Entrei em casa lentamente, sem acreditar que Benicio tinha estado ali. Ele viu Adam ir embora, eu tinha certeza. Que péssimo timming o nosso, pelo amor de Deus. Ele realmente sorriu com tristeza para mim? Eu podia jurar que sim. O que era isso que eu estava sentindo agora?
Sentei no sofá. A noite passada tinha sido boa, sim. Adam tinha conseguido superar o nervoso inicial e nos encaixamos bem nesse aspecto. Eu tinha me entregado ao momento, mas acordar com os braços dele ao meu redor tinha sido um pouco estranho. E a estranheza tinha aumentando quando ele acordou e sorriu, me puxando para mais perto e beijou minha testa. Precisei inventar que minha mãe ia chegar logo para que ele saísse da cama e se vestisse, sempre com um sorriso satisfeito no rosto. E assim que entrei de volta em casa, olhei pela janela e vi Benicio saindo de trás de uma árvore. Como isso foi acontecer? Primeiro eu nego ser namorada do garoto, para logo em seguida ele ver nossa cara de quem dormiu junto? Muito coerente da minha parte. Com certeza isso estava bloqueado. Eu tinha acabado de fechar a porta para qualquer coisa que pudesse acontecer entre nós dois. Por puro mal entendido. Se ele tivesse me dado a chance de explicar a cena que tinha visto na escola, nada disso teria acontecido. Levantei e me enfiei num banho longo, deixando a água quente cair nos meus músculos doloridos. Tudo que eu precisava agora era relaxar e voltar a focar nos últimos meses da escola, fechar com chave de ouro essa fase da minha vida. Nada de homens para estragar esses momentos finais, estava decidido. Quando desliguei o chuveiro todo o banheiro estava coberto por vapor. Esfreguei a mão no espelho para poder pentear o cabelo com calma e me encarei no espelho. Às vezes eu não sabia muito bem quem estava me tornando, as vezes era complicado saber o que fazer ou escolher a coisa certa. Quando peguei meu celular esquecido na sala, tinha uma chamada de um número privado que ignorei e uma mensagem de Adam: “A noite de ontem foi incrível para mim. Espero ter feito ela especial para você também”. Não soube o que responder. Tinha sido, mas eu não queria que ele criasse expectativas muito grandes em cima disso. Enquanto eu comia o café da manhã, o número privado chamou novamente, mas eu não estava com vontade de falar com ninguém que não estava disposto a se identificar. Fosse quem fosse, ia ter que esperar um pouco mais. Por volta da hora do almoço, a campainha tocou. Juro que não esperava encontrar Adam todo perfumado e arrumado na minha porta, segurando uma marmita com alguma comida muito cheirosa. - Oi, pensei que pudéssemos almoçar juntos. Sua mãe ainda está em casa? - Não, ela está meio atrasada. – respondi, subitamente pensando no motivo da demora dela. – Entra. Ele entrou muito mais confiante que a noite anterior. Aparentemente perder a virgindade o tinha deixado muito mais confortável dentro da minha casa, e sutilmente um pouco convencido. Adam seguiu até a cozinha e colocou as marmitas em cima da mesa. - Pode ser? – perguntou apontando a comida. - Claro. – confirmei me sentando. Que mal poderia ter? A campainha tocou no instante que encostei no assento. Com um sinal para que ele se sentasse, levantei novamente e fui até a porta. Quem mais poderia aparecer de surpresa hoje? Congelei quando vi o policial parado. Depois, tudo que me lembro é das palavras do policial sobre um acidente na pista e então, o chão. Não sei se apenas sentei ou se acabei caindo ali sem forças para me manter em pé. Os braços ao meu redor se alternavam entre os do policial e os de Adam. E escuridão. Por minutos ou horas, eu fiquei boiando num vazio escuro onde não havia nada, apenas estupor. Nada poderia me machucar enquanto eu estivesse ali, e lutei com todas as minhas forças para permanecer onde estava e ignorar a voz que me chamava com insistência, porém foi impossível. Fui lançada à realidade e abri os olhos para o rosto desesperado de Adam e de um médico que imediatamente começou a me examinar por todos os lugares. Pouco depois Adam me colocou no carro e me levou de volta para casa. Nada fazia sentido. Eu era órfã agora, estava completamente sozinha. Se soubesse que seria a última vez, eu teria largado meus cadernos e ido abraçar a minha mãe mais uma vez. Mas nunca sabemos e com certeza, nunca esperamos que algo assim possa acontecer. - Betina, fala comigo. – ele pediu enquanto eu deitava na minha cama – Estou muito preocupado. – ajoelhou ao meu lado. - Adam, eu só quero ficar quieta. – pedi, sentindo meus olhos arderem. A imagem dele embaçou consideravelmente. - Tudo bem. – concordou rapidamente, passando a mão pelo meu cabelo – Vou cuidar de tudo, vou cuidar de você. Eu prometo. Fechei os olhos e esperei que o estupor voltasse, mas não voltou. Antes de finalmente cair num sono estranho cheio de pesadelos, eu rodei por imagens que não queria imaginar. O carro capotado, minha mãe sozinha por horas e horas sangrando até morrer. Seguida por imagens nossas durante toda nossa vida, principalmente quando éramos apenas nos duas, de luto pelo meu pai. Pensei que nunca mais sentiria aquela dor de novo, mas essa era ainda pior. Papai tinha descansado, mamãe estava no auge. Tinha muita coisa ainda por viver. Eu esperava que algum dia ela saísse do luto pelo meu pai e encontrasse um novo companheiro. Ela era tão jovem...- Acho que precisamos conversar. – falei entrando na cozinha onde Júlio estava fazendo um café. O que tinha dado na minha cabeça? - Não precisa falar nada. – ele respondeu virando o corpo na minha direção – Foi um deslize, não é? Casual. – a voz dele era desprovida de raiva, que eu entenderia se ele estivesse sentindo. - Júlio, eu... – tentei encontrar palavras para o que eu tinha feito, mas não sabia como descrever. Por que eu tinha corrido ali? Para camuflar a chateação que eu estava sentindo? Isso era horrível. Eu tinha usado ele.&nbs
Meus braços ficaram subitamente frios longe do contado do corpo dele. Era estranho demais Benicio estar ali, era estranho demais eu ter me sentido completamente acolhida por ele, era estranho eu finalmente ter conseguido chorar em seus braços. Adam tinha cuidado de mim o tempo todo, e de toda parte burocrática que podia, tinha me dado todo o suporte, e eu não tinha conseguido me soltar com ele. - Adam, eu... – acho que eu devia uma explicação para ele. - Não importa. – ele me cortou – Não importa. 
Durante dois meses mergulhei numa história nova e praticamente não sai de casa, não comi direito e nem dormi, não atendi o telefone e não procurei ninguém. Dessa forma, eu não pensava em Betina. Mas era só eu sair dessa rotina que meus pensamentos me traiam. Quando eu pensava no abraço que lhe dei, sentia quase uma dor física por ter sido separado dela, e quando eu deitava na cama, a lembrança do seu corpo e de sua boca me deixavam quase febril. Depois de dez chamadas perdidas da minha mãe resolvi retornar, ou então a polícia iria acabar batendo na minha porta. Ela reclamou do meu sumiço e de novo tentei explicar meu processo criativo sem sucesso, depois insistiu que
- Nossa! – Adam falou com uma risada – Que cena mais imprópria para a porta de uma escola. Vão para um quarto. Não consegui responder. Fiquei parada olhando Benicio nos braços de um cara. Aquele era o pior momento, e nunca vou esquecer, mas foi assim que eu percebi que poderia estar apaixonada por ele. Enquanto um outro cara passava a mão por baixo de sua camiseta, como eu tinha feito, e obtendo o mesmo resultado que eu. Senti uma coisa quente me preencher. E ele olhou diretamente para mim. Diretamente nos meus olhos e foi embora.&nb
Sai da cama tentando fazer o menor barulho possível e andei lentamente até a cozinha para tomar um café. No caminho, peguei a minha camiseta que estava no chão da sala e vesti. Logo eu teria que adiantar um pouco meus textos e precisava despertar meu cérebro. Cinco minutos depois, Júlio apareceu com cara de sono atrás de mim, usando apenas uma cueca. Ele ficava a maior parte do tempo assim agora. Tínhamos passado quase todos os últimos dias na cama sem nunca conversar sobre isso, ele não me perguntara nem mesmo o motivo de eu ter o agarrado na formatura, apenas fomos direto para a casa dele. Na verdade, acho que ele não queria saber o motivo, apenas aproveitar os momentos
Eu estava com um copo na mão, rindo com um amigo meu no gramado, quando vi Betina descer as escadas da casa rapidamente. Havia algo errado, eu soube no mesmo instante, porque sua expressão estava completamente transtornada. Ela saiu para o gramado e seguiu diretamente para a rua onde tínhamos estacionado. Sabia que devia ir atrás dela e saber o que tinha acontecido, mas fiquei parado observando a casa de longe. Instantes depois um cara veio descendo a escada com uma expressão estranha. O rosto dele não me era estranho. Fiquei buscando na mente, sentindo que estava logo ali e eu não conseguia acessar a memória. Ele saiu lentamente para o gramado e foi andando em direção
Estacionei o carro na frente da casa de Benicio e ficamos em silêncio e imóveis. A boca dele finalmente tinha parado de sangrar e estava inchando um pouco. Eu não estava mais irritado, apenas incrivelmente cansado. - Desculpa. – finalmente ele disse, virando-se para mim – Eu sei que tenho sido um babaca. - Eu sabia que a nossa situação era apenas... – me virei para ele também – Olha, eu sabia que não estávamos namorando, ok? – suspirei – Mas não esperava que você sairia comigo e no mesmo lugar ia atrás dela. - Eu não fui at
Foi uma tarefa absurda explicar porque eu estava com o rosto machucado e disfarçar os roxos das costelas dos meus pais. Mantive Betina fora da história o tempo todo e inventei uma outra história qualquer, mas não achei que eles tinham acreditado em mim. Por outro lado, o mais longe que eles poderiam ir era que algum cara tinha mexido com ela e eu tinha ficado irritado. Eles nunca iam imaginar que ela tinha me traído. Na manhã seguinte, eu me sentia de ressaca sem nem ter bebido mais que dois copos. Todo meu corpo doía, mas meu peito doía absurdamente mais. A dor de ter sido traído e de perder Betina me machucavam em igual proporção, e eram infinitamente maiores do que as físicas. Pensei que iria enlouquecer ali, com tantas imagens perturbadoras na min