3 - LAIUS ACUADO

Todos ao mesmo tempo, com andar e olhar de caçadores, se aproximaram juntos com a cauda serpenteante levantada ao céu. Fecharam o círculo à minha volta, aproximando-se com os olhos fixos em mim! Movimentos tão perfeitamente sincronizados que quase hipnotizaram a vítima: eu.

Tomado por súbito medo de virar refeição, senti a adrenalina jorrar. Com um movimento lento, pus a mão no cabo da minha lâmina e fiquei imóvel, tentando prestar atenção em todos os que cabiam em meu raio de visão. Um deles, um macho em especial, dirigiu-se com ferocidade à tigresa que me trouxera e rugiram um para o outro sem se tocar, repetindo o gesto algumas vezes. Tive a impressão que se comunicavam ou, mais precisamente, discutiam seriamente sobre mim, porque entre uma rugida e outra, encaravam-me de relance.

Era o maior de todos, bem acima da média e parecia irritado ao me ver. “O alfa” — pensei intrigado com a situação. Parou de rugir e me observou em silêncio. Tão lento quanto antes, afrouxei um pouco a mão em volta do cabo da lâmina. Devagar, caminhou em minha direção com passadas perfeitas e firmes, características dos felinos e sem desviar os olhos, aproximou-se fazendo-me apertar a empunhadura.

Cheirou-me por inteiro tocando, por vezes, o narigão gelado em partes do meu corpo. Levantou-se sobre as patas traseiras e colocou as dianteiras em meu ombro quase me abraçando. Era tão mais alto que senti o bafo de cima cafungando meu rosto e minha cabeça.

E que patas enormes! Estaquei sem reação imaginando que, se tivesse a mesma velocidade que têm os gatos domésticos para um ataque, poderia decapitar-me com uma patada.

Tomado pelo pânico, fiquei petrificado, suando frio e minha mão apertou mais! O medo retardou minha ação e, quando decidi sacar a lâmina, o bichano deu várias lambidas ásperas e molhadas na minha cara, desconcertando-me e desfazendo qualquer possibilidade de reação agressiva de minha parte.

Senti o ar fugir dos pulmões, em alívio. Ganhara uma sobrevida. Pensando friamente, o que teria adiantado reagir? Eu estaria morto se eles assim desejassem.

Ele dirigiu-se outra vez à tigresa dando rugidos intercalados com resmungos, e respondidos da mesma forma. Em seguida, rugiu estrondosamente alto, olhando para cima e para os outros tigres como se desse uma ordem. Absolutamente tudo o que eu vira até aquele momento fora surpreendente, mas o que veio a seguir foi, em uma palavra: inacreditável!

Todos os animais adotaram postura bípede ao mesmo tempo em que seus corpos diminuíam de tamanho, os pelos sumiam e as feições mudavam. Transformavam-se em seres humanos muito rápido!

Com a transformação completa, girei devagar trezentos e sessenta graus ao observar estupefato! Vestiam peles de animais e pareciam de etnias diferentes. Por fim, minha visão estacou nela, a tigresa que me levara até lá transformada em uma lindíssima mulher de formas e curvas perfeitas; longos e ondulados cabelos tão negros que emitiam um brilho azulado e pele branca como a neve; olhos grandes, verdes como esmeraldas e enigmáticos fixos em mim. A boca de lábios médios e sensuais me agraciou com um sorriso encantador de dentes perfeitos.

Hipnotizado, eu não consegui tirar os olhos dela, tamanha a beldade! A boca rosada e carnuda na medida certa se mexia, falava algo e eu, encantado pela perfeição que ela irradiava, demorei para começar a escutá-la. Esforcei-me para ouvi-la e o volume de sua voz subiu aos poucos, tão aveludada que mais parecia o canto de uma sereia. Eu não conseguia prestar atenção no que dizia e, sim, no timbre melodioso que emitia.

Acordei do transe ao me dar conta que ela usava uma língua familiar. Esforcei-me mais e percebi que a entendia parcialmente, até que reconheci o idioma. Fiquei pasmo outra vez!

Era uma língua muito antiga que há mais de dois mil anos serviu de base para o nosso idioma atual. Era surpreendente, mas ela falava inglês!

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