SORRISO- Tarlisson! Você tem certeza disso, meu filho? - Minha coroa me encarava apreensiva, enquanto eu arrumava a minha mochila. - Já tomei a minha decisão, dona Talita - Fechei o ziper da mochila e peguei meu boné, colocando o mesmo - Vou piar aqui sempre que der, mãe! Fica tranquila - Falei a puxando pra um abraço e ela logo me apertou com toda a sua força.- Como eu vou ficar tranquila, Tarlisson?! Tu vai pra longe de mim e ainda vai continuar com essa vida errada aí... você sabe que não precisa disso - Falou me soltando. Ela ainda me encarava apreensiva, e até um pouco aborrecida também. Mas eu não poderia fazer nada, eu já tinha decidido e tirar um bagulho da minha cabeça era ossada. Eu não iria ficar aqui vendo o casal 20 subindo e descendo esse morro na maior melação, não mesmo. Sem as chance, menor. - Não vou ficar em um lugar que não me faz bem, se ligou?! Não dá não, mãe. Aturei muita piada da parte daquele fdp, se eu continuar aqui vai ser pra quebrar ele na madeira.
NEGUINHO- Calma aí, deixa pelo menos eu respirar - Falei parando no portão, passando a mão no peito.- Dário, pelo amor de Deus não vai desmaiar outra vez - A Martinha falou colocando as mãos na cintura, parando a minha frente - Vou te deixar cair no chão, garoto - Disse e eu olhei pra ela indignado.- Que isso, cara - Desencostei do portão - Não vou não, amor - Passei por ela - Mas quem vai abrir a porta dessa vez é tu - Falei e ela revirou os olhos, indo na minha frente.Ela passou na frente e eu fui atrás tentando conter meu nervosismo, o que era foda. Papo até de tremer eu tava. E pior que na primeira vez, menor, esse papo era bagulho sério e eu não queria nem imaginar como o Talibã reagiria agora.- Tem certeza que hoje é um bom dia pra contar? - Perguntei assim que entrei, com ela na minha frente - Porra, Marta! Eu tô tremendo, cara - Falei parando perto do sofá.- Vamos logo, para de graça - Ela falou me puxando, indo até a cozinha - Boa tarde família linda!!! - Me puxou, faze
3 meses depois.CLARADepois de tantas consultas por insistência da minha mãe, no terceiro mês da minha gestação a minha ginecologista nos revelou que ao invés de um, estavam a caminho dois bebês.De início, fiquei com um pouquinho de receio e medo junto do Rael. Eu era tão novinha. Seria uma gravidez de risco? Será que eu teria espaço para os dois alí? Mas em meio a conversas com a minha médica, ela me tranquilizou e tranquilizou o Rael. Não tinhamos riscos, mas para prevenir, eu teria que ter bastante repouso e uma boa alimentação. Acompanhada das vitaminas que ela me recomendou, e alguns remédios que ela julgou serem necessários para os enjoos.Hoje faço 5 meses de gestação. E como planejado, fariamos o chá revelação para saber o sexo dos bebês.- Tá maluco, eu fico lindão de azul! Olha isso - O Sorriso falou arrumando a camisa vendo o seu reflexo no espelho, e eu ri do quão convencido ele é.E enquanto a Martinha arrumava as alças do meu vestido, a Aninha terminava a minha make.-
CLARAA Ritinha desceu do carro primeiro e logo depois eu desci, sendo acompanhada pela Aninha e o Sorriso que desligou o carro e travou as portas, guardando as chaves no bolso da bermuda. Segurei na mãozinha da Rita e subi o batente, indo ao encontro do Rael.Entramos juntos, e assim que passamos da porta já era possível ouvir a música 9 meses ao fundo e ver todos os balões azuis e rosa que decoravam o teto da sala. E bem lá no meio, havia uma mesa com vários docinhos, roupinhas, lembrancinhas e no centro, um bolo metade rosa e metade azul.Tava tudo muito lindo. Fiquei apaixonada demais, e minha ansiedade em saber o resultado só aumentou quando vi três quadrinhos com os possíveis nomes para os convidados escolherem. Que se fossem meninos, seriam "Isaac e Cauã. Meninas, Rebeca e Hadassa e se fosse um casal, Ravi e Aylla.- Vacilo! Cadê o nome Charles aí? - O Sorriso perguntou parando perto da bancada - Não tem, então vou na dupla sertaneja - Disse pegando a caneta e uma folhinha azul
RAELDepois de ter passado boa parte da festa com a Clara e ter recebido felicidades de todos alí, eu consegui sair para agradecer.Eu poderia esperar para ir a uma igreja, ou até mesmo esperar que a festa acabasse e só agradecesse quando fosse dormir. Mas eu precisava mesmo fazer isso agora.Sai da casa pela porta da frente e dei a volta no jardim, subindo as escadas para a laje. Tava de tardezinha já. Um por do sol maneiro até e eu fiquei alí, só recordando tudo o que aconteceu comigo durante todos esses anos.Eu costumo dizer que se você perde algo é porque aquilo não era pra ser teu. Não vou mentir não, eu senti pra caralho quando perdi a Renata e o meu filho. Mas se o cara lá de cima quis daquele jeito, teve que ser. E eu ainda tinha a Rita, foi por ela que lutei para sobreviver. Me mantive forte e focado em cuidar dela, por isso qualquer bagulho que aparecia, eu encarava. Ia lá batalhar só pra ela não passar fome, assim como eu passei um dia. Foi tudo por ela.Quando fizeram aqu
MINHA REALIDADEMorro do Cantagalo, Rj.RAELCresci em um lugar onde a violência batia na minha porta. Não importava a hora, sempre era a mesma coisa. Um assasinato por dívidas de drogas, violência física e sexual contra a mulheres e crianças, e como era rotina, operações todos os dias com quem deveria nos proteger, matando quem viam pela frente sem se importa em saber se era um inocente ou realmente um bandido. E foi assim, desse modo, que a minha mulher morreu junto ao nosso filho que ela esperava, me deixando sozinho com a minha pequena, minha Ritinha.— Papai, quando tu chegar a gente pode ir tomar sorvete? — Rita perguntou enquanto eu penteava seus longos cabelos loiros.— Claro, gatinha. Vamos sim — prendi seu cabelo pra cima — bora, a Lis ta esperando tu lá na casa dela - Falei e ela pulou da cama com um sorriso de orelha a orelha.Sorri.Saí do quarto, arrumei a mochila dela com o lanche e fechei a porta do quintal.Arrumei minha mochila também, peguei meu boné no armador e jo
RAELEles me acusaram, me humilharam e me agrediram sem motivo. E se eu reagisse, seria pior, parcero. Me deixei ser tratado como bicho por aqueles filhos da puta.Aquela manhã foi a mais ralada da minha vida. Horrível, cara. Me esculacharam bonito, e depois me largaram no pé do morro, em uma rua entre o asfalto e a favela. Eu tava todo fodido, braço quebrado e os caralho.Todos que passavam ali faziam pouco-caso e nem me direcionavam o olhar, passavam rente. Papo de não ter amor ao próximo, tá ligado.Me arastei até a calçada de uma casa e caí por lá, o sol tava dando moca, calor tava foda e sem ao menos perceber eu apaguei.RICO- Dindo, o meu papai vai voltar né? - perguntou enquanto rabiscava alguns papéis.Fiquei calado. Eu nem sabia o que dizer. Eu não tinha o que dizer nessa porra.Respirei fundo, passei a mão pelo meu rosto e me sentei no sofá que tinha alí na salinha.Eu tava nervosão, parcero. Se ele rodasse eu não teria condições e nem estrutura pra criar a Ritinha. Maior
RAELAcordei com uma luz forte que tomava todo o quarto, e as paredes brancas deixavam tudo ainda mais claro.Tudo doía, cara. Meu corpo, meu rosto tava inchadasso, conseguia nem abrir os olhos direito e o braço que mesmo quebrado eu sentia menos, agora tá doendo pra caralho.Ouvi uma gritaria alí fora, e logo a porta foi aberta.— Tu é foda em — Sorriso falou e eu virei a cabeça com dificuldade vendo ele me encarar, risonho como sempre.Me apoiei no braço bom e me sentei na cama. Grunhir sentindo minhas costas doerem.— A Rita tá com a Aninha, e o Rico tá vendo um médico aí pra tu — falou, antes mesmo que eu perguntasse.Assenti sentindo um fisgada no pescoço, coloquei rápido a mão alí me desequilibrando e caindo deitado na cama novamente.— Ai caralho! — resmunguei de dor. Respirei fundo olhando pro teto de gesso.— Tá mal em, corajoso — Neguinho entrou no quarto — Só os covardes pegaram você aí, parceiro. Melhor forma é tu largar essa vida de moleque certinho, papo de visão — comen