Nós morávamos na mesma rua e estudávamos no mesmo colégio desde a nossa infância. Eu sabia seu nome, a data de seu nascimento, onde ele morava e toda sua vida, já ele não sabia nem como eu me chamava, eu não existia para aquele rapaz. Victor era o garoto mais popular do colégio, na verdade não sei se popular era a palavra certa, pois ele não tinha muitos amigos, mas todo mundo sabia quem ele era, havia até boatos de que ele era garoto de programa, mas eu nunca acreditei nisso não, pois ele era lindo e hétero, podia ter a garota que ele quisesse num piscar de olhos, não precisava fazer isso para conseguir sexo com facilidade, aqueles olhos azuis já conquistavam tudo e um pouco mais. Eu, por minha vez, era gay assumido mas não era afeminado e nem nunca fui de expor isso para todo o mundo, mas o pessoal do meu convívio sabia que eu gostava de garotos, inclusive, a minha família e quando eu contei todos me apoiaram, só umas tias minhas distante que quando ficaram sabendo passaram a me olhar torto, mas eu não estava nem ai, eu era feliz daquele jeito, e nada, nem ninguém, seria capaz de mudar quem eu era, pois eu me aceitava desse jeito e era só o que importava para mim.
Victor era da minha turma desde que estávamos no sexto ano, mas nunca trocamos uma palavra sequer, ele era muito comunicativo e mesmo tendo poucos amigos ele conversava com todos menos comigo, eu era completamente invisível para ele, só não sabia o porquê, será que era pelo fato de eu ser gay? Quer dizer, eu acho que ele não sabia, tipo, eu não saia por aí contando pra todo mundo, mas alguns dos meus colegas sabiam, talvez tivessem comentado algo com ele, ah, eu só queria saber o porquê dele não me notar.
Era um sábado quando eu estava voltando de uma festa na zona sul de São Paulo e era quase 23h quando chegando no meu bairro eu avistei quatro garotos batendo em um rapaz, pensei em chamar a polícia, mas podia demorar, então mesmo com receio eu fui até onde eles estavam e falei para irem embora.
- E quem vai nos obrigar? Você? – Perguntou um dos garotos que estava a bater no pobre rapaz.
- Não. Mas se vocês não forem embora agora eu vou chamar a polícia. - Falei tentando não demonstrar o medo que eu estava sentinddo naquele momento.
E então os quatro garotos foram embora, eu ajudei o rapaz machucado a levantar e quando eu vi de quem se tratava, eu tive uma grande surpresa.
- Victor? - Perguntei.
- Nos conhecemos? - Parecia um pouco confuso.
- Sim, sou Manuel, somos colegas de escola. - Falei.
Ele fingiu se lembrar de mim e eu deixei assim, não quis tocar no fato dele não saber quem eu era, enquanto íamos em direção as nossas ruas ele me agradeceu por ter ajudado -o e me contou que andou ameaçando um garoto que havia brigado com sua irmã e então esse garoto chamou mais três amigos e todos resolveram dar uma surra nele, fiquei morrendo de dó de Victor, mas não quis deixar transparecer isso, se não ele ia achar que eu era gay, o que não era mentira, mas também ele não precisava saber disso. E mal sabia eu que a partir daquele dia a gente se tornaria amigos inseparáveis. Bom, amigo, não era exatamente o que eu gostaria de ser dele, mas já era um grande começo.
Victor e eu tínhamos a mesma idade, dezesseis anos e tínhamos gostos muito parecidos, adorávamos jogar vídeo game e futebol, subíamos em árvores, adorávamos conversar bastante, ir ao cinema, tomar sorvete, porém tinha algo que ele gostava e eu não: Garotas. Eu tinha várias amigas, mas nunca pensei em namorar uma garota, sei lá achava nojento, mas claro que Victor não sabia disso, não quis contar para ele que eu era gay, pois tinha medo de perder a amizade dele e como eu não parecia ser homossexual acabei deixando as coisas assim, pensava em falar a verdade para ele algum dia, mas numa ocasião mais propícia, ou seja, depois que a gente se conhecesse melhor.
Eu levei Victor até sua casa que era dois quarteirões depois da minha e lhe falei que era melhor ele ir tratar os curativos, queria muito me oferecer para cuidar de seus ferimentos mas fiquei com vergonha. Combinamos de nos encontrar no dia seguinte que seria um domingo e fui para minha casa dando pulos de alegria (literalmente) porque pela primeira vez desde que eu conhecera Victor eu havia conseguido falar com ele e confesso que ele era muito mais legal do que eu imaginava, ficamos conversando até chegarmos na casa dele e cada vez eu queria falar mais e mais com ele, pois tínhamos muito o que conversar já que era a primeira vez que a gente se falava.
No dia seguinte após o almoço a gente se encontrou num campo perto de nossas casas e passamos o dia inteiro juntos. Jogamos pelada no campinho, tomamos sorvete na sorveteria que tinha uma quadra depois do campo em que estávamos e conversamos muito. Em apenas algumas horas um soube da vida do outro. Victor me contou que tinha dois irmãos mais novos, Ariele de quinze anos e Christopher de sete anos, eles moravam sozinhos desde que haviam perdido seus pais em um acidente de avião quando ambos viajavam a trabalho e então Victor começou a trabalhar para sustentar os irmãos e para pagar o aluguel do apartamento em que eles moravam, porém quando eu perguntei no que ele trabalhava ele desconversou. E eu contei que eu tinha mais três irmãos, Francesco de vinte e dois anos que era casado e não morava com a gente, Kamilla de vinte anos que morava com o meu pai em uma cidade vizinha e Karolayne de oito anos que morava comigo, com a minha mãe e com o nosso padrasto.
Francesco era meu irmão apenas por parte de pai e não se dava muito bem com ele, meu irmão e papai viviam brigando porque papai não gostava da esposa de meu irmão que sinceramente era muito chata, Kamilla era minha irmã por parte de pai e mãe e havia optado em morar com papai porque ele morava mais perto da empresa em que ela trabalhava e Karolayne era minha irmã apenas por parte de mãe, mamãe havia tido ela com seu antigo namorado um pouco antes dele falecer. Meus pais haviam se separado quando eu tinha uns cinco anos, sofri muito na época mas acabei superando, uns dois anos depois mamãe começou a namorar outro cara, o Geraldo, eles ficaram juntos somente uns seis meses mas mamãe acabou engravidando dele e na verdade eles só se separaram porque Geraldo acabou morrendo com uma bala perdida pouco antes da Karol nascer, mamãe sofreu muito mas depois ela conheceu Giovanni e pouco depois eles se casaram, eu e minha irmã não gostamos nem um pouco dele, confesso que ele nos dá muito medo, mas mamãe gosta dele e isso é o que importa para a gente, pois tudo o que eu mais quero é vê-la feliz.
- Por que vocês não gostam dele? - Me questionou Victor.
- Porque quando Karol tinha dois anos ele passou a beber e toda vez que ele chegava bêbado em casa ele batia na minha mãe e em mim, ele só não batia na minha irmã porque eu ficava na frente dela e assim ele acabava batendo sempre em mim. Mas já faz um pouco mais de três anos que ele parou de beber mas ele nos olha de um jeito como se fosse nos comer vivos, sei lá, é tão assustador. - Falei.
- Mas Manuel, sua mãe nunca pensou em terminar com ele?
- Eles já se separaram algumas vezes, mas sempre acabam voltando, no fundo mamãe ama muito ele e ela acredita que ele possa se tornar uma boa pessoa. - Falei enquanto olhava aqueles lindos olhos azuis me observando.
Estava adorando ser amigo do Victor, ele era um cara e tanto, mas confesso que estava morrendo de medo de chegar segunda feira e ele me esnobar na escola por causa de seus outros amigos, na verdade queria que a gente continuasse como estávamos, o que para mim estava sendo ótimo, pois estava amando conhecê-lo melhor, havia sonhado com isso há alguns anos.
Era quase 20h quando fomos para as nossas casas e combinamos de ir juntos para o colégio no dia seguinte e foi o que aconteceu, percebi então que de fato havíamos nos tornado amigos, o que me deixou muito contente.- Tem namorada? - Perguntou Victor enquanto íamos para o colégio.- Hã... Não. - Respondi timidamente. - E você?- Solteiro sim, sozinho nunca. - Brincou ao dar um leve sorriso malicioso. - Você não é virgem não, né?- Hã... Ah, não, claro que não. - Falei um pouco envergonhado. - E você também não é, né?- Óbvio que não. Perdi com treze anos. - Falou.- Legal. - Eu disse meio sem graça.Treze anos? Meu Deus! Eu com treze anos era uma verdadeira criança. Quem que perde a virgindade com treze anos? Só o Victor mesmo. Fiquei bem surpreso com su
Nós ficamos conversando um pouco na sala, eu, Victor e seus irmãos que pareciam ser bem legais, e eles eram tão divertidos quanto o irmão mais velho, acho que era de família.- Que tal a gente pedir algumas pizzas? - Sugeriu Victor após algumas horas de conversa.- Demorou. - Respondeu Chris bastante empolgado.Enquanto Victor ligava para uma pizzaria para pedir as pizzas, eu fiquei jogando vídeo game com o Chris e com a Ari e por coincidência ou não, era o meu jogo preferido: Crash. Eles gostavam do mesmo jogo que eu, era muito surreal isso. Ficamos jogando play até as pizzas chegar, o que aconteceu cerca de uma hora depois. Victor pagou as pizzas e eu até quis ajudar, mas ele se negou dizendo que eu era visita e seria tudo por conta dele, o entregador pegou o dinheiro e foi embora.- Atacar. - Gritou Ariele .Eu ajudei eles a colocar a mesa e começamos a comer at&e
O filme estava muito legal, embora muitas vezes eu tivesse ficado com medo e como se não bastasse isso Victor ainda ficava rindo da minha cara e dizia que eu estava parecendo uma garotinha, o que me deixou bastante irritado porque mesmo eu sendo gay odiava que falassem que eu pareço uma garota, o que não era verdade., as vezes, eu achava que ele fazia isso só para me irritar porque ele sabia que eu não gostava disso.Após o cinema eu peguei as minhas coisas na casa do Victor e voltei para a minha casa, mamãe e Karolayne queriam saber tudo que havia acontecido na casa de Victor e eu falei das pizzas, do filme que a gente vira em sua casa, só não mencionei a parte que a gente matara aula, porque senão mamãe ia matar seria eu. No ano passado eu resolvi matar aula com meus amigos porque a gente tinha prova de física e estávamos muito mal na matéria, então r
- Fala. - Falei ao atender o telefone.- Onde vocês estão? - Perguntou Giovanni.- Eu estou fazendo um lanche com um amigo e a Karol está na casa da Evelyn. - Tomeium gole de refrigerante.- Não vem muito tarde para casa que eu vi que vai cair um temporal hoje e pode deixar que eu busco a Karol. - Falou Giovanni que aparentemente parecia estar sóbrio.- Ok. Pode ir buscar a Karol. - Falei.Desliguei a ligação e guardei o celular no bolso traseiro da bermuda. Dei mais um gole em meu refrigerante.- Era meu padrasto. - Falei.- Ele vai buscar a sua irmã e você não se preocupa com isso? - Perguntou Victor.- Não. Pois ele parecia estar bem no telefone, conheço o jeito dele falar quando ele bebe e ele não havia bebido portanto a Karol não corre perigo com ele dessa vez. - Falei despreocupadamente enquanto terminava de comer.
Karol adorou Victor e logo já foi perguntando se podia andar de bicicleta com ele, que acabou aceitando, depois de percorrer quase o bairro todo paramos nossas bikes em um rio e começamos a nadar, Victor e eu nadamos apenas de bermuda e Karol nadou de roupa mesmo por ser menina, foi uma manhã e tanto, nos divertimos bastante, Victor era tão legal, eu estava tão feliz por finalmente sermos amigos.Voltamos para casa para almoçar, mas marcamos de sair à tarde.- Manuel, preciso te contar uma coisa. - Falou Karol com a voz trêmula enquanto almoçávamos.- Quando você me chama de Manuel é porque aí tem. O que foi dessa vez?- A minha professora quer falar com o meu responsável, só que mamãe trabalha o dia todo e Giovanni não é nada meu, então só sobrou você. – Falou Karol enquanto eu servia mais comida para ela.<
Chegamos lá antes do sinal tocar, a minha irmã me apresentou sua professora e depois foi brincar com os seus amigos. Engoli em seco de nervosismo por imaginar o que a professora da Karol podia querer comigo.- Por que não veio os pais da Karolayne? - Me perguntou a professora.A professora de Karol era uma moça jovem, loura de olhos castanhos e muito bonita, devia ter por volta de uns vinte e cinco anos e parecia ter muita paciência com seus alunos, não era a toa que minha irmã me falava muito bem dela.- O pai dela morreu há alguns anos e nossa mãe trabalha muito e não tem como faltar o serviço, mas pode falar comigo, eu sou irmão mais velho dela e passarei qualquer coisa para a nossa mãe. - Falei.- Ok. Sabe, a Karolayne sempre foi uma das minhas melhores alunas, sempre foi a primeira a acabar a tarefa, super inteligente, ela corrigia comigo todas as questõe
- Mana, vem cá. - Falei para minha irmã no dia seguinte enquanto eu me sentava em minha cama.- O que foi? - Perguntou Karol se sentando ao meu lado.- Sabe, eu conversei com a sua professora e ela disse que você anda muito diferente e quer saber? Eu também notei isso. Você não parece mais a minha irmãzinha de antes, sei que tem algo te incomodando, mas não sei o que é. Quer me contar? - Perguntei acariciando a sua mão que estava em cima da minha.- Desculpa, mas eu não posso. - Falou Karol cabisbaixa.- Por que não? - Perguntei preocupado.Karol não respondeu, apenas me olhou e voltou a abaixar a cabeça.- Alguém te ameaçou? - Perguntei.Ela negou num gesto com a cabeça e depois eu pude perceber uma lágrima cair de seu olho. Eu tentei explicar para a minha irmã que não era preciso ela ficar com med
Voltei para casa de noite, antes da mamãe voltar do serviço e ao me ver Karol veio correndo me abraçar e estava muito trêmula, parecia abalada com alguma coisa, como se tivesse visto algum fantasma, ou coisa do tipo.- O que foi? - Perguntei.Karol não me respondeu, apenas ficou cabisbaixa e chorando muito, não queria conversar comigo e não parava de tremer, o que acabou me assustando um pouco.- O que aconteceu? - Perguntei a Giovanni assim que ele saíra do banho.- Nada, por quê? - Ele perguntou parecendo um pouco nervoso.- O que você fez para a minha irmã? – O empurrei enfurecido.- Nada. - Dirigiu seu olhar para minha irmã.- O que você fez para ela? - Perguntei voltando a empurrá-lo. - Porque ela está chorando e não para de tremer?- Eu não sei. Ela estava aqui na sala vendo desenho enquanto eu trabalha