Priscila
A sorveteria se encontra lotada de jovens, conversando. Fiquei indecisa em entrar, mas Ethan me tranquilizou ao dizer que tinha dinheiro suficiente para pagar a conta e que se eu estava com medo disso, era para ficar “de boa” como ele falou. Mais relaxada, acabei pedindo um banana split com bastante calda de morango, enquanto Ethan pediu somente um milkshake de morango e notei como ele olhava tudo ao redor com bastante atenção.
— Então, linda, como foi o seu final de semana? Pensei em te ligar, mas não sabia se você estava ocupada em casa ou com alguém.
Ethan diz. Ainda nervosa, com tudo que vem acontecendo, eu dei um sorriso sem graça para ele.
— Fiquei auxiliando a minha mãe a limpar a nossa casa, depois passei a tarde na pastelaria com a minha melhor amiga.
Contei, vendo um sorriso se formando em seus lábios. Ele me olhou com carinho e isso foi motivo para me deixar com vergonha.
— Linda, você sempre fica vermelha igual um pimentão quando eu te encaro. Pode ficar despreocupada, mostrei que sou um cara tranquilo e não vou te fazer mal algum. Na verdade, eu tive que agradecer o Miguel por ter me arrastado até aquela boate. Porque eu nem estava no clima naquela noite.
Ele diz, sem deixar um segundo sequer de me olhar nos olhos.
Fomos interrompidos, pela chegada da garçonete com os nossos pedidos. A garota, atenciosa, se afastou nos deixando a sós.
— Sou viciado em doce. Emma fala que pareço uma formiga de tanto que como doce.
Ethan diz, ao provar o seu milkshake. Mas espera, quem será Emma? Como não consigo disfarçar nada, ele deve ter percebido a minha curiosidade.
— Emma é a minha coroa, quero dizer, é a minha avó paterna. Se você a conhecer um dia, vai gostar de conversar com ela.
Então Emma é sua avó. Gostei de saber essa informação e por enquanto ele não mostrou ter ninguém em sua vida.
— Eu não tenho avós, moro apenas com a minha mãe. Papai faleceu uns anos atrás e os parentes vivos da minha mãe, moram no Norte do país.
Comentei, curiosa para saber da vida dele. Mas não serei uma intrometida em ficar perguntando.
— Legal, linda. Eu não tenho parentes, é apenas a minha avó mesmo.
Ethan respondeu. Fiquei pensando se ele seria órfão de pais? Se for isso, deve ser triste não ter ninguém além da sua avó. Mesmo morando com a minha mãe, ainda tenho a família da Bia e os tios são como se fossem meus parentes de sangue e amo todos como tios de verdade.
— Você mora com a sua avó então?
Perguntei, sem esconder a curiosidade, enquanto presto atenção em seu rosto confuso. Ethan parece que está pensando em alguma resposta que possa me convencer.
— Na verdade, eu apareço na casa da Emma às vezes. A coroa é boa comigo e quando preciso de um lugar ela deixa eu dormir na sua casa.
A resposta é vaga para uma pergunta como a minha, porém deixo esse detalhe de lado e volto a focar em nós dois em um encontro como esse. Eu não tenho muito tempo para ficar sozinha com Ethan e nem sei quando poderei ter uma oportunidade como essa. Então passamos a conversar sobre o meu cursinho e minha vida na comunidade. Ethan não responde todas as perguntas que faço e acaba passando despercebido por mim esses detalhes que ao me ver são bobos. Saímos da sorveteria um pouco depois das seis e meia da tarde. Os minutos passaram depressa que quando dei por mim, era a hora de voltar. Ethan era engraçado e me fez rir das bobagens que dizia. Retornamos para o carro, de mãos dadas e isso para mim era um estranho bom. Quando Bia soubesse tudo do meu passeio com um rapaz, tenho certeza que iria me interrogar para saber todos os detalhes.
— Me passa o seu endereço, que jogo no GPS e assim consigo encontrar sua casa. Te disse que sou zero à esquerda, quando se trata de andar pelas ruas dessa cidade. Passo o endereço, Ethan digita no GPS do carro e logo a voz, surge dando as instruções. Ele saiu da vaga, pegando a rua principal. Sentada ao seu lado, ouço um rock suave que vem do rádio.
— Amo essa batida. O Serj tem uma voz muito louca — Ethan cita o nome do cantor e da banda. Como não conheço nada desse estilo de música, apenas escuto calada. Notei desde que nós nos conhecemos, como ele gosta de rock e além de ser fã e conhecer tantos cantores que eu nunca ouvi falar na vida.
Eu não acho que você acredite
I don't think you trust
No meu suicídio egoísta
In my self-righteous suicide
Eu choro
I cry
Quando anjos merecem morrer
When angels deserve to die
— Você curte uns tipos de músicas bem diferentes do que costumo ouvir.
Disse, vendo ele cantar o refrão da música.
— É que você não conhece os melhores do mundo. Um dia, te deixo ouvir todas as minhas bandas de rock favoritas e você compreenderá o meu vício por boa música.
Ele diz, sorrindo para mim, com seus olhos esverdeados que me conquistaram desde o primeiro segundo que nos encontramos. Ethan entra na rua principal da comunidade, porém notei que ele desviou do caminho virando em uma entrada paralela. Só então percebi que ele lembrou do que eu disse, sobre não poder chegar tardiamente em casa e ainda por cima acompanhada de um desconhecido. Esse horário não é perigoso ficarmos aqui no carro, contudo mesmo assim ainda é errado, pois se algum conhecido passar e me ver saindo do carro dele, alguém será capaz de contar tudo para a mamãe. Ele desligou o motor do carro, soltou o seu cinto de segurança, depois se aproximou de mim, fazendo o mesmo com o meu cinto.
— Vamos ficar um pouquinho aqui, depois a gente volta para a rua principal e eu te deixo perto da sua casa.
Ele diz, pegando-me de surpresa ao beijar a minha bochecha. Abaixo a cabeça envergonhada, Ethan segura meu queixo, fazendo com que eu olhe novamente para o seu rosto.
— Não precisa ficar com vergonha toda vez que eu te beijar. Como poderei tocar esse seu rosto lindo ou saborear seus lábios doces se você ficar um pimentão a cada carinho que faço.
Dou um sorriso para ele, tentando não demonstrar como sou inexperiente e ingênua na frente de um garoto como ele.
— Eu não tenho costume de sair em encontros, por isso que eu sempre fico assim.
Digo, sorrindo para ele.
— Comece a se acostumar a partir de hoje, porque vou te buscar e te deixar no cursinho todos os dias se quiser.
Como assim, levar e buscar? Ele ficou doido? Mamãe nunca deixará eu ter amizade com um garoto mais velho e vestido como um roqueiro.
— Ethan, obrigada por hoje, mas não posso ir e vir contigo diariamente. Se a minha mãe souber será uma confusão lá em casa.
Mal terminei de falar, o meu celular começa a tocar na mochila. Assustada, tiro de dentro e vejo o nome no visor e antes de atender peço que ele faça silêncio.
— Oi, mamãe!
Atendi, tentando não transparecer nervosismo em minha voz.
— Sim, senhora. Estou chegando em casa. Tudo bem, eu jantarei com a tia Kátia. A senhora se cuida, que ficarei esperando lá.
Desliguei o celular, guardando na bolsa. Ethan continua me encarando, então digo ser a minha mãe ao telefone e que eu precisava voltar.
— Preciso ir agora — digo arrumando a minha bolsa para sair do carro, mas antes ele impede segurando meu braço com cuidado.
— Sei que você precisa ir, mas aproveitamos só alguns minutos antes de você ir. Promete que amanhã você me espera no mesmo lugar de hoje e você chegará mais cedo em casa e ainda podemos ter um tempo para aproveitarmos juntos.
Ele me beijou com carinho, seus lábios tocando os meus, o cheiro da sua colônia, deixando-me inebriada com seu toque em minha perna. Retribuo o beijo sentindo algo explodir dentro de mim e sei que é uma felicidade que jamais pensei que iria sentir. Ficamos mais alguns minutos nos beijando, até que tive que voltar para o meu mundo real, no momento em que Bia me mandou SMS questionando onde eu estava e porque não havia chegado em casa.
Priscila— Você tá esquisita e muito calada para o meu gosto.Bia e eu estamos em seu quarto, sentadas no chão, enquanto ela pinta as unhas do pé, eu leio o livro obrigatório do cursinho para o vestibular. Mesmo estando no começo do ano, ainda assim preciso focar cem por cento nos estudos.— Não tenho nada. Estou somente estudando e aguardando a chegada da mamãe.Respondi, voltando a atenção ao capítulo que estou lendo.— Engraçado, que você não parece que está apenas lendo. Ficou caladinha no jantar, mamãe te perguntava as coisas e você respondia numa má vontade. O que tá pegando, contigo? O gatinho da boate te dispensou, foi isso? Você se arrumou demais para estudar naquele seu cursinho chato. Conta a verdade para sua melhor amiga. O carinha com nome diferente, te deu um bolo e você agora está se sentindo péssima porque continua virgem aos dezoito.Bia, não cansa de tirar sarro de mim, por achar que fui descartado. Para que ela deixasse de encher o meu saco, decidi contar sobre o en
PriscilaSão Paulo amanheceu debaixo de chuva. Mamãe foi para o trabalho de táxi, pago pelo seu chefe, ou não iria conseguir chegar a tempo. A nossa rua não teve alagamento, entretanto a rua do ponto de ônibus se encontra interditada e dessa forma, não tenho como ir para o cursinho. Até pensei em pagar o táxi com as economias que tenho na minha poupança, porém se faço isso é capaz da mamãe engolir meu fígado por eu estar gastando dinheiro com bobagens. Voltando para casa, dou de cara com Beatriz virando a rua que dá para a parte central da comunidade.— Voltou cedo ou tá matando aula?Questionou. Bia, usava um short jeans curtinho, blusinha de alças e uma maquiagem forte no rosto e não eram duas horas da tarde.— A rua do ponto de ônibus está interditada e eu não consegui chegar a tempo, então decidi voltar para casa. Quando a mamãe chegar do trabalho, explico certinho. E aonde vai essa hora toda arrumada?Perguntei, vendo o sorriso no rosto dela.— Me encontrar com o Juninho. Mamãe n
PriscilaOlhava a roupa que escolhi, pela terceira vez, indecisa se realmente estou bem. Beatriz aqui, seria de grande ajuda, porém não posso falar sobre o meu encontro com Ethan e a sua avó. Optei por uma calça jeans, uma camisa três quartos, azul clara e nos pés um sapato de saltinho, que ganhei no último natal. Geralmente uso ele quando vou aos cultos no domingo, entretanto ando um pouco desviada da igreja e nem sei como a mamãe deixou eu sair para me encontrar com os supostos amigos do cursinho. Ethan, achou melhor enviar um SMS, disse ter medo de que eu acabasse me complicando em casa, se fosse ligar então me mandou mensagem logo após o café da manhã. Portanto, limpei a casa, arrumei o meu quarto, tomei um banho demorado, até mesmo escovei os cabelos, coisa que raramente faço. Enfim, estava me sentindo bonita, tanto que deixei os cabelos soltos, caindo em cachos e a cor dele, estava um castanho mais brilhoso. Nos lábios um batom rosinha, maquiagem bem discreta, para não dar na ca
PriscilaEmma, preparou limonada com bolo de milho para o nosso lanche, enquanto tomava o seu chá de camomila. Ethan tentava me tranquilizar com as perguntas que sua avó fazia. Por duas vezes, percebi que ambos trocaram olhares, como se escondesse algo, entretanto deve ser loucura minha.— Sua mãe é secretária em uma clínica popular?Emma questiona, bebendo um gole do chá me observando.— Sim, mamãe trabalha para o doutor Júlio há muito tempo. Moramos em uma comunidade, e eu estudo no cursinho pré-vestibular da prefeitura no período da tarde.Respondi, tentando não parecer nervosa na frente dela.— Ethan me contou que vocês se conheceram em uma festa. Realmente o destino se encarregou de colocar uma boa garota na vida desse garoto.Diz, sorrindo para o neto.— Te contei que fui lá acompanhando o Miguel — Ethan respondeu para a avó.— Que não passa de uma má companhia e você sabe disso. Perdoe-me Priscila, mas às vezes tenho que chamar atenção dessa cabeça dura. Ethan e esses amigos qu
Priscila— Vou esperar mais quinze minutos. Se o seu namorado imaginário não aparecer, ficarei muito irritada, porque você me fez comprar uma roupa nova para te acompanhar ao shopping para no final ser apenas um delírio seu.Beatriz e eu estamos aguardando a chegada do Ethan, na entrada do shopping. Hoje é domingo, consegui convencer minha mãe a deixar eu ir ao cinema com a minha melhor amiga. Ethan sumiu por uns dias, quando me ligou contou que teve alguns problemas que ele precisava resolver, mas que agora estava tudo bem e que ele estava animado para sair comigo e conhecer a minha amiga.— Deve ter acontecido algo, pois ele me garantiu que viria e ainda me avisou que traria um amigo. Teremos um encontro duplo hoje e ao invés de reclamar, me agradeça.Disse entre risos, observando a porta de entrada. Queria me sentir mal, por pedir dinheiro da minha mãe para o cinema, enquanto eu, na verdade, estou aguardando o garoto que pouco a pouco vem adentrando o meu coração, fazendo com que e
Priscila— Amiga, juro que estou processando a notícia da tia desencalhando. Se ajoelhou no meio do quintal e agradeceu aos céus por esse feito? Sua mãe, com um namorado, vai deixar de ser chata, amarga e quem sabe você pode apresentar o seu gatinho para ela.Beatriz e eu estamos em meu quarto, enquanto escolho a roupa que vou usar no jantar de hoje a noite. Mamãe e a tia Kátia se encontram na cozinha, terminando de preparar a comida. A mãe da minha amiga, não pensou duas vezes antes de ajudar mamãe na preparação de tudo.— Eu continuo pensando sobre esse namoro. Poucas vezes eu me encontrei com o doutor Júlio. Ele sempre foi educado comigo e não se importava com mamãe levando a filha para o trabalho.Comentei ao me decidir por um vestido florido de manga curta, um pouco abaixo do joelho.— Contou para o Ethan que sua mãe tá namorando?Bia perguntou, enquanto separava alguns cordões e brincos para eu escolher mais tarde.— Não falei nada ainda. Amanhã, vamos passar a tarde na casa da
PriscilaEthan e eu estamos em seu quarto. Meu namorado pelo jeito pensou em tudo, para que nós dois tivéssemos uma tarde romântica. As guloseimas que amo, suco de laranja, tudo organizado em uma bandeja. Decidimos assistir um filme romântico, sobre um casal que se conheceu em uma noite, se apaixonaram, se separaram por interferência de terceiros e a protagonista ficou grávida, sendo obrigada a entregar a criança para adoção.Sentada entre as pernas dele, prestava atenção a cena em que o protagonista canta a canção que escreveu para o seu amor. Não pude deixar de chorar ao ouvir a canção romântica, mas, ao mesmo tempo, melancólica.— Só você mesmo, para me fazer assistir aos filmes melosos.Diz, cheirando meu cabelo.— O filme é lindo e você não pode falar o contrário.Respondi, fazendo um carinho em sua perna.— Linda é você e agora que o filme terminou, será que podemos namorar um pouco? Não é sempre que eu tenho a sorte da Emma deixar eu usar a casa dela, para um encontro amoroso c
PriscilaEstamos na cozinha da casa da Emma. Sentados um do lado do outro com a avó dele, a nossa frente nos olhando como aquelas diretoras prestes a passar um belo sermão aos alunos. Me sinto tão envergonhada ao ser pega num momento tão íntimo com Ethan que penso que nunca mais vou colocar os pés aqui. Enquanto estou envergonhada, Ethan age como se o que fizemos fosse algo normal.— Não quero parecer a avó chata e careta, algo que meu neto sabe que eu não sou. Porém, não posso deixar passar o que quase aconteceu debaixo do meu teto.Emma diz, sinto meu rosto arder de tanta vergonha e humilhação e queria sumir da frente dela num piscar de olhos.— Parece até que os jovens não transam hoje em dia.Ethan respondeu com ironia recebendo um olhar de advertência da sua avó.— Nada de brincadeiras sem graça, garoto. Você sabe muito bem do que eu quero falar. Você nem mesmo conheceu a mãe da Priscila, como quer dormir com a garota, quando nem mesmo fez o papel de homem como se deve fazer.Emm