(Esmen) O som ritmado das rodas da carruagem sobre o caminho ecoava no silêncio. Então, momentos depois parecia ser terra molhada e neve, o barulho provocado pelas rodas mudava de acordo com a composição da estrada. A cada solavanco, sentia o movimento aproximar meu corpo do dele, o que só servia para intensificar o peso do momento. Meus olhos estavam fixos na paisagem além da janela, ainda era neve com algumas poucas folhas à mostra, mas a mente insistia em vagar até a presença que preenchia o pequeno espaço ao meu lado. Tauron estava ali, a menos de um braço de distância, calado como a maioria das vezes, tão rígido quanto as montanhas que começavam a surgir no horizonte. Era o mesmo homem que me havia tratado como nada mais do que um peão em seu jogo de vingança. Mas, ainda assim, havia algo diferente nele agora. Ele não me olhava como antes; com frieza ou indiferença. Seus olhos, quando ousavam encontrar os meus, carregavam algo mais profundo, algo que ele parecia lutar para nã
(Esmen) O frio intenso parecia querer despedaçar o teto velho, feito de telhas de barro sobre nossas cabeças, pois vinha acompanhado de um vento forte, capaz de arrepiar qualquer corpo mal vestido. Busquei minha mãe pela pequena casa e a encontrei perto do fogão a lenha, onde havia uma panela completamente cheia de sopa, em sua última fase, quase pronta para ser servida. Seu corpo magro, como o meu, envolto em roupas surradas e finas, era aquecido pelo calor do fogo, ao qual ela se mantinha próxima, mexendo na sopa. O único casaco de pele quentinho que possuíamos estava sobre meus ombros. Eu o daria a ela quando se sentasse à pequena mesa junto comigo. Por hora, me aferrava a ele como se fosse a salvação da minha vida. Com o capuz cobrindo meus cabelos castanhos escuros, ainda sentia minhas bochechas queimando. O frio intenso passava pelas fissuras na madeira desgastada da porta estreita, soprando diretamente no meu rosto. Deixei apenas os olhos verdes, como esmeraldas, de fora
(Esmen) Não recuei. Havia mais soldados de todos os lados, e eu ainda tinha esperança de que ele estivesse errado sobre a paternidade. Quando se aproximou o suficiente, ele me dirigiu a palavra: — Você é minha filha. Abri a boca para contestar, mas soube pelo seu olhar reprovador que não era tudo o que ele tinha a dizer. — E será preparada para casar com o rei Tauron, hoje à noite. Meus olhos saltaram. Agora não havia permissão ou tradição alguma que me fizesse ficar calada. — Como? — Você, Esmen, será a mulher do rei Tauron. — Ele não parou de me fitar. Parecia estar vendo minha mãe em mim; seu olhar pesava como uma tonelada, trazendo algo como frustração e satisfação ao mesmo tempo. Provavelmente por me vender como mercadoria para alguém. — Eu não... — me interrompeu com um erguer de mão, que chegou perto demais do meu rosto frio. Diferente de mim, que tinha roupas surradas e finas, como um vestido longo verde desbotado, sapatos gastos e apenas os cabelos alinhad
(Esmen) — Por que ele fez isso? — perguntei, enquanto ajustavam o corpete do vestido, apertando minha cintura fina. — Sua majestade? — Sim — encarei cada uma delas. A maioria fingia não ouvir a conversa com a colega enquanto trabalhava. — Dizem que foi um erro. Apenas isso. Aquilo não poderia ser verdade, mas elas não sabiam. "Como alguém mata outro e chama isso de erro?" — Apenas um erro? — encarei a mulher que havia falado. Ela baixou os olhos por alguns segundos, fingindo estar alisando o tecido do vestido. Alguém sempre sabia mais do que deixava transparecer, e rumores sempre corriam com pedaços maiores de verdade. Estavam dispostas a me manter no escuro, mesmo sabendo que jogavam "sua alteza" diretamente na boca do leão. "Não vão me tratar bem nesse novo reino." "Antes, nem sequer me tratavam como uma delas. Agora, estou aqui para servir de moeda de troca, mas não tenho importância para ninguém. Estou apenas salvando suas cabeças." Estava decidido. Na primei
(Esmen)Repousando a mão sobre minha barriga, fiz cara de desconforto. Não havia comido nada mesmo.— Não comi nada hoje. — Fiz cara triste.— Minha barriga dói por falta de um desjejum. Como posso ser apresentada para o rei Tauron tão fraca? E se não aguentar a viagem?Nesse momento, um deles, depois de novamente trocar olhares, me perguntou se queria algo em especial.— Apenas me mostrem a cozinha. — A desconfiança não os deixou.— Serei rápida. Não quero passar vergonha diante do rei vizinho. — Fiz minha melhor cara de timidez, ciente de não ter o rosto completamente visto por causa do véu de rendas floradas.— Vamos mostrar... — Fiz uma jogada de mão descartando a possibilidade.— Não precisa, apenas me mostrem o caminho.— Não podemos. A vossa alteza irá fugir. — Disse um deles.— Eu irei comer. Como posso fugir de barriga vazia? — Encarei ambos.Um franziu o cenho, e, trocando olhares novamente, me apontaram a direção:— É por ali. — Lancei uma cara de satisfação na direção dele
(Esmen) Por sorte não cheguei a mais que balançar para frente. Equilibrando-me capturei novamente os lados do traje, me obriguei a ser mais resistente. — Volte princesa! “Loucos!” Corria como nunca, a neve me atrapalhava mais do que poderia ter pensado, o vestido longo estava completamente frio, me impedindo de ser mais rápida. O peso de todo aquele tecido atrapalhava muito a persistência que queria adquirir. O véu ainda estava sobre os meus fios negros. O ar saía como fumaça por entre meus lábios, a cada respiração. Podia ouvir os cavalos relincharem sob os gritos dos soldados a perseguir-me. Mas eu não desistiria, eu iria até onde não conseguisse mais correr. Já tinha corrido por horas, de repente tropecei novamente, desta vez, caindo de cara na neve. Tentei me levantar, mas as pernas e braços não obedeciam, apenas pude virar meu rosto. Estava queimando. Minha face queimava em contato com a neve, a renda do véu parecia fundir-se com a minha pele. “Não posso morrer a
(Tauron)Era sinal de que Vitorian não queria sua fuga, não era uma encenação para chamar minha atenção.Então o verme também obriga outras pessoas, até mesmo a sua filha, a fazer as coisas que ele não quer. Tudo para manter sua própria cabeça em cima do pescoço.“Eu sabia sobre o medo dele com relação a mim, mas não queria que fosse um covarde tão patético.” Enojei-me.Seus olhos pousaram em mim, verdes, como as folhas das árvores, que se não fosse a neve as cobrindo desde o topo, estariam da mesma cor, tendo o mesmo brilho.Vir a ilusão passar nos seus olhos, ela acreditou que eu era a esperança chegando para salvá-la. Mas não estava trazendo brilho, eu estava trazendo as trevas para sua vida. Não importava quem ela era, apenas de quem ela era filha e o que ele tinha feito para mim.Ela não imaginou quem estava à sua frente, o desespero nublava sua mente.Eu faria Vitorian pagar através dela, e se não fosse o suficiente, iria voltar atrás dele, seria o seu carrasco pessoalmente.Ci
(Esmen)“Não. Ele não quer minha morte. Certamente quer vingança pela mulher que amava.”Arrumei minha postura, sentando-me com certo cuidado, pois não sabia como estava minha condição física, se ainda sentiria exaustão ou fraqueza. Utilizei a cabeceira da cama como apoio e recebi a xícara. Ela pegou o bule e derramou um pouco do chá que havia dentro dele, apenas o suficiente. Curvando-se levemente, retrocedeu dois passos.— Se desejar um pouco mais, avise-me.Desconfiada, bebi um pouco do chá, com a intenção de me aquecer, mesmo que já sentisse uma boa temperatura. Aqueles panos e aquela cama eram superquentes; sequer parecia que eu havia andado na floresta durante uma nevasca. Recordando-me disso, tomei mais um gole, com o intuito de fazer perguntas àquela mulher. Para tal, precisava ser receptiva ao que ela trouxera, pois provavelmente fora feito por ela mesma.Depositando a xícara de volta no pequeno prato, levantei os olhos e a encontrei interessada em minha imagem. Perguntei:—