7 anos antes
Primeiro dia de aula em uma escola nova, bem no meio do período, sendo alvo de todos os olhares possíveis como a novata estranha e pálida que se mudou recentemente do Alasca — meu amado Alasca — sendo atirada aos leões de São Francisco que agora me encaram como se eu fosse uma alienígena.
Quando a professora, que fiquei impactada quando soube que se chamava Aretha Trelawney, me lançou aquele típico olhar de quem vai nos fazer passar vergonha, quis me encolher em meu assento e virar uma poça imediatamente. Pena que desejos não se realizam.
— Turma, hoje estamos recebendo nossa nova colega, a Srta. Johnson se juntou a nós depois de sua mudança do Alasca. Por favor, sejam gentis com ela. — Ouço resmungos de concordância por toda a sala, mas ninguém se dirige a mim, o que involuntariamente agradeço. Não sou uma garota tímida nem introvertida, só não estou nos meus melhores dias. Não queria me mudar. Não queria sair do conhecido para o desconhecido. Implorei que me deixassem morar com minha avó, mas minha mãe e meu padrasto bateram o pé dizendo que era inadmissível me deixar lá aos 15 anos. Mas eu sabia bem a razão de não cederem, quem olharia meu irmãozinho quando os dois quisessem sair por aí como se não tivessem responsabilidades?
Solto um suspiro.
Amo minha família, mas eles me cansam.
Como estava em uma turma mais avançada em álgebra no meu antigo colégio, me permito ficar vagando até o término do horário — que se arrasta. O relógio em meu pulso apita sinalizando finalmente o final da aula, depois de guardar tudo saio da sala e vou andando devagar, conhecendo os pontos dessa nova escola onde ficarei presa pelos próximos 3 anos. Me surpreendo por gostar de pequenos detalhes, de como é feito a dinâmica dos armários, é novidade para mim esse sistema das cores. Cada estudante tem seu armário renovado todo ano, mantendo a efetividade desse novo programa. Por exemplo, faltam três anos para que eu possa ingressar na faculdade, então meu armário está no setor verde. No próximo semestre irei para o setor azul e no último ano estarei no setor diamante, onde os armários possuem combinações de cores que alternam dependendo do foco de luz. É impressionante.
Finalmente alcanço a entrada do refeitório e está um caos.
Algum aluno idiota está apostando com outro, tão idiota quanto, quem aguenta colocar mais batatas fritas dentro da boca antes de sentir vontade de vomitar. Ridículos. Com essa aposta sem cabimento, o refeitório todo está voltado para os dois que já estão com uma cor nauseante no rosto. Olhando ao redor, vejo que consigo atravessar o local sem me aproximar da multidão e aos poucos vou deslizando para pegar minha bandeja.
Pensei que sairia ilesa, mas um dos garotos que estava competindo, finalmente chega ao seu limite vomitando tudo o que estava na boca e no estômago bem em cima dos espectadores, já o outro, salta da mesa para fugir do jato e para o meu absurdo azar, tropeça nos próprios pés e desembesta na minha direção. Observo horrorizada ele chegando em alta velocidade perto de mim e não tenho reação nenhuma, a não ser me preparar para a colisão. O impacto enfim chega e sou arremessada para longe.
Puta que pariu.
Ouço algum engraçadinho parabenizando aquele que me derrubou e logo o refeitório todo explode em uma gargalhada ensurdecedora. Que inferno.
Bufando de ódio, começo a me erguer do chão quando uma mão aparece no meu campo de visão, sigo esse movimento e me deparo com o olhar irônico do otário que me derrubou. Sinto uma aversão instantânea com o ser humano em pé na minha frente.
— Você não tem noção não? Poderia ter me machucado. — Reclamo.
Ele estreita os olhos azuis para mim.
— Olá estranha, me chamo Mark...
— Não me interessa como você se chama... — Ignorando sua mão estendida na minha direção, ergo-me do chão, dou batidinhas na minha roupa que ficou amassada e desviando do senhor inconsequente, disparo para a saída do refeitório desistindo do meu almoço.
Estou quase entrando no banheiro feminino quando sou surpreendida por uma mão no meu ombro.
— Ei... — A voz me paralisa momentaneamente, é o engraçadinho de novo.
Viro-me e o pego no flagra, no momento exato em que estava olhando para o meu traseiro.
Deus, não mereço tanto.
— O que você quer?? — Exclamo.
— Me desculpar... não caí em cima de você de forma proposital...
— Pelo menos isso né... já que estava fazendo aquela nojeira com seu amigo.
Seus olhos brilham em divertimento.
— Qual a graça de estar preso nesse colégio se não posso me distrair?
— Então é daquele jeito que vocês se distraem por aqui? Preciso me preparar para ver cenas daquele tipo todos os dias então?
Soltando um riso contido, ele estende a mão novamente.
— Começamos de um jeito errado ali, permita-me reparar esse lamentável incidente...
Suspirando audivelmente e com o semblante entediado, aceito sua mão.
— Sou Melanie.
O sorriso que recebo é capaz de aquecer o mais gelado dos corações. É deslumbrante, típico de garotos que estão acostumados a conseguir tudo o que querem com um aceno de mãos.
— Muito prazer Melanie... Sou o Mark.
Não sabia disso ainda, mas depois dessa estranha apresentação, nunca mais reclamaria de ter mudado contra minha vontade para São Francisco.
Dias AtuaisLeio pela terceira vez o e-mail de confirmação da minha passagem de volta para São Francisco e me atento aos horários para não dar nenhum problema, como aconteceu na viagem de alguns meses atrás. Não consigo esquecer do drama que Mark fez porque esqueci de avisá-lo de um atraso que teve na conexão e isso o fez ficar no aeroporto me esperando por mais de 4 horas.Dessa vez enviei para o meu querido melhor amigo toda minha programação e o site onde tem os acompanhamentos de todos os voos saídos da Irlanda com destino aos Estados Unidos, assim ele não tem do que reclamar quando eu finalmente chegar.Abusado do jeito que é, bem provável que me deixasse mofando no aeroporto até ele chegar, só para descontar o tempo que perdeu da última vez. Ainda não consigo entender como aguento esse homem ano após ano. Mas o que eu estou falando? Mark faz parte de mim, é como um irmão, senti tanto a falta dele nesses dois anos longe, que até seus feedbacks dos relacionamentos de uma noite me
Depois de horas que pareciam intermináveis, desembarquei no aeroporto de São Francisco, meu coração está enlouquecido com a iminência de encontrar Mark no desembarque. Que saudade desse idiota, como pode me fazer tanta falta assim?Como levei a bordo somente uma bolsa pequena, quando autorizam a saída corro como se não houvesse amanhã em direção a restituição das bagagens. Assim que me aproximo da esteira, pego o vislumbre de Mark olhando ansiosamente pelo local e quando sente meu olhar cravado nele, gira na minha direção. O sorriso que ele abre é capaz de iluminar meus dias mais escuros.O que vem a seguir entrou para o Guinness como a cena mais deprimente em aeroporto.Saio correndo em sua direção e me choco contra seu corpo musculoso, causando um baque para o qual ele não se preparou a tempo e fomos parar no chão, rindo igual duas hienas histéricas.— Puta que pariu — Ele chia antes de cair igual um dois de paus no chão.Dou tanta risada que perco o ar e em determinado momento fung
Solto um riso engasgado, esse idiota tinha que soltar uma de suas gracinhas por causa da aparência da cunhada.— Olha só o Jonah te ouvindo falando essas coisas da esposa dele. — Explodo em uma gargalhada quando o vejo com um olhar de olhos esbugalhados, como se estivesse vendo seu irmão se materializando na sua frente.— Porra, ele é capaz de arrancar minhas bolas. — Resmunga, com o corpo trêmulo. — Mas falando sério, minha cunhada é muito linda, tem que ver como meu irmão fica pairando sob ela. Patético demais.— Repito o que disse mais uma vez. Todos viram cadelinhas quando a mulher certa aparece...— Sou vacinado contra isso... Pior ainda se a mulher for bonita, meu irmão está ferrado com todos os gaviões de olho no pardalzinho dele. — Meu Deus, como ele é otário, Mark com suas metáforas é um caminho sem volta, depois que ele começa não para mais. Explodo em uma gargalhada.— Ainda vou ver você se casando Mark.Fazendo som de engasgo, ele faz um sinal de desdém com a mão e foca a
Toda a euforia do retorno da Melanie se esvai do meu corpo quando percebo que ela está me escondendo alguma coisa, seu corpo todo ficou tenso e não conseguiu mais me encarar, virando o rosto para a janela.Que porra está acontecendo aqui?Tinha planejado uma noite para que ela conhecesse a nova boate que abriu nesse período que esteve fora, mas, a julgar pela sua decisão repentina de ficar no seu apartamento — quando ela nunca quis ficar naquela porra — sei que vai recusar o passeio. O que me leva novamente ao questionamento, o que ela está me escondendo?O clima ficou pesado dentro do carro, o ar está intragável.Que grande merda.Encosto na frente do seu prédio e ela rapidamente se movimenta para sair, lhe lanço um olhar questionador.— Preciso descansar Mark, amanhã a gente conversa.Arregalo os olhos, e ela sabendo que conseguiu me deixar em choque, se encolhe.— Ok. — Resmungo. Depois que ela se vai, mil teorias se passam pela minha cabeça e nenhuma delas faz sentido para mim, su
Suas tiradas espertinhas sobre cada casinho meu de uma noite, também foi algo que não quis perder com o tempo e se eu me envolvesse com ela, não poderia voltar atrás, a regra é clara para qualquer um. Como queria Melanie na minha vida, mais do que queria ficar com ela, foi uma escolha óbvia.Isso é, até ela começar a namorar aquele mauricinho no final do seu primeiro ano em São Francisco.Não sei o que foi que senti, não consegui nomear na época e não consigo agora, mas a sensação de sufocamento cada vez que via os dois juntos eram desesperadores. Mas não sei nem porque estou pensando nisso, não é o caso agora. Melanie esta solteira faz mais de dois anos, deve ter tido seus casinhos, mas nada sério a ponto de correr o risco de apelar para a instituição falida do matrimônio.Pelo menos é o que me obrigo a acreditar, enquanto os idiotas que venho a chamar de amigos ficam botando pilha e piorando meu estado de nervos.Imbecis.— Quem cala, consente — Cole diz, rindo.— Claro que pensei,
Aceno com a cabeça e saio da cama.— Pode usar o banheiro do corredor. — Sem dar tempo para que diga mais alguma coisa, encontro meu celular caído no chão perto da porta do meu banheiro, e sem muito rodeio entro trancando a porta atrás de mim.Solto um suspiro.Estou começando a ficar cansado dessa vida, ainda mais quando erro a mão e saio com mulheres que mudam de ideia no meio do caminho. Ela é gostosa, a foda foi uma delícia. Mas é isso, apenas uma foda.Meu celular vibra na minha mão de novo e olho para a tela.Era uma mensagem de Melanie.Mel: Bom dia... Já está acordado?Eu: Acabei de acordar, com uma dor de cabeça daquelas.Mel: Quanto de whisky bebeu dessa vez? Eu: Não faço ideia.Mel: *revirando os olhos* Eu: *rindo mentalmente, porque ao vivo dói*Mel: Você é ridículo... Vamos no café que tem aquele brownie maravilhoso? Estou salivando desde que cheguei ontem no aeroporto, só tem aqui.Eu: Chego em 15. Mel: O de sempre? Eu: Claro 😉Largo o celular em cima da pia, esvazi
Entro no café onde combinei de encontrar a Mel e o cheiro de baunilha me atinge em cheio, respiro fundo sendo dominado pelo delicioso aroma. Vou me esbaldar nos cupcakes e brownies que tem aqui. Dou uma olhada em volta e vejo minha amiga sentada de costas para mim entretida em um telefonema, sigo em sua direção e escuto quando diz ao seu interlocutor.— Eu também estou morrendo de saudades.Fico petrificado atrás dela, completamente sem reação, em determinado momento ela dá uma risada e como se sentisse minha presença, olha para trás.Arregalando os olhos, diz no telefone.— Preciso desligar agora, nos falamos mais tarde. Mark chegou.Ouve atentamente o que é digo do outro lado da linha e logo desliga, voltando-se para mim, abre um sorriso contagiante.— Mark, finalmente, estava quase comendo tudo sozinha.Com um sorriso sacana, dou a volta na mesa e sento-me de frente.— Você está com uma aparência horrível.— Ui, que belo jeito de falar que sou um gato Mel, perdeu a mão. — Digo sorr
O que diz me acerta em cheio, como um golpe de boxe, perco o ar e a visão fica turva, sua voz vai se distanciando conforme minha mente começa a girar, as vozes dos rapazes voltam com tudo, me deixando desnorteado.Porra, então eles tinham razão quando disseram que ela estava com alguém. Mas por que ela não me contou antes? Revoltado, levanto-me da cadeira em um salto causando um estardalhaço e lançando um último olhar para ela, saio de lá a passos largos.Estou enfurecido demais para me controlar e antes que diga algo que possa me arrepender depois, prefiro me afastar. Escuto ela me chamando ao fundo, mas não dou bola e quando vejo, já estou atrás do volante do meu carro arrancando em alta velocidade.Não sei exatamente para onde estou indo, só percebo que cheguei no Sebastian, quando estaciono em frente ao seu apartamento. Dou bom dia para o porteiro que já me conhece e sigo para os elevadores. Durante todo o trajeto meu celular não parou nenhuma vez, Melanie está implacável e não d