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Maria das Dores saiu sorridente pelo caminho que Patrick indicara para ela. Que homem bom era aquele que conhecera. Não era apenas o dono da empresa, era alguém que demonstrava interesse por aqueles que trabalhavam com ele. Pelo menos era assim que ela o via depois desses breves encontros ao acaso. E tinha algo a mais. Um brilho naquele olhar, algo diferente, que fazia dele um homem especial.

“Rico e bonito, será que é isso que minha tia Marta estava falando ontem?”

Deu uma risadinha sozinha pelas ruas. Jamais imaginaria que um homem como aquele olhasse para ela. Ela era a empregada, a pessoa da limpeza. E só.

Aquela manhã foi bem tranquila na vida da jovem Maria das Dores. Ela chegou à empresa médica, fez seu exame, pegou o resultado e voltou para a Barrier. Era o momento de começar.

– Senhor Patrick, sei que fui contratada ontem, mas me permite um comentário? – Mariana estava um pouco inquieta dentro do escritório, mesmo sendo o primeiro dia de emprego naquele lugar.

– Fale, Mariana. Você foi contratada, entre outras coisas, para ajudar aqui em todas as funções que conseguir exercer. O que lhe incomoda?

Ela suspirou, fazendo um ar inocente e de quem se preocupa com a empresa:

– Essa moça que o senhor contratou, a Maria das Dores.

– O que é que tem a jovem?

– Ela... não parece muito o perfil de pessoa que seria contratada por uma empresa como esta.

– Eu sei – ele respondeu, de maneira enérgica. – É esse o motivo principal que escolhi uma jovem como ela para integrar a nova equipe. Ainda mais com o prédio novo que está por vir, precisaremos de mais pessoas e quero inovar a forma de trabalharmos. Por isso eu escolhi a Maria. Ela, com certeza, vai trazer algo diferente para nossa equipe. E é justamente o que preciso nesse momento, de novidades.

Ainda que inconformada, ela não estendeu o assunto. Não queria passar uma impressão ruim para o seu patrão. Logo deixou a sala do jovem Patrick, seguindo para resolver diversos papéis.

Ao passar pela porta, ela se deparou com Jarbas, parado de braços cruzados. Ele olhou firmemente para a jovem secretária, dizendo:

– Vejo que você não gostou da jovem que o senhor Patrick escolheu para trabalhar aqui.

– Como assim? Não é bem isso... – ela disfarçou, tentando não demonstrar aquele desprezo que sentiu pela jovem Maria das Dores.

– Fique tranquila, eu não gostei dela também – respondeu Jarbas, tentando tornar o ambiente mais leve. – Eu quero lhe pedir um favor. Fique de olho nela. Se caso a jovem tentar algo diferente, se ela cometer qualquer erro, me avise na hora. Não quero pessoas como... ela estragando a empresa que meu patrão construiu e seu filho herdou. Você entende o que quero dizer?

Um pouco aliviada, ela deu um sorriso leve, acenando com a cabeça. Teria um aliado ali, com aquele homem que estava sempre ao lado de seu patrão.

– Pode deixar, seu Jarbas. Tenho certeza de que faremos um bom trabalho e que nesse mês de preparação ela não vai tentar nada. Depois... a gente dá um jeito nessa intrusa que chegou na empresa.

– Que bom que posso contar com você. O senhor Patrick não pode saber que tivemos essa conversa, está entendido?

– Com certeza. Jamais falamos dela. Nem lembro o nome daquela jovem...

Jarbas sorriu. Sabia que poderia contar com a nova secretária. Seu olhar clínico não falhava. Ele a escolhera focado nos interesses que tinha em relação à empresa e ao seu patrão. E isso faria com que ele conseguisse preservar a memória de Geraldo di Meni, aquele que dera a ele a maior oportunidade de sua vida.

               

                Maria das Dores, depois de andar por horas em direção ao local do exame e de retornar para a empresa, finalmente chegou na Barrier. Ela entrou, avisando de sua chegada:

– Com licença.

Mariana, ao ouvir a voz da jovem, já demonstrou irritação. Ela teria que aguentar pessoas assim por quanto tempo? Não aceitava aqueles que julgava inferior. E criara um desprezo por Maria das Dores desde a primeira vez que a viu naquele lugar:

– Ah, você voltou. Fez o exame?

– Sim. – Ela entregou o papel para Mariana, que conferiu tudo. – Não demorou tanto lá, mas a distância que atrapalhou um pouco de chegar antes.

Mariana quase expressou seus pensamentos: “Poderia ter demorado mais”.

– Parece que está tudo certo. Agora, você deve seguir neste endereço para pegar o uniforme. Amanhã, às 7 da manhã, você começa aqui.

Maria das Dores se sentia cansada, ainda mais que não havia comido nada. Mas não diria isso para aquela mulher. Esboçou um sorriso, um pouco transtornada, e agradeceu:

– Obrigada, eu farei isso. Estarei aqui.

Quando Maria das Dores deixou aquele lugar, Mariana disse, baixinho:

– Por mim, nem entraria. Mas o patrão mandou, o que eu posso fazer?

De volta às ruas daquela grande cidade, mais uma vez a jovem deveria andar. Caminhou na direção contrária. Cruzou uma rua grande, conhecida como Rua da Carioca, onde viu diversas lojas com instrumentos musicais. Achou aquilo maravilhoso, ainda mais que não tinha uma relação com a música muito grande. Na sua cidade, poucos tocavam e eram músicas regionais. Parou por alguns instantes admirando uma loja onde violinos estavam expostos na vitrine. Era maravilhoso ver aqueles instrumentos tão belos naquele lugar. E isso mostrava como o Rio de Janeiro era uma cidade diferente.

Ainda maravilhada com aquele lugar que parecia mágico, viu pessoas que entravam em saíam das lojas, comprando itens, conversando e se divertindo. Lojas de eletrônicos vendiam cada vez mais, com propagandas e promoções que pareciam irresistíveis.

“Quando eu tiver com meu salário, virei aqui para comprar um presente para minha tia Marta. Ela merece por tudo que tem feito por mim.”

E assim a sua caminhada continuou, rua a rua, até que se deparou com a famosa Praça XV. Ela ouvira falar que a Barrier se mudaria para perto da Praça XV, mas não conhecia o lugar. Olhou as construções e logo identificou aquele que seria o prédio onde trabalharia em breve. Era gigantesco. Realmente a empresa estava investindo em um grande espaço para expansão dos negócios. Isso a alegrava e a assustava. Trabalhar em um lugar como aquele era uma grande responsabilidade.

– Eu vou mudar de vida neste lugar. Tenho certeza. É aqui onde tudo vai acontecer e eu serei feliz. Vou ter uma vida boa e cuidar da minha tia Marta.

Firme, caminhou pelas ruas em direção ao lugar onde pegaria o uniforme para trabalhar na Barrier.

Ao chegar, entrou em uma pequena loja. Era em uma via pública, cercada de lojas com todos os itens. Dentro, parecia muito maior. Viu uma atendente, mal humorada, que logo chegou até ela:

– Vai comprar o quê? Quer fantasia, roupas para a semana ou só está dando uma olhadinha?

Maria das Dores pegou o papel que a secretária lhe entregou e deu um belo sorriso para a jovem que trabalhava naquela loja. Ela não queria ser assim. Queria ver o lado bom da vida e aproveitar cada momento para conhecer mais da vida no Rio de Janeiro:

– Boa tarde, eu sou funcionária nova do Barrier. Mandaram eu vir até aqui para pegar esses uniformes.

Com um olhar de desconfiança e de desprezo, a jovem olhou para ela. Pegou o papel, lendo as anotações que a secretária fizera. Havia, também, a assinatura de Patrick. Então, ela suspirou:

– Então tá, né. Vou pegar para você. Espere aqui... e não mexa em nada.

Maria das Dores não entendeu aquele comentário. Por que ela mexeria naquelas roupas? Estava ali apenas para pegar os uniformes. Não havia nada que lhe interessasse naquele lugar.

Minutos depois, a jovem voltou com três sacolas. Disse para Maria das Dores:

– Vamos conferir tudo. Uniforme cinza, blusa, calça, botas, luvas. Tudo em três pares. Para usar todos os dias da semana que for trabalhar. Ah, a recomendação é que você lave com água morna e deixe secar na sombra. Isso evita de desbotar a roupa e não mancha também. Se for usar máquina, tem que ser com sabão de coco. Entendeu, meu bem?

Tantas recomendações por conta de um pouco de roupa. Ela estava acostumada a lavar roupas, fazendo com que durassem muito tempo. Era assim a vida no campo, era assim a sua vida naquele lugar onde habitou por tantos e tantos anos.

– Tudo bem – respondeu, tentando pelo menos parecer educada.

– Assine aqui. Isso é para dizer que você recebeu as roupas.

Ela assinou, agradeceu e foi embora. A jovem que estava na loja continuou olhando para ela com desprezo, como se fosse alguém que não deveria nem ter ido lá pegar uniformes. Além disso, ela invejava Maria das Dores por ter conseguido um emprego em uma grande empresa, sem precisar trabalhar dia e noite em comércio.

– Aposto que tem gente lá dentro que conhece ela. Porque bonita não é, inteligente não parece. Mas, também, para trabalhar com limpeza, é melhor eu ficar aqui mesmo que ganho mais da minha vida!

Sem ouvir aqueles comentários inúteis da mulher, Maria das Dores saiu da loja com suas sacolas de uniformes. Fez todo o trajeto de volta para conseguir encontrar o rumo da casa da tia Marta. Era assim que ela pretendia chegar sempre que se perdesse. Com isso, passou grande parte da tarde andando debaixo de um forte sol. E aquilo lhe incomodava. não estava acostumada a tanto calor e àquele clima abafado da cidade grande. Queria mesmo era descansar um pouco. E aproveitaria o resto da tarde para isso.

Quando finalmente chegou em casa, entrou com as sacolas. Tia Marta olhou para ela:

– Minha filha, foi às compras já?

– Não, tia. São os uniformes da empresa. Tive que andar pela cidade toda para encontrar a loja.

Tia Marta a abraçou. Logo apontou para a cozinha:

– E conhecendo como é, aposto que não comeu nada o dia todo. Vamos. Sei que é tarde, mas ainda dá tempo de você almoçar. Depois a gente come mais.

Sorridente, ela foi comer. Esperava por aquele momento desde cedo. Sabia que era só o começo da sua vida naquela empresa.

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