Última Esperança

A entrevista ainda estava sendo transmitida pela TV da sala de espera no quarto andar de um Hospital Pediátrico, enquanto uma enfermeira andava pelo corredor com uma prancheta em mãos, entrando pela porta na sala e encontrando-se com um homem adulto, de cabelos loiros, com uma leve calvície sobe sua testa. Sua barba estava por fazer e seu olhos estavam profundos, com olheiras tão intensas que davam a impressão que ele havia recebido um golpe em cheio em ambos. Ele usava uma camiseta verde escura, a mesma possuía um logotipo de uma empresa de metalúrgica, além de um relógio prateado no pulso. Suas mãos, estavam sujas e calejadas, com sujeira provinda de graxa entre as unhas. Sua expressão era de nervosismos e ansiedade, assim como era a da maioria das pessoas numa sala de espera de hospital.

— Senhor, Clézio Schavaren? — disse a enfermeira olhando o nome na prancheta para se certificar que disse o sobrenome corretamente. — O doutor já terminou os exames e você já pode ir vê-la. Em breve ele voltará com os resultados.

— Certo. — respondeu com um olhar de esperanças. — Obrigado.

Imediatamente se levantou e seguiu a enfermeira por um corredor extenso de paredes brancas e piso feito em mármore, as lâmpadas tubulares e compridas piscavam enquanto ambos andavam em silêncio, com apenas o som dos sapatos da enfermeira ecoando pelo corredor. Finalmente pararam em frente a um quarto de porta de madeira, ao abri-la, Clézio pôde ver uma pequena garotinha, com não mais de oito anos, deitada sob uma cama, inconsciente e ligada a uma série de aparelhos, com a cabeça totalmente raspada, sintoma causado pelas inúmeras sessões de quimioterapia. Se aproximou devagar do leito, segurando as lágrimas, que forçavam para saltar de seus olhos. Se inclinou e se aproximou do ouvido da garota, e disse quase sussurrando, com uma voz rouca em seus pequenos ouvidos:

— Olá, querida. — disse passando a mão em sua testa, enquanto a máquina ligada a seu coração apitava dizendo que ele batia. — A mamãe estava muito cansada, então, eu disse para ela descansar um pouco. Mas eu estou aqui. — concluiu com um sorriso fraco e oprimido.

Não conseguiu conter as lágrimas, porém, uma voz adentrou na sala de surpresa, era um homem, alto e moreno, que ao chegar no quarto, se sentou à mesa e colocou uma prancheta sobre ela.

— O senhor é o pai, certo? — perguntou ele.

— Sim, Doutor, eu sou. — respondeu ainda acariciando a testa de sua filha, enquanto tentava inutilmente secar as lágrimas de seus olhos com o antebraço. 

— Então... Senhor Clézio... é melhor o senhor sentar-se aqui. O que tenho para lhe dizer, não será fácil. — disse o médico apontando para uma cadeira logo à frente.

Clézio olhou para a cadeira à sua frente por alguns segundos. Sentiu que ao se sentar ali, perderia o seu mundo, perderia toda a sua razão de viver. Ele sabia que ouvir o que o médico estava prestes a lhe dizer acabaria com sua última esperança. Hesitou, ele não queria se sentar, mas mesmo assim, se sentou.

— Eu sei que é ainda mais difícil ouvir esse tipo de coisa. —continuou —  Mas, os resultados dos exames de sua filha não mostram qualquer melhora. O fato é que ela sempre teve uma saúde frágil, e essa última recaída, parece ter sido demais para ela. Eu sinto muito, mas são os aparelhos que estão a mantendo viva, eu não sei se ela aguentará por muito tempo, pode ser que aguente por cinco dias, uma semana ou mais, mas é impossível dizer ao certo. Não é fácil, e não quero forçá-lo a nada, mas nestas situações, costumamos perguntar aos familiares se querem manter os aparelhos ligados.

A notícia foi como uma lâmina sendo fincada ao peito, Clézio já havia vivenciado muitas coisas horríveis, mas nada lhe me deixado a ponto de se desorientar os pensamentos e perder o equilíbrio como isso. Seus ouvidos tiniram, sentiu como se pudesse desmaiar, sem perceber, seu rosto já estava desabando entre lágrimas, sua voz não saia, a garganta estava trancada e lhe faltou ar.

O médico se levantou da cadeira e se aproximou, colocou a mão sobre seu ombro e continuou. — O hospital não quer pressioná-lo, nem o apressar, podemos mantê-la aqui pelo tempo que quiser. Mas, seria alimentar uma falsa esperança e gasto de dinheiro. Tudo que estava ao nosso alcance já foi feito. Sei que precisará de tempo para pensar e conversar com sua esposa. Eu lhe peço desculpas por dizer essas coisas, sinto muito. Irei buscar um copo de água com açúcar para o senhor.

O Doutor se retirou do quarto, deixando Clézio e sua filha sozinhos, enquanto o sol de domingo refletia pela janela em um vaso com flores, deixadas ao lado da cama como um presente de aniversário.

     Ele se aproximou novamente da cama com passos pesados, então, segurou a pequena mão de sua filha, que coube inteiramente dentro da sua tão facilmente. Ela ainda era pequena, até mesmo para uma criança de oito anos devido à sua doença.

     Enquanto isso, na mesma sala de esperava do hospital pediátrico, um homem estranho trajando um grosso casaco sentava-se nas cadeiras do fundo, ele aguardava ansiosamente alguém, até que essa pessoa finalmente apareceu. Um dos médicos do hospital, mais jovem e aparentemente novo ali, ao vê-lo, demonstrou reconhecê-lo negativamente:

— O que você está fazendo aqui?! — perguntou o médico enfurecido ao se aproximar.

— Você sabe... — respondeu. — Estou aqui a negócios. O que mais me traria a este lugar? — concluiu olhando para os lados.

— Então, você conseguiu outro daqueles e veio leiloar no hospital, não é? — indagou o médico furioso. — Mas eu já lhe disse, não vou mais ajudar com isso. Da última vez você quase foi pego por um dos médicos. Eu não quero me encrencar por sua causa, você pode não ter nada a perder, mas eu tenho que pensar em minha carreira e em minha família. Preciso desse trabalho.

— É justamente por se preocupar com sua família que você aceitou me ajudar na última vez, não foi? Diga se a sua parte do lucro não foi de grande ajuda para sua família a comprar a nova casa? Inclusive, foi o que te ajudou a pagar seu saldo com o banco, não foi?

— Você tem razão... — respondeu sem jeito. — Mas era uma situação diferente, agora estão de olho, já suspeitaram do meu envolvimento na última vez. Acharam que estávamos vendendo algum tipo de droga para os pacientes.

O médico tentava dispensar o homem, mas ele insistia em pedir sua ajuda.

— Desta vez será a última. Você não tem ideia, Marcos, mas o que tenho aqui não é outra como as de antes, essa é muito mais rara, e também, muito mais valiosa! Ficaremos ricos, hoje mesmo!

Marcos pensou por alguns segundos, então, finalmente cedeu após a chantagem.

— Está bem. Mas esta é a última vez, está me ouvindo, a última vez! — concluiu e alto e bom som.

— Como eu disse, será a última.

— Espere aqui um pouco, irei verificar as pastas de prontuários e lhe passo o número dos quartos e os casos de doenças autoimunes. — disse o médico.

— Não. — disse com um sorriso. — Dessa vez, me dê os casos mais graves. Preciso de alguém que esteja à beira da morte.

— Tudo bem, mas tente não chamar atenção até eu retornar.

O médico se retirou do local às pressas, deixando o homem ali esperando, enquanto ele sorria e cumprimentava as pessoas que passavam ao seu lado.

Algum tempo depois, anda no quarto andar, Clézio esperava sentado de cabeça baixa ao lado de minha filha, quando um homem estranho vestido com um casaco grosso entrou no quarto.

— Com licença senhor, esta é sua filha, não é? — perguntou educadamente, mas suspeito por sua aparência.

— Sim, é minha filha.

— Oh..., mas que lamentável a situação que ela se encontra. — disse ele. — Pobrezinha. Tão pequena. O senhor faria de tudo para poder ajudá-la, não é? — perguntou olhando nos olhos de Clézio.

Neste momento, ele sentiu raiva, pois pensou que o homem estivesse debochando. Se controlou, então perguntou:

— Você é médico?

— Digamos que, talvez. — respondeu. — Mas tenho algo que com certeza pode ajudá-la.

O homem retirou de um dos bolsos de seu casaco uma pequena caixa, aparentemente de chumbo e colocou sobre a mesa do médico. Ele a abriu lentamente pois a tampa era aparentemente muito pesada, e de dentro dela, retirou uma pequena pedra verde brilhante de seu interior, não muito maior do que uma ameixa. A pedra possuía um formato curioso, como uma pirâmide, achatada e sem pontas. Ele a segurava com um sorriso, iluminado pelo brilho esverdeado. Estendeu a mão, aproximando o objeto estranho da garota sobre a cama.

No momento, Clézio tentou questionar a atitude, mas o homem apenas sorria, dizendo para que mantivesse calma e apenas observasse. 

A pedra que ele segurava tinha um brilho opaco e esverdeado, mas começou a perder lentamente seu brilho ao se aproximar de sua filha. Os aparelhos em que ela estava ligada, passaram a mostrar alterações. Em seguida, a pequena garotinha começou a mexer levemente os dedos da mãos, em poucos segundos, começou a reagir, fazendo pequenos movimentos, respirando profundamente, e então, milagrosamente ela abriu suavemente os olhos e dirigiu o olhar diretamente o seu pai, que estava espantado e emudecido pelo que estava presenciando diante de seus olhos, era um verdadeiro milagre, era uma nova esperança.

Ela abriu suavemente a boca, seus lábios estavam secos e partidos. Após respirar fundo, disse quase aos sussurros, com sua voz doce e fraca.

— Pa... Pai?

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