O vento cortava seu rosto, arrancando lágrimas que nem eram de dor, mas de algo muito mais profundo. Algo que crescia em seu peito, apertando sua garganta, queimando seus pulmões. Ivy corria sem olhar para trás. Suas pernas ardiam, cada músculo do seu corpo gritava para que parasse, mas ela não podia.Não queria.As árvores passavam como vultos em sua visão, sombras que se misturavam com as lembranças que tentava deixar para trás. A noite estava viva ao seu redor—o farfalhar das folhas, o som de galhos quebrando sob patas ágeis. Ela sabia que não estava sozinha.Vários lobos se moviam pela floresta, olhos brilhando na escuridão, observando-a conforme passava. Alguns pareciam hesitar, quase como se quisessem segui-la, outros apenas a observavam, seus olhares carregados de algo que ela não queria interpretar.Ela deveria estar em sua forma lupina. Deveria sentir o solo sob suas patas, correr tão rápido quanto qualquer um deles. Mas não conseguia. Nunca conseguira.Seu peito se apertou.
O silêncio que ficou entre Alaric e Ivy era tão latente que só fora quebrado apenas pelo som da água pingando do corpo de Alaric e o farfalhar distante das árvores. Ivy ainda estava ofegante da corrida, mas a visão dele, emergindo do lago como um predador, fez seu coração bater de um jeito diferente. Não de cansaço. Mas de alerta.Alaric avançou alguns passos em sua direção, sua expressão indecifrável. Seus olhos escuros pareciam avaliá-la, como se tentassem entender o que diabos ela fazia ali.— O que você está fazendo aqui, Ivy? — Sua voz era baixa, rouca, carregada de algo que ela não soube definir.Ivy abriu a boca, pronta para responder, mas, ao ver seu estado —completamente nu, a pele pálida cintilando sob a luz do luar — fechou-a de novo e desviou o olhar.— Você… não vai colocar uma roupa? — Sua voz saiu mais seca do que pretendia.Alaric ergueu uma sobrancelha, a sombra de um sorriso irônico surgindo em seus lábios.— Ah, então agora você se importa? — Ele soltou um riso bai
O mundo ao redor de Ivy parecia se contrair. O ar estava mais denso, pesado, e o fogo que ardia em sua marca pulsava como um aviso silencioso. Mas o pior não era a dor. Era a voz.Aquela voz gélida e antiga que há algum tempo havia se calado dentro dela."Agora você finalmente voltou para o seu lugar. Não te deixarei ir embora jamais."Ivy tentou engolir o pânico. Seus dedos pressionaram a pele latejante de seu pescoço, como se pudesse apagar aquela sensação. Mas ela sabia que era inútil.Porque aquilo não era apenas uma marca. Era uma corrente.Ao seu lado, Alaric caminhava em silêncio, sem perceber a batalha interna que a consumia. O som ritmado dos passos dele ecoava na trilha de terra úmida, e a forma despreocupada com que ele se movia apenas deixava tudo mais sufocante.Ela queria perguntar. Queria exigir respostas que talvez ele teria, já que possuíam aquele maldito vínculo antepassado. Mas como perguntar a explicação de e algo que nem ela mesma entendia o que era esse algo?A d
O ar que Ivy segurava era tão espesso que parecia ter forma.Ela não conseguia se mover. Seus olhos estavam fixos na silhueta escura do outro lado do vidro, o coração batendo alto demais dentro do peito.A figura não se movia. Apenas esperava.Então, a luz fraca da lua atravessou as nuvens, revelando o que estava ali.Um corvo.O alívio veio rápido, mas não durou.Havia algo de errado naquele pássaro.Seus olhos negros pareciam inteligentes demais, quase humanos. Ele a observava como se estivesse esperando por algo. E então, com um movimento súbito, bicou o vidro.Uma. Duas. Três vezes.O som ecoou pelo quarto como um aviso.Ivy respirou fundo, tentando acalmar o tremor em seus dedos. Ela se aproximou com cautela e destravou a janela. O vento gelado entrou de imediato, bagunçando os fios soltos de seu cabelo.O corvo abriu as asas e, com um salto gracioso, pousou no parapeito.— O que você quer, garoto? — Murmurou, mais para si mesmo.Foi só então que Ivy viu.Preso à sua pata havia u
O medalhão queimava na palma da mão de Ivy.O pequeno pedaço de prata escurecida pelo tempo parecia pesar mais do que deveria, como se carregasse todo o peso da verdade que ela nunca quis enxergar.O ar no escritório parecia rarefeito, e sua respiração vinha curta, descompassada.Alaric continuava parado na porta, a luz fraca lançando sombras irregulares sobre seu rosto. Havia algo nele que a fazia sentir um frio na espinha—um olhar que não era de surpresa, nem de culpa.Era um olhar de tédio.— Você não deveria estar aqui. — Ele repete, a voz calma, sem pressa, como se estivesse comentando sobre o tempo.Ivy apertou o medalhão com tanta força que sentiu o metal gelado contra sua pele.— O que isso está fazendo aqui? — Sua voz saiu trêmula, baixa, mas carregada de algo afiado.Alaric inclinou a cabeça levemente, como se estivesse considerando a pergunta. Depois, deu um passo para dentro da sala, fechando a porta atrás de si. O clique do trinco soou alto demais no silêncio.— Achei qu
O mundo virou de cabeça para baixo.O vento cortava o rosto de Ivy como navalhas, empurrando seus cabelos para trás enquanto ela despencava pelo ar. O choque da queda fez seu estômago se revirar, a gravidade puxando-a com uma brutalidade impiedosa. Os estilhaços de vidro ainda dançavam ao seu redor, brilhando como estrelas em meio à escuridão da noite.Por um breve segundo, o tempo pareceu desacelerar.Ela viu flashes. O riso abafado de Ethan enquanto a ensinava a lutar quando eram crianças. O cheiro de terra molhada da floresta onde costumavam brincar. O toque quente da mão dele segurando a dela. "Eu sempre estarei aqui, Ivy."A dor rasgou seu peito antes mesmo de o impacto vir.O chão se aproximava rápido demais.Ivy aterrissou de lado, rolando pelo cascalho do pátio. Uma onda de dor explodiu por seu corpo, cada músculo gritando em agonia. Ela sentiu o gosto metálico do sangue na boca. Seu braço esquerdo latejava violentamente. Talvez estivesse quebrado. Mas ela não podia parar.— I
Tudo ao redor de Ivy se tornou um borrão.Os olhos dela estavam fixos no homem diante dela, mas era como se seu cérebro recusasse a processar o que via. Sua respiração vinha curta, entrecortada, como se o próprio ar tivesse se tornado pesado demais para ser puxado para dentro dos pulmões. O som dos soldados ao redor—armas sendo erguidas, passos firmes sobre a terra seca—parecia abafado, distante, como se ela estivesse submersa em um mar de confusão e descrença.Não podia ser real.Alaric…O mesmo Alaric que por tanto tempo fora seu amigo, confidente. O homem que caçava os rebeldes com uma determinação impiedosa, que falava sobre ordem, poder, paz como se fossem inquebrantáveis. O mesmo Alaric que prometera acabar com qualquer ameaça ao seu território.E agora… ele era a ameaça.O exército não estava ali para derrubá-lo. Estava ali para segui-lo.Líder.A palavra ainda pairava no ar, como uma lâmina suspensa prestes a se cravar em seu peito.— Não… — a voz dela saiu rouca, quase inaudí
O silêncio que se seguiu à chegada de Lucian foi sufocante. Tudo ao redor parecia carregado de eletricidade, como se o próprio mundo prendesse a respiração diante da cena.Os olhos de Ivy, ainda arregalados pelo choque da traição de Alaric, encontraram os de Lucian. Algo profundo e instintivo se acendeu dentro dela. Um reconhecimento imediato.Ali, ele parecia um lobo entre cordeiros.E, naquele momento, ele era sua única chance.— Soltem-a. — Lucian diz outra vez.A voz dele cortou o ar como um açoite, baixa, mas impregnada de uma ameaça tão crua que os soldados ao redor hesitaram.Alaric, no entanto, apenas ergueu uma sobrancelha, o canto dos lábios se curvando em um sorriso preguiçoso.— Ah, Lucian… Sempre tão dramático.Lucian não se moveu. Seu olhar, predatório e implacável, permaneceu fixo em Alaric.— Não vou repetir.O sorriso de Alaric se ampliou, e ele deu um passo à frente, as mãos para trás, como se estivesse avaliando um jogo de tabuleiro cujo desfecho já conhecia.— Vo