O quarto destinado à ela, ficava no andar de cima. Era amplo e muito bem decorado, as janelas altas estavam totalmente abertas, deixando entrar a brisa da tarde. A região em volta era densamente arborizada e isso, dava uma sensação de frescor.
Logo a porta se abriu e uma fila de criados negros, vestidos de branco, entraram trazendo seus baús e uma enorme banheira de madeira.
Nossa! Um banho demorado era tudo que ela estava precisando. Os negros voltaram carregando baldes de água e despejaram na enorme tina de madeira. Uma negra baixa e gorducha entrou e começou a retirar suas roupas dos malões.
Beatrice se aproximou cheia de curiosidade. O que Gabriel teria colocado naquelas malas? Será que ele teria devolvido parte de suas roupas? Não! Nenhuma daquelas roupas lhe pertenciam. Ela começou a examinar as peças variadas, pareciam roupas novas, sem uso algum. Será que ele as te
Beatrice saiu para a varanda de seu quarto que dava vista para a rua. Inspirou profundamente e observou a cidade.Sob o céu estrelado, algumas carruagens abertas e coches percorriam as ruas ruidosamente, enquanto pessoas alegres riam nas calçadas. A cidade fervilhava de gente animada, com muito movimento nas casas de jogos e nas tabernas. Barracas coloridas vendiam de tudo aos passantes. Os limões-de-cheiro perfumavam o ar, eram inofensivos recipientes de cera que continham água perfumada em seu interior.Beatrice logo procurou saber tudo sobre aquela festa tradicional. O entrudo português, era uma festa popular, onde as pessoas caminhavam ou dançavam pelas ruas. Muitas usavam máscaras e brincavam entre si, jogando limão-de-cheiro umas nas outras e rindo muito diante da surpresa e algumas vezes da indignação das pessoas que eram atingidas. Outros jogavam farinha e papel picado, fazendo uma bagun
Depois de rodar meio sem rumo pela cidade, Gabriel foi até o Paço Real. Não conseguira dormir direito e depois de ficar cansado de rolar de um lado para o outro, resolveu sair. Acabou vindo conversar com o amigo, pois sabia que este acordava cedo, não importando há que horas fosse dormir. Sempre levantava cedo para fazer seus exercícios físicos, os quais, apregoava aos quatro cantos ser a melhor maneira de um homem manter o seu vigor. A esta hora já devia estar tomando o aperitivo antes do almoço.Gabriel parecia abatido naquela manhã, observou D. Pedro.- Nos proporcionou um belo espetáculo, meu caro! O baile estava um tanto enfadonho, até você e sua dama começarem a brigar na frente de todos. – D. Pedro soltou uma gargalhada e tomou um outro trago de cachaça. – Ali
Seu tio tanto insistira para que ela o acompanhasse a um Sarau, que sentiu-se na obrigação de aceitar.Não estava com a menor disposição para sair e conhecer pessoas.Esfregou os olhos que ardiam e questionou a própria sanidade. Só a completa loucura, justificaria o fato de ter se comportado como uma mulher perdida, com um homem que não sentia nada por ela.Cansada, Beatrice inclinou a cabeça para trás, apoiando-a no encosto da cadeira e fechou os olhos, tentando não pensar. Mas uma tristeza pesada e dolorida a envolveu. Tinha que admitir, Gabriel significava mais para ela do que poderia desejar ou suportar.Pensava nele o tempo todo, seu coração disparava toda vez que o via, o som da voz dele despertava seus sentidos deixando-a excitada e carente. Quando ele a tocava se derretia toda, tornando-se dócil e submissa. Uma verdadeira cretina! –
- Não se mexa! – gritou Beatrice. - Não ouse chegar perto de mim, canalha! Se der mais um passo eu atiro – falou com a voz engasgada, tamanho o nó que lhe apertava a garganta numa mistura de medo e raiva.Suas mãos tremiam e Beatrice tentava se controlar enquanto segurava a pesada pistola com as duas mãos . Seus cabelos desgrenhados, caíam sobre o rosto banhado em lágrimas e seus olhos fuzilavam o homem completamente nu parado à sua frente.- Você ficou maluca, benzinho? Devolva a minha arma e se acalme um pouco – disse o homem com voz pastosa e atitude indolente, que só um bêbado teria diante de uma arma. – Seja boazinha e peça um café, minha cabeça está rodando mais que pião.- Não vou pedir nada. Pegue suas roupas e saia daqui antes que eu lhe meta uma bala no peito, que é o que você merece.- Ora, ora, benzinho. Você está muito nervosa. É certo que eu bebi além da conta ontem a noite, talvez você não tenha gostado, mas isso não é
Ao sentir a carruagem diminuir a velocidade e parar, esticou-se para dar alívio aos músculos doloridos e viu que o sol já estava mais fraco ao entardecer. Ouviu cavalos se aproximando a galope e gritos do cocheiro que agitava as rédeas tentando aumentar a velocidade dos cavalos. Alguma coisa parecia estar errada.Colocou a cabeça para fora da janela, os cavalos levantavam muita poeira e vinham pela estrada rapidamente em direção a eles. Apertou os olhos e conseguiu ver o primeiro cavaleiro, que estava com o chapéu enterrado na cabeça e uma barba longa e escura lhe encobria o restante do rosto. Arregalou os olhos novamente, quando ouviu um estampido. Tiro! Estavam atirando contra a carruagem.Seu coração disparou e pareceu subir para a boca, tal a sensação de sufocamento que Beatrice sentiu. Estavam sendo assalta
Dando um pulo sentou na cama assustada. Tudo não passara de um pesadelo, tinha que ser um pesadelo!Respirou fundo e afastou com as mãos as mechas do longo cabelo dourado que lhe caíam em cima dos olhos.Olhou para um lado, depois para o outro, não tinha a menor idéia de onde estava. As lembranças vinham aos turbilhões em sua mente, deixando-a ainda mais confusa.Quando a realidade de tudo que acontecera desabou sobre ela, sentiu um nó enorme se formar em sua garganta e seus olhos se encheram de lágrimas.Jogou o corpo para trás com violência. O colchão de plumas afundou com o peso do seu corpo que caía.Colchão de plumas? Que cativeiro era aquele que tinha colchão de plumas?Suspirou mais uma vez e resolveu que não iria adiantar nada, ficar enterrada naquela cama chorando e sentindo pena de si mesma.Olhou para o teto e viu que este era forrado de madeira de boa qualidade, inclusive os detalhes de acabamento mostravam que o artesão se esmerara no trabalho
Beatrice tentou acompanhar os passos largos do homem a sua frente, sem demonstrar a dor que sentia em seus pés machucados. Quando pisou em uma pedra pontiaguda, não suportou mais, soltou um grito estridente. Tentou manter-se em pé mas foi inútil, caiu de joelhos e ficou ali de cabeça baixa até que sentiu braços fortes a enlaçarem. Foi aconchegada ao peito largo e carregada no colo até a casa. Não falou nada e nem resistiu a intimidade do gesto. Seus pés latejavam como se estivessem em carne viva.Gabriel entrou pela porta da cozinha e chamou a criada negra .– Anastácia! Traga água quente e unguentos para o quarto da hóspede, ela machucou o pé.– Sim, sinhôzinho. Vai precisá de bandagê tamém? – falou no português próprio dos escravos.– Acho que sim. Leve tudo para lá, enquanto eu vejo
Beatrice rolava de um lado para outro na cama, negava-se a acordar. Queria dormir e sonhar, não queria acordar para a realidade que tanto a oprimia. Não queria continuar cativa, queria se libertar de tudo, esquecer seu passado e viver livre das humilhações e indignações que sofrera no passado e das que voltara a sofrer nos últimos dias.Mas seu estômago roncou alto, reclamando a falta de comida. Devia ter dormido o dia inteiro, se esquecera até do almoço. Abriu os olhos e percebeu que já estava bem escuro, a noite já caíra por completo. Com todas as atribulações que passara, acabara dormindo demais e agora estava morta de fome.Afastou os lençóis, sentou na cama e lembrou-se que estava nua. Tinha dormido enrolada apenas na toalha, teria que arrumar alguma coisa para vestir se quisesse sair do quarto para comer.Apalpou a mesinha do lado da cama e achou o castiçal, tateou mais um pouco e encontrou os fósforos. Acendeu as três velas do castiçal e começou a procura