Acordei no outro dia, me sentindo quebrada, parecia haver dormido em cima de pedras. Noah havia acordado mais de três vezes na noite, e não queria dormir na última vez que acordou. Como não havia muita coisa para fazer e ele ainda estava dormindo, resolvi ligar para minha amiga Isa, que com certeza estava morrendo de preocupação comigo. No dia anterior, havia comprado um chip novo para o celular. Mesmo sabendo que minha mãe não iria me ligar, tinha medo do sem escrúpulos do Sandro querer vir atrás de mim, ou tentar fazer ameaças. Sandro era um homem muito rigoroso em casa e vaidoso também. Aquele prato de comida deve ter dado a ele uma boa cicatriz no rosto e, conhecendo como ele era, sabia que não deixaria esse fato passar em branco. Além disso, ele não falou nada para a minha mãe, esperava se vingar sozinho e sabe lá que método usaria. Por ser um funcionário público, tinha acesso a muitas informações e conhecia gente importante também. Seria muito fácil ele me achar se continuasse n
No quarto, comecei a pensar na situação em que havia me metido. Estava sozinha no mundo, morando na casa de um homem totalmente desconhecido, longe da cidade e cuidando de um bebê que eu não tinha ideia de quem era a mãe. Não teria mais um salário e estava sendo vista como mentirosa pelo meu patrão. Eu não poderia mais ficar ali, não havia motivos. Comecei a arrumar minhas poucas coisas na bolsa quando o Noah começou a chorar, o peguei no colo e vi que estava ardendo em febre, peguei um remédio dentro da farmacinha que eu havia feito, dei a ele e depois dei um banho, esperando que a febre baixasse. Eu não havia tomado café da manhã e muito menos almoçado, decidi que não iria comer nada naquela casa, para que Oliver não pensasse que estaria ali apenas pela comida e pelo abrigo. Certamente, ficar na casa, mesmo sem receber um real, era mais seguro do que sair à deriva por aí sem ter certeza de como seria dali em diante, mas estava gostando daquele bebezinho e deixá-lo partiria o meu cor
— Embora, como assim? — Saulo perguntou sem entender nada. Parece que Oliver não comentou com o amigo sobre a última conversa que tivemos. — Sou menor de idade, o senhor Oliver me mandou embora. — Quanto tempo para você completar dezoito? — Só dois meses, mas não é isso. — Continuava chorando. — E o que é então? — Mesmo que eu complete meus dezoito, não posso ficar aqui, pois não posso trabalhar registrada. — Acabei soltando a minha preocupação, que estava matutando na minha cabeça. Sandro descobriria onde estava, ele viria atrás de mim, acabaria com a minha vida ou sabe lá o que conseguiria fazer. — Aurora, você deve algo à justiça? Está fugindo de quê? — Saulo perguntou, sem entender. — Não é isso. Deixa quieto, você não entenderia. Nesse momento percebi o quão frágil estava, que quase ia contando a minha história para o Saulo. Me recompus, peguei o copo de água e me levantei. — Com licença, preciso ficar com o Noah. — Espera, só mais uma coisa, o Oliver sabe que você está a
Com aquele clima pesado na cozinha, eu não sabia o que fazer. — Só falta o pernil terminar de assar, senhor. — Denise respondeu. — Ande depressa, que estou morrendo de fome, sabe que gosto das coisas no horário certo. Após falar com a mulher, ele dirigiu o olhar para mim. — O menino já está melhor? — Perguntou sem expressão alguma no rosto. Eu não conseguia acreditar que aquele homem soubesse que seu filho estava doente e não demonstrou preocupação, saindo de casa cedo e indagando sem demonstrar preocupação. — Sim, senhor, o seu filho está melhor. — Enfatizei o nome filho, para ver se o comovia um pouco. Ele me encarou por alguns segundos, esperando talvez que eu falasse mais alguma coisa, mas simplesmente virei as costas e saí com o Noah. Fui passear no jardim, estava um dia lindo, andei perto das árvores, já era quase meio-dia e o sol estava muito quente, mas as grandes árvores davam uma enorme sombra. Noah estava acordadinho, seus olhinhos estavam abertos, coisa que era rar
Passeei mais um pouco com o Noah, minha barriga roncava de fome, mas só comeria depois que Oliver saísse da cozinha. Estava entrando na casa, quando meu celular tocou. Era um número privado, estranhei porque apenas Isa tinha meu número novo. — Alô. — Atendi. — Vagabunda, eu vou encontrar você, e antes de deformar a sua cara inteira, terminarei o que comecei. Após falar, desligou. Eu sabia muito bem quem era, conhecia aquela voz nojenta em qualquer lugar no universo, era ele, Sandro! Meu coração errou as batidas, por um segundo fiquei tonta e quase caí no chão com o Noah. Meu maior pesadelo estava acontecendo, ele estava atrás de mim, como conseguiu meu número? Será que ele já sabia onde eu estava? Minha cabeça girou mais um pouquinho, então por medo de cair do lado de fora com o bebê, fui para dentro da casa. Entrei tremendo tanto, que ignorei Oliver e Saulo me chamando, nem me importei, continuei andando e entrando no quarto, coloquei Noah na cama e me sentei no chão, esta
Acordei com o clarão de um raio. Havia dormido com o Noah e tinha me esquecido de fechar as cortinas da janela. Os raios clareavam o quarto vez ou outra, mas não se ouvia o barulho do trovão, a janela era bem lacrada à prova de som. Olhei e vi que Noah continuava dormindo como um anjinho, me levantei, arrastando com cuidado uma das poltronas até a janela, me sentei e comecei a observar a chuva caindo. Eu amava a chuva, amava os raios, eles eram tão lindos. Apesar de perigosos, era a coisa que eu mais admirava na natureza, tão imponentes, seguidos com sua voz majestosa de trovão. Olhei no relógio e vi ser duas e pouco da madrugada. Lá fora, tudo era assustador, lembrei que cheguei aqui numa madrugada como essa, raios, chuva e aquele homem. Lembrei-me do homem na ponte, do carro parado, dele prestes a se jogar e da minha interferência. Será que salvei a vida dele? Como será que ele estava agora? Quem era, e qual o motivo que o levaria a tentar contra a própria vida? Bem baixinho, pedi
Assustei-me com o diabo. Ele aparecia do nada, como se teletransportasse usando sapatinhos de algodão, pois não conseguia ouvir seus passos quando chegava. — Aurora, levanta daí, está chorando pelo quê agora? — Nada, senhor, eu só estava distraída. Me olhava como se esperasse alguma brecha para dizer algo. — É pelo homem da ponte, não é? — Insinuou. — Claro que não, nem o conhecia! — Neguei imediatamente. — Ah, que pena, pois já descobriram a identidade dele, sabia? — Lamentou. — Mas, como você não se interessa no assunto, deixa para lá. — Blefou. Virou-se de costas para sair, mas minha curiosidade foi maior. Queria saber quem era o homem e o porquê dele ter feito tal ato e parecia que Oliver sabia disso e queria usar contra mim. — Espera, quem era ele? — Perguntei, me sentindo vencida por suas provocações. Oliver virou-se para mim outra vez, sorrindo como se tivesse ganhado a batalha. — O nome dele era Antônio Vargas Viana, tinha 49 anos, estava fugindo da polícia, após a i
No interior do escritório, dois homens conversavam. — Esta garota está achando que sou algum idiota. — Quem cara? — A Aurora! — Tem paciência com ela, cara, a coitada passou a madrugada toda com o menino no pronto-socorro. — Ela se esqueceu de que sou o patrão, eu que mando aqui! — O que ela te disse para você ficar tão nervoso assim, hein? Perdi alguma coisa enquanto estava fora? — Falou, se sentando na poltrona do escritório. — Deixa aquela pirralha para lá… —Oliver também se senta e abre o notebook. — Foi você quem começou falando dela.— Saulo zomba. — Me diz, onde você estava para encontrar a Aurora na estrada de madrugada? — Admirando a perfeição da vila. — Riu descaradamente. — Conta outra, Saulo. — Revirou os olhos. — Sério Oliver, a vila São Caetano é perfeita, cara, você projetou cada coisa ali como se morasse lá. — Mas moro de certo modo. — O mercado, o pronto-socorro, a farmácia, o banco, a escola e o bar. — Se animou. — Cara, aquele bar lá é bom demais, quando