— Achei que já tinha ido.Absorta em meus pensamentos, me assustei ao ouvir a voz grossa. Me virei de supetão e tentando regular os batimentos cardíacos com um exercício de respiração, pude ver Tyler parado na porta do quarto com as mãos no bolso da calça social.Se queria que o meu coração deixasse de palpitar, houve uma falha nisso quando vi o homem com os cabelos bagunçados e a barba não tão ajeitada como de costume. Tyler tinha olheiras profundas e seu semblante não era o melhor do mundo, mas não deixava de estar lindo vestido em seu terno caríssimo.— Estou saindo agora — anunciei baixinho.Ele apenas balançou a cabeça em concordância.— Precisa de ajuda com a mala? — Apontou para a bolsa de rodinhas que não era tão grande e não estava tão pesada.— Não. Posso carregar sozinha. Aliás, vou indo.Apontei para a porta com o intuito de dizer "me dê licença, por favor" mas ele continuou parado, sem se movimentar, apenas me encarando com certa tristeza. Mas o que queria? Quando fica
Eu não entendia o porquê, mas morder o lábio inferior por dentro era uma coisa que fazia eu me desligar do mundo e descontar um pouco da ansiedade. Não me importava se ia machucar e se depois quando fosse tomar um suco de limão a ardência me causaria um arrependimento enorme, eu só precisava fazer alguma coisa que me mantivesse calma e sem entrar em surto.Limpei a mão suada na calça e continuei mordiscando a boca. Agora até as bochechas entravam na jogada enquanto eu observava a parede pintada em um tom forte de laranja à minha frente. Bem brega, podia afirmar com certeza, e se o intuito era transmitir alegria, com aquelas flores pintadas todas tortas e quase abstratas, não trazia conforto algum.— Os pacientes é quem desenharam. Faz parte do projeto de Arte — informou a recepcionista sorridente.Continuei olhando para a parede por mais perturbador que fosse e agora minha perna balançava em um ritmo frenético.— Hope Lisbon, ela está te esperando! — anunciou uma outra senhora que
Sim, eu sabia que ela e minha tia não se davam nada bem e que fugiam uma da outra porque compartilharam um passado ruim, contudo, eu precisava abrir mão de Nicole Clark e para isso, não podia mais ter ela como uma preocupação todos os dias. Sendo assim, ofereci uma boa mesada para que sua irmã se encarregasse de fazer o mínimo. Minha mãe ia permanecer por mais alguns meses na casa de repouso, mas após isso, se não encontrasse o seu final ali mesmo, teria que encontrá-lo com minha tia.— Onde está o seu pai? Como conseguiu achar ele? Vocês estão se falando? Aquele desgraçado, filho da puta! Ele abandonou nós duas e você consegue olhar para a cara daquele porco asqueroso? — perguntou iniciando seus gritos. — Você é uma merda, como ele é, Hope! Você puxou tudo para ele. É nojenta como ele. Deve ser tão asquerosa quanto ele! Me diz, aquele maldito ainda gosta de comer bunda de homem?Entendendo que a conversa não chegaria a nenhum lugar interessante, respirei fundo olhando para ela com
O barulho dos meus saltos se chocando contra o piso reluzente ecoava por todo o ambiente vazio. Os funcionários da Calisto já não estavam mais lá, as mesas estavam todas vazias e uma grande parte das luzes estavam apagadas, da maneira como deveria estar às oito da noite.Corri apressada em direção a sala de reuniões. A única coisa que o segurança me disse foi que os dois se pegaram no último andar e que foi preciso intervir para separá-los. Quis demonstrar surpresa com a informação mas era impossível. Eu já estava preparada, sempre estava. Era super normal para mim aquilo, por mais que agora soava um tanto estranho visto que os dois andavam se entendendo ultimamente pelo que me foi informado. Enfim…A cada passo mais rápido podia sentir meu coração mais acelerado. Talvez fosse porque eu estava prestes a intervir mais uma vez, mas também podia ser porque estar na Calisto me causava sensações incríveis. Sentia um certo tipo de nostalgia por me recordar dos meus dias atuando como s
— A Sophie ligou dizendo que vocês saíram no soco então eu vim. Me deixe ver isso — pedi levando minha mão até seu rosto mas ele recuou, desviando do meu toque.Encarei Tyler um tanto ofendida. O que mais ele queria? Além de protagonizar cenas com seu irmão, ia também se fazer de difícil e intocável? Ah, faça-me o favor!— Você não deveria estar aqui.Bufei dando um passo para trás. Tyler só podia estar de brincadeira com a minha cara. Sério que eu não deveria estar ali? Ele achava mesmo que eu não sabia disso?— É, eu não deveria estar aqui. Mas adivinha só? Estou aqui porque eu me preocupo com você, seu idiota! — Empurrei seu peito nu contudo, sua postura continuou a mesma.Tyler olhou para os próprios pés, a ferida aberta voltou a pingar sangue e pude ver uma gota generosa escorrer por seu rosto, o manchando e deixando tudo ainda mais caótico.— Me desculpe. Não queria te fazer voltar só por causa de uma briga idiota com o meu irmão.Ri sem muita emoção, ainda encarando o homem
>Tyler, aos 12 anos.
— Como está a minha florzinha linda, hum?Minha raiva foi alimentada ainda mais quando senti o cheiro forte de bebida impregnado em sua roupa. Ele ainda tinha a capacidade de chegar perto de uma bebê mesmo se encontrando naquele estado deprimente?!— Você está fedendo, pai — Benedict soltou levando a mão até o nariz para não sentir o cheiro.Os olhos claros se voltaram para o meu rosto e após ajeitar a postura ele apenas fez um gesto com a cabeça em um cumprimento silencioso. Aquele não era o meu pai, não tinha como ser. Não o pai amoroso que ia até mim quando chegava do trabalho todos os dias e me jogava em suas costas para brincar de "cavalinho". Não aquele que pegava Benedict nos braços e corria pela casa com uma bola de basquete nas mãos, buscando algo como alvo para ser a "cesta" deles.Aquele homem em minha frente era só um bêbado que por algum motivo ficou traumatizado com algo no trabalho e acabou se enfiando em álcool para tentar mudar a situação. Mudou, para pior.— Vam
— Nada no mundo vai mudar o que aconteceu, e eu sei, sei que ele me culpou todos os dias que se seguiram depois disso. Ele disse isso na minha cara, disse que a culpa era minha. E eu acredito, sabe? Eu acredito que se não tivesse insistido, que se tivesse deixado ele ficar em casa, que se tivéssemos ido ver os patos, nada daquilo teria acontecido. Foi minha culpa? Talvez. Os três morreram? Sim. Essa era a nossa realidade. Meus pais e nossa irmãzinha morreram, e o Bene achava que eu era o culpado.Engoli em seco secando as lágrimas que insistiam em cair. Aquilo me pegou em cheio, de um jeito difícil de engolir. Não porque eu pensava como Benedict, mas porque… porra! Um bebê. Os pais deles, e… Era algo pesado demais.Agora eu entendia.— Ty, não é sua culpa. Não… Não pode ser sua culpa, entende? Você só queria um passeio, queria ter uma tarde legal com a sua família, e…O quê? Como eu o convenceria de que não deveria se culpar de tal forma?O homem sentado no chão assim como eu, encar