DEENA— Ah, você vai ver, Eve está tão ansiosa para a apresentação de balé, estava preocupada com que você não chegasse a tempo e...Paro de falar ao perceber que ele não está prestando atenção. Até agora estava tagarelando para não deixar espaços para esse elefante na sala, mas parece que ele está sentado nas costas de Henry e não há o que fazer. Pego a xícara fumegante e deslizo para ele sobre o tampo da mesa, depois pego uma xícara para mim.Ele está com o olhar perdido em seu smartfone, deslizando coisas para cima. Será que está arrependido? Será que não quer mais ficar comigo? Ou será que decidiu que Eve é muita coisa para ele, que talvez não queira ser pai. Pego em seu braço e o chacoalho levemente para que olhe para mim.— Henry... — começo.— Deena... — ele me interrompe hesitante. Engulo em seco, seu olhar é dolorido. — Não sei como começar a te explicar isso, não sei se será capaz de me entender... — ele apoia o rosto nas mãos em desespero.— Você pode me contar o que quise
HENRYNão sei se estou mesmo vivendo minha vida ou um espetáculo de circo, volto para o meu quarto a passos largos. Que absurdo! Ele quer ter certeza de que não vou voltar atrás, ele deve saber que estamos tentando a anulação do casamento, esse pessoal tem informantes em todo lugar. Eu não deveria ter vindo, caí na minha própria armadilha.— Como foi com o meu pai?Escuto assim que abro a porta, Katia está a janela. Ela é mesmo muito bonita e alta, temos quase o mesmo tamanho. Que pai serve a filha numa bandeja desse jeito para um desconhecido.— Pior, impossível. — digo passando por ela e indo me atirar na cama.— Por quê? Não podemos ir embora amanhã?— Ele disse que não podemos sair daqui enquanto não consumarmos o casamento.— Consumarmos? — ela está confusa.— Você sabe... ter a nossa noite de núpcias.Ela engole em seco e desaba na poltrona a frente da cama.— Que decepção! Não passa na cabeça dele que se a gente fosse mesmo adiante eu precisaria de um pouco mais de tempo? Vou c
DEENADe todas as palavras que eu esperava ouvir da boca dele, casado, nem de longe me passou pela cabeça. Fico sem reação por alguns segundos e tenho a impressão de que vou desmaiar.— Casado? — não sei se estou perguntando ou só repetindo.— Sim e não. Nossos pais nos casaram por Procuração, documento esse que nunca redigimos.— Procuração? — procuração? O que é isso? Por que nada mais está fazendo sentido?— Deena... estamos resolvendo isso. Fui para a Rússia para resolver isso, mas o pai dela não permitiu que saíssemos sem...— Sem o quê?— Bem, não importa. O caso é que fomos escoltados até o aeroporto para que não déssemos entrada ao pedido de anulação do casamento. Agora, bem... chegamos ontem e eu vim direto para cá.— Chegamos??? — pergunto um pouco mais alto do que deveria. Chegou com quem?— Com Katiana Petrenko, atualmente, minha esposa.– Sua... — não consigo terminar de falar porque a bola azeda de vômito sobe rapidamente pela minha garganta, acabando no carpete do meu
HENRYA fala de Deena sobre Eve me destruiu. Mesmo com toda essa confusão, a melhor coisa que me aconteceu foi o fato de Eve me adotar como pai, foi como um atestado de que algo em mim, finalmente valia a pena, até Deena me dizer que a pequena merecia mais, não que isso seja uma grande revelação, sempre soube disso, mas quis me iludir e pensar que eu finalmente era um homem respeitável, crescido e de família. Que espécie de homem deixa o pai cometer um crime contra si e fica quieto? Que tipo de homem eu sou?— Sr. Denis, este já é seu quarto copo de whisky, acho melhor tomar água e ir se deitar um pouco.É Margot, tentando tomar o copo baixo e pesado da minha mão para trocar pelo comprido, cheio de água.— Margot?— Senhor?— Que tipo de homem eu sou?A mulher parece não se abalar, mas queda-se reflexiva por um instante.— Não creio que eu possa avaliar o senhor dessa maneira, não seria ético de minha parte.Sorrio sarcástico, deixando o copo de água sobre a mesa da varanda e me dirig
DEENAAcompanho Eve, que está correndo pela neve. Já fez anjos de neve, brincou de guerra de bolas de neve com as outras crianças e agora, estamos procurando um lugar para montar nosso boneco de neve.É início de dezembro e há quase um mês que não converso com Henry, com muita dor no coração, bloqueei suas mensagens, não vejo mais nada que venha do seu número. Para não dizer que não o vi, estava assistindo a um programa de fofocas e o vi, quando os filmaram em um evento social. Ali eu tive certeza de que meu coração ficará para sempre partido. Ela é linda, loira e alta, mais alta do que ele e, acima de tudo: Fina. Fina como só o dinheiro pode fazer uma mulher. Coisa que nunca serei.Eve ainda pergunta e fala muito sobre ele, sobre o que farão juntos quando ele voltar. Não tive coragem de dizer que ele não vai voltar. Conversarei com a Dra. Mônica na próxima sessão.Encontramos um bom lugar e começamos a moldar as bolas de neve, estamos treinando para a competição de melhor boneco de n
HENRY— Eu já disse que não. Não vou assinar anulação nenhuma.— Katiana, não me faça perder a paciência.— Eu não posso voltar para a Rússia e não sou uma refugiada.— Katiana, precisamos resolver essa... — ela me interrompe batendo a porta do meu próprio quarto na minha cara. Não sei mais o que fazer para convencê-la a assinar os documentos da anulação. Deena me bloqueou de todos os seus contatos e não sei mais o que fazer, sinto que estou beirando a loucura.Abro a porta do quarto e entro.— Esse é o meu quarto e você vai ter que me escutar.— Não tenho que escutar nada. É meu quarto também, sou sua esposa, não sou?— Não é. NÃO É! E é isso o que você não está entendendo. Por que você não entende? Eu não te quero! Você está f*****o com a minha vida! — Oras, Henry Denis, sua vida já estava f****a bem antes de mim.— Assine a droga dos papéis!— Não posso! — diz em um tom quase inaudível e incerto.— POR QUÊ?!!! — grito, inconsolável.— Porque eu assinei a minha Procuração.O san
DEENA — Você não deveria ter feito isso! — esbravejo com Welma. — Você não vê o quanto estou abalada? — Vejo muito mais do que isso. — ela diz, distraidamente, rabiscando em uma folha de papel. — Eu não posso mais ter contato nenhum com ele. Você sabia que ele está casado? Ela respira fundo. Desisto de falar com ela, parece até uma parede, acha que está com a razão. Pego meu casaco e começo a deslizá-lo pelo meu braço. — Você não tem nada para me contar, menina? — sua pergunta estranha só não é mais estranha do que o olhar que ela levanta na minha direção. Como se eu estivesse escondendo dela algo que ela já tem conhecimento. Repasso todas as minhas ações, tentando encontrar algo minimamente errado ou repreensível. Não encontro. — Não. — respondo um pouco hesitante. Ela dá um sorrisinho e meneia a cabeça. Ela está tirando um sarro da minha cara? Como ela não diz mais nada, termino de vestir o casaco e saio porta afora. Estamos naquela época do ano em que toda a visão que temos
HENRYVolto para casa andando nas nuvens. Nem acredito que a tive em meus braços mais uma vez. Está leve como uma pluma, será que está tão gravemente doente como diz? Não vou deixá-la ir ao médico sozinha, que tipo de homem eu seria se deixasse?O carro para. Não! Não disse a Otto que iria para o Hotel. Respiro fundo e subo para o meu apartamento. Quando chego ao meu andar, escuto música e vozerio vindo dele. Me aproximo devagar, a porta está entreaberta.Pessoas formam pequenos grupos, conversam e riem enquanto uma música brasileira preenche o ambiente. Ao me ver perdido, Katia vem até mim com uma taça de champanhe.— Boa noite, marido! Não sabia que viria para casa esta noite, então resolvi dar uma festa.— Quem são essas pessoas? Achei que não conhecia ninguém aqui.— Ah! Achou que nunca tinha vindo para a América? — ela gargalha, jogando a cabeça para trás de um jeito muito genuíno. — Moramos aqui cerca de uns oito anos aleatórios. Primeiro dois, depois três, dois e depois um. Não