Eu ofego.— Pai, eu vou me casar com ela.Silêncio.Do outro lado da linha, ouço um xingamento abafado antes que meu pai interrompa a ligação sem sequer se despedir. Ele não precisava dizer nada; o peso da sua desaprovação já estava claro como o dia. Respiro fundo, tentando dissipar o aperto no peito, e ergo os olhos para Burak, que está me aguardando com sua expressão calma e inquisitiva.Ao meu redor, o burburinho do restaurante parece distante, como se houvesse uma barreira invisível me isolando do resto do mundo. As vozes misturam-se em um som indistinto, mas nada disso importa. Tudo o que consigo pensar é no peso da história que estou prestes a compartilhar, uma história que até agora guardei apenas para mim.Olho para Burak e, reunindo coragem, começo:— Tudo começou há quatro meses...Minha mente me transporta para aquele dia. O primeiro dia de trabalho de Isabela. Um almoço beneficente organizado pelo meu pai, repleto de figuras importantes. E lá estava ela, ao lado dele, dese
Ela me lançou um olhar arisco, controlado, como se suas palavras estivessem guardadas atrás de um escudo. Não respondeu nada. Apenas acenou de leve, desviou o olhar na direção do meu pai e, com um pedido de licença educado, afastou-se. Fiquei parado por um momento, observando enquanto ela se juntava a ele. Meu pai a aguardava com a postura de sempre — rígida, superior.A segunda vez que a vi foi em uma reunião sobre biotecnologia, onde eu e meu pai participamos juntos. Isabela estava lá, novamente como intérprete. Lembro-me de cada detalhe daquele dia, principalmente do quanto me distrai ao observá-la.Enquanto ela traduzia termos técnicos com sua voz calma e precisa, não consegui evitar. Meus olhos insistiam em deslizar até sua boca, admirando a forma como ela articulava cada palavra. Seus gestos, ainda que sutis, revelavam dedicação e esforço. Quando ela arqueava as sobrancelhas em dúvida e lançava um olhar em minha direção para buscar confirmação, sentia algo indescritível crescer
Depois que soube de sua gravidez, fui tomado por uma avalanche de emoções: amargura, angústia, frustração, tristeza e uma dor quase física que não dava trégua. Mas, em meio a tudo isso, uma coisa era certa no meu coração: eu lutaria pelos direitos de Isabela. Estava pronto para enfrentar meu irmão, Zein, e exigir que ele assumisse sua responsabilidade. Sabia que isso significaria uma briga de proporções épicas, pois ele teria meu pai como aliado em qualquer decisão que tomasse.Já conseguia prever o desenrolar dos eventos: Zein, com o apoio de meu pai, aceitaria assumir a criança, mas tudo não passaria de uma farsa. Eles convenceriam Isabela a viajar para nosso país com a promessa de casamento, apenas para meu pai encontrar uma forma de afastá-lo e confiná-la no palácio até o nascimento do bebê.Nesse mesmo dia, angustiado e decidido, esperei meu pai no hotel. Antes que Zein chegasse, contei-lhe sobre a conversa que tive com Isabela. Relatei a gravidez, o modo como meu irmão a enganou
Burak faz um gesto de rendição, levantando as mãos.— Você é quem sabe. Mas, Raed, só espero que esteja preparado para o que vem pela frente.— Estou. — A certeza em minha voz não deixa espaço para dúvidas. — E, por favor, quero total discrição sobre tudo que conversamos.Ele assente.— Claro. Você sabe que pode confiar em mim. Mas... você não acha que errou em ter contado a verdade para Camily?Meu olhar vacila por um breve instante, a dúvida invadindo minha mente como uma sombra indesejada.— Sinceramente? Não sei. Não sei o que seria pior. Contar a verdade ou esconder dela. Ambas as escolhas parecem erradas de alguma forma, mas agora já está feito.Burak apoia o queixo na mão, pensativo.— E você já marcou a data do casamento?— Ainda não. — Minha resposta é curta, mas a ansiedade pulsa nas palavras.— E como será? — Ele sorri de canto, tentando aliviar o peso da conversa.— Simples. Apenas no papel. Nunca fui muito ligado às tradições, Burak. Sempre fiz as coisas do meu jeito, mes
Ranjo os dentes, minha paciência sendo testada mais uma vez. Uma mistura de decepção e amargura toma conta de mim, mas me esforço para parecer indiferente.— Não. E não quero saber. — Minto sem hesitar.Ela não parece convencida, mas não insiste.— Ele já sabe, né? Que vamos nos casar?Minha mandíbula trava. As palavras dele com certeza foram mais que diretas, e eu sei que ele já fez seus próprios planos. Mas não posso deixar Isabela perceber isso.— Sabe. — Admito. — E é por isso que precisamos seguir em frente, sem nos preocuparmos com o que ele pensa ou quer.Ela observa meu rosto por um longo momento, como se tentasse entender o que está por trás das minhas palavras. Finalmente, assente levemente, e vejo uma faísca de confiança em seus olhos.E nesse instante, faço um juramento silencioso: eu não vou falhar com ela.Os olhos verdes de Isabela se fixam nos meus, um brilho relutante os tornando ainda mais hipnotizantes. Ela acena com a cabeça, um gesto simples, mas carregado de sign
Sento-me na minha cama, jogando meu corpo para trás, como se o peso do passado pudesse ser aliviado com esse gesto simples. Mas não é tão fácil. Imagens tristes e intensas invadem minha mente, rasgando o véu de controle que tento manter. Quando Isabela me disse que estava grávida, não fazia ideia da profundidade de sua ligação com Zein. Era um mistério que me torturava silenciosamente. Então, como se o destino já não fosse cruel o suficiente, Zein morreu, e a árdua tarefa de contar a ela recaiu sobre mim.Engoli minha própria dor, sufocando emoções que ameaçavam escapar. Peguei o telefone e, com a voz mais firme que consegui, pedi que ela fosse ao hotel. Numa sala reservada, ao lado do saguão principal, esperei. O tempo parecia uma entidade cruel, arrastando-se enquanto meu coração martelava com angústia. Estava arrasado, nervoso, e uma tristeza sufocante pairava como uma névoa densa.Quando ela entrou no saguão, levantei-me imediatamente. Meu corpo se moveu com a determinação de quem
O jatinho, parte da frota real das Organizações Ibrahim, corta o céu com elegância enquanto decola. Isabela está sentada de frente para mim, com os olhos apertados em apreensão. Tento suavizar o ambiente, oferecendo um sorriso que espero transmitir confiança, mas ela mantém sua expressão indecifrável, quase desafiadora.Seu peito arfa levemente, mas suas palavras são silenciadas por uma barreira que parece intransponível. Sei que, apesar de estar grata por eu tê-la tirado das garras do meu pai, ela ainda sente a tensão de estar sob o meu domínio. Esse desapontamento nos olhos dela é como uma agulha constante na minha consciência.Preciso mudar isso. Ela precisa sentir que pode ser ela mesma ao meu lado, tão à vontade que até esqueça o peso de ser, em essência, minha cativa.— Quer comer algo? Beber algo? — Pergunto, acenando para o comissário de bordo.— Sim, estou com sede.Eu fungo levemente, a frustração escorrendo em minha voz.— Por que não me disse? Quero que se sinta à vontade
Respiro fundo e aceito o jornal que o comissário me oferece, tentando ocupar a mente. As palavras dançam na minha frente, mas nenhuma delas me prende. Viro uma página atrás da outra, até que uma matéria sobre a morte de Zein surge diante de mim.Uma onda de desgosto me invade, e empurro o jornal para longe. As imagens de Zein, sempre sorridente, exibindo seus carros esportivos com aquele ar de invencibilidade, invadem minha mente sem permissão. A dor é aguda, não pela perda em si, mas por tudo que ficou entre nós — as palavras não ditas, as mágoas não resolvidas.Eu e Zein nunca fomos unidos. Nossa relação era... conturbada, para dizer o mínimo. Desde crianças, havia uma tensão constante, como se estivéssemos em lados opostos de uma batalha invisível. Zein sempre se comportou como o centro do universo, e nosso pai, junto com minha madrasta, reforçava essa ideia a cada oportunidade.Ele era o "bom filho" — a fachada perfeita de obediência e carisma. Mas eu conhecia a verdade por trás d