Antoni Armand
A chamada telefônica me puxa de volta à realidade, interrompendo o turbilhão de pensamentos que me consome. Com o celular na mão, respiro fundo antes de atender, sabendo que o peso da conversa será inevitável. — Pai, eu vou dar um jeito nessa situação, ok? — tento controlar minha voz, tentando parecer mais calmo do que realmente me sinto, já antecipando o tom pesado que virá do outro lado da linha. — Antoni, eu confiei a empresa nas suas mãos. Você me prometeu que ia cuidar de tudo. — A voz dele é grave, saturada de frustração e preocupação. Sinto o peso das palavras, como se cada uma delas fosse um açoite. — Sua irresponsabilidade está colocando tudo o que construímos em risco. Estamos perdendo contratos importantes e, o pior, estamos minando a credibilidade de clientes fiéis que confiaram na gente por anos. Ouço o suspiro pesado do meu pai, como se cada palavra tivesse sido um esforço físico. A tensão que ele carrega na voz é palpável, e consigo sentir a dor de cada decisão que tomamos. Ele construiu tudo isso do zero, dedicando sua vida a essa empresa, e agora sou eu quem está colocando tudo em risco. — Eu sei, pai. Eu sei. — Minha voz sai mais baixa, mais rouca. Tento controlar a frustração, tentando não transparecer o medo que começa a tomar conta de mim. — Me dá mais esse voto de confiança, por favor. Eu vou arrumar isso. Vou tomar as rédeas e fazer as coisas acontecerem de novo. — Eu não quero mais ver nenhum escândalo seu nas mídias, Antoni. Este vai ser o último voto de confiança que eu te dou. — A voz dele fica mais fria, mais distante, e sinto o peso de suas palavras esmagando minhas esperanças. Ele está no limite da paciência, e eu sei que qualquer deslize agora pode ser o fim de tudo. Fico em silêncio por um momento, absorvendo a gravidade da situação. Ele está certo. Cada erro meu agora tem consequências irreversíveis. A empresa não é apenas um negócio. É o legado do meu pai, é a essência da nossa história. — Eu prometo, pai. Não vou te decepcionar. — Tento ser firme, mas a tensão na minha voz é evidente. Eu sei o que está em jogo, e a última coisa que quero é fracassar. A chamada termina, e a escuridão do silêncio toma conta do ambiente. Fico ali, parado, tentando processar o peso que acabo de carregar. Não posso mais ser o filho rebelde e irresponsável. A empresa, a família, tudo depende de mim agora. A responsabilidade nunca foi tão pesada, e eu sei que estou em uma linha tênue, onde qualquer erro pode fazer tudo desmoronar. De repente, o som suave de dois toques na porta interrompe meus pensamentos. Antes que eu possa dar permissão para entrar, a figura conhecida da minha irmã surge na porta. Ela está com aquele sorriso de quem sabe que está me empurrando para uma responsabilidade a mais, e eu não consigo evitar o suspiro que escapa dos meus lábios. — Irmãozão, vim me despedir e trazer as coisas da Kira. Já organizei tudo para ela. — Ela entra, com um ar de quem já planejou tudo, como sempre. Seu sorriso é misto de afeto e uma leve pitada de ironia. Ela sabe exatamente o que está me forçando a fazer. Eu olho para ela, sem poder esconder o sorriso irônico que surge no meu rosto. — Tudo bem. Vou pedir para os seguranças colocarem as malas no porta-malas e a cadeirinha no banco. — Respondo, já sabendo que isso vai me consumir um bom tempo a mais do que eu gostaria. Mas, o que posso fazer? É minha irmã, e se eu não fizer, vou ser crucificado. Ela me observa, o olhar dela, como sempre, sério e observador. Mas, ao contrário do que ela imagina, não consigo evitar o riso diante de sua expressão. — Eu sei que você não gosta de nada disso, Antoni, mas eu só tenho você. Depois que a mamãe se foi, sempre fomos um pelo outro. Não posso simplesmente deixar minha joia nas mãos de qualquer um. — Ela diz, com um tom que mistura preocupação e determinação, e uma pontada de carinho que, por mais que eu tente, não consigo ignorar. Eu suspiro, tocado pela forma como ela se dedica à Kira, mas também pela culpa que ela não diz, mas sempre carrega. Não é fácil para ela confiar alguém com a filha, especialmente depois de tudo o que aconteceu. — Eu sei disso, e não teria coragem de deixar a Kira com qualquer um. — Respondo com convicção, sentindo o peso da responsabilidade, mas também o orgulho de saber que ela confia em mim. Ela me observa por um momento, seu olhar muda. Agora, ela está mais séria, mais rígida. Como se estivesse me dando uma última chance para provar que eu sou capaz de fazer as coisas do jeito certo. — Antoni, Kira tem uma alimentação saudável, nada de doces ou lanches em excesso. E, por favor, nada de bagunça no cabelo dela. Eu não quero chegar e encontrar minha filha com um coque torto ou, pior, com a meia-calça errada. — Ela fala com uma autoridade que não se pode ignorar, e eu a escuto atentamente, ciente de que ela não está brincando. Eu faço uma careta exagerada, como se fosse o maior sacrifício do mundo, tentando aliviar a tensão que se forma no ar. — Certo, sargenta. Pode deixar. — Brinco, mas, por dentro, estou absorvendo cada palavra, porque sei que ela está falando sério. Ela me dá um beijo no ar, um gesto rápido, mas cheio de carinho, antes de se virar e sair. Eu fico ali, no silêncio da sala, pensando no que vem pela frente. Agora, a realidade b**e de vez. Eu tenho esses próximos dias para provar a mim mesmo, e ao meu pai, que posso assumir as rédeas da minha vida e não deixar que tudo se desfaça. Sem festas, sem escândalos, sem nada que me coloque de novo nos holofotes. Só eu, minha sobrinha e minha rotina de CEO. E, quem sabe, um pouco de sexo casual com a Cíntia, só para manter as coisas “sob controle”. Mas, por agora, o objetivo é claro: manter minha imagem limpa e, mais importante, não ser o alvo das revistas de fofoca. Eu sei que, se seguir as regras, tudo vai se ajeitar. Pelo menos, é o que espero.Isabella Cavalieri Os dias se arrastam como um balé exaustivo, e o cansaço tornou-se minha sombra mais fiel. Acordo antes do sol para ensinar pliés e piruetas, corrigir posturas e incentivar pequenos passos que, um dia, se tornarão grandes voos. À tarde, a rotina continua, e minha energia se dissolve a cada movimento repetido. À noite, as meninas mais velhas se juntam a mim para o ensaio extra de O Lago dos Cisnes—e, mesmo apaixonada pelo que faço, meu corpo suplica por descanso. Meus pés estão sempre doloridos, latejando sob o peso de tantas horas na ponta. Quando as luzes da academia finalmente se apagam e posso ir para casa, meu maior desejo é simples: uma ducha quente que lave o cansaço e me devolva ao mundo dos vivos. Só então, envolta no aconchego dos lençóis, me permito uma última indulgência—um romance clichê onde, em apenas 90 minutos, tudo encontra seu final feliz. Saio da sala de balé, tranco a porta com cuidado e caminho até a recepção para entregar a chave à Milena. Ma
Antoni Armand Fico parado diante da porta, atordoado. Meu olhar ainda está fixo no espaço vazio por onde aquela… tempestade passou. Uma bailarina em miniatura, mal maior que um tremor, berrando na minha cara como se fosse minha mãe. E eu? Eu, Antoni Armand, CEO da Armand’s Company, acostumado a enfrentar acionistas hostis, repórteres sensacionalistas e concorrentes de sangue frio… fiquei sentado, sem conseguir abrir a boca.O eco das palavras dela ainda reverbera na minha mente, junto com a imagem de seus olhos faiscando de fúria. Quem diabos era aquela mulher? Melhor ainda… quem ela pensa que é para entrar no meu escritório, me desafiar e sair como se tivesse vencido?Me recosto na cadeira, esfregando a mão no rosto, tentando absorver o que acabou de acontecer. Mas antes que eu possa colocar meus pensamentos em ordem, um par de passinhos ecoa pelo chão de mármore.Kira surge na minha frente, completamente alheia à guerra que aconteceu aqui dentro. Seu sorriso doce contrasta absurdam
Isabella Cavalieri Acordo com um sono péssimo. Ontem, ao chegar em casa mais tarde do que de costume, acabei me atrasando para tudo. Meu corpo, acostumado à rotina, parece que não sabe funcionar sem ela, e, como resultado, acordo completamente perdida. Me levanto, passo um pouco de água fria no rosto para tentar espantar o cansaço e me recompor. Coloco a roupa de balé, jogo tudo na mochila e desço para tomar café. Na mesa, encaro minha mãe com uma expressão de quem não está nada bem. Não sei se já mencionei isso antes, mas mamãe é… controladora, para dizer o mínimo. Ela está me observando com atenção, como se estivesse esperando algo de mim. O olhar de minha mãe é afiado como uma lâmina quando me sento à mesa. Sei exatamente o que está por vir antes mesmo de ela abrir a boca. — Onde esteve ontem, que chegou mais tarde que o usual? — A pergunta vem seca, sem rodeios, carregada de julgamento. Eu seguro um suspiro, mantendo a expressão neutra. Não adianta demonstrar irritação, iss
Isabella Cavalieri Estava no final do meu alongamento quando uma voz doce me tirou dos pensamentos. — Titia, cheguei! — Kira anunciou com sua mochila rosa balançando nas costas enquanto corria até mim. Sorrio, encantada com a energia que ela sempre trazia ao estúdio. — Oi, pequena! Vem cá, a titia vai te arrumar para a aula. — Estendi os braços, chamando-a, e ela veio correndo, um sorriso enorme no rosto. Kira é uma criança encantadora, com cabelos longos e escuros que sempre me lembram a mãe dela. Seus olhos levemente puxados lhe dão uma doçura especial, e seu entusiasmo pela dança ilumina qualquer ambiente. Ajudei-a a trocar de roupa, colocando seu collant preto e, por cima, uma sainha leve que balançava conforme ela se mexia. Como estava calor, optamos por não usar meia-calça. Nem eu estava usando naquele dia, já que o sol parecia derreter o asfalto lá fora. — Pronto, agora vamos para a parte mais importante — digo, pegando a escova de cabelo e me sentando no chão. Puxe
Isabella Cavalieri Era sexta-feira, e o cansaço me dominava como um manto pesado. Depois de uma semana exaustiva de ensaios, enfim havia um raro momento de respiro. Da beira da sala, observava as meninas na barra — seus movimentos precisos, a sincronia quase hipnótica, as expressões concentradas que denunciavam a disciplina de cada uma.Mas foi impossível não notar Kira.A pequena bailarina tinha algo diferente no olhar — um brilho sempre presente, mas hoje misturado ao opaco das lágrimas silenciosas que deslizavam por seu rosto. Ainda assim, ela seguia, impecável, executando seus pliés com uma delicadeza que partia o coração.Engoli em seco. Era impossível não lembrar de mim mesma, na mesma idade. Quantas vezes dancei sufocando dores físicas e emocionais, repetindo os passos como minha mãe exigia, porque, segundo ela, a excelência não dava espaço ao conforto.Aproximei-me de Kira e me abaixei ao seu lado, suavizando o tom da voz.— Ei, está tudo bem, querida?Ela balançou a cabeça d
Antoni Armand O médico apareceu pouco antes da meia-noite e confirmou que Kira estava com uma infecção estomacal. Ela precisava passar a noite em observação. Assim que ele terminou de falar, Kira desabou em lágrimas. Ela tinha um pavor visceral de hospitais e só se acalmou quando Isabella subiu na cama estreita e a envolveu em um abraço apertado. Eu nunca tinha visto minha sobrinha confiar tão rápido em alguém. Bella era um porto seguro para Kira, e algo nela a fazia sentir-se protegida. Talvez fosse o jeito carinhoso, a paciência infinita, ou até mesmo aquela doçura que parecia contagiar qualquer um que cruzasse seu caminho. Passei a noite sentado na poltrona do quarto, observando as duas dormirem juntas. Bella mantinha os braços firmes em volta da pequena, como se dissesse que nada no mundo a machucaria enquanto ela estivesse ali. Suas palavras mais cedo continuavam ecoando na minha mente: “Você está criando uma criança, Antoni.” E ela estava certa. Olha onde estávamos. Quand
Isabella Cavalieri Hoje quando cheguei do hospital eu e minha mãe tivemos uma briga feia, ela simplesmente não se importou por eu ter ajudado Kira, ela simplesmente achou o cúmulo eu não cumpri a minha carga horária de trabalho e não ter dormido bem, o que na verdade foi mentira por que eu dormi a noite toda. Isso me deixa incomodada, parece que pra ela só serve se eu tiver fazendo algo ligado ao balé, e eu tô cansada, eu queria ter amigas, sair, beber, poder sei lá fazer uma faculdade, ter um namorado, mas eu não vejo como me livrar de tudo isso, eu amo minha mãe e não quero magoá-la. Chego do restaurante depois do almoço e minha mãe me encara com a cara fechada. — você saiu quando eu mandei você ficar no estúdio ensaiando até a hora que eu mandasse parar – ela diz — mãe eu fiz isso, mas precisava parar pra almoçar, eu tinha sido convidado pelos Armands pra comer e eu fui – me explica — eu quero que se afaste dessa menina, você está saindo da sua rotina por conta dela,
Antoni Armandi Encaro a pequena garota descendo as escadas, os pés descalços tocando suavemente cada degrau, o tecido da minha camisa batendo no meio de suas coxas, larga demais para ela, o que só reforçava o contraste delicado daquela cena. Por mais estranho que parecesse, algo dentro de mim se aquecia ao vê-la ali — não apenas pela presença dela em minha casa, mas pela naturalidade com que ela se encaixava naquele espaço.— Ela dormiu? — perguntei, assim que se sentou ao meu lado no sofá, com a mesma leveza de quem já fazia parte daquela sala.— Dormiu sim — respondeu com um tom calmo e baixo, quase cúmplice. — Deixei tudo organizado lá em cima e deixei um abajur aceso pra ela não acordar no escuro.Assenti, observando a tranquilidade com que ela falava, como se cuidar de Kira fosse algo natural, instintivo.— Quer um chá? Camomila? — ofereci, meio sem pensar. Talvez quisesse apenas uma desculpa para prolongar sua presença por ali, mais alguns minutos, quem sabe horas.Ela riu com