Quando chegou a hora do jantar, Beatrice resolveu que iria até a sala, pois se não fosse, era bem possível que esquecessem a sua presença na casa. Os homens deviam estar muito ocupados com as duas espanholas, para se lembrarem dela.
Ela é que não iria passar fome, por causa daquelas pessoas. Ah, mas não iria mesmo. Como era obrigada a suportá-los, eles que aturassem a sua presença também.Quando entrou na sala de jantar, notou que Sanchez estava sentado entre as duas mulheres e conversavam muito a vontade. Gabriel estava parado em pé, de frente para a janela e dava as costas ao trio animado. Sua postura ereta, com as mãos entrelaçadas nas costas, sugeria que estava sério e pensativo.
Beatrice entrou e só quando chegou ao lado da mesa e puxou a cadeira, foi notada pelo trio que imediatamente parou de falar. Sanchez se levantou e fez uma reverência educada cumprimentando Beatrice, as mulheres a olharam com extrema má vontade e desdém e não lhe deram mais atenção.MesmoAo acordar, Beatrice ficou paralisada na cama. Não era verdade – pensou – não podia ser verdade! Aquilo era um pesadelo! Como ela pudera se submeter àquele homem? Um reles ladrão de estradas, um homem sem eira nem beira, um ser desclassificado, vil!Coberta de vergonha e cheia de indignação, sentou-se na cama. Estava indignada consigo mesma e envergonhada por ter correspondido daquela forma. Agira como um ser faminto diante de um banquete.Inadmissível! Suas ações haviam sido inaceitáveis. Como que ela, uma mulher que aprendera a controlar suas emoções e a duras penas se tornara discreta e ajuizada, podia ter agido como uma vagabunda qualquer, se entregando a um homem que mal conhecia? Um homem totalmente inadequado, para dizer pouco!Quando recordava os momentos passados com ele, não podia se reconhecer. Aquela mulher alucinada de paixão, não era ela. Seu ex-marido sempre dissera que era frígida, incapaz de sentir prazer algum com um homem.E no entanto, “aq
Os dias que se sucederam, foram repletos de sol e de um calor excessivo. Beatrice sentia lhe faltar o ar e no meio da tarde, era tomada por uma sonolência incontrolável que muitas vezes a fazia dormir até o entardecer.Gabriel sempre muito ativo, não acompanhava-a durante a sesta. A não ser que pudesse mantê-la acordada durante a maior parte do tempo.Os dias passavam e Beatrice sentia-se cada vez mais satisfeita com a vida que levava ali. Já não se importava mais com a inconveniência e desfaçatez daquele relacionamento. O pequeno mundo em que vivia atualmente, era tudo para ela.Gabriel preenchia todos os seus anseios. Era alegre, despreocupado, com ele a vida parecia uma eterna brincadeira.Pela manhã costumavam cavalgar, na maioria das vezes, iam tomar banho de rio e se divertiam feito crianças, até que as brincadeiras tomassem um rumo mais p
O quarto destinado à ela, ficava no andar de cima. Era amplo e muito bem decorado, as janelas altas estavam totalmente abertas, deixando entrar a brisa da tarde. A região em volta era densamente arborizada e isso, dava uma sensação de frescor.Logo a porta se abriu e uma fila de criados negros, vestidos de branco, entraram trazendo seus baús e uma enorme banheira de madeira.Nossa! Um banho demorado era tudo que ela estava precisando. Os negros voltaram carregando baldes de água e despejaram na enorme tina de madeira. Uma negra baixa e gorducha entrou e começou a retirar suas roupas dos malões.Beatrice se aproximou cheia de curiosidade. O que Gabriel teria colocado naquelas malas? Será que ele teria devolvido parte de suas roupas? Não! Nenhuma daquelas roupas lhe pertenciam. Ela começou a examinar as peças variadas, pareciam roupas novas, sem uso algum. Será que ele as te
Beatrice saiu para a varanda de seu quarto que dava vista para a rua. Inspirou profundamente e observou a cidade.Sob o céu estrelado, algumas carruagens abertas e coches percorriam as ruas ruidosamente, enquanto pessoas alegres riam nas calçadas. A cidade fervilhava de gente animada, com muito movimento nas casas de jogos e nas tabernas. Barracas coloridas vendiam de tudo aos passantes. Os limões-de-cheiro perfumavam o ar, eram inofensivos recipientes de cera que continham água perfumada em seu interior.Beatrice logo procurou saber tudo sobre aquela festa tradicional. O entrudo português, era uma festa popular, onde as pessoas caminhavam ou dançavam pelas ruas. Muitas usavam máscaras e brincavam entre si, jogando limão-de-cheiro umas nas outras e rindo muito diante da surpresa e algumas vezes da indignação das pessoas que eram atingidas. Outros jogavam farinha e papel picado, fazendo uma bagun
Depois de rodar meio sem rumo pela cidade, Gabriel foi até o Paço Real. Não conseguira dormir direito e depois de ficar cansado de rolar de um lado para o outro, resolveu sair. Acabou vindo conversar com o amigo, pois sabia que este acordava cedo, não importando há que horas fosse dormir. Sempre levantava cedo para fazer seus exercícios físicos, os quais, apregoava aos quatro cantos ser a melhor maneira de um homem manter o seu vigor. A esta hora já devia estar tomando o aperitivo antes do almoço.Gabriel parecia abatido naquela manhã, observou D. Pedro.- Nos proporcionou um belo espetáculo, meu caro! O baile estava um tanto enfadonho, até você e sua dama começarem a brigar na frente de todos. – D. Pedro soltou uma gargalhada e tomou um outro trago de cachaça. – Ali
Seu tio tanto insistira para que ela o acompanhasse a um Sarau, que sentiu-se na obrigação de aceitar.Não estava com a menor disposição para sair e conhecer pessoas.Esfregou os olhos que ardiam e questionou a própria sanidade. Só a completa loucura, justificaria o fato de ter se comportado como uma mulher perdida, com um homem que não sentia nada por ela.Cansada, Beatrice inclinou a cabeça para trás, apoiando-a no encosto da cadeira e fechou os olhos, tentando não pensar. Mas uma tristeza pesada e dolorida a envolveu. Tinha que admitir, Gabriel significava mais para ela do que poderia desejar ou suportar.Pensava nele o tempo todo, seu coração disparava toda vez que o via, o som da voz dele despertava seus sentidos deixando-a excitada e carente. Quando ele a tocava se derretia toda, tornando-se dócil e submissa. Uma verdadeira cretina! –
- Não se mexa! – gritou Beatrice. - Não ouse chegar perto de mim, canalha! Se der mais um passo eu atiro – falou com a voz engasgada, tamanho o nó que lhe apertava a garganta numa mistura de medo e raiva.Suas mãos tremiam e Beatrice tentava se controlar enquanto segurava a pesada pistola com as duas mãos . Seus cabelos desgrenhados, caíam sobre o rosto banhado em lágrimas e seus olhos fuzilavam o homem completamente nu parado à sua frente.- Você ficou maluca, benzinho? Devolva a minha arma e se acalme um pouco – disse o homem com voz pastosa e atitude indolente, que só um bêbado teria diante de uma arma. – Seja boazinha e peça um café, minha cabeça está rodando mais que pião.- Não vou pedir nada. Pegue suas roupas e saia daqui antes que eu lhe meta uma bala no peito, que é o que você merece.- Ora, ora, benzinho. Você está muito nervosa. É certo que eu bebi além da conta ontem a noite, talvez você não tenha gostado, mas isso não é
Ao sentir a carruagem diminuir a velocidade e parar, esticou-se para dar alívio aos músculos doloridos e viu que o sol já estava mais fraco ao entardecer. Ouviu cavalos se aproximando a galope e gritos do cocheiro que agitava as rédeas tentando aumentar a velocidade dos cavalos. Alguma coisa parecia estar errada.Colocou a cabeça para fora da janela, os cavalos levantavam muita poeira e vinham pela estrada rapidamente em direção a eles. Apertou os olhos e conseguiu ver o primeiro cavaleiro, que estava com o chapéu enterrado na cabeça e uma barba longa e escura lhe encobria o restante do rosto. Arregalou os olhos novamente, quando ouviu um estampido. Tiro! Estavam atirando contra a carruagem.Seu coração disparou e pareceu subir para a boca, tal a sensação de sufocamento que Beatrice sentiu. Estavam sendo assalta