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O primeiro mês de trabalho de Maria das Dores foi na antiga sede da Barrier. Ali, ela conheceu toda a equipe e começou a desenvolver seu trabalho, que consistia em apenas deixar todos os lugares sempre bem limpos. Andaria por todos os lados com vassouras, esfregões e tudo mais que tivesse para garantir que a empresa inteira estivesse brilhando para receber os clientes que sempre iam àquele lugar.

Assim como Mariana, a chefe da limpeza não gostou de Maria das Dores. Ela dizia para as outras funcionárias que também eram daquele setor:

– Como alguém pode ser assim? Trabalhando limpando chão e dizendo que está feliz. Nem sei como que ela conseguiu o emprego, mas parece que é uma pobre coitada que tem uma mentalidade bem pequena.

Elas riam. Certamente que a vida não seria fácil para a jovem naquele lugar. Os piores serviços eram destinados a ela em todos os momentos:

– Das Dores, vá limpar o banheiro... Das Dores, tem um lugar no terceiro andar que está sujo... Das Dores, alguém precisa se pendurar e limpar as janelas pelo lado de fora, e como você é a mais nova, precisa ser você.

E assim eram seus dias naquele lugar. Mas em nenhum momento ela reclamava. Para a equipe de limpeza, ela se tornou “das Dores”. Para Mariana, ela se tornava a pessoa a ser deixada longe do patrão. Jarbas compartilhava do mesmo sentimento. Queria que ela tivesse um desvio apenas para mandá-la embora.

Com isso, o mês de adaptação foi passando. Ela passou a levar comida, preparada por tia Marta em um pote de metal:

– Minha filha, aqui é assim. A gente leva a marmita e esquenta como dá. Um dia, com certeza isso vai melhorar. Mas é melhor levar assim do que ficar sem comer.

Maria das Dores sorria para a tia, agradecida pela dedicação:

– Não tem problema, minha tia. Muito obrigada por toda a ajuda para me manter nesse emprego. Prometo que vou pagar por todos os seus gastos.

– Não seja boba, menina. Não quero que me pague nada! Quero que você melhore de cargo e que viva bem aqui na cidade comigo.

Quando as outras pessoas da equipe de limpeza viram que ela levava uma marmita com comida e deixava sempre guardado no armário, começaram a rir. Uma delas, maldosa, disse:

– O que será que ela está trazendo naquele pote de metal? Será que é igual aqueles pedreiros, que carrega arroz com ovo e está muito bem? Ou será que a dona esquisita traz comida decente.

Outra, gargalhando, disse:

– Eu é que não deixo minhas duas horas de almoço para comer com marmita. Vou mesmo no restaurante aqui do lado e como. O vale refeição é muito bom para que a gente fique desprezando assim.

Nesse instante, a chefe da limpeza apareceu, ouvindo parte da conversa. Apenas acrescentou:

– Ela é uma ridícula.

Uma delas disse, pensativa:

– Mas eu sei o que podemos fazer com ela no dia de hoje que jamais ela vai esquecer.

Naquele dia em especial, Maria das Dores estava especialmente com fome. Mal tomara um café da manhã, pois só tinha um pedaço de pão em casa do dia anterior que ela dividiu com sua tia Marta.

No momento em que deu a hora do almoço, ela caminhou com o todos os dias para o vestiário. Lá, iria abrir seu armário e pegar a marmita com a comida que levara para seu almoço. Comida simples, mas preparada com muito carinho pela sua tia. Feijão, arroz e um pedaço de frango. Ainda que não fosse uma comida de luxo, era o que ela precisava para aquele dia. Ficara a manhã quase que inteira sem comer e trabalhou tanto que estava muito cansada e com muita fome.

O que ela não imaginava era que surpresas a aguardavam naquele dia, pois o desprezo e a inveja dos colegas de trabalho faziam com que sua vida não fosse fácil naquele emprego. Ao chegar no seu armário notou que ele estava aberto. Ela sempre fechava, mas jamais trancava, pois não imaginava que precisaria fazer isso. Na verdade, foi inocência sua acreditar que as pessoas que trabalhavam com ela era um suas amigas e não mexeriam nas coisas. Não tinha nada demais, apenas a roupa de trabalho e sua comida. E foi justamente na comida que elas mexeram. Ao abrir o pequeno armário, descobriu que sua marmita fora virada de cabeça para baixo e todo o conteúdo estava espalhado sobre a roupa limpa que levara naquele dia. Isso tinha dois significados: ela estava sem comida e teria que ir embora de uniforme. Não havia uma roupa limpa para ir para casa.

Ela ficou chocada ao perceber aqueles acontecimentos. Como poderiam fazer isso com ela? Desde que entrara na empresa jamais fizera mau a ninguém, ao contrário, queria manter sempre boas amizades com suas colegas. Justamente uma delas resolveu destruir sua comida e sujar sua roupa. Era inconcebível na cabeça dela que fizessem isso. Não poderia considerar um acidente, pois abriram um armário e mexeram em todas as suas coisas. Mas também não poderia contar para ninguém, pois era apenas uma faxineira naquele lugar.

Como todos os outros dias, ela não tinha dinheiro e isso significava que ficaria com fome naquela tarde também. Não conseguiria aproveitar nada da comida, nem mesmo saber sabia como tiraria daquele armário aquela sujeira. Além disso, a chefe do setor, se visse aquela bagunça, certamente a culparia e a puniria. Então, fez a única coisa que lhe restava: sentou no chão e começou a chorar.

Naquele dia, por um acaso do destino, Patrick resolveu ir até a sala de vídeo para conferir as imagens. Como o foco da empresa era segurança e ele era responsável por toda ela, queria verificar como andavam as câmeras e como funcionava o sistema interno antes de passar para o novo prédio. Seu objetivo era modernizar todo o sistema de forma garantir o melhor cuidado com seus clientes. Para isso, sua empresa deveria ter o que era de mais moderno na área de tecnologias de imagem de proteção.

Enquanto notava o que acontecia naquele lugar, ele passava todas as câmeras, visualizando cada espaço da empresa e pensando em soluções para melhorias daquele lugar. Algo chamou sua atenção naquele momento em que passou pela câmera que ficava em cima dos armários de funcionários. Ali estava Maria das Dores encostada no armário, sentada no chão, chorando. Ver aquela funcionária chorando trouxe preocupação. Desde sua contratação, não tinha mais visto a moça dentro da empresa. Mas, naquele momento, ficou pensativo e queria saber o que estava acontecendo.

– Veremos a segurança depois, eu preciso resolver um problema agora.

 O rapaz responsável pelas imagens concordou com a cabeça, afinal, ele era o patrão e poderia fazer o que quisesse. Ao mesmo tempo, ficou intrigado porque percebeu que o patrão vira funcionária chorando e foi na direção dela.

Não era comum Patrick andar por toda a empresa. Geralmente ele entrava em sua sala e dali saía para almoçar e para a ir para casa. Mas, devido aquele acontecimento, ele foi até o lugar onde estava o armário de funcionários.

Quando desceu dois andares até encontrar espaço que procurava, seus olhos perceberam Maria das Dores ainda sentada, chorando. O trajeto levou pelo menos três minutos, o que significava que ela já estava mais tempo naquela posição desagradável com lágrimas correndo pelos olhos. Ele se aproximou calmamente, preocupado com a jovem e perguntou:

-– Maria, por que você está aí sentada, chorando, na hora de seu almoço?

Maria das Dores, ao perceber patrão por perto, ergueu a cabeça e no mesmo instante relatou todo o ocorrido naquela manhã:

– Senhor Patrick, eu cheguei em meu armário para pegar meu almoço e descobri que ele estava entornado em cima da minha roupa. Agora não tenho almoço e ainda todas as roupas estão sujas. Terei que ir para casa de uniforme.

Patrick não compreendeu a fala da jovem, afinal, ele sempre pagava pelos tickets refeição e eram trocados ao lado para que nenhum funcionário ficasse sem comida. Ele questionou:

– E os tickets que mandei lhe dar no dia da sua contratação, o que aconteceu?

Maria não sabia do que se tratava. Ela sacudiu cabeça e disse:

– Não recebi nenhum ticket. Desde que fui contratada, trago minha corrida todos os dias.

Patrick se irritou saber deste fato. Tinha dado ordens expressas para que a jovem recebesse seu ticket no dia da contratação. Mas, antes de resolver este problema, deveria resolver o principal: a jovem que estava sem comida e sem roupa para ir embora. Então, disse:

– Vou resolver com problema dos tickets, mas, primeiro, vamos resolver o seu problema. Não vou aceitar que você fique sem comer e quero descobrir quem foi que mexeu em sua comida e em sua roupa. Isso não vai ficar assim. Não é justo que uma funcionária que se esforce tanto passe por este problema.

– Mas o que o senhor vai fazer? Hoje não tem dinheiro para pagar nem um prato de comida...

Ainda um pouco revoltado, ele respondeu:

– Você deveria ter recebido vale alimentação para todo esse mês. Foi isso que pedi que fizessem. O erro não é seu. Além disso, o que fizeram com você e sua comida é imperdoável.

Patrick direcionou a jovem para sua sala pessoal. Ela conhecia aquele lugar, onde foi a entrevista na primeira vez em que estivera na empresa. Sentou numa cadeira e ficou aguardando o seu patrão, que saiu pela porta principal.

Alguns minutos depois, Patrick retornou com duas quentinhas. Junto, estavam talheres e um litro de suco de uva. Ele sentou em outra cadeira, entregou uma das quentinhas para ela, abriu a outra e disse:

– Vamos comer hoje aqui. Almoçaremos juntos no meu escritório. Após o almoço eu resolvo o problema das suas roupas. E não se preocupe, como falei, a culpa não é sua.

Ainda que tivesse constrangida, a fome era maior do que a vergonha de almoçar com patrão. Os dois, então, comeram quase todo o tempo em silêncio. Ao final, Patrick fez algumas pequenas perguntas para a jovem Maria:

– Você sabe quem pode ter feito isso?

– Não, seu Patrick. Desde que entrei aqui procuro ter amizade com todas da minha equipe, porém, hoje me deparei com este triste fato. Senti que não sou bem recebida. Elas não gostam muito de mim e não sei o motivo, mas eu juro que tentei.

Pensativo seus próximos passos, Patrick apoiou o braço na mesa e apoiou o queixo. Era impensável deixar alguém que fazia aquele tipo de humilhação com um colega trabalhando em sua empresa. Ele levava a sério tudo o que fazia e queria que assim o fosse por parte de todos que estavam ali trabalhando.

Com compaixão, olhou mais uma vez para a jovem Maria das Dores:

– Não se preocupe, eu vou compensar você por tudo que está lhe acontecendo neste dia.

Ela estava triste, humilhada, mas sabia que, pelo menos, ele estaria a par de todos os acontecimentos que sofrera por parte da equipe onde trabalhou.

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