Capítulo 6

Priscila

— Você tá esquisita e muito calada para o meu gosto.

Bia e eu estamos em seu quarto, sentadas no chão, enquanto ela pinta as unhas do pé, eu leio o livro obrigatório do cursinho para o vestibular. Mesmo estando no começo do ano, ainda assim preciso focar cem por cento nos estudos.

— Não tenho nada. Estou somente estudando e aguardando a chegada da mamãe.

Respondi, voltando a atenção ao capítulo que estou lendo.

— Engraçado, que você não parece que está apenas lendo. Ficou caladinha no jantar, mamãe te perguntava as coisas e você respondia numa má vontade. O que tá pegando, contigo? O gatinho da boate te dispensou, foi isso? Você se arrumou demais para estudar naquele seu cursinho chato. Conta a verdade para sua melhor amiga. O carinha com nome diferente, te deu um bolo e você agora está se sentindo péssima porque continua virgem aos dezoito.

Bia, não cansa de tirar sarro de mim, por achar que fui descartado. Para que ela deixasse de encher o meu saco, decidi contar sobre o encontro.

— A gente se encontrou na porta do cursinho. O Ethan me levou na sorveteria, conversamos, ele me trouxe para a casa e não aconteceu nada, além disso.

Omiti os beijos trocados no carro, não sou louca de expor tudo e dessa forma ser feita de chacota por ela.

— Puta que pariu! Não acredito no que está me contando e acho que esse tal Ethan é coisa da sua cabeça. Nunca que você anda sozinha no carro de um desconhecido, do jeito que caga de medo da sua mãe. Priscila, conta outra, porque essa sua mentira eu não acredito.

Beatriz, respondeu, rindo de mim e percebo que minha amiga acha que eu inventaria uma mentira dessas.

— Não estou mentindo — falei na defensiva, vendo Beatriz parar com a pintura nas unhas para dar um tapinha de leve no meu rosto.

— Você ficou doida, foi?

Disse, afastando sua mão do meu rosto.

— Doida aqui é você. Pare de ficar sonhando com o príncipe encantado e comece a viver a realidade que você vive. Agora tomarei um banho, que hoje a noite sairei com o Juninho. Mas bico fechado, que espero os meus pais dormirem para encontrar com ele. Você deveria vir comigo, vai que acaba encontrando algum gatinho lá no baile.

Se levanta do chão, guardando suas coisas na necessaire, enquanto volto para a minha leitura. É melhor assim, Beatriz achando que é mentira minha. Pois se não der certo entre a gente, finjo que nunca o conheci e sigo a minha vida, tranquila como sempre vivi até hoje.

***

— Filha, não gosto de te deixar sozinha, porém vou ficar a semana inteira chegando em casa no mesmo horário.

Mamãe e eu estamos em casa, ela passou na casa da tia Kátia para me buscar e agora conversamos na cozinha de casa, enquanto ela prepara o almoço de amanhã. Mesmo não morando no luxo, temos uma vida estável e mamãe se esforça para que eu tenha o melhor em casa.

— Kátia, sabe que você tem que ficar me esperando na casa dela e passo para te buscar. Como foi a aula hoje? Fiquei tão preocupada lá no consultório. Você sabe como não gosto de te deixar em casa sozinha, mas o doutor Júlio marcou pacientes para depois das dezoito horas a semana inteira, como ele vai me pagar um extra por isso, aceitei, pois estou juntando dinheiro para as despesas, quando você começar a faculdade no próximo ano.

Mamãe comenta comigo. Eu me sinto mal, porque estou mentindo, por sair do curso e ido direto para um encontro com um garoto desconhecido. Se a minha mãe soubesse que deixei um homem me beijar e tocar com carinho o meu rosto e minhas pernas, poderia mandar o pastor me rezar por ter um espírito mundano ao lado.

— A senhora não tem que ficar economizando tanto assim, eu quero tentar mudar o horário do curso para a parte da manhã e conseguir um serviço de meio período para auxiliar nas despesas. Não é justo a senhora arcar com tudo sozinha, quando eu já sou uma mulher adulta.

Respondi. Mamãe diminui o fogo do arroz, vindo sentar na cadeira ao meu lado.

— Meu amor, quero apenas que você se esforce nos estudos para se tornar uma mulher digna e com um diploma. Além de ser a única filha que tenho, não quero que você termine os seus dias, trabalhando para os outros em um emprego como o meu.

Mesmo amando o consultório e o doutor Júlio sendo um bom patrão, mamãe quer um futuro diferente para a sua filha. Tanto que namoro é algo proibido em nossa casa, enquanto eu não terminar a faculdade, que se eu conseguir passar no vestibular, será aos vinte e três anos.

— Eu entendo, porém, eu quero auxiliar a senhora e já disse que vou dar um jeito de conseguir um trabalho temporário, nem que seja durante as férias do meio do ano.

Encerrei a conversa, levantando-me da cadeira, para preparar a salada, do dia seguinte. Minha mãe sempre preparava o almoço à noite, pois até mesmo o dinheiro da alimentação ela economizava para que eu pudesse lanchar no cursinho e pagar a minha passagem de ônibus ida e volta. Bia é que vivia dizendo que não faria isso por filho, mesmo sendo uma boa filha como eu. Me zoava falando que até os bons cometem falhas e que mamãe só faltava me colocar num altar por achar que eu era uma pessoa sem defeitos. Não decepcionaria nunca a minha mãe e encontrar Ethan outra vez, era melhor deixar claro que entre a gente não teria nada e assim posso seguir meus estudos sem nenhum tipo de distração.

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