ser concluída. Meu marido me perguntou a necessidade de outra sessão, e foi nesse ponto que surgiu a primeira de muitas mentiras. “Estava doendo e comecei a ficar de saco cheio”. Lógico que ele acreditou, não havia motivos para suspeitar uma vez que nunca se submetera à dor.Depois do estúdio, fomos direto para a casa dos meus cunhados, policiei-me o quanto pude para permanecer na conversa. Entretanto, regressei por várias vezes àquela sala, tão nítido quanto possível, ainda sentia o aroma do Gustavo, a cadência de sua voz e os olhos cor de azeviche.Quando re
Ele soltou a minha mão quando entramos na sua sala e, mesmo assim, percebi que relutou em fazê-lo. Senti-me abandonada quando perdi o seu calor e sem que eu percebesse, ele me tranquilizava. Agora me diz, onde eu andava com a cabeça? Estava tão perdida!Acomodei-me na maca e observei seus gestos. Ele ligou o iPod e, imediatamente, uma melodia saiu nos alto-falantes da sala: Extreme – More Than Words nos envolveu. Já falei que amo ouvir música? Sempre tenha em mente que quando digo amo estou me expressando por meio de letras garrafais. Ela me acalma, me excita e permite viajar, assim como um bom livro.Durante a minha história, você perceberá que muitas músicas aparecerão e esse detalhe não foi por acaso. Em um de nossos encontros, Gustavo me disse que trabalhava melhor quando a sala era preenchida pela mistura dos sons de uma bela canção com o ru&iacu
Ele me levou a uma cafeteria próxima ao estúdio. Um local simples, porém, aconchegante com mesas na parte da frente e, nos fundos, alguns sofás. No canto direito, bem ao lado do balcão, revistas e livros foram disponibilizados para os clientes. As paredes brancas com detalhes em creme serviam de apoio para vários quadros com figuras de sucos, doces e lanches.O ambiente estava praticamente vazio e os poucos frequentadores se misturavam com o aroma do café, com o tilintar de louças sendo lavadas e as vozes sussurradas da TV. Sentamo-nos na última mesa, um de frente ao outro. Gustavo pediu um suco com pão de queijo e eu pedi o meu básico, café puro. Não tinha fome e, graças ao meu nervosismo, comer era a última coisa que conseguiria fazer.Outra vez a conversa transcorreu de forma natural. Contou-me um pouco mais sobre a sua profissão, a época da faculda
A minha vida voltou “quase” ao normal. Depois de tanto chorar e fazer promessas e mais promessas, resolvi segui-las dentro da normalidade costumeira.O trabalho ajudava bastante, mantinha a cabeça ocupada. Em casa, como sempre, as crianças me davam trabalho e, até certo ponto, uma excelente distração. No casamento, aí... já era outra história. Estar presente, de corpo e alma, demandava um rigor severo. Com o mínimo de esforço, meu último pensamento antes de adormecer e o primeiro da manhã voltavam-se para o Gustavo. Tirá-lo da mente tornou-se, independentemente do meu empenho, uma tarefa hercúlea.O marido percebeu o meu afastamento e questionou, mas eu sempre encontrava uma mentira para contar. Como a gente aprende a mentir, né? Às vezes, o cansaço era o vilão; no outro dia, problemas no serviço ou a desobediência