Vincenzo D'AngelisO silêncio da noite era mais profundo do que o habitual, o tipo de quietude que só se encontra nas horas mais tardias, quando o mundo parece ter parado. Estava na sala, uma luz suave iluminando apenas o suficiente para que eu visse o rosto sereno de Enrico, adormecido em meus braços. Era sexta-feira, o final de uma semana que, para minha surpresa, foi diferente de qualquer outra.Eu nunca fui o tipo de homem que fica em casa. Não tinha tempo para isso. Estar aqui, cuidando do meu filho, era uma novidade que, admito, no início não me agradava muito. Meu lugar sempre foi na linha de frente, no controle das operações, com decisões pesadas sobre meus ombros. Mas algo mudou. Algo que eu não havia previsto.Olhei para o pequeno Enrico, o corpo quente e frágil aninhado no meu peito. Ele não fazia ideia do mundo que o esperava, do caos que poderia engoli-lo se eu não estivesse à altura da tarefa de protegê-lo. Eu não sabia o que estava fazendo como pai — quem no meu lugar s
Antonella FontanaAcordei no sábado, pensativa. Eu e Vincenzo acabamos criando uma amizade onde temos mais liberdade para nos abrir e brincar, aliviando todo o peso da decisão que está próxima. Isso me deixa um pouco ansiosa, pois percebo que estou me apegando mais a Vincenzo e a Enrico, como se ele realmente fosse meu filho. E isso não é bom.Levantei-me, seguindo meu ritual matinal, e segui para o quarto do pequeno, onde uma cena aqueceu meu coração mais do que todas que presenciei essa semana. Vincenzo estava trocando a fralda de Enrico. Até aí, normal. Mas a forma como ele conversava com o bambino, prometendo ser um bom pai, prometendo protegê-lo e fazer dele um homem forte, um líder nato, era de partir o coração. Sua voz saía com tanto carinho e afeição que não pude evitar um sorriso, talvez me rendendo um pouco mais a esse homem.— Vince, tudo bem por aí? — me critiquei mentalmente por ter usado apelidos, mas ao ver o leve sorriso de Vincenzo, esse arrependimento desapareceu.—
Vincenzo D'AngelisAcordei no sofá, a luz da manhã filtrando-se através das cortinas. A sensação de ter Antonella ao meu lado durante a noite ainda estava fresca em minha mente. Não conseguia deixar de lembrar do jantar, da forma como nossos olhares se cruzaram e do calor que crescia entre nós enquanto cozinhávamos e assistíamos ao filme. A proximidade dela me deixou com um nó no estômago, uma mistura de alegria e apreensão. Nunca pensei que me sentiria tão confortável, tão relaxado, mesmo em meio ao caos da minha vida.Levantei-me devagar, tentando não fazer barulho para não a acordar. A noite foi tranquila, mas a imagem dela adormecida ao meu lado fez meu coração acelerar. Enquanto caminhava até a cozinha, fui tomado por um sentimento de gratidão. A Raposa havia se tornado uma parte importante da minha vida, e cuidar de Enrico não seria a mesma coisa sem ela.Decidi preparar um café para nós dois. O aroma do café fresco começou a preencher o ar, e a sensação de estar em casa, cercad
Vincenzo D'AngelisA segunda-feira chegou, trazendo consigo uma pesada atmosfera de expectativa. Acordei cedo, o sol ainda tímido, refletindo minha própria hesitação. Após o almoço em família ontem, um misto de alegria e alívio ainda pulsava em mim, mas hoje era diferente. A sensação de normalidade que havia experimentado com Antonella e minha família agora era apenas um eco distante, sufocada pelo peso das responsabilidades que estavam por vir.As horas pareciam arrastar-se, e minha mente estava a mil. Pensei no conselho, em como a reunião seria tensa, e como, mais uma vez, minha vida estaria nas mãos deles. O jantar com minha família me deixara contente, mas o retorno à realidade que a máfia exigia de mim era implacável. Eu sabia que estava prestes a enfrentar uma decisão que mudaria não apenas minha vida, mas também a vida de Antonella e Enrico.A casa do conselho tinha um ar imponente, com paredes decoradas com fotos de antigos chefes da máfia, cada um com seu olhar decidido e imp
Vincenzo D'AngelisChego do anexo dos meus pais e a cena diante de mim é familiar, quase reconfortante. A raposa está na cozinha, fazendo algo que se tornou parte do nosso cotidiano, enquanto Enrico está quietinho em seu carrinho, observando com curiosidade. Antonella canta suavemente uma canção infantil, seu sorriso iluminando o ambiente. O aroma do molho de tomate e manjericão é irresistível, e meu estômago ronca alto, quebrando a serenidade do momento.Ela para de cantar e me encara, seus olhos escuros cheios de preocupação.— Vince, por Dio! Estava preocupada. Como foi lá? O que decidiram? — Ela desliga a panela, seu olhar intenso me faz sentir como se estivesse sendo examinado.Suspiro, sabendo que a conversa que precisamos ter não será fácil.— Eles deram a decisão deles. Preciso me casar dentro de dois meses, mas tenho apenas uma semana para apresentar a noiva e Enrico formalmente para o conselho. A moça precisa ser virgem e ter vínculo com a máfia.O impacto das minhas palavra
Antonela FontanaOs dias passaram, e Vincenzo voltou à sua correria habitual. Nossas refeições com sua família eram frequentes, mas nossas interações se tornaram breves, quase mecânicas. À noite, depois que o piccolo dormia, assistíamos a algo na televisão, trocávamos algumas palavras, mas uma névoa de tensão pairava sobre nós. Era inevitável que tudo estivesse diferente. A distância crescia, mesmo que nossos olhares ainda se encontrassem com a mesma intensidade. Contudo, esses olhares agora estavam carregados de incertezas, de dúvidas não ditas... e de uma despedida silenciosa.Hoje era quarta-feira, e Vince parecia mais tenso que o normal. Voltávamos de um almoço na casa de seus pais, e o silêncio entre nós era mais pesado do que o habitual.— Vince, tutto bene? — sussurrei, tentando não quebrar o frágil equilíbrio entre nós.— Está sim, Raposa — ele me ofereceu um meio sorriso, mas seus olhos estavam longe. — Queria te dizer que hoje à tarde uma moça vai vir aqui, uma das escolhas
Vincenzo D'Angelis Hoje era domingo, um dia sagrado para la famiglia. Mama Camille fazia questão de reunir todos à mesa. Para ela, o domingo era mais do que uma simples tradição; era um ritual que reforçava os laços da família. Quem ousasse faltar pagaria caro, não com dinheiro ou punições físicas, mas com os intermináveis sermões e olhares de desaprovação que só a matriarca sabia dar. O respeito por ela era absoluto, e até mesmo papa Alessandro, o capo da família D'Angelis, seguia suas ordens. Por mais que ele comandasse negócios, acordos e até exércitos, dentro de casa, era a voz de Camille que prevalecia. Estávamos todos reunidos, saboreando o final da sobremesa — torta di mele, como sempre no domingo. O ambiente era leve, as conversas fluíam, e por um momento, o peso da vida que levávamos fora dessas paredes parecia distante. Entretanto, a calma foi interrompida pela entrada discreta de dona Germana, nossa governanta de confiança, que se aproximou da mesa com um olhar preocupad
Antonella FontanaAssim que o senhor Vincenzo sai, aproveito o momento de paz para ir até o quarto onde o pequeno Enrico está. A cena é até cômica: uma pequena bolinha de bebê, bem embrulhada, deitada no meio de uma cama enorme. Sinto um misto de ternura e incredulidade ao vê-lo ali, tão indefeso e alheio ao peso que o nome D'Angelis carrega. Ele mal sabe o que o espera.Olho ao redor e faço uma análise rápida do que será necessário para transformar aquele ambiente impessoal em um quarto de bebê adequado. Anoto mentalmente: uma cômoda com trocador, uma poltrona confortável para amamentação, um berço decente, uma babá eletrônica e, claro, uma banheira. Também vou precisar de um carrinho. No quesito de móveis, isso deve bastar por enquanto.Fecho a porta com cuidado e sigo em direção ao meu novo quarto. Ele é grande, frio, sem personalidade. Embora a cama seja macia e confortável, o ambiente está longe de ser acolhedor. Não faço questão de pedir mudanças, sei que isso é temporário. No e